Protestos na Bolívia em 2019
Protestos na Bolívia em 2019 | |||||||
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![]() De cima para baixo: O colapso da estátua do ex-presidente venezuelano Hugo Chávez na cidade de Riberalta. O colapso foi causado por manifestantes, já que Chávez era aliado de Evo Morales. | |||||||
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Participantes do conflito | |||||||
Governo Boliviano | Manifestantes | ||||||
Líderes | |||||||
Evo Morales | Carlos Mesa |
Protestos na Bolívia em 2019 são uma série de protestos civis em andamento em várias cidades da Bolívia.[1]
Índice
Antecedentes[editar | editar código-fonte]
A primeira rodada de votações nas eleições gerais foi realizada no dia 20 de outubro.[1] O Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) liberou duas contagens parciais de votos poucas horas após o encerramento do período de votação (uma detalhada e outra contagem rápida realizada extrapolando-se dados de uma pesquisa de boca de urna), subsequentemente atualizando a contagem de votos em um website em tempo real. A contagem rápida marcava uma vantagem de 9,33% para Evo Morales, com uma média de 95,6% dos votos apurados, enquanto a contagem detalhada, tendo apurado 72% dos votos, dava a Morales uma vantagem de apenas 0,58%.[2] Às 19:30 do horário local (UTC-4), 83,8% dos votos haviam sido contados, com 45,3% dos votos até então tendo sido lançados para Evo Morales, e 38,2% para seu principal opositor e ex-Presidente da Bolívia, Carlos Mesa, sugerindo uma vantagem de menos de 10% para Evo Morales, o que significaria a necessidade de um segundo turno nas eleições,[3] que seria realizado em 15 de dezembro. Dez minutos depois, o Tribunal Supremo Eleitoral suspendeu a contagem de votos do sistema de Transmissão de Resultados Eleitorais Preliminares, conhecido como TREP.[1][4] As autoridades eleitorais afirmaram que o sistema preliminar fora encerrado pois os dados finais oficiais estariam começando a ser disponibilizados, mas nenhuma atualização foi publicada durante a noite e a madrugada.[3] Quando o sistema voltou a reportar a contagem preliminar dos votos, às 19 horas do dia seguinte, a contagem de votos marcava 95,3%, incluindo 46,86% dos votos para o MAS de Evo Morales e 36,72% dos votos para a coalizão de Mesa, significando uma vantagem de mais de 10% para Evo Morales, o que significaria uma vitória sem segundo turno de votações. Carlos Mesa e sua coalizão alegaram fraude nesse procedimento de apurações.[2] Grupos opositores trocaram insultos e começou um clima de tensão.[5]
Protestos[editar | editar código-fonte]
Houve relatos de confrontos ocorridos no dia 21 de outubro em Sucre, Oruro, Cochabamba, La Paz e outras cidades.[1] Centenas de pessoas iniciaram protestos em frente à sede do TSE e enfrentaram a polícia, que reagiu com bombas de gás lacrimogêneo.[6] No dia 22 de outubro o vice-presidente do TSE, Antonio Costas, pediu demissão em meio a fortes críticas.[6] No mesmo dia, os protestos levaram ao fechamento da fronteira com o Brasil, entre a cidade de Puerto Quijarro, na Bolívia e Corumbá, no Brasil.[7][8] No dia seguinte, o presidente Evo Morales, anunciado como reeleito para o cargo,[9] declarou em sua rede social que o país estava em estado de emergência e "em mobilização pacífica, constitucional e permanente".[1] A Organização dos Estados Americanos (OEA) convocou então uma sessão de seu Conselho Permanente em Washington, para acompanhar a situação na Bolívia.[6]
As autoridades bolivianas aceitaram que fosse feita uma auditoria da OEA e propuseram que a comunidade cívica de Carlos Mesa se juntasse a elas, e que uma recusa exigiria uma nova eleição. O chefe da missão da OEA disse que estava se retirando da auditoria "para não comprometer sua imparcialidade" após a publicação na imprensa de um artigo que ele havia escrito antes da eleição, no qual denunciava o presidente boliviano.[10]
No dia 7 de Novembro, Patricia Arce, prefeita da cidade de Vinto, do Movimento Ao Socialismo (MAS), foi humilhada publicamente por uma multidão de opositores que a raptaram e a fizeram assinar uma carta de demissão improvisada. Além de a pulverizarem com tinta, cortaram-lhe o cabelo e obrigaram-na a andar descalça durante vários quilômetros. A Câmara Municipal foi incendiada.[11].
