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Missão Artística Francesa: diferenças entre revisões

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A '''Missão Artística Francesa''' foi um grupo de artistas e artífices [[franceses]] que, deslocando-se para o [[Brasil]] no início do [[século XIX]], revolucionou o panorama das Belas-Artes no país introduzindo o sistema de ensino superior [[Academismo|acadêmico]] e fortalecendo o [[Neoclassicismo]] que ali estava iniciando seu aparecimento. O grupo era liderado por [[Joachim Lebreton]] e foi amparado pelo governo de [[Dom João VI]], mas seu trabalho tardou a frutificar, encontrando a resistência da tradição barroca firmemente enraizada e tendo de enfrentar a escassez de recursos financeiros e uma série de intrigas políticas que dissolveram boa parte do primeiro entusiasmo oficial pelo projeto.
A '''Missão Artística Francesa''' foi um grupo de artistas e artífices [[franceses]] que, deslocando-se para o [[Brasil]] no início do [[século XIX]], revolucionou o panorama das Belas-Artes no país introduzindo o sistema de ensino superior [[Academismo|acadêmico]] e fortalecendo o [[Neoclassicismo]] que ali estava iniciando seu aparecimento. O grupo era liderado por [[Joachim Lebreton]] e foi amparado pelo governo de [[Dom João VI]], mas seu trabalho tardou a frutificar, encontrando a resistência da tradição barroca firmemente enraizada e tendo de enfrentar a escassez de recursos financeiros e uma série de intrigas políticas que dissolveram boa parte do primeiro entusiasmo oficial pelo projeto.


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* {{Link||2=http://www.itaucultural.org.br/AplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=marcos_texto&cd_verbete=340&cd_item=10 |3=''Missão Artística Francesa'' |4=. Enciclopédia Itaú Cultural}}
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Revisão das 13h49min de 14 de maio de 2013

François Gérard: Retrato de Joachim Lebreton, o líder da Missão Francesa.

A Missão Artística Francesa foi um grupo de artistas e artífices franceses que, deslocando-se para o Brasil no início do século XIX, revolucionou o panorama das Belas-Artes no país introduzindo o sistema de ensino superior acadêmico e fortalecendo o Neoclassicismo que ali estava iniciando seu aparecimento. O grupo era liderado por Joachim Lebreton e foi amparado pelo governo de Dom João VI, mas seu trabalho tardou a frutificar, encontrando a resistência da tradição barroca firmemente enraizada e tendo de enfrentar a escassez de recursos financeiros e uma série de intrigas políticas que dissolveram boa parte do primeiro entusiasmo oficial pelo projeto.

Antecedentes

A partir de 1815, depois da queda definitiva de Napoleão Bonaparte, Portugal, que fora invadido e ocupado pelos franceses, pôde iniciar um processo de normalização de suas relações diplomáticas, comerciais e culturais com a França. Nesta altura a sede do reino português estava instalada no Rio de Janeiro, onde a corte se havia refugiado. O príncipe regente Dom João desde sua chegada havia procurado dinamizar a vida da então colônia. Entre outras medidas, abriu os portos brasileiros para as nações amigas, fundou o Banco do Brasil, fomentou uma indústria incipiente e estimulou a vida cultural especialmente na capital, e, no contexto das negociações do Congresso de Viena, em 1815 alçou o Brasil à categoria de Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.[1] Do ponto de vista administrativo, não seria producente, para uma corte instalada no exílio, manter uma terra enorme sob o antigo perfil extrativista e agrário, com uma administração semi-feudal, quando a metrópole estava talvez perdida para sempre, a ciência estava em alta e a indústria começava a se tornar desejada e necessária. Não havia garantia de quando a volta seria, se é que haveria um retorno, e assim melhor fazer esta imensidão ser competitiva diante da comunidade das nações.[2] Além disso a instituição de um sistema de ensino superior em artes e ofícios viria a minimizar o vazio provocado pela expulsão dos jesuítas, que antes administravam boa parte do ensino.[3][4]

Nesse ambiente de renovação, segundo Neves, António de Araújo e Azevedo, o 1.º conde da Barca, ministro do reino, teve a idéia de convidar alguns artistas franceses para que trouxessem para o Brasil elementos louváveis e desejáveis da civilização francesa. Com o estabelecimento de acordos comerciais com a França em 1815, se iniciaram as negociações para a organização do grupo. Como intermediários do governo português na França estavam o embaixador Pedro José Joaquim Vito de Meneses Coutinho, Marquês de Marialva, e o encarregado de negócios em Paris, Francisco José Maria de Brito, que consultaram o naturalista Alexander von Humboldt a respeito do assunto. Humboldt indicou então o nome de Joachim Lebreton, que fora secretário do Institute de France e recém havia sido demitido por suas ligações com o finado regime bonapartista. Ele por sua vez assumiu a liderança do projeto e reuniu um grupo de interessados em se transferir para o Brasil, desde que o governo português financiasse a viagem e seu estabelecimento.[1]

Pradier: Retrato de D. João VI.

