Antônio Conselheiro: diferenças entre revisões

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'''Antônio Vicente Mendes Maciel''' ([[Quixeramobim|Nova Vila de Campo Maior]], {{dtlink|lang=br|13|3|1830}} — [[Canudos]], {{dtlink|lang=br|22|9|1897}}), mais conhecido na [[História do Brasil]] como '''Antônio Conselheiro''', que se autodenominava "o peregrino",<ref>NOGUEIRA, Ataliba, ''António Conselheiro e Canudos''. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1997</ref> foi um líder religioso [[brasil]]eiro.<ref name="InfoEscola">{{citar web |url=http://www.infoescola.com/biografias/antonio-conselheiro/ |título=Antônio Conselheiro |acessodata=22 de setembro de 2012 |autor=Thais Pacievitch |coautores= |data=8 de julho de 2008 |ano= |mes= |formato= |obra= |publicado=InfoEscola |páginas= |língua= |língua2=pt |língua3= |lang= |citação= }}</ref>
'''Antônio Vicente Mendes Maciel''' ([[Quixeramobim|Nova Vila de Campo Maior]], {{dtlink|lang=br|13|3|1830}} — [[Canudos]], {{dtlink|lang=br|22|9|1897}}), mais conhecido na [[História do Brasil]] como '''Antônio Conselheiro''', que se autodenominava "o peregrino",<ref>NOGUEIRA, Ataliba, ''António Conselheiro e Canudos''. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1997</ref> foi um líder religioso [[brasil]]eiro.<ref name="InfoEscola">{{citar web |url=http://www.infoescola.com/biografias/antonio-conselheiro/ |título=Antônio Conselheiro |acessodata=22 de setembro de 2012 |autor=Thais Pacievitch |coautores= |data=8 de julho de 2008 |ano= |mes= |formato= |obra= |publicado=InfoEscola |páginas= |língua= |língua2=pt |língua3= |lang= |citação= }}</ref>


Figura carismática, adquiriu uma dimensão [[messias|messiânica]] ao liderar o arraial de Canudos, um pequeno vilarejo no sertão da [[Bahia]], que atraiu milhares de sertanejos, entre camponeses, índios e escravos recém libertos, e que foi destruído pelo Exército da República na chamada [[Guerra de Canudos]] em 1896.<ref name="UOL - Educação">{{citar web |url=http://educacao.uol.com.br/biografias/antonio-conselheiro.jhtm |título=Antônio Conselheiro |acessodata=22 de setembro de 2012 |autor= |coautores= |data= |ano= |mes= |formato= |obra= |publicado=UOL - Educação |páginas= |língua= |língua2=pt |língua3= |lang= |citação= }}</ref>
Figura carismática, adquiriu uma dimensão [[Messianismo|messiânica]] ao liderar o arraial de Canudos, um pequeno vilarejo no sertão da [[Bahia]], que atraiu milhares de sertanejos, entre camponeses, [[Povos indígenas do Brasil|índios]] e [[Escravidão no Brasil|escravos recém libertos]], e que foi destruído pelo Exército da República na chamada [[Guerra de Canudos]] em 1896.<ref name="UOL - Educação">{{citar web |url=http://educacao.uol.com.br/biografias/antonio-conselheiro.jhtm |título=Antônio Conselheiro |acessodata=22 de setembro de 2012 |autor= |coautores= |data= |ano= |mes= |formato= |obra= |publicado=UOL - Educação |páginas= |língua= |língua2=pt |língua3= |lang= |citação= }}</ref>


A imprensa dos primeiros anos da República e muitos historiadores, para justificar o genocídio, retrataram-no como um louco, fanático religioso e contrarrevolucionário monarquista perigoso.
A imprensa dos primeiros anos da República e muitos [[historiador]]es, para justificar o [[genocídio]], retrataram-no como um louco, [[Fanatismo religioso|fanático religioso]] e [[Contrarrevolução|contrarrevolucionário]] [[monarquista]] perigoso.


