Língua iúpique do Alasca Central

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Iúpique do Alasca Central

Yugtun, Yup'ik

Pronúncia:['iuˠ.tun] / [ˈjup:ik]
Outros nomes:Cugtun, cup'ik, cup'ig, iúpique central
Falado(a) em:  Estados Unidos
Região: Oeste e Sudoeste do Alasca
Total de falantes: c. 10.000[1]
Família: Esquimó-aleúte
 Esquimó
  Iúpique
   Iúpique do Alasca Central
Escrita: Alfabeto latino
Silabário Yugtun (em desuso)[2]
Estatuto oficial
Língua oficial de:  Alasca[3]
Regulado por: Alaskan Native Language Center (Centro de Línguas Nativas do Alasca)
Códigos de língua
ISO 639-1: --
ISO 639-2: ---
ISO 639-3: esu
Distribuição das línguas iúpique

O iúpique do Alasca Central (em iúpique: yugtun, AFI: ['iuˠ.tun]), também conhecido como yup'ik, iúpique central ou cugtun,[4] é uma língua pertencente ao ramo esquimó da família esquimó-aleúte (ou escaleuta), utilizada pelo povo indígena da etnia iúpique residente nas regiões oeste e sudoeste do Alasca, Estados Unidos.

Tanto pelo número populacional quanto pela quantidade de falantes (aproximadamente 10.000),[1] forma o maior grupo étnico entre os indígenas do Alasca. Contudo, de acordo com o Atlas Mundial das Línguas em Perigo da UNESCO, faz parte do grupo de idiomas na categoria "vulnerável",[5] fenômeno que ocorre devido ao processo de aculturação da população pela prevalência da língua inglesa e da cultura estadunidense.[6] Ainda, o sirenik (Сиӷы́ных), uma de suas línguas próximas, foi classificada como extinta em 1997.[7]

Em 25% das vilas iúpique do Alasca as crianças tem a língua nativa como a primeira, porcentagem cuja localização se dá principalmente no baixo rio Kuskokwim, na ilha Nelson e ao longo da costa entre essas duas localidades.[1] O iúpique do Alasca central geral se divide em mais quatro dialetos separados por suas localizações geográficas, norton sound, hooper bay-chevak, nunivak e egegik.[8] Por causa da grande variedade linguística entre a comunidade, não é possível identificar um dialeto padrão da língua, que pode sofrer alterações pela região do falante ou por sua família.[9]

Assim como outras línguas escaleutas, o iúpique é polissintético e utiliza principalmente a adição de sufixos às raízes das palavras, estabelecendo o sentido por meio de expressões com grafias longas. Entre esses sufixos estão as chamadas pós-bases (do inglês postbases),[10] sufixos derivacionais presentes nas línguas esquimó-aleútes. Para essa língua, não existe marcação de gênero gramatical ou o uso de artigos, e a categoria de número opõe singular, dual e plural.[11]

Etimologia[editar | editar código-fonte]

O termo yup’ik é um endônimo que significa 'pessoa real', relativo tanto ao povo iúpique do Alasca central quanto ao seu idioma. É originado a partir da palavra yuk, 'pessoa' (derivação da proto-etimologia iŋuˠ) adicionada da pós-base (sufixo) -p’ik que expressa ideia de realidade ou autenticidade.[6]

Originalmente, a expressão era utilizada apenas na região norte, enquanto no sul era utilizado o termo yupiaq e, no dialeto egegik, tarupiaq. Atualmente, yup’ik é utilizado como termo comum entre os dialetos para referenciar a língua, entretanto, não substituiu totalmente os endônimos cup’ik, no dialeto chevak, e cup’ig (nativamente cugtun) no nunivak.[12]

'Pessoa(s) (ser humano)' e endônimos nos dialetos iúpique
Dialeto Singular Dual Plural Singular Dual Plural
Norton Sound (Unaliq-Pastuliq) yuk yuuk yuut (< yuuget) ~ yug'et Yupʼik Yupiik Yupiit
Iúpique Central Geral (Yugtun) yuk yuuk yuut (< yuuget) ~ yug'et Yupiaq Yupiak Yupiat
Chevak (Cugtun) cuk cuugek cuuget Cup'ik Cupiik Cupiit
Nunivak (Cugtun) cug cuug cuuget Cup'ig Cupiig Cupiit
Egegik taru ~ taruq Tarupiaq Tarupiak Tarupiat

⠀⠀⠀

Criança iúpique da Ilha Nunivak. (1930)

A origem do nome da língua está na sua utilização como forma de denominar o povo, podendo ser atribuído um significado semelhante a “pessoa da nossa gente”. O significado literal “pessoa real” é referente à utilização da comunidade como forma de designar uma pessoa comum, em contraste aos xamãs, espíritos ou divindades.[12]

Apesar de ser grafado como "yup’ik”, percebe-se uma maior recorrência do termo yugtun na oralidade. A utilização do apóstrofo no nome da língua representa um prolongamento do som da consoante 'p',[13] e auxilia na diferenciação da língua yupik (sem apóstrofo) que geralmente se refere ao idioma iúpique siberiano central, que, apesar de serem da mesma família, são mutualmente ininteligíveis.[14]

⠀⠀

Distribuição[editar | editar código-fonte]

A fluência no iúpique do Alasca central está quase completamente limitada a esse grupo étnico, no qual os falantes da língua configuram aproximadamente 42% da população.[15] Em geral, estes estão localizados entre Norton Sound, ao norte; Península do Alasca, ao sul; lago Iliamna, ao leste e a ilha Nunivak à oeste.