Entretanto, as origens da Missão Francesa não são muito claras, e outros autores afirmam que a iniciativa partiu de Marialva [5] ou que foi fruto de um oferecimento espontâneo dos franceses à corte portuguesa diante da sua situação política problemática em sua terra natal. Segundo Schwarcz esta parece ser a hipótese mais provável, a partir da opinião de Laudelino Freire, Mário Barata e Mário Pedrosa, que baseando-se em documentos mais antigos, desmontaram a "versão oficial" do caso que apontava Dom João como o mentor do projeto e que pretendia apenas enaltecer o caráter ilustrado da monarquia portuguesa. Reforços a esta tese vieram de Donato Mello Júnior, que descobriu em 1980 duas cartas de Nicolas-Antoine Taunay ao príncipe regente Dom João oferecendo seus serviços. Parte da correspondência pessoal de Lebreton, conservada na Torre do Tombo em Lisboa, também diz o mesmo, e a correspondência oficial de Fernando José de Portugal e Castro, Marquês de Aguiar, para o príncipe sugere a mesma coisa, dizendo além de tudo em carta para Lebreton que de parte da corte não havia intenção nenhuma de financiar a viagem deles ou garantir-lhes a estadia. Sobrevivem também cartas de Brito ao Conde da Barca onde ele apresenta o projeto concebido por Lebreton, e uma carta de Brito a Lebreton, onde ele lembrava ao destinatário que o projeto era inteiramente obra de Lebreton e que não lhe garantira nada em nome do governo português, e que uma acolhida oficial dependeria apenas da circunstância, incerta, de o príncipe regente decidir apoiá-los. Fica claro que até então isso ainda não estava assegurado, e só o foi de fato em janeiro de 1816, quando Barca passou a preparar no Rio a chegada do grupo, já contando com o aval de Dom João.[6] Finalmente, o decreto de fundação da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios em 12 de agosto de 1816 informa que Dom João, ao criar a escola, desejava aproveitar o serviço de "alguns estrangeiros" que a ele haviam recorrido em busca de proteção, como se lê no trecho a seguir:

"Atendendo ao bem comum, que provêm aos meus fiéis vassalos, de se estabelecer no Brasil uma Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, em que se promova e difunda a instrução e conhecimentos indispensáveis aos homens destinados não só aos Empregos Públicos da Administração do Estado, mas também ao progresso da Agricultura, Mineralogia, Indústria e Comércio, de que resulta a subsistência, comodidade e civilização dos povos, maiormente neste continente, cuja extensão, não tendo o devido e correspondente número de braços indispensáveis ao amanho e aproveitamento do terreno, precisa de grandes socorros da prática para aproveitar os produtos, cujo valor e preciosidade podem vir a formar do Brasil o mais rico e opulento dos Reinos conhecidos, fazendo-se, portanto, necessário aos habitantes o estudo das Belas-Artes com aplicação e referência aos ofícios mecânicos, cuja prática, perfeição e utilidade depende dos conhecimentos teóricos daquelas artes, e difusivas luzes das ciências naturais, físicas e exatas; e querendo, para tão úteis fins aproveitar, desde já, a capacidade, habilidade e ciência de alguns dos estrangeiros beneméritos que têm buscado a Minha Real e Graciosa Proteção, para serem empregados no ensino da instrução pública daquelas artes: Hei por bem, e mesmo enquanto as aulas daquelas artes e ofícios não formam a parte integrante da dita Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios que Eu Houver de Mandar estabelecer, se pague anualmente etc…" [7]

A Missão Artística

Ver artigo principal: Academismo no Brasil
Jean-Baptiste Debret: auto-retrato publicado em Voyage pittoresque et historique au Brésil (1834).
Augusto Müller: Retrato de Grandjean de Montigny, c. 1843.