==Biografia==
==Biografia==
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[[Imagem:Conselheiro Revista Ilustrada.jpg|thumb|300px|A ''Revista Ilustrada'', de [[Angelo Agostini]], veículo de propaganda republicana durante o Império, retratava '''Conselheiro''' de forma caricatural, com séqüito de bufões armados com velhos [[bacamarte]]s, tentando "barrar" a República.<br />Exemplo de como a imprensa da época reagiu ao messianismo.]]
[[Imagem:Conselheiro Revista Ilustrada.jpg|thumb|300px|A ''Revista Ilustrada'', de [[Angelo Agostini]], veículo de propaganda republicana durante o Império, retratava '''Conselheiro''' de forma caricatural, com séqüito de bufões armados com velhos [[bacamarte]]s, tentando "barrar" a República.<br />Exemplo de como a imprensa da época reagiu ao messianismo.]]


Em 1857 Antônio casa-se com Brasilina Laurentina de Lima, jovem filha de um tio seu. No ano seguinte, o jovem casal muda-se para [[Sobral]], onde Antônio Vicente passa a viver como professor do primário, dando aulas para os filhos dos comerciantes e fazendeiros da região, e mais tarde como [[advogado]] prático, defendendo os pobres e desvalidos em troca de pequena remuneração. Passa a mudar-se constantemente, em busca de melhores mercados para seus ofícios; primeiro vai para Campo Grande (atual [[Guaraciaba do Norte]]),<ref name="InfoEscola"/> depois [[Santa Quitéria]] e finalmente [[Ipu]], então um pequeno povoado localizado bem na divisa entre os sertões pecuaristas e a fértil [[Serra da Ibiapaba]].
Em 1857 Antônio casa-se com Brasilina Laurentina de Lima, jovem filha de um tio seu. No ano seguinte, o jovem casal muda-se para [[Sobral]], onde Antônio Vicente passa a viver como professor do primário, dando aulas para os filhos dos comerciantes e fazendeiros da região, e mais tarde como [[Rábula|advogado prático]], defendendo os pobres e desvalidos em troca de pequena remuneração. Passa a mudar-se constantemente, em busca de melhores mercados para seus ofícios; primeiro vai para Campo Grande (atual [[Guaraciaba do Norte]]),<ref name="InfoEscola"/> depois [[Santa Quitéria]] e finalmente [[Ipu]], então um pequeno povoado localizado bem na divisa entre os sertões pecuaristas e a fértil [[Serra da Ibiapaba]].
Em 1861 flagra a sua mulher em traição conjugal com um [[sargento]] de [[polícia]] em sua residência na Vila do Ipu Grande. Envergonhado, humilhado e abatido, abandona o Ipu e vai procurar abrigo nos sertões do [[Cariri]], já naquela época um pólo de atração para penitentes e flagelados, iniciando aí uma vida de peregrinações pelos sertões do nordeste.<ref name="UOL - Educação"/>
Em 1861 flagra a sua mulher em traição conjugal com um [[sargento]] de [[polícia]] em sua residência na Vila do Ipu Grande. Envergonhado, humilhado e abatido, abandona o Ipu e vai procurar abrigo nos sertões do [[Cariri]], já naquela época um pólo de atração para penitentes e flagelados, iniciando aí uma vida de peregrinações pelos sertões do nordeste.<ref name="UOL - Educação"/>


