Pobreza menstrual

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Caixa de doação de produtos menstruais
Caixa de doação de produtos menstruais

Pobreza menstrual, também chamada de precariedade menstrual, é o termo dado à falta de acesso a produtos para manter uma boa higiene no período da menstruação e está relacionada à pobreza, bem como à infraestrutura do ambiente de vida, especialmente o saneamento. O termo também se refere à falta de acesso à educação necessária para saber como cuidar da higiene menstrual.  A pobreza menstrual e o tabu em torno da menstruação impedem meninas e mulheres cisgênero e também homens trans de participar da vida cotidiana, o que tem consequências graves como o absentismo na escola ou no trabalho durante os períodos menstruais.[1]

O direito à higiene menstrual foi reconhecido como um direito humano e uma questão de saúde pública, pela ONU, em 2014.[2]

O assunto foi tema do premiado documentário Period. End of Sentence. (Absorvendo o Tabu), de Rayka Zehtabchi, vencedora do Oscar de Melhor Curta-Metragem Documental em 2019.

O caso no Brasil[editar | editar código-fonte]

No Brasil, estima-se que 22% da população adolescente entre os 12 e os 14 anos de idade que menstrua sofra de pobreza menstrual; o número sobe para 26% em jovens entre os 15 e os 17 anos de idade.[2] Também a população encarcerada ou em situação de rua está particularmente exposta à pobreza menstrual.[2][3]

A Unicef o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) divulgaram o estudo Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos[4], no dia em 28 de maio, escolhido para ser o "Dia Internacional da Dignidade Menstrual". Segundo o relatório, mais de 4 milhões de estudantes frequentam escolas sem estruturas sanitárias necessárias, como banheiros sem condições de uso, sem pias ou lavatórios, papel higiênico e sabão. Cerca de 200 mil não contam com nenhum item de higiene básica no ambiente escolar. Além disso, o estudo aponta que 713 mil meninas não têm acesso a nenhum banheiro (com chuveiro e vaso sanitário), nem mesmo em suas casas. E outras 632 mil meninas vivem sem sequer um banheiro de uso comum no seu terreno ou propriedade.[5]

No que diz respeito à população encarcerada, segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), o Brasil registra 37.828 mulheres presas. Desse total, 24,9% estão em unidades que não contam com estrutura de higiene necessária para lidar com o período menstrual. De acordo com o livro Presos que Menstruam, de Nana Queiroz, o material distribuído nos presídios para higiene pessoal era idêntico para pessoas de todos os sexos e não contavam com nenhum tipo de absorvente e as quantidades de papel higiênico eram iguais para todas as pessoas, desconsiderando as necessidades daquelas que menstruam. [5]

A 3 de junho de 2019, Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro aprovou a lei nº 6603, garantindo o fornecimento de absorventes nas escolas públicas daquele município.[2]

Em 2019, Rafaella de Bona, na altura aluna de Design da Universidade Federal do Paraná, desenvolveu um absorvente menstrual para pessoas em situação de rua.[3] Feito à base de fibra de banana, este absorvente tem a forma de um rolo de papel higiénico e é sustentável.[3] A designer explicou que teve a ideia depois de assistir ao documentário Period. End of Sentence.[3]

Legislação federal[editar | editar código-fonte]

Em 26 de agosto de 2021, a Câmara dos Deputados do Brasil aprovou um projeto de lei (PL 4.968, de 2019) de autoria da então deputada Marília Arraes (PT-PE) e de mais 34 congressistas cujo objetivo era de combater a pobreza menstrual a nível nacional através, dentre outras coisas, da oferta gratuita de absorventes a estudantes em escolas de nível médio e fundamental; pessoas em situação de rua (ou de extrema vulnerabilidade) e presidiárias (ou em cumprimento de medida socioeducativa). De acordo com o projeto, Estados, Distrito Federal e municípios podem aderir ao programa federal.[6][7]

Em 14 de setembro do mesmo ano, o Senado Federal aprovou o referido projeto de lei, que foi à sanção do então presidente Jair Bolsonaro.[7]

Em outubro de 2021, Bolsonaro vetou a distribuição gratuita de absorvente menstrual para estudantes de baixa renda de escolas públicas e outros grupos previstos no projeto de lei, sob o argumento de suposta falta de previsão de fonte de custeio para o programa. Entretanto, o projeto aprovado previa que os recursos usados no programa seriam provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS) – e, no caso das presidiárias, do Fundo Penitenciário Nacional.[8]

Em 10 de março de 2022, após engajamento de parlamentares mulheres e de organizações da sociedade civil, o Congresso Nacional derrubou o veto presidencial, restaurando, assim, o programa.[9][10]

O caso em Portugal[editar | editar código-fonte]

Em maio de 2021 a deputada Cristina Rodrigues entregou um projeto de resolução na Assembleia da República que recomenda ao Governo português a distribuição gratuita de copos menstruais e outros produtos higiênicos nos centros de saúde. Na iniciativa, a deputada (ex-PAN) recomenda ao Governo que garanta a distribuição gratuita de produtos de higiene menstrual, incluindo copos menstruais, nos centros de saúde, escolas, universidades e institutos politécnicos, assim como a promoção de programas de literacia menstrual para acabar com o estigma associado à menstruação, principalmente na comunidade estudantil.[11]