O grupo aportou no Rio de Janeiro a 26 de março de 1816, a bordo do navio Calpe, escoltado por navios ingleses, e era formado, segundo Neves, por Joachim Lebreton, o líder, Jean Baptiste Debret, pintor histórico, Nicolas-Antoine Taunay, pintor de paisagens e cenas históricas, Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny, arquiteto, junto com seus discípulos Charles de Lavasseur e Louis Ueier, Auguste Marie Taunay, escultor, Charles-Simon Pradier, gravador, François Ovide, mecânico, Jean Baptiste Leve, ferreiro, Nicolas Magliori Enout, serralheiro, Pelite e Fabre, peleteiros, Louis Jean Roy e seu filho Hypolite, carpinteiros, François Bonrepos, auxiliar de escultura, e Félix Taunay, filho de Nicolas-Antoine, ainda apenas um jovem aprendiz. Muitos deles trouxeram suas famílias, criados e outros auxiliares.[1] Pinassi acrescenta ainda os nomes de Sigismund Neukomm, músico, e Pierre Dillon, secretário de Lebreton.[5] Seis meses mais tarde, uniram-se ao grupo Marc Ferrez, escultor (tio do fotógrafo Marc Ferrez) e Zéphyrin Ferrez, gravador de medalhas.

O projeto de Lebreton e o contexto brasileiro

Em 12 de junho de 1816 Lebreton elaborou um memorando para o Conde da Barca onde propôs instaurar uma nova metodologia de ensino através da criação de uma escola superior de Belas Artes com disciplinas sistematizadas e graduadas. O ensino se daria em três fases:

  • Desenho geral e cópia de modelos dos mestres, para todos os alunos;
  • Desenho de vultos e da natureza, e elementos de modelagem para os escultores;
  • Pintura acadêmica com modelo vivo para pintores; escultura com modelo vivo para escultores, e estudo no atelier de mestres gravadores e mestres desenhistas para os alunos destas especialidades.

Para a arquitetura haveria também três etapas divididas em teóricas e práticas:

  • Na teoria:
    • História da arquitetura através de estudo dos antigos;
    • Construção e perspectiva;
    • Estereotomia.
  • Na prática:
    • Desenho;
    • Cópia de modelos e estudo de dimensões;
    • Composição.

Paralelamente Lebreton sugeria ainda o ensino da música, bem como sistematizava o processo e critérios de avaliação e aprovação dos alunos, o cronograma de aulas, sugeria formas de aproveitamento público dos formados e projetava a ampliação de coleções oficiais com suas obras, discriminava os recursos humanos e materiais necessários para o bom funcionamento da Escola, e previa a necessidade da formação de artífices auxiliares competentes através da proposta de criação paralela de uma Escola de Desenho para as Artes e Ofícios, cujo ensino seria gratuito mas igualmente sistemático.[8]

Esse projeto tinha um perfil muito contrastante com o sistema de ensino e circulação de arte até então prevalente no Brasil. Havia uma significativa tradição artística local, como prova o rico legado de arte barroca que ainda sobrevive no país, mas seus métodos eram em tudo diversos. O aprendizado ainda seguia o modelo informal das corporações de ofícios medievais, o status de artista nem era reconhecido, antes eram considerados meros artesãos especializados, cuja inserção na sociedade era apenas marginal, e as temáticas privilegiadas por esse produtores eram basicamente religiosas, uma vez que praticamente não havia mercado algum para a arte profana, mesmo a nobreza radicada na terra parecia pouco inclinada para os assuntos artísticos, e tudo que se criava era encomendado pela Igreja Católica para a decoração dos templos e mosteiros. Diante desse quadro, o sistema brasileiro de arte da época não estava capacitado para a produção de uma arte palaciana como a que desejava a corte, e assim se explica a rápida encampação do projeto de Lebreton pela monarquia no exílio, considerando-o o marco inaugural da entrada no Brasil na "verdadeira" civilização.[9] A Missão chegou ao Brasil imbuída de altos propósitos, como escreveu Debret:

"Animados todos por um zelo idêntico e com o entusiasmo dos sábios viajantes que já não temem mais, hoje em dia, enfrentar os azares de uma longa e ainda, muita vezes, perigosa navegação, deixamos a França, nossa pátria comum, para ir estudar uma natureza inédita e imprimir, nesse mundo novo, as marcas profundas e úteis, espero-o, da presença de artistas franceses"[10]
Montigny: Frontispício da Academia Imperial.