===Peregrinações===
===Peregrinações===
Em [[Sergipe]], em 1874, o jornal O Rabudo traz a primeira menção pública de Antônio Maciel como penitente conhecido nos sertões: ''Há seis meses que por todo o centro desta Província e da Província da Bahia, chegado (diz ele) do Ceará, infesta um aventureiro santarrão que se apelida por Antonio dos Mares. O que, a vista dos aparentes e mentirosos milagres que dizem ter ele feito, tem dado lugar a que o povo o trate por S. Antônio dos Mares. Esse misterioso personagem, trajando uma enorme camisa azul que lhe serve de hábito a forma do de sacerdote, pessimamente suja, cabelos mui espessos e sebosos entre os quais se vê claramente uma espantosa multidão de bichos (piolhos). Distingue-se pelo ar misterioso, olhos baços, tez desbotada e de pés nus; o que tudo concorre para o tornar a figura mais degradante do mundo.''(O Rabudo, 22 de Novembro de 1874)
Em [[Sergipe]], em 1874, o jornal O Rabudo traz a primeira menção pública de Antônio Maciel como penitente conhecido nos sertões:
:''Há seis meses que por todo o centro desta Província e da Província da Bahia, chegado (diz ele) do Ceará, infesta um aventureiro santarrão que se apelida por Antonio dos Mares. O que, a vista dos aparentes e mentirosos ''[[milagre]]s'' que dizem ter ele feito, tem dado lugar a que o povo o trate por S. Antônio dos Mares. Esse misterioso personagem, trajando uma enorme camisa azul que lhe serve de ''[[Hábito religioso|hábito]]'' a forma do de ''[[sacerdote]],'' pessimamente suja, cabelos mui espessos e sebosos entre os quais se vê claramente uma espantosa multidão de bichos (''[[piolho]]s''). Distingue-se pelo ar misterioso, olhos baços, tez desbotada e de pés nus; o que tudo concorre para o tornar a figura mais degradante do mundo.''(O Rabudo, 22 de Novembro de 1874)


Já famoso como "homem santo" e peregrino, Antônio Conselheiro é preso em 1876 nos sertões da Bahia, pois corre o boato de que ele teria matado mãe e esposa. É levado para o Ceará, onde se conclui que não há nenhum indício contra a sua pessoa: sua mãe havia morrido quando ele tinha seis anos. Antônio Conselheiro é posto em liberdade e retorna à Bahia.<ref name="InfoEscola"/>
Já famoso como "homem santo" e peregrino, Antônio Conselheiro é preso em 1876 nos sertões da Bahia, pois corre o boato de que ele teria matado mãe e esposa. É levado para o Ceará, onde se conclui que não há nenhum indício contra a sua pessoa: sua mãe havia morrido quando ele tinha seis anos. Antônio Conselheiro é posto em liberdade e retorna à Bahia.<ref name="InfoEscola"/>


Em 1877, o [[Nordeste do Brasil]] passa por uma das mais calamitosas [[seca]]s de sua história; levas de flagelados perambulam famintos pelas estradas em busca de socorro governamental ou de ajuda divina; bandos armados de criminosos e flagelados promovem justiça social "com as próprias mãos" assaltando fazendas e pequenos lugarejos, pois pela ética dos desesperados "roubar para matar a fome não é crime". Cresce a notoriedade da figura de Antônio Conselheiro entre os sertanejos pobres; para eles, Antônio Conselheiro, ou o "Bom Jesus", como também passa a ser chamado, seria uma figura santa, um profeta enviado por "Deus" para socorrê-los.
Em 1877, o [[Nordeste do Brasil]] passa pela [[Grande Seca]], uma das mais calamitosas [[seca]]s de sua história; levas de flagelados perambulam famintos pelas estradas em busca de socorro governamental ou de ajuda divina; bandos armados de criminosos e flagelados promovem [[justiça social]] "com as próprias mãos" assaltando fazendas e pequenos lugarejos, pois pela [[ética]] dos desesperados "roubar para matar a fome não é crime". Cresce a notoriedade da figura de Antônio Conselheiro entre os sertanejos pobres; para eles, Antônio Conselheiro, ou o "Bom Jesus", como também passa a ser chamado, seria uma figura santa, um [[profeta]] enviado por "[[Deus]]" para socorrê-los.


Com o fim da [[escravidão]], em 1888, muitos ex-escravos, libertos e expulsos das fazendas onde trabalhavam sem ter então nenhum meio de subsistência, partem em busca de Conselheiro.
Com o fim da [[escravidão]], em 1888, muitos ex-escravos, libertos e expulsos das fazendas onde trabalhavam sem ter então nenhum meio de subsistência, partem em busca de Conselheiro.