Dialetos[editar | editar código-fonte]

Atualmente, cinco dialetos compreendem toda a variedade linguística desse idioma, sendo eles: iúpique do Alasca central geral, norton sound, hopper bay-chevak, nunivak e egegik (atualmente considerado extinto).[16]

A formação do continuum dialetal desse idioma pode ser associada à prática histórica de tabu com relação às variações de outras regiões, pois os falantes "muitas vezes se sentem orgulhosos de seus próprios dialetos".[17] De acordo com a análise do Censo dos Estados Unidos de 1980,[18] a divisão de dialetos e sub-dialetos pode ser feita da seguinte maneira:

  • Iúpique do Alasca Central

Entre os dialetos, aquele que mais se diferencia é o nunivak, entretanto, também são perceptíveis diferenças entre os subdialetos, principalmente nos campos léxico e fonético.[21]

Comparação entre sub-dialetos do iúpique do Alasca central geral[21]
Yukon
(Kuigpak)
Kuskokwim
(Kusquqvak)
Português
elicar- elitnaur- estudar (intrans.); ensinar (alguém) (trans.)
elicaraq elitnauraq estudante
elicari- elitnauri ensinar (intrans.)
elicarista elitnaurista professor
aiggaq unan mão
ikusek cingun cotovelo
ayuqe- kenir- ferver/cozer
cella ella mundo, exterior, céu, universo, consciência
naniq kenurraq lâmpada, luz
uigtua- naspaa- provar, testar, tentar

Línguas relacionadas[editar | editar código-fonte]

O iúpique do Alasca central faz parte de um continuum dialetal que está localizado geograficamente entre o norte do Alasca, o Canadá e a Groenlândia, formando o ramo esquimó da família esquimó-aleúte.[22] Por isso, possui grande proximidade com línguas como inupiaque, inuctitute e groenlandês, pertencentes ao ramo das línguas inuíte. O idioma também possui uma forte relação com outras línguas do ramo iúpique, como o alutiiq, o iúpique siberiano central, o naukan(ski) e o extinto sirenik(ski). Sobre o último, existem divergências acerca de sua classificação pela maior diferença se comparado aos outros idiomas iúpique, por isso, pode ser considerado um ramo distinto dentre as línguas esquimó.

Escaleuta 

Aleúte

 Esquimó 

Sirenik

 ⠀Iúpique⠀ 

Alutiiq

Iúpique do Alasca Central

Naukan

Iúpique Siberiano Central

 Inuíte 

Inupiaque

Inuvialuctune

Inuctitute

Groenlandês

A principal semelhança entre as línguas esquimó-aleútes é a combinação da grande variedade de sufixos, pós-bases e morfemas,[23] caracterizando esta como uma família de idiomas polissintéticos. Alguns exemplos de expressões com um grande número de morfemas são:[12]

  • Ikircugngaan naspaayukuvgu ‎- 'você conseguirá abrí-lo se você quiser tentar'
  • Natmurteqatarcit? - 'para onde você vai?'

Fonologia[editar | editar código-fonte]

Consoantes[editar | editar código-fonte]

O iúpique do Alasca central possui 28 fonemas consonantais, em que prevalecem as consoantes desvozeadas. As consoantes plosivas não contrastam em voz, contudo, a língua possui uma grande variedade de fricativas, nas quais todas, exceto as pós-alveolar e palatal (que não incluem fricativas), possuem pares desvozeado-vozeado.[24]

Quadro consonantal do iúpique do Alasca central[24]
Labial Alveolar Consoante pós-alveolar/
Palatal
Velar Uvular
simples labializada simples labializada
Nasal desvoz. [a] [a] ŋ̊[a]
voz. m n ŋ
Plosiva p t k q
Africada t͡s[b][c] t͡ʃ[c]
Fricativa desvoz. f s x χ χʷ[b]
voz. v z ɣ ɣʷ ʁ ʁʷ
lateral ɬ
Aproximante l j w[b]
  1. a b c Todas as consoantes podem aparecer duplicadas (geminadas) exceto as três nasais desvozeadas, que não podem ser prolongadas.
  2. a b c São alófonos. A fricativa uvular surda labializada [χʷ] não ocorre no dialeto chevak e não constrasta com seu par vozeado [ʁʷ].
  3. a b São alófonos quando seguidos do schwa.

Vogais[editar | editar código-fonte]

O idioma possui quatro vogais, sendo três delas vogais tônicas, /a/, /i/, /u/; e uma átona, o schwa, que pode ser representado pelos alófonos /ɨ/ (central fechada não arredondada) ou /ə/ (central média não arredondada) e escrito como "e" na ortografia da língua.[25]

Quadro vocálico do iúpique do Alasca central[26]
Anterior Central Posterior
Fechada ⠀⠀i ⠀⠀ɨ ⠀⠀u
Aberta ⠀⠀a

Exceto para o schwa, todas as vogais podem ser combinadas com outras vogais (inclusive idênticas, no caso de duplicação) formando ditongos. Além disso, pode haver prolongamento, indicado pelo sinal ponto mediano ⟨·⟩ após a vogal prolongada. Em casos de encontro consonantal não apropriados na fala é adicionado o schwa entre as consoantes, caracterizando o fenômeno da epêntese na língua.[25]

Tons[editar | editar código-fonte]

Em apenas alguns casos o tom determina o significado de uma palavra e é majoritariamente afetado pelo prolongamento de uma vogal ou consoante. Por exemplo:[27]

  • [ag·gi:tok] akituuq - 'valioso'
  • [ag:gi·tok] akiituq - 'barato'⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
  • [nɨk·a] nek'a - 'minha casa'
  • [nɨk·a·] nekaa - 'é a casa dele'.