Mas a realidade contradisse suas expectativas. Embora com o apoio real, a missão encontrou resistência entre os artistas nativos, ainda seguidores do Barroco, e ameaçavam a posição de mestres portugueses já estabelecidos. A verdade é que os franceses foram recebidos como importunos tanto por portugueses quanto por brasileiros. A rainha D. Maria I faleceu em 1816, e o projeto de modernização da capital avançava lentamente. O governo central tinha muitas outras preocupações a atender - o acompanhamento da instável situação na Europa, uma revolução em Pernambuco, as constantes demandas administrativas internas, o alto custo de manutenção da corte, uma recessão provocada pela drástica queda no preço internacional do açúcar e do algodão, uma grave seca no Nordeste que desestruturou a economia regional, e os conflitos de fronteira no sul na Questão Cisplatina, subtraindo recursos e atenção do projeto cultural francês. O principal e um dos únicos verdadeiros incentivadores do projeto, o Conde da Barca, faleceu no ano seguinte, o contrato dos artistas foi posto em discussão e o cônsul francês no Brasil, coronel Maler, não via com bons olhos a presença de bonapartistas,[1][11] sendo mais tarde acusado por Taunay de ser o principal entrave ao bom desenvolvimento do projeto.[12]

Enquanto a Escola não era instalada definitivamente, ficando à mercê das oscilações políticas e sofrendo modificações no projeto original, sucumbindo, como lamentava Debret, aos "aos erros e vícios do ancien régime",[4] os artistas sobreviviam da pensão que lhes concedera o governo, e ocupavam-se aceitando encomendas de retratos e organizando festas suntuosas para a corte, ao lado das aulas que conseguiam ministrar nas precárias condições em que se achou o projeto nos primeiros anos. O próprio grupo enfrentava dissidências internas, lutas pelo poder, e Lebreton foi acusado de favorecimentos indevidos e má administração, e teve de se isolar de todos, falecendo em segida, em 1819. Como seu sucessor foi nomeado o português, professor de Desenho, Henrique José da Silva, artista conservador, ferrenho crítico dos franceses. O seu primeiro gesto foi liberar os franceses de suas obrigações como professores. Tantas foram as dificuldades que Nicolas-Antoine Taunay abandonou o país em 1821 (ano da morte de Napoleão), deixando para trás o seu filho, Félix Taunay. Pouco depois o Taunay escultor também faleceu, desfalcando ainda mais o grupo primitivo, do qual foram efetivamente aproveitados pelo governo apenas cinco integrantes: Debret, Nicolas Taunay, Auguste Taunay, Montigny e Ovide.[7][13]

Passaram dez anos antes de a Missão dar seus primeiros frutos significativos, com a inauguração, em 5 de novembro de 1826, com a presença de D. Pedro I, da Academia Imperial. Em 1831, Debret também retornou à França.[14]

A contribuição individual

Os integrantes da Missão executaram diversos trabalhos para a família real, relacionados às datas e fatos comemorativos da monarquia, como as cerimônias de aclamação de D. João VI (1817) e as comemorativas da vinda da futura imperatriz Leopoldina (1817), assim como os festejos para a aclamação e coroação de D. Pedro I em 1822. Estes eventos envolveram a criação de obras de arquitetura efêmera, como arcos de triunfo, obeliscos e ornamentos para a cidade. Também deixaram uma importante série de retratos oficiais de personalidades e membros da nobreza e registros variados da vida na corte e na cidade.[15]

Lebreton foi a força organizadora inicial do projeto. Diante das intrigas em torno da Missão, e tendo uma personalidade difícil, atritou-se com todos e retirou-se para uma propriedade do Flamengo, falecendo poucos anos depois.[14] As 50 obras de arte que adquiriu na França e trouxe consigo formam um dos núcleos iniciais da atual coleção do Museu Nacional de Belas Artes.[16]

Debret, cujo atelier se encontrava no bairro do Catumbi, foi o que teve maior êxito no registrar os usos e costumes do país, as tradições anacrônicas da corte portuguesa, como por exemplo o beija-mão. Além de converter-se em pintor oficial do Primeiro Reinado, Debret, sobrinho de David, deixa-se encantar pelas paisagens exuberantes e inéditas, os costumes barrocos, e nas horas em que não lecionava, registrou-os em uma sucessão de desenhos e aquarelas que os retratam, e que anos mais tarde, já de volta à França, ele publicou na Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Tais imagens são uma inestimável documentação visual da época, e fonte básica para o estudo da cultura e paisagem brasileiras de então.