===Arraial de Canudos===
===Arraial de Canudos===
Em 1893, cansado de tanto peregrinar pelos sertões e então sendo um "fora da lei", Conselheiro decide se fixar à margem Norte do [[Rio Vaza-Barris]], num pequeno arraial chamado [[Canudos]].<ref>NOVAIS SAMPAIO, Consuelo. ''Canudos - Cartas para o Barão'', páginas 231-232.</ref> Nasce ali uma experiência extraordinária: em Belo Monte (como a rebatizou Antônio Conselheiro, apesar de encontrar-se em um vale cercado de colinas), os desabrigados do sertão e as vítimas da seca eram recebidos de braços abertos pelo peregrino, era uma comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras dos capatazes das fazendas tradicionais. Um "lugar santo", segundo os seus adeptos. Durante o período em que liderou o povoado de "Belo Monte", escreveu os "Apontamentos dos Preceitos da Divina Lei de Nosso Senhor Jesus Cristo, para a Salvação dos Homens", que consiste de uma coletânea de reflexões sobre temas diversos, de matiz fundamentalmente religioso.
Em 1893, cansado de tanto peregrinar pelos sertões e então sendo um "fora da lei", Conselheiro decide se fixar à margem Norte do [[Rio Vaza-Barris]], num pequeno arraial chamado [[Canudos]].<ref>NOVAIS SAMPAIO, Consuelo. ''Canudos - Cartas para o Barão'', páginas 231-232.</ref> Nasce ali uma experiência extraordinária: em Belo Monte (como a rebatizou Antônio Conselheiro, apesar de encontrar-se em um vale cercado de colinas), os desabrigados do sertão e as vítimas da seca eram recebidos de braços abertos pelo peregrino, era uma comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras dos capatazes das fazendas tradicionais. Um "lugar santo", segundo os seus adeptos. Durante o período em que liderou o povoado de "Belo Monte", escreveu os "Apontamentos dos Preceitos da Divina Lei de Nosso Senhor Jesus Cristo, para a Salvação dos Homens",<ref>[[Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência]] - [http://www.sbpcnet.org.br/livro/62ra/resumos/resumos/6349.htm ''OS APONTAMENTOS DA DIVINA LEI DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO SEGUNDO ANTONIO CONSELHEIRO: TRAZENDO À TONA UM MANUSCRITO CENTENÁRIO.''] Gisele da Silva & Pedro Lima Vasconcellos. Acessado em 13/03/2018.</ref> <ref>''Canudos: subsídios para a sua reavaliação histórica.'' [[Fundação Casa de Rui Barbosa]], colaborador: José Augusto Vaz Sampaio Neto. 1986, pág.18, ISBN 9788570040923 Adicionado em 13/03/2018.</ref> que consiste de uma coletânea de reflexões sobre temas diversos, de matiz fundamentalmente religioso.


O lugar atraiu milhares de agricultores pobres, índios e escravos recém-libertos, que começaram a construir uma comunidade igualitária inspirada no exemplo da doutrina Católica. Por meio do trabalho comunitário, conseguiu-se que ninguém passasse fome. Tratava-se de uma comunidade rural, com uma economia autossustentável, baseada na solidariedade. A religião era um instrumento da libertação social<ref>[http://www.ihu.unisinos.br/noticias/526989-os-santos-do-povo-padre-ibiapina-antonio-conselheiro-e-padre-cicero Os santos do povo: padre Ibiapina, Antonio Conselheiro e Padre Cícero], acesso em 14 de janeiro de 2015.</ref>.
O lugar atraiu milhares de agricultores pobres, índios e escravos recém-libertos, que começaram a construir uma comunidade [[Igualdade|igualitária]] inspirada no exemplo da [[doutrina Católica]]. Por meio do trabalho comunitário, conseguiu-se que ninguém [[Carestia|passasse fome]]. Tratava-se de uma comunidade rural, com uma economia autossustentável, baseada na [[solidariedade]]. A religião era um instrumento da libertação social<ref>[http://www.ihu.unisinos.br/noticias/526989-os-santos-do-povo-padre-ibiapina-antonio-conselheiro-e-padre-cicero Os santos do povo: padre Ibiapina, Antonio Conselheiro e Padre Cícero], acesso em 14 de janeiro de 2015.</ref>.