Em várias cidades do país, policiais se manifestavam contra o governo, na forma de "motim policial". O governo afirmou que o uso do exército contra os amotinados seria descartado.[12]
No dia 9 de novembro, Morales denunciou que foram incendiadas as casas de sua irmã na cidade de Oruro, do governador de Oruro e do governador de Chuquisaca.[13]
Demissão de ministros, parlamentares e renúncia de Evo Morales[editar | editar código-fonte]
Em 10 de novembro, a OEA recomendou uma nova eleição, que o presidente boliviano aceitou. A situação continuou a se deteriorar durante o dia: os manifestantes tomaram posse dos meios de comunicação social públicos e fizeram reféns os familiares dos políticos próximos do presidente, o que levou à demissão de vários ministros e deputados. Em discurso filmado, o Comandante-Chefe das Forças Armadas, cercado por oficiais, pediu a renúncia de Evo Morales. Logo depois, Morales renunciou ao mandato, assim como o vice-presidente Álvaro García Linera e a presidente do Senado, Adriana Salvatierra.[14] Depois da renuncia, manifestantes saquearam a casa de Morales.[15] No dia seguinte, apoiadores de Morales, conhecidos como "Ponchos Rojos", chegaram a La Paz. A situação causou a interrupção de reunião na Assembleia Legislativa Plurinacional.[16]
No dia 13 de novembro, policiais impediram que Adriana Salvatierra, ex-presidente do Senado e que era a segunda na linha de sucessão de Evo Morales, chegasse à sede do Congresso Nacional. Adriana afirmou que para que sua renúncia tivesse efeito, teria que ser lida em sessão no Congresso, e que não havia renunciado ao cargo de senadora, mas apenas à presidência do Senado.[17] Na madrugada do dia seguinte, Sergio Choque, líder da bancada do MAS, foi eleito presidente da Câmara dos Deputados. Após sua eleição, criticou a repressão policial contra os partidários do ex-presidente Evo Morales.[18] No mesmo dia, Morales concedeu uma entrevista, em que afirmou que estaria disposto a voltar para pacificar o país se o Congresso da Bolívia rejeitasse a sua renuncia.[19] Ainda no início da tarde do mesmo dia, chegou a La Paz uma grande manifestação procedente de Los Altos, que exigia a volta de Evo Morales.[20] Naquela mesma noite, Mónica Eva Copa, do MAS, foi eleita presidente do Senado, em sessão que contou com a presença de 26 senadores, que desse modo ultrapassou o quórum mínimo de dois terços da casa que tem 36 senadores.[21]
Agravamento dos protestos[editar | editar código-fonte]
Cinco cocaleros, manifestantes favoráveis a Evo Morales foram mortos em Sacaba, capital da província de Chapare, no departamento de Cochabamba no dia 15 de novembro, durante repressão a protestos. Segundo o comando da polícia local, os manifestantes portavam escopetas, coquetéis molotov, bazucas caseiras e artefatos explosivos.[22] Segundo Teresa Zubieta, delegada da Defensoria Pública em La Paz, ao final do dia, o número de mortos desde a renúncia de Evo Morales chegava a 23.[23][24] No dia seguinte, o número de mortos chegava a oito, com cerca de 125 feridos. Em sua conta no Twitter, Evo Morales condenou a repressão aos cocaleros e pediu para que as Forças Armadas e a polícia cessassem o que chamou de "massacre", pedindo a pacificação do país e a restauração do estado de direito.[25]
Segundo Nelson Cox, da Defensoria Pública em Cochabamba, as oito pessoas mortas durante os confrontos eram manifestantes que foram levados a um hospital "com ferimentos de bala", mas morreram antes de chegarem, além disso, outras 125 pessoas ficaram feridas e 110 manifestantes foram detidos.[26] Cox desmentiu as alegações policiais de que se tratou de um caso de enfrentamento e acrescentou que todos os mortos apresentavam ferimentos de projéteis na cabeça ou no tórax[27] No mesmo dia do massacre, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) condenou o uso desproporcional da força militar e policial.[28] No dia 16 de novembro, teve início a retirada de cerca de setecentos médicos cubanos que atuavam no país. O Ministério das Relações Exteriores de Cuba anunciou o encerramento da sua missão médica na Bolívia, alegando que as autoridades locais estavam promovendo violência contra os profissionais, alegando que estes estariam instigando a rebelião.[29]
No dia 19 de novembro, oito manifestantes foram mortos durante uma operação para retirar uma bloqueio a uma refinaria em El Alto[30].