Já Grandjean de Montigny trabalhou para transformar a paisagem urbanística do Rio de Janeiro, elaborando o projeto da primeira sede oficial da Academia, do qual infelizmente só resta o pórtico, da primeira sede da Alfândega, obra concluída em 1820, e que hoje abriga a Casa França-Brasil, e diversas outras obras de saneamento e urbanização,[17] além de ter formado cerca de vinte novos arquitetos, entre eles José Maria Jacinto Rebelo, Teodoro de Oliveira, Joaquim Cândido Guilhobel, Domingos Monteiro e Francisco Joaquim Béthencourt da Silva.

Nicolas Taunay, que chegou ao Brasil com cerca de 60 anos, jamais se adaptou completamente ao contexto local, mas realizou bela documentação da paisagem em suas telas. Seu filho Félix seria mais tarde Diretor da Academia Imperial, além de realizar obra individual de mérito, e seu outro filho, Adrien, foi desenhista da expedição Langsdorff, nos anos 1820, deixando importantes registros visuais do interior.

Auguste Taunay foi nomeado professor da Escola Real mas não chegou a ocupar efetivamente o cargo. Realizou decorações na cidade do Rio na aclamação de D. João VI. Deu aulas em regime livre, sendo mestre de José Jorge Duarte, Xisto Antônio Pires, Manuel Ferreira Lagos, Cândido Mateus Farias, João José da Silva Monteiro e José da Silva Santos.

Legado

A Missão teve um papel importante na atualização do Brasil em relação ao que ocorria na Europa na época, foi a modernidade em seu tempo.[18] Embora o tenha exercitado de forma sistemática, não foi a primeira nem a única força responsável pela difusão do Neoclassicismo no país,[19] já perceptível na obra de diversos artistas precursores atuando aqui desde fins do século XVIII, como Antonio Landi e Mestre Valentim na arquitetura, Manuel Dias de Oliveira na pintura e na música os últimos integrantes da Escola Mineira, como Lobo de Mesquita e João de Deus de Castro Lobo. Mas é certo que os princípios estéticos que a Missão defendia foram com o tempo adotados quase na íntegra e se tornaram naturais, integrando o novo dado à história nacional, tradição fortalecida na gestão de Félix-Emile Taunay, filho de Nicolas, à frente da AIBA. O projeto já foi criticado modernamente como uma invasão consentida,[20] uma intervenção violenta e repressora no desenvolvimento cultural brasileiro, que ainda trazia forte herança barroca e há pouco encontrara a maturidade em artistas como Mestre Ataíde e Aleijadinho, mas com o apoio oficial aos artistas neoclássicos a transição para a nova estética foi acelerada, e com isso tumultuada.[21]

Pedro Américo: A Batalha do Avaí.
Victor Meirelles: A Primeira Missa no Brasil.

Por outro lado, sua importância como fundadores de um novo sistema de ensino não pode ser negligenciada, já que a Academia, mesmo encontrando na origem sérios empecilhos e demorando para frutificar, tornar-se-ia mais adiante a mais importante instituição oficial de arte no Brasil, e nela se formariam gerações dos maiores artistas brasileiros, atestando a validade do método proposto. A atuação dos franceses também contribuiu para melhorar o status do artista, assumindo uma postura de cidadãos livres, profissionais, numa sociedade em vias de laicização, e não mais submetidos à Igreja e seus temas, como se observava nos tempos anteriores. As noções de saneamento e higiene que trouxeram iriam modificar o urbanismo das cidades.[22]

Foram os fundadores da arte acadêmica como estilo no Brasil, uma arte cultivada pelo estado e organizada dentro de linhas metodológicas rígidas, com temáticas próprias, modelos formais próprios, exames de aptidão e sistema de premiações, e boa parcela de censura a originalidades supeitas de romper os cânones consagrados; tal organização chocava o hábito de séculos, pois até ali a Igreja havia sido o grande mecenas, e suas orientações eram diferentes. Desdenhada por uns, aplaudida por outros,.[4] sem sombra de dúvida a arte acadêmica, que floriu imensamente da segunda metade do século XIX até o início do seguinte, herdeira direta dos franceses repudiados e de seu sistema, foi o veículo formal de boa parte dos mais vigorosos monumentos da história da arte nacional de todos os tempos.