Ortografia[editar | editar código-fonte]

Silabário Yugtun[editar | editar código-fonte]

"Pai-Nosso" escrito no silabário yugtun.

O silabário yugtun ou silabário do Alasca (do inglês: yugtun script), foi criado aproximadamente no ano de 1900 pelo xamã iúpique Uyaquq. A fonte de inspiração do xamã foi a observação de missionários falantes da língua inglesa ao realizarem a leitura de textos sagrados, admirando suas habilidades de proferirem as palavras da mesma forma repetidas vezes. Uyaquq era monoglota, porém tinha um filho bilíngue que compreendia o inglês e o ajudava a realizar traduções de textos da Igreja dos Irmãos Morávios do Alasca para o recém-criado silabário.[28]

Inicialmente, esse sistema de escrita era pictográfico, porém a dependência demasiada das habilidades de memorização e a falta de precisão na representação de expressões pressionou mudanças em sua estrutura. Após diversas modificações, a escrita passou a representar todas as sílabas da língua, por isso, é considerada um silabário. Entretanto, apesar do completo desenvolvimento do silabário yugtun, atualmente a língua iúpique do Alasca central é majoritariamente escrita no alfabeto latino. A direção da leitura desse sistema de escrita, assim como do alfabeto latino, segue o padrão da esquerda para a direita em linhas horizontais.[28]

Alfabeto Latino[editar | editar código-fonte]

A primeira construção da ortografia prática foi realizada em 1969 pelo departamento de linguística da University of Alaska Fairbanks, e foi inclusa no programa de educação bilíngue do estado do Alasca a partir de 1970. Atualmente, a versão utilizada é a estabelecida pelo Eskimo Language Workshop em 1972[29] e que está presente no livro "A Grammar on Central Alaskan Yup'ik (CAY)" de autoria de Osahito Miyaoka (2012). A ortografia da língua é feita no alfabeto latino, sendo essa constituída por 30 letras.[30]

Alfabeto iúpique do Alasca Central
Letra AFI Observações e comparações com outros idiomas
a /a/ no português: amor
c /t͡s/ ou /t͡ʃ/ no português: participação ou tchau
e /ə/ no inglês: banana
g /ɣ/ no holandês:[ɣaːn] (ir)
gg /x/ no português: arte
i /i/ no português: milho
k /k/ no português: barco
l /l/ no português: lagartixa
ll /ɬ/ no hmong:[ɬi] (lua)
m /m/ no português: maçã
ḿ /m̥/ no inglês britânico (RP): stop me
n /n/ no português: nariz
ń /n̥/ no inglês: cotton
ng /ŋ/ no inglês: sing
ńg /ŋ̊/ no islandês: banka
p /p/ no português: pato
q /q/ no inglês: caught
r /ʁ/[a] no português: carro (vozeado)
rr /χ/ no português: carro (desvozeado)
s /z/[b] no português: zero
ss /s/ no português: sapo
t /t/ no português: tapete
u /u/ no português: urubu
u͡g /ɣʷ/ pronunciado como /ɣ/ com os lábios arredondados
u͡r /ʁʷ/ pronunciado como /ʁ/ com os lábios arredondados
u͡rr /χʷ/ pronunciado como /χ/ com os lábios arredondados
v /v/ ou /w/ no português: avião ou quando
vv /f/ no português: fantasma
w /xʷ/ pronunciado como /x/ com os lábios arredondados
y /j/ no português: ioiô
  1. Caso no final de uma palavra, representa /χ/
  2. Caso no início de uma palavra, representa /s/

O uso de hífens é feito em casos de empréstimos estrangeiros, que correspondem majoritariamente a palavras de origem russa ou de idiomas vizinhos, como o inupiaque. Além disso, é utilizado para indicar a aglutinação de morfemas, como nos exemplos:[31]

Caiaques de Nunivak (1936)
  • Angya ‎- 'barco'
  • Angya-a ‎ ‎- 'barco dele'
  • Angya-m-ni‎ - 'no meu barco'
  • Angya-ge-m-ni ‎- 'nos meus dois barcos'

No caso dos enclíticos - morfemas adicionados após as flexões verbais como no português "amá-lo" - é utilizado o símbolo de igualdade (=).[32]

  • Tai-li=tuq - 'eu espero que ele venha'

Gramática[editar | editar código-fonte]

Pronomes[editar | editar código-fonte]

Pronomes pessoais[editar | editar código-fonte]

Nessa língua, os pronomes pessoais são palavras independentes e utilizadas para associar principalmente os seres humanos aos sujeitos ou objetos de uma frase, bem como possuidores de substantivos. Apesar de ser um idioma muito sensível a questões de tratamento ou contextos atitudinais, o iúpique do Alasca central não possui variações que indiquem os níveis de formalidade.[33] A terceira pessoa (não reflexiva) possui distinção entre absolutivo ou relativo (ergativo/genitivo).

Pronomes pessoais em iúpique do Alasca central[34]
Singular Plural Dual
Primeira pessoa /wii/ ~ /wiiŋa/ /waŋkuta/ /waŋkuk/
Segunda pessoa /ɨɬpɨt/ /ɨɬpɨci/ /ɨɬpɨtɨk/
Terceira pessoa (absolutivo) /ɨɬii/ /ɨɬait/ /ɨɬkɨk/
Terceira pessoa (relativo) /ɨɬiin/ /ɨɬaita/ /ɨɬkɨnka/
Terceira-reflexiva /ɨɬmi/ /ɨɬmiŋ/ /ɨɬmɨk/
Primeira pessoa[editar | editar código-fonte]

Existem duas formas distintas para indicar o singular: wii, que significa "eu" e wiinga "sou eu", de modo que a segunda é considerada uma variação mais enfática que possui a adição da pós-base /-ŋa/, utilizada para indicar ideia de "estar em estado de" ou "ser".[34] Juntamente com as formas plural e dual, possui relação com a raiz /wa-/, que se refere à ideia do imediato, seja no espaço ou no tempo, podendo ser associada aos pronomes pessoais da primeira pessoa. O uso dessa raiz em outros contextos ocorre em palavras como waniwa "agora", watua! "nesse exato momento" (exclamação) e waken "daqui".