==A Guerra de Canudos==
==A Guerra de Canudos==
[[Ficheiro:Antonio Conselheiro (Pátria Brazileira).jpg|thumb|Antônio Conselheiro.]]
{{Artigo principal|[[Guerra de Canudos]]}}
{{Artigo principal|[[Guerra de Canudos]]}}
[[Ficheiro:Antonio Conselheiro (Pátria Brazileira).jpg|thumb|Antônio Conselheiro.]]
Em 1896 ocorre o episódio que desencadeia a Guerra de Canudos: em 24 de novembro desse ano, é enviada a primeira expedição militar contra Canudos, sob comando do Tenente Pires Ferreira. Mas a tropa é surpreendida pelos fiéis de Antônio Conselheiro, durante a madrugada, em [[Uauá]]. Após uma luta corpo-a-corpo são contados mais de cento e cinquenta cadáveres de conselheiristas. Do lado do exército morreram oito militares e dois guias. Estas perdas, embora consideradas ''insignificantes quanto ao número'' nas palavras do comandante, ocasionaram o retiro das tropas.<ref>PIRES FERREIRA, Manuel da Silva. ''Relatório do Tenente Pires Ferreira, comandante da 1a Expedição contra Canudos''. Quartel da Palma, 10 de dezembro de 1896.</ref> Em 29 de dezembro de 1896 tem início uma segunda expedição militar contra Canudos.<ref name="UOL - Educação"/> Assim como a primeira, esta expedição foi violentamente debelada (vencida) pelos conselheiristas.
Em 1896 ocorre o episódio que desencadeia a Guerra de Canudos: em 24 de novembro desse ano, é enviada a primeira expedição militar contra Canudos, sob comando do Tenente Pires Ferreira. Mas a tropa é surpreendida pelos fiéis de Antônio Conselheiro, durante a madrugada, em [[Uauá]]. Após um [[combate corpo a corpo]] são contados mais de cento e cinquenta cadáveres de conselheiristas. Do lado do exército morreram oito militares e dois guias. Estas perdas, embora consideradas ''insignificantes quanto ao número'' nas palavras do comandante, ocasionaram o retiro das [[tropa]]s.<ref>PIRES FERREIRA, Manuel da Silva. ''Relatório do Tenente Pires Ferreira, comandante da 1a Expedição contra Canudos''. Quartel da Palma, 10 de dezembro de 1896.</ref> Em 29 de dezembro de 1896 tem início uma segunda expedição militar contra Canudos.<ref name="UOL - Educação"/> Assim como a primeira, esta expedição foi violentamente debelada (vencida) pelos conselheiristas.


No ano seguinte tem início a terceira expedição contra Canudos; comandada pelo capitão [[Antônio Moreira César]], conhecido como "o Corta-Cabeças", por suas façanhas na [[Revolução Federalista]], no [[Rio Grande do Sul]]. Mas, acostumado aos combates tradicionais, Moreira César não estava preparado para eliminar Canudos, e foi abatido por tiros certeiros de homens leais a Antônio Conselheiro. A tropa foge em debandada, deixando para trás armamentos e munição. Para os conselheiristas, trata-se de uma prova cabal da santidade do beato de Belo Monte. Em 5 de abril de 1897 tem início a quarta e última expedição contra Canudos; desta vez o cerco foi implacável; até muitos dos que se rendiam foram mortos; eliminar Canudos e seus habitantes tornou-se uma questão de honra para o exército.<ref name="UOL - Educação"/>
No ano seguinte tem início a terceira expedição contra Canudos; comandada pelo capitão [[Antônio Moreira César]], conhecido como "o Corta-Cabeças", por suas façanhas na [[Revolução Federalista]], no [[Rio Grande do Sul]]. Mas, acostumado aos combates tradicionais, Moreira César não estava preparado para eliminar Canudos, e foi abatido por tiros certeiros de homens leais a Antônio Conselheiro. A tropa foge em debandada, deixando para trás [[armamento]]s e [[munição]]. Para os conselheiristas, trata-se de uma prova cabal da santidade do [[beato]] de Belo Monte. Em 5 de abril de 1897 tem início a quarta e última expedição contra Canudos; desta vez o cerco foi implacável; até muitos dos que se rendiam foram mortos; eliminar Canudos e seus habitantes tornou-se uma questão de honra para o exército.<ref name="UOL - Educação"/>


===Morte===
===Morte===
Em 22 de setembro de 1897, morre Antônio Conselheiro. Não se sabe ao certo qual foi a causa de sua morte. As razões mais citadas são ferimentos causados por uma [[Granada (arma)|granada]], e uma forte "caminheira" ([[disenteria]]).
Em 22 de setembro de 1897, morre Antônio Conselheiro. Não se sabe ao certo qual foi a causa de sua morte. As razões mais citadas são ferimentos causados por uma [[Granada (arma)|granada]], e uma forte "caminheira" ([[disenteria]]).