Foram os franceses os qualificados professores da primeira geração de artistas nacionais educados em escola pública, segundo um sistema profissionalizante inédito, e estes formaram muitos outros de grande valor segundo os mesmos princípios. Basta dar um lance de olhos na listagem de artistas formados pela Academia nas décadas seguintes que se verá uma pletora de mestres: Victor Meirelles, Almeida Júnior, Rodolfo Amoedo, Henrique Bernardelli, Pedro Américo, Eliseu Visconti, Artur Timóteo da Costa, Belmiro de Almeida, e tantos outros, que conseguiram, graças à sólida formação recebida na escola, retratar o Brasil em grande estilo, chegando a criar obras que se tornaram ícones nacionais.

Tal atividade intensa atraiu a presença no pais de mais bom número de outros estrangeiros, como Georg Grimm, Castagneto, François-René Moreau, Eduardo de Martino, que deram sua contribuição adicional à cultura do Brasil. Essa tradição só se interrompeu com a absorção da Academia, depois Escola Nacional de Belas Artes, pela atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, exatamente quando o Modernismo aparecia com força na cena encerrando um grande ciclo cultural e a República reorganizava o sistema de ensino superior.

Referências

  1. a b c d Neves, Lúcia M. B. Pereira das. A missão artística francesa. Rede da Memória Virtual Brasileira.
  2. Neto, Manoel S. in www.opiniaoenoticia.com.br/interna.php?id=15319 A chegada da Corte Portuguesa ao Brasil]. Entrevista, Jornal Opinião e Notícia, 24 de março de 2008
  3. Lima, Oliveira. Emancipação intelectual: D. João VI no Brasil. Disponível em Consciência.org
  4. a b c Cardoso, Rafael. A Academia Imperial de Belas Artes e o Ensino Técnico. In: 19&20 - A revista eletrônica de DezenoveVinte. Volume III, n. 1, janeiro de 2008.
  5. a b Pinassi, Maria Orlanda. Três devotos, uma fé, nenhum milagre: Nitheroy, revista brasiliense de ciências, letras e artes. Coleção Prismas. UNESP, 1998, pp. 55-59
  6. Schwarcz, Lilia Moritz. O sol do Brasil: Nicolas-Antoine Taunay e as desventuras dos artistas franceses na corte de d. João. Companhia das Letras, 2008, pp. 176-188
  7. a b Freire, Laudelino. Um Século de Pintura (1816-1916). Disponível em Pitoresco.com
  8. Lebreton, Joachim. Memória do Cavaleiro Joachim Lebreton para o estabelecimento da Escola de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 12 de junho de 1816.
  9. Schwarcz, pp. 189-193
  10. Siqueira, Vera Beatriz. Redescobrir o Rio de Janeiro. In: 19&20 - A revista eletrônica de DezenoveVinte. Volume I, no 3, novembro de 2006.
  11. Schwarcz, pp. 215-216
  12. Pedrosa, Mário & Arantes, Otília Beatriz Fiori. Acadêmicos e Modernos: Textos Escolhidos III. EdUSP, 1995, p. 89
  13. Schwarcz, pp. 233-234
  14. a b Pedrosa & Arantes, pp. 54-70
  15. Schwarcz, pp. 224-228
  16. Museu Nacional de Belas Artes - Coleções
  17. Mizoguchi, Ivan. Palladio e o Neoclassicismo. EDIPUCRS, 2006, pp. 103-104
  18. Luz, Ângela Âncora. A Missão Artística Francesa: novos rumos para a Arte no Brasil. Rio de Janeiro: Revista Da Cultura, Ano IV, n° 7, Dezembro de 2004. p. 16-22.
  19. Conduru, Roberto. Araras Gregas. In: 19&20 - A revista eletrônica de DezenoveVinte. Volume III, n. 2, abril de 2008.
  20. Martins, Alexandre. Histórias de uma invasão cultural: Ensaios avaliam o papel da Missão Francesa no Brasil no século XIX. Resenha de Bandeira, Xexéo & Conduru. A missão francesa. Memória Viva.
  21. Sonho de iluminismo com sotaque francês. Cardenos Especiais: Brasil 500 Anos, Fascículo 8. Tribuna do Norte
  22. Peter, Glenda Dimuro. Influência francesa no patrimônio cultural e construção da identidade brasileira: o caso de Pelotas. Portal Vitruvius.

Ligações externas

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Ver também