Segunda pessoa e terceira pessoa reflexiva[editar | editar código-fonte]

Ambas derivam da raiz /ɨɬ-/ e não distinguem entre os casos absolutivo e relativo. Apenas para a terceira pessoa reflexiva, também chamada "quarta pessoa" no estudo das línguas esquimó,[35] é permitido o uso do pronome pessoal para objetos inanimados ou não humanos.

Terceira pessoa[editar | editar código-fonte]

A terceira pessoa deriva da raiz /ɨɬɨ-/ e possui distinção entre os casos absolutivo e relativo. Não existe clara distinção de gênero entre os pronomes, por isso, são glossados como 'ele' para humanos e 'isso' para não-humanos, exceto em casos pragmáticos em que a interpretação do contexto indica o uso de 'ela'.[36]

Substantivos[editar | editar código-fonte]

Gênero[editar | editar código-fonte]

A distinção de gênero ou classe, como feminino, masculino ou neutro, não possui força nesse idioma. Só são utilizadas diferenciações em contextos práticos, e, muitas vezes, podem não ser especificadas. Culturalmente essa tendência pode ser observada na liberdade de nomear as crianças sem nomes específicos para determinado gênero, mesmo que alguns possam soar mais apropriados para a comunidade.[37]

Número[editar | editar código-fonte]

As flexões por número na língua iúpique do Alasca central, assim como outras línguas da família escaleuta, são singular, plural e dual, apesar da última ser menos recorrente entre as novas gerações de falantes[36] devido à substituição pela flexão plural semelhante à língua inglesa.

Casos gramaticais[editar | editar código-fonte]

O idioma possui oito casos gramaticais, sendo eles: absolutivo, relativo, locativo, alativo, ablativo-modalis, terminativo, prolativo e equalis.[38]

Caso absolutivo[editar | editar código-fonte]

O caso absolutivo é aquele que modifica um substantivo com o intuito de indicar o objeto direto de um verbo transitivo ou o sujeito de um verbo intransitivo.[39] As terminações para o caso absolutivo são:[40]

Número do substantivo
singular dual plural
Sem possuidor Ø :(e)t :(e)k
1ª pessoa sing. -ka :(e)gka :(e)nka
dual -puk[a] :(e)gpuk -puk
plural -put[b] :(e)gput -put
2ª pessoa sing. :(e)n :(e)gken -ten
dual -tek[c] :(e)gtek -tek
plural -ci[d] :(e)gci -ci
3ª pessoa sing. :(ng)a :(e)k :(ng)i
dual :(ng)ak :(e)gkek -kek
plural :(ng)at :(e)gket :(ng)it
4ª pessoa

(reflexivo)

sing. -ni :(e)gni -ni
dual -tek[e] :(e)gtek -tek
plural -teng[f] (e)gteng -teng
  1. -vut caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
  2. -vuk caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
  3. -sek caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
  4. -si caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
  5. -sek caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
  6. -seng caso ligada a pós-bases terminadas em vogal.
Caso relativo[editar | editar código-fonte]

O caso relativo é tradicionalmente utilizado na linguística das línguas esquimó para se referir aos casos genitivo, referente à posse, e ergativo, utilizado em contraposição ao caso absolutivo. Serve para marcar os substantivos com função de sujeito de um verbo transitivo ou a ideia de "possuidor". Nota-se que, exceto para o possuidor da terceira pessoa, as terminações do substantivo singular e plural são idênticas.[41] As terminações para o caso relativo são:[42]

Número do substantivo
singular plural dual
Sem possuidor :(e)m :(e)t :(e)k
1ª pessoa sing. -ma :(e)gma
dual -megnuk[a] :(e)gmegnuk
plural -mta :(e)gemta
2ª pessoa sing. -vet/+pet[b] :(e)gpet
dual -vtek/+petek[b] :(e)gpetek
plural -vci/+peci[b] :(e)gpeci
3ª pessoa sing. :(ng)an :(ng)in :(e)gken
dual :(ng)agnek -kenka :(e)gkenka
plural :(ng)ata :(ng)ita :(e)gketa
4ª pessoa

(reflexivo)

sing. -mi :(e)gmi
dual -mek :(e)gmek
plural -meng[c] :(e)gmeng
  1. Ou -mnuk.
  2. a b c À esquerda, variação que pode ser utilizada tanto para pós-bases terminadas em vogal quanto para consoantes. A variação da direita é utilizada apenas após consoantes.
  3. Outras formas são -megta e -megteng.
Casos locativo, terminativo, ablativo-modalis e alativo[editar | editar código-fonte]

O caso locativo funciona como indicador do nome de um local em uma descrição espacial. No português, uma expressão locativa seria algo como: "O supermercado fica ao lado da escola". Nessa língua, o caso locativo é marcado nos substantivos, como nos exemplos "supermercado" ou "escola", que sofrem derivação.[43]

O caso terminativo serve como marcador do limite, seja no tempo ou no espaço, que um substantivo possui em si próprio. No português, esse caso é comparável à expressão "até", como em "até às oito horas". Na língua iúpique, o substantivo é marcado de acordo com a ideia de seu término.[44]