Em 5 de outubro de 1897 são mortos os últimos defensores de Canudos, e o exército inicia a contagem das casas do arraial. No dia seguinte o cadáver de Antônio Conselheiro é encontrado enterrado no Santuário de Canudos, sua cabeça é cortada e levada até a [[Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia|Faculdade de Medicina de Salvador]] para ser examinada pelo Dr. [[Nina Rodrigues]], pois para a ciência da época, "a loucura, a demência e o fanatismo" deveriam estar estampados nos traços de seu rosto e crânio. O arraial de Canudos é completamente destruído.
Em 5 de outubro de 1897 são mortos os últimos defensores de Canudos, e o exército inicia a contagem das casas do arraial. No dia seguinte o cadáver de Antônio Conselheiro é encontrado enterrado no Santuário de Canudos, sua cabeça é cortada e levada até a [[Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia|Faculdade de Medicina de Salvador]] para ser examinada pelo Dr. [[Nina Rodrigues]], pois para a ciência da época, "a loucura, a demência e o fanatismo" deveriam estar estampados nos traços de seu rosto e crânio (''ver: [[frenologia]]''). O arraial de Canudos é completamente destruído.


Em 3 de março de 1905, um incêndio na antiga Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, em Salvador (BA), destrói a cabeça de Antônio Conselheiro, que lá se encontrava desde o final da guerra de Canudos, em outubro de 1897.
Em 3 de março de 1905, um incêndio na antiga Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, em Salvador (BA), destrói a cabeça de Antônio Conselheiro, que lá se encontrava desde o final da guerra de Canudos, em outubro de 1897.
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O diagnóstico de louco, mais especificamente de portador de uma [[Psicose]] sistemática progressiva (termo equivalente ao [[delírio]] crônico proposto por [[Valentin Magnan|Magnan]]) e a [[paranóia]] dos italianos, (referindo-se à [[Eugênio Tanzi]] e Gaetano Riva) por uma célebre autoridade sanitária da época, o Dr. [[Nina Rodrigues]] (1862 - 1906), no qual se fundamentaram os escritos da época (inclusive de [[Euclides da Cunha]]), ainda hoje se constitui como um entrave para o reconhecimento de seu mérito como líder comunitário responsável pela organização de mais de 24 mil pessoas em um ambiente extremamente adverso (Martins <ref>MARTINS, Paulo Emílio Matos. O empreendedor do sertão HSM Management 61 março-abril 2007 [http://br.hsmglobal.com/adjuntos/14/documentos/000/061/0000061732.pdf Disponível em pdf]</ref>) e até mesmo como um homem [[Canonização|religioso]] com [[Teologia|verdadeiros]] ideais [[Cristianismo|cristãos]].
O diagnóstico de louco, mais especificamente de portador de uma [[Psicose]] sistemática progressiva (termo equivalente ao [[delírio]] crônico proposto por [[Valentin Magnan|Magnan]]) e a [[paranóia]] dos italianos, (referindo-se à [[Eugênio Tanzi]] e Gaetano Riva) por uma célebre autoridade sanitária da época, o Dr. [[Nina Rodrigues]] (1862 - 1906), no qual se fundamentaram os escritos da época (inclusive de [[Euclides da Cunha]]), ainda hoje se constitui como um entrave para o reconhecimento de seu mérito como líder comunitário responsável pela organização de mais de 24 mil pessoas em um ambiente extremamente adverso (Martins <ref>MARTINS, Paulo Emílio Matos. O empreendedor do sertão HSM Management 61 março-abril 2007 [http://br.hsmglobal.com/adjuntos/14/documentos/000/061/0000061732.pdf Disponível em pdf]</ref>) e até mesmo como um homem [[Canonização|religioso]] com [[Teologia|verdadeiros]] ideais [[Cristianismo|cristãos]].