O caso na Escócia[editar | editar código-fonte]

Em novembro de 2020 a Escócia se tornou o primeiro país do mundo a determinar a gratuidade dos produtos de higiene menstrual para todas as pessoas que menstruam. O projeto de lei foi apresentado pela parlamentar Monica Lennon, cuja campanha para acabar com a pobreza menstrual remonta ao ano de 2016.[12][13]

O caso no Reino Unido[editar | editar código-fonte]

No Reino Unido, o movimento #FreePeriods (menstruação gratuita), organizado pela ativista Amika George, iniciou em 2017 uma onda de conscientização sobre o assunto em marchas de protesto pelo fim da pobreza menstrual. Como consequência, poucos meses depois foi feito um anúncio no Parlamento Britânico de que 1,5 milhão de libras do fundo de impostos  de absorventes internos seria doado a instituições de caridade.[14]

De seguida, em 2018, a Escócia fez história ao se tornar o primeiro país no mundo a se comprometer com a causa e em 2020 a ser o primeiro a fornecer produtos menstruais gratuitos em todas as escolas, faculdades e universidades. O projeto foi aprovado pelo parlamento escocês por unanimidade. Os produtos passaram a estar disponíveis em todos os banheiros, como sabonete e papel higiênico, para que todos os alunos tenham acesso a suprimentos de período, independentemente de recursos financeiros ou quaisquer outras barreiras de acesso aos produtos em casa que possam enfrentar. Além disso podem ser adquiridos por pessoas de famílias de baixa renda.[15][13][16]

Desde janeiro de 2021 que no Reino Unido os produtos menstruais, como os absorventes tradicionais e os internos, não são mais taxados. A medida retirou desses itens a classificação de "produtos não essenciais", que é a classificação dele no resto União Europeia, para "produtos essenciais".[17]

Durante a pandemia da COVID-19, algumas redes de supermercado também passaram a dispor gratuitamente os produtos de higiene menstrual na Irlanda. No país, metade das das adolescentes entre 12 e 19 anos disseram dificuldade em comprar estes produtos. Cerca de 60% afirmaram já ter faltado à escola por causa da menstruação.[18][19]

Referências

  1. «O que é pobreza menstrual e como ela pode se agravar durante a pandemia de Covid-19». O Globo. 28 de maio de 2020. Consultado em 7 de maio de 2021 
  2. a b c d «Pobreza menstrual: um problema que afeta desde presidiárias a estudantes». Ponte Jornalismo. 8 de julho de 2020. Consultado em 10 de maio de 2021 
  3. a b c d «Estudante brasileira desenvolve absorvente sustentável para mulheres em situação de rua». O Globo. 3 de outubro de 2019. Consultado em 10 de maio de 2021 
  4. Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). POBREZA MENSTRUAL NO BRASIL: DESIGUALDADES E VIOLAÇÕES DE DIREITOS (PDF). [S.l.: s.n.] 
  5. a b «O que é pobreza menstrual e por que ela afasta estudantes das escolas». Senado Federal. Consultado em 9 de agosto de 2022 
  6. PODER360 (27 de agosto de 2021). «Câmara aprova projeto que prevê distribuição gratuita de absorventes». Poder360. Consultado em 9 de julho de 2023 
  7. a b «Câmara aprova projeto que prevê distribuição gratuita de absorventes higiênicos femininos». G1. 26 de agosto de 2021. Consultado em 9 de julho de 2023 
  8. «Bolsonaro veta distribuição gratuita de absorvente menstrual». G1. 7 de outubro de 2021. Consultado em 9 de julho de 2023 
  9. «Promulgada lei para distribuição de absorventes às mulheres de baixa renda». Senado Federal. Consultado em 9 de julho de 2023 
  10. «Congresso derruba veto de Bolsonaro à distribuição gratuita de absorventes menstruais». G1. 10 de março de 2022. Consultado em 9 de julho de 2023 
  11. Lusa. «Deputada quer copos menstruais distribuídos nos centros de saúde». PÚBLICO. Consultado em 9 de maio de 2021 
  12. «Period poverty: Scotland first in world to make period products free». BBC News (em inglês). 24 de novembro de 2020. Consultado em 10 de maio de 2021 
  13. a b «Escócia se torna primeiro país do mundo a oferecer absorventes e tampões de graça». BBC News Brasil. Consultado em 8 de maio de 2021 
  14. «Girls are still missing school because of period poverty. There is an answer | Amika George». the Guardian (em inglês). 8 de janeiro de 2019. Consultado em 8 de maio de 2021 
  15. «Britânicas terão absorvente de graça em escolas para não faltarem a aulas». www.uol.com.br. Consultado em 8 de maio de 2021 
  16. «Escócia é o primeiro país do mundo a fornecer absorventes menstruais gratuitos». CNN Brasil. Consultado em 8 de maio de 2021 
  17. «Reino Unido elimina imposto sobre absorventes para facilitar acesso das mulheres aos produtos menstruais». O Globo. 4 de janeiro de 2021. Consultado em 8 de maio de 2021 
  18. «Produtos menstruais grátis em supermercado na Irlanda». SIC Notícias. Consultado em 8 de maio de 2021 
  19. Amado, Carolina. «Lidl oferece produtos menstruais em todas as lojas da Irlanda». PÚBLICO. Consultado em 8 de maio de 2021 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]