O caso ablativo-modalis é menos usual nas línguas do mundo, entretanto, está muito presente no estudo das línguas iúpique. Sua utilização tem uma finalidade mais ampla pois engloba dois outros casos, o ablativo e o modalis, sendo o primeiro majoritariamente relacionado aos agentes da passiva e o segundo relativo a ideias como habilidade, necessidade, intenção ou obrigação, como nos verbos em português "poder" e "dever".[45]

O caso alativo determina o movimento em direção à algo ou a um lugar. Tem como significado "sentido voltado para o exterior".[46] As terminações para o caso locativo são:[44]

Número do substantivo
singular dual plural
Sem possuidor ~mi :(e)gni ~ni
1ª pessoa sing. -mni :(e)gemni -mni
dual -megni :(e)gmegni -megni
plural -mteni :(e)gemteni -mteni
2ª pessoa sing. -vni/+peni[a] :(e)gpeni -vni/+peni[a]
dual -vtegni/+petegni[a] :(e)gpetegni -vtegni/+petegni[a]
plural -vceni/+peceni[a] :(e)gpeceni -vceni/+peceni[a]
3ª pessoa sing. :(ng)ani :(e)gkeni :(ng)ini
dual :(ng)agni :(e)gkegni -kegni
plural :(ng)atni :(e)gketni :(ng)itni
4ª pessoa

(reflexivo)

sing. -mini :(e)gmini -mini
dual -megni :(e)gmegni -megni
plural -meggni :(e)gmeggni -meggni
  1. a b c d e f À esquerda, variação que pode ser utilizada tanto para pós-bases terminadas em vogal quanto para consoantes. A variação da direita é utilizada apenas após consoantes.

As terminações do locativo são bastante semelhantes as terminações dos outros três casos. No caso ablativo-modalis há a substituição do i final por ek e, no terminativo, este é substituído por un.

Caso prolativo[editar | editar código-fonte]

É empregado em um substantivo para expressar o meio que é executada uma ação, a exemplo de "por meio de" ou "através de" no português.[47] As terminações para o caso prolativo são:[48]

Número do substantivo
singular dual plural
Sem possuidor -kun :(e)gnegun[a] -tgun
1ª pessoa sing. -mkun :(e)gemkun -mkun
dual -megnegun :(e)gmegnegun -megnegun
plural -mteggun :(e)gemteggun -mteggun
2ª pessoa sing. -vkun/+pegun[b] :(e)gpegun -vkun/+pegun[b]
dual -vtegnegun/+petegnegun[b] :(e)gpetegnegun -vtegnegun/+petegnegun[b]
plural -vcetgun/+pecetgun[b][c] :(e)gpecetgun -vcetgun/+pecetgun[b][c]
3ª pessoa sing. :(ng)akun :(e)gkenkun :(ng)ikun
dual :(ng)agnegun :(e)gkegnegun -kegnegun
plural :(ng)atgun :(e)gketgun :(ng)itgun
4ª pessoa

(reflexivo)

sing. -mikun :(e)gmikun -mikun
dual -megnegun :(e)gmegnegun -megnegun
plural -megteggun :(e)gmegteggun -megteggun
  1. Ou -e(g)kun
  2. a b c d e f À esquerda, variação que pode ser utilizada tanto para pós-bases terminadas em vogal quanto para consoantes. A variação da direita é utilizada apenas após consoantes.
  3. a b Outras formas são -vciuggun/+peciuggun e -(e)gpeciuggun
Caso equalis[editar | editar código-fonte]

Também chamado aequalis ou equativo, este realiza a marcação de igualdade ou semelhança de algo em comparação ao substantivo no qual é empregado.[49] As terminações para o caso equalis são:[50]

Número do substantivo
singular dual plural
Sem possuidor -tun :(e)gtun -cetun
1ª pessoa sing. -mtun :(e)gemtun -mtun
dual -megtun :(e)gmegtun -megtun
plural -mcetun :(e)gemcetun -mcetun
2ª pessoa sing. -vtun/+petun[a] :(e)gpetun -vtun/+petun[a]
dual -vtegtun/+petegtun[a] :(e)gpetegtun -vtegtun/+petegtun[a]
plural -vcetun/+pecetun[a] :(e)gpecetun -vcetun/+pecetun[a]
3ª pessoa sing. :(ng)atun :(e)gketun :(ng)itun
dual :(ng)agtun :(e)gkegtun :(ng)igtun
plural :(ng)acetun :(e)gkecetun -kegtun
4ª pessoa

(reflexivo)

sing. -mitun :(e)gmitun -mitun
dual -megtun :(e)gmegtun -megtun
plural -megcetun :(e)gmegcetun -megcetun
  1. a b c d e f À esquerda, variação que pode ser utilizada tanto para pós-bases terminadas em vogal quanto para consoantes. A variação da direita é utilizada apenas após consoantes.

Adjetivos[editar | editar código-fonte]

A língua iúpique do Alasca central não possui uma classificação ou categoria definida para adjetivos, pois possui apenas um pequeno inventário de sufixos com essa função específica. Percebe-se a introdução de uma oração intransitiva relativa em um período para adjetivar o substantivo. Além disso, é recorrente a utilização das pós-bases marcadoras do modo particípio intransitivo /-lria/ e /-nguq/, que significam 'aquele que é X' (ideia de autenticidade). Exemplos de frases com essa estrutura são:[51]

  • Qertulria ingriq - 'montanha alta' (quertu = ser alto; /-lria/ = autêntico/aquele que é; ingriq = montanha)
  • Assiilnguq qantaq - 'tigela ruim' (assiil = ser ruim; /-nguq/ = autêntico/aquele que é; qantag = tigela)

Nota-se que "quertu" e "assiil", palavras que denotam características dos substantivos, são consideradas verbos.