A pecha de [[loucura]] e [[fanatismo]] com os conceitos da época de psicologia das multidões inspiradas na obra de [[Gustave Le Bon]] (1841—1931) também são responsáveis por toda uma lógica de interpretação das revoltas sociais como ocasionadas por influência de uma personalidade [[psicopata|psicopática]], a insanidade moral proposta por [[Henry Maudsley]] (1835–1918), num ambiente de ignorância, pobreza ou degenerescência tal como se designava na época, incluindo entre esses fatores psicossociais características biológico raciais. (ver Rodrigues <ref>[[Nina Rodrigues|RODRIGUES, Nina]]. As collectividades anormaes, (Bibliotheca de Divulgação Scientifica, nº 19, RJ Civilização Brasileira, 1939</ref>)
A pecha de [[loucura]] e [[fanatismo religioso]] com os conceitos da época de [[psicologia social]] inspiradas na obra de [[Gustave Le Bon]] (1841—1931) também são responsáveis por toda uma lógica de interpretação das revoltas sociais como ocasionadas por influência de uma personalidade [[psicopata|psicopática]], a insanidade moral proposta por [[Henry Maudsley]] (1835–1918), num ambiente de ignorância, pobreza ou degenerescência tal como se designava na época, incluindo entre esses fatores psicossociais características biológico raciais. (ver Rodrigues <ref>[[Nina Rodrigues|RODRIGUES, Nina]]. As collectividades anormaes, (Bibliotheca de Divulgação Scientifica, nº 19, RJ Civilização Brasileira, 1939</ref>)


== Memorial Antônio Conselheiro ==
== Memorial Antônio Conselheiro ==
[[Ficheiro:Monumentos em homenagem a Antonio Conselheiro.JPG|200px|miniaturadaimagem|estátua em madeira representando o Conselheiro no memorial em Quixeramobim]]
[[Ficheiro:Monumentos em homenagem a Antonio Conselheiro.JPG|200px|miniaturadaimagem|estátua em madeira representando o Conselheiro no memorial em Quixeramobim]]


Há dois centros culturais relacionados a Antônio Conselheiro e à Guerra de Canudos. Um localizado em [[Quixeramobim]] no interior do Ceará, conta a história de seu filho ilustre, e está situado no centro da cidade. O imóvel, tombado pelo Ministério da Cultura em 2006, foi a casa em que Antônio Conselheiro nasceu e viveu até os seus 27 anos de idade. Após o tombamento, foi criado no local a ''Casa de Cultura e Memorial do Sertão Cearense''.<ref>{{citar web|url= http://www.quixeramobimnews.com.br/brisanet-quixeramobim-faz-uma-pequena-homenagem-antonio-conselheiro/|título= Homenagem a António Conselheiro|publicado= quixeramobimnews.com|obra= |autor= |data= 2 de fevereiro de 2018|acessodata= 6 de março de 2018|wayb= 20180306222656}}</ref> O outro centro cultural está situado em [[Canudos]], Bahia, criado pelo Decreto 33.333, de 30 de junho de 1986, (publicado no Diário Oficial de 1º de julho) mantido e administrado em parceria com a [[Universidade do Estado da Bahia|UNEB]].
Há dois [[Centro cultural|centros culturais]] relacionados a Antônio Conselheiro e à Guerra de Canudos. Um localizado em [[Quixeramobim]] no interior do Ceará, conta a história de seu filho ilustre, e está situado no centro da cidade. O imóvel, tombado pelo Ministério da Cultura em 2006, foi a casa em que Antônio Conselheiro nasceu e viveu até os seus 27 anos de idade. Após o tombamento, foi criado no local a ''Casa de Cultura e Memorial do Sertão Cearense''.<ref>{{citar web|url= http://www.quixeramobimnews.com.br/brisanet-quixeramobim-faz-uma-pequena-homenagem-antonio-conselheiro/|título= Homenagem a António Conselheiro|publicado= quixeramobimnews.com|obra= |autor= |data= 2 de fevereiro de 2018|acessodata= 6 de março de 2018|wayb= 20180306222656}}</ref> O outro centro cultural está situado em [[Canudos]], Bahia, criado pelo Decreto 33.333, de 30 de junho de 1986, (publicado no Diário Oficial de 1º de julho) mantido e administrado em parceria com a [[Universidade do Estado da Bahia|UNEB]].