Referências
- ↑ a b c d e «Evo Morales diz que paralisação na Bolívia é um golpe e declara estado de emergência». G1. 23 de outubro de 2019. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ a b «Anger mounts in Bolivia over poll result confusion». BBC (em inglês). 22 de outubro de 2019. Consultado em 25 de outubro de 2019
- ↑ a b «Concern as Bolivia poll results transmission stops». BBC (em inglês). 21 de outubro de 2019. Consultado em 24 de novembro de 2019
- ↑ «Apoiadores de Carlos Mesa vão às ruas para protestar contra o que consideram fraude nas eleições presidenciais». G1. 22 de outubro de 2019. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ «Sistema de apuração rápida retorna na Bolívia e aponta vantagem que pode dar vitória a Evo no primeiro turno». G1. 21 de outubro de 2019. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ a b c «Bolívia é sacudida por protestos diante de iminente resultado eleitoral». IstoÉ. 23 de outubro de 2019. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ Julia Braun (23 de outubro de 2019). «Bolivianos fecham fronteira com Brasil em protesto contra eleições». Veja. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ «Protesto de bolivianos fecha fronteira com o Brasil em Mato Grosso do Sul». G1. 23 de outubro de 2019. Consultado em 23 de outubro de 2019
- ↑ «Evo Morales é reeleito na Bolívia no primeiro turno, indica apuração oficial». O Globo. 24 de outubro de 2019. Consultado em 25 de outubro de 2019
- ↑ «Mutinerie dans la police bolivienne». L'Humanité (em francês). 9 de novembro de 2019. Consultado em 11 de novembro de 2019
- ↑ Confrontos violentos deixam um morto na Bolívia e prefeita é humilhada por opositores, acesso em 13 de 11 de 2019.
- ↑ «Bolivie : aspergée de peinture, ses cheveux coupés, une maire humiliée par des opposants à Morales». RT en Français (em francês). Consultado em 11 de novembro de 2019
- ↑ Evo Morales diz que casas da irmã e de dois governadores foram incendiadas na Bolívia, acesso em 13 de novembro de 2019
- ↑ «Après trois semaines de contestation, le président bolivien Evo Morales annonce sa démission» (em francês). 10 de novembro de 2019
- ↑ Casa de Evo Morales é saqueada e incendiada após renúncia, acesso em 13 de novembro de 2019.
- ↑ Al grito de "guerra civil", turba de ponchos rojos llega a La Paz y evacúan la Asamblea, acesso em 13 de novembro de 2019
- ↑ policiais-barram-entrada-de-ex-presidente-do-senado-no-congresso, acesso em 13 de novembro de 2019.
- ↑ Sergio Choque es electo presidente de la Cámara de Diputados de Bolivia, acesso em 14 de novembro de 2019
- ↑ Evo Morales ya está listo para regresar a Bolivia, acesso em 15 de novembro de 2019.
- ↑ Multidão em La Paz grita: "Volta, Evo Morales" , acesso em 15 de novembro de 2019.
- ↑ Partido de Evo Morales reassume presidência do Senado e da Câmara, acesso em 15 de novembro de 2019.
- ↑ Cinco cocaleiros leais a Evo Morales morrem em confrontos na Bolívia, acesso em 16 de novembro de 2019.
- ↑ Zubieta: Suman en total 23 fallecidos durante golpe en Bolivia, acesso em 16 de novembro de 2019
- ↑ Denuncian 23 muertos en el marco del golpe de Estado en Bolivia, em espanhol, acesso em 16 de novembro de 2019.
- ↑ Confrontos deixam 8 mortos e 125 feridos na Bolívia; Evo fala em "massacre"
- ↑ Confrontos com a polícia deixam 8 mortos e 125 feridos na Bolívia, acesso em 17 de novembro de 2019.
- ↑ Licencia para matar y salir impune en Bolivia, em espanhol, acesso em 17 de novembro de 2019
- ↑ Crise na Bolívia: Organizações internacionais criticam "uso desproporcional da força" contra seguidores de Evo Morales, acesso em 17 de novembro de 2019.
- ↑ Médicos cubanos começam a ir embora da Bolívia e acusam governo interino de maus-tratos, acesso em 17 de novembro de 2019
- ↑ Manifestantes marcham com caixões de mortos em protestos na Bolívia, acesso em 23 de novembro de 2019.