Verbos[editar | editar código-fonte]

Conjugação[editar | editar código-fonte]

A conjugação de verbos no idioma é marcada obrigatoriamente pelos fatores concordância e modo verbal.[52] O primeiro está relacionada ao número, pessoa e transitividade dos verbos, enquanto o segundo diz respeito à atitude ou intenção do que é expresso. Além disso, é importante apontar que os modos verbais podem pertencer aos grupos das orações subordinadas, independentes ou do modo conectivo, que engloba uma variedade de sub-modos.

Modos[editar | editar código-fonte]

Existem seis modos verbais no idioma iúpique do Alasca central, são eles: indicativo, particípio, optativo, conectivo, aposicional e interrogativo.[53]

Modos verbais da língua iúpique do Alasca central[54]
Modos Usos mais comuns Exemplos na língua
Modos

Independentes

Indicativo Criar sentenças declarativas.[55] Ellam yuan tangvagaakut (o guardião desse mundo está nos observando).[56]
Particípio Utilizados principalmente em respostas. Tem finalidade expressiva e indica ideias como confirmação, constestação ou argumentação.[57] Tuarpiaq nunailnguten

(parece que você não tem um lugar para ficar).[56]

Interrogativo Perguntas informacionais (o que? quando? onde?) e perguntas binárias (sim ou não).[58] Kina tekita? (quem chegou?).[59]
Optativo Expressa desejos, sugestões ou pedidos do emissor. Pode também ser utilizado para pedir permissão ou consentimento.[60] Irniaqa ciumek nerli? (meu/minha filho(a) pode comer primeiro?).[61]
Co-subordinado Aposicional Produzir uma oração co-subordinada sintaticamente e semanticamente dependente da oração principal, entretanto não está completamente integrada e não faz parte dela.[62] Quteggluni itertuq (ele entrou, arrogante).[63]
Sub-modos do

modo conectivo

Causal Indicar causa, razão ou tempo ("porque", "quando"...).[64] Quyauq, aatani uterrniaraan (ela se sente grata porque seu pai voltará logo).[65]
Constantivo Indicar constância ou continuidade do que é afirmado ("sempre que", "toda vez que"...).[66] Quyalartua tangrraqamken (eu estou feliz sempre que vejo você).[67]
Precessivo Demonstrar a anterioridade do que é dito em comparação ao tempo presente ("antes").[68] Angutet maqillruut, nervailegmeng (o homem tomou um banho antes deles comerem).[68]
Concessivo Indicar ideia de concessão ("mesmo que", "apesar de"...).[69] Apteng'erpenga, kiusciigatamken (mesmo que você me pergunte, eu não posso lhe responder).[70]
Condicional Possui variadas funções. Pode indicar condição, hipótese ou contrapontos ("se").[71] Ikayuumanrilkuma, tuqucaraanga (se eu não tivesse sido ajudado(a) ele teria me matado).[72]
Indireto Utilizado para fazer sugestões, advertências ou decisões indiretas.[72] Maqiyuanllu Nuk'aq, unugpailgan (Nuk'aq também deveria tomar um banho quente antes que a noite chegue).[73]
Contemporativo Demonstra contemporaneidade do que é dito em comparação ao tempo presente ("quando").[74] Ella yagtellrani (quando a terra extendeu seus braços) (indicando tempo ruim).[75]
Simultâneo Indica uma ação contínua no momento do assunto da fala ("enquanto").[76] Nerngiinanrani (enquanto ele continuava comendo).[77]
Estativo Indica o estado, modo ou sentimento ("estar no/em estado de").[77] Ciugmi yuuguq (ele vive com a cabeça levantada) (indicando estado de arrogância).[78]

Apesar de serem os usos mais comuns, existem outras utilidades para um mesmo modo verbal. Um exemplo disso é a função não declarativa do modo indicativo, que pode ser utilizado em uma frase indireta, por exemplo uma recomendação ou comando para uma terceira pessoa, como em: Ampi! ayagnarqaaten você deve se apressar e ir!', em que "narq" é uma pós-base que aponta a ideia de causalidade da fala do emissor para o receptor, podendo ser compreendida como "tender a causar alguém a X", e indica um comando, apesar de se comportar como uma frase no modo indicativo.[79]

Tempo e aspecto[editar | editar código-fonte]

Tempo e aspecto não são categorias marcadas nos verbos, mas sim sufixos independentes e opcionais estabelecidos durante o discurso.[80] Um verbo nos tempos presente ou passado recente não é marcado, exceto em casos de especificações por aspectos derivacionais. Esses verbos, apesar de poderem se referir ao passado recente, são glossados no presente para maior compreensão.[81]

Os principais marcadores de tempo são os sufixos de passado e futuro, enquanto os que indicam aspecto são o perfectivo, que denota uma ação concluída no passado; o iminente, que expressa uma ação que ameaça se concretizar ("quase X"); o incoativo, que indica o início da ação; o momentâneo, que denota espontaneidade; o contínuo, que demonstra continuidade; o estativo, que indica um estado; o iterativo, que apresenta uma repetição da ação; o costumeiro, que indica hábitos; e o consequencial, que expressa causas e consequências.[82]

Quadro de sufixos de tempo[80]
Sufixo Exemplo e tradução para o português
Passado -llru Allellruuq (isso rompeu)
Futuro -ciq Allegciquq (isso vai romper)

Em casos de especificação são utilizados adjuntos adverbiais de tempo. Os adjuntos que indicam passado não demandam o uso do marcador /-llru/, como em Unuaq tangrr-aqa 'eu o vi hoje de manhã' (unuaq = essa manhã, tangrr-aga = ver ele/ela). Contudo, adjuntos que indicam o tempo futuro necessitam do uso do sufixo /-ciq/, a exemplo de Unuaqu ayag-ciq-ua 'eu sairei amanhã' (unuaqu = amanhã, ayag-ciq-ua = sair no futuro).[83]

Quadro dos principais sufixos dos aspectos[84]
Sufixos Usos mais comuns Exemplos e traduções para o português
Incoativo -ng Começar a fazer algo. Allnguq (isso está começando a romper).
-qatar Estar próximo de dar início a algo (a ação acabou de ser decidida). Tangerqatartuq (ele está próximo de ver/quase vendo).
-qata'ar Gradualmente/lentamente fazer algo. Anqata'artuq (ele está lentamente saindo).
-ri / -i Induzir início de mudança em algo. Cukariuq (isso está acelerando).
-yagut/ -sagut Se tornar/chegar ao estado X. Nalluyagutaqa (eu esqueci isso) (chegar ao estado de desconhecimento).
-kugt Estar perto de fazer algo (planejar). Unuku maani qavakugtua (estou planejando dormir aqui esta noite).
Momentâneo -gart / -ga'rt / - Inesperadamente, de repente fazer algo. Caugartaa (de repente ele a enfrentou).
Perfectivo -uma Algo foi encerrado em um passado distante. Kiagpak neqsuumauq (ele pescou o verão inteiro).
-umari Após ter encerrado algo. Yuraumariuteng neryaqlirtut (Depois de terminarem de dançar, eles finalmente comeram).
Contínuo -squma Desejar algo. Ayaasqumaaten (ele queria que você fosse).
- tu'(ra)r Estar, de maneira contínua, fazendo algo. Quligtu'rtuq (o gelo está rachando).
Estativo -ngqa Estar em estado X. Qavartuq nangengqaluni (ele está dormindo enquanto está de pé).
Iterativo -nqigt(e) Novamente fazer algo. Atunqigtuq (ele está cantando novamente).
-a(a)/ -ga/ -ar Repetidamente fazer algo. Ikayuaguq (ele continua nos ajudando repetidas vezes).
-qaraq/ -karak Intermitentemente/de vez em quando fazer algo. Iqvaqaraqluni (ele colhe frutos de vez em quando)
Costumeiro -l(l)ar "Habitualmente", "geralmente". Assik(e)larait (eles geralmente gostam deles).
-tu "Regularmente", "comum". Kiirtuuq (é quente regularmente).
Consequencial -naur "Então, após x" Anutnaurqa (então, me deixe levar para fora).
Evidencialidade[editar | editar código-fonte]

A marcação da evidencialidade não é um fenômeno muito forte na língua iúpique do Alasca central, contudo, existem sufixos e enclíticos que fazem o papel de indicar confirmação ou direcionamentos de mensagens à terceiros sem a necessidade de especificação de suas origens.[85] O enclítico e os sufixos que podem ser utilizados para marcar evidencialidade são:

Quadro das marcações de evidencialidade[86]
Sufixo/Enclítico Usos mais comuns Exemplos de frases na língua e traduções para o português
-llini- 'Evidentemente', agora eu vejo'... Naulluurpallrulliniluni (é evidente que ele está doente).
-luugt- 'Afinal', 'na realidade', 'eu percebi'... Ilakut'luugtelliniukut (verificou-se, afinal, que nós somos parentes um do outro).
-saaq- 'Eu percebi o contrário', 'mas, na verdade'... Ayuqsaaquk (eles até se parecem, mas, na verdade, possuem diferenças).
=gguq Função reportativa. 'Eles disseram', 'está dito, 'diga a ele/ela'... Qavártù'ryugnárquqllúgguq (Eles dizem que ele provavelmente continuou dormindo também).[87]

Sentenças[editar | editar código-fonte]

Sintaxe[editar | editar código-fonte]

Uma oração no iúpique do Alasca central possui dois núcleos: um predicado verbal com adjuntos e um ou dois argumentos (sujeito, objetos etc.). A concordância verbal pode variar entre os padrões ergativo-absolutivo e nominativo-acusativo, dependendo do modo gramatical. Entretanto, nota-se com relação à concordância verbal a maior predominância do alinhamento ergativo, em que existe diferenciação de casos para os sujeitos dos verbos intransitivo e objetos diretos de verbos transitivos (absolutivo) e para sujeitos dos verbos transitivos (relativo ou ergativo/genitivo).[88]

A ordem dos constituintes de uma oração, diferentemente da ordem de sufixos e enclíticos, tende a ser mais flexível e se apoia no grande potencial sintático da língua, em que diversas indicações são feitas por meio dos sufixos. Contudo, a maior preferência no idioma é pelo padrão SOV (sujeito-objeto-verbo).[89] Essa tendência se encontra em frases como:[90]

  • Elitnauriste mikelnguut assikait‎ - 'os professores gostam das crianças' (literalmente: 'professores crianças gostam')
  • Mikelnguut elitnauristet assikait'as - 'as crianças gostam dos professores' (literalmente: 'as crianças professores gostam')

Em contraste, também se encontram frases com outros padrões, como em:

  • Aptait mikelguut angutet‎ ‎- 'as crianças perguntaram ao homem' (mais comum) ou 'o homem perguntou as crianças' (literalmente: 'perguntar crianças homem')

Por isso, pode-se afirmar que a língua recebe maior influência de fatores pragmáticos relacionados ao contexto da fala em comparação à aspectos sintáticos.‎[90]

Negação[editar | editar código-fonte]

A negação é majoritariamente feita por meio da modificação dos verbos, adição de sufixos e pela introdução da palavra qa(a)ŋ ~ qàŋa 'não'. Pode haver fusão dos sufixos de negação com fatores ligados ao aspecto e modo verbal, e não existem afixos de negação para substantivos ou adjetivos,[91] como ocorre no português com a palavra "indelicado" que possui o afixo "in-". Alguns exemplos de sufixos de negação são:

Quadro dos principais sufixos de negação[92]
Sufixo Tradução para o português Exemplo na língua e tradução para o português
-nrit- 'Não'. Kiunrituq (ele não respondeu).
+pek'- ~ -vke- 'Não' (seguido do marcador aposicional "-nani"). Kiuvkenani (ele não está respondendo).
-at- 'Não'. Piniatuq (ele é fraco) (pinir = ser forte).
-nrilkurt- 'Tentando não' (resistir contra). Qavanrilkurtuq (ele (possivelmente com sono) está tentando não dormir).
+ngait- 'Não vai' (negação no futuro). Calingaituq (ele não vai trabalhar).
-ksait- ~ -qsait- 'Ainda não' (muito associado ao intensificador |-qa-|). Tangerqaqsaitua tigeraamek (eu nunca vi um tigre).
-(s)ciigat- 'Não conseguir'. Calisciigatuq (ele não consegue trabalhar).
-yuit- 'Nunca/geralmente não'. Qanyuituq (ele não fala (nunca)).

Podem haver também casos de dupla negação ou de negação parcial. A primeira objetiva retomar modificações semânticas de termos que normalmente são enfáticos e positivos, diferentemente, por exemplo, de contruções como "ne-pas" na língua francesa, que realizam a negação por meio de dois morfemas negativos simultâneos.[93] São exemplos de dupla negação as frases: Pinritevkenani 'ele está fazendo sem erro' (no qual "sem" e "erro" caracterizam palavras negativas) e Niitenriteksaunaku 'não desprezando isso' (em que ocorre negação nas palavras "não" e "desprezando", negativo de "prezar").

A negação parcial é feita por meio da adição do morfema |-rrlainar-|, relativo à algo como "somente" no português, anterior à um sufixo negativo, como ocorre em: Piliqerrlainarpeknateng 'nem sempre eles jogam o jogo de pegar' (não somente).[94]

Vocabulário[editar | editar código-fonte]

Entrada de um Qasgiq (casa de banho) na vila de Stebbins (1900)
Expressões do dia-a-dia em iúpique central[95]
Iúpique do Alasca Central Português
Cama-i Olá (bom te ver)
Waqaa Oi (como vai?)
Piura Tchau
Quyana Obrigado(a)
Quyana tailuci Bem-vindo
Cangacit Como você está?
Assirtua Eu estou bem
Homem da etnia iúpique tocando um tambor, elemento de sua cultura (1927)
Números em iúpique central[96]
Número Português Iúpique do Alasca Central
1 Um Atauciq
2 Dois Malruk
3 Três Pingayun
4 Quatro Cetaman
5 Cinco Talliman
6 Seis Arvinglegen
7 Sete Malrunlegen
8 Oito Pingayunlegen
9 Nove Qulngunritaraan
10 Dez Qula
11 Onze Qula atauciq
12 Doze Qula malruk
13 Treze Qula pingayun
14 Catorze Akimiarunrita’ar
15 Quinze Akimiaq
16 Dezesseis Akimiaq atauciq
17 Dezessete Akimiaq malruk
18 Dezoito Akimiaq pingayun
19 Dezenove Yuinaunrita’ar
20 Vinte Yuinaq
Meses do ano em iúpique do Alasca central (dialeto Nelson Island)[97]
Mês Português Iúpique do Alasca Central Significado e etimologia
1 Janeiro Manignarcuutnguaq 'Instrumento de pescar peixes lota-do-rio inautêntico'. Nessa época, os peixes migram pelos rios e são capturados em redes.
2 Fevereiro Kep'nerciq O fim do período de frio extremo causa o derretimento do gelo e o alagamento de casas subterrâneas. Tem etimologia na pós base "-neq" 'o processo de' e no verbo "kepe- " 'cortar caminho'.[12]
3 Março Tengmiirviguaq 'Chegada de pássaros inautêntica'. Tempo de esperar os gansos voltarem.
4 Abril Tengemqapiar Mês de chegada dos gansos. Tem etimologia no verbo "tenge-" 'voar, levantar voo'.[12]
5 Maio Iqalluarpiit anutiit 'Tempo de saída do peixe Microgadus tomcod (tipo de bacalhau)'.
6 Junho Kayangut anutiit 'Tempo de saída dos ovos de seus ninhos'. Mês em que é feita a retirada de ovos de diversas espécies de pássaros.
7 Julho Ingun 'Tempo de troca de penas'. Tempo em que os pássaros realizam a mudança de suas penas.
8 Agosto Qangqiiq ingutiit 'Tempo de troca de penas da ave lagopus'. Essa espécie e outros tipos de pássaros voam soltando suas penas.
9 Setembro Amiraayaaq 'Pequeno (bebê) caribu -?- pele' (sem ligação direta entre os termos). Período em que o animal ganha chifres.
10 Outubro Amirairun 'Pele -?- crescimento'. Tempo em que os chifres do caribu amadurecem e ficam aveludados.
11 Novembro Cauyarvik 'Tempo de tambor'. Época em que são realizadas danças acompanhadas de toques de tambor.
12 Dezembro Kanruyauciq 'Tempo de formação de geada'. Época mais fria do ano e com dias mais curtos.

Referências

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Bibliografia[editar | editar código-fonte]

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