=== Lenda ===
=== Lenda ===
Com o passar do tempo, a casa de Antonio Conselheiro em Quixeramobim foi se tornando palco de [[Fantasma|contos de assombração]]. Acredita-se na cultura popular, que a casa abriga espíritos e que existem tesouros enterrados em vasos de barro. Essas histórias passaram a fazer parte do folclore local.<ref>{{citar web|url= http://www.cultura.gov.br/noticias-destaques/-/asset_publisher/OiKX3xlR9iTn/content/ceara-tomba-a-casa-de-antonio-conselheiro-56623/10883|título= Ceará tomba a casa de Antonio Conselheiro|publicado= Ministério da Cultura|obra= ''O Estado de S. Paulo''|autor= Jotabê Medeiros|data= 9 de janeiro de 2006|acessodata= 6 de março de 2018|wayb= 20180306221139}}</ref>
Com o passar do tempo, a casa de Antonio Conselheiro em Quixeramobim foi se tornando palco de [[Fantasma|contos de assombração]]. Acredita-se na cultura popular, que a casa abriga espíritos e que existem tesouros enterrados em vasos de barro. Essas histórias passaram a fazer parte do [[folclore]] local.<ref>{{citar web|url= http://www.cultura.gov.br/noticias-destaques/-/asset_publisher/OiKX3xlR9iTn/content/ceara-tomba-a-casa-de-antonio-conselheiro-56623/10883|título= Ceará tomba a casa de Antonio Conselheiro|publicado= Ministério da Cultura|obra= ''O Estado de S. Paulo''|autor= Jotabê Medeiros|data= 9 de janeiro de 2006|acessodata= 6 de março de 2018|wayb= 20180306221139}}</ref>


==Ver também==
==Ver também==

Revisão das 15h16min de 13 de março de 2018

Antônio Conselheiro
Antônio Conselheiro
A única foto conhecida de Antônio Conselheiro, místico rebelde e líder espiritual do arraial de Canudos (1893-1897), Bahia, Brasil. Foto tirada duas semanas após sua morte, pelo fotógrafo Flávio de Barros, a serviço do Exército.
Nascimento 13 de março de 1830
Nova Vila de Campo Maior, Ceará
Morte 22 de setembro de 1897 (67 anos)
Canudos, Bahia
Nacionalidade Brasileiro
Ocupação Líder religioso

Antônio Vicente Mendes Maciel (Nova Vila de Campo Maior, 13 de março de 1830Canudos, 22 de setembro de 1897), mais conhecido na História do Brasil como Antônio Conselheiro, que se autodenominava "o peregrino",[1] foi um líder religioso brasileiro.[2]

Figura carismática, adquiriu uma dimensão messiânica ao liderar o arraial de Canudos, um pequeno vilarejo no sertão da Bahia, que atraiu milhares de sertanejos, entre camponeses, índios e escravos recém libertos, e que foi destruído pelo Exército da República na chamada Guerra de Canudos em 1896.[3]

A imprensa dos primeiros anos da República e muitos historiadores, para justificar o genocídio, retrataram-no como um louco, fanático religioso e contrarrevolucionário monarquista perigoso.

Biografia

Infância e vida no Ceará

Igreja do Bom Jesus, em Crisópolis, Bahia, construída por Antônio Conselheiro

Antônio Vicente Mendes Maciel nasceu em 13 de março de 1830, na cidade de Quixeramobim, interior do Ceará, então um pequeno povoado perdido em meio à caatinga do sertão central da paupérrima província do "Ceará Grande". Desde o início da vida, seus pais queriam que Antônio seguisse a carreira sacerdotal,[2] pois entrar para o clero era naquela época uma das poucas brechas que os pobres teriam para ascender socialmente. Com a morte de sua mãe, em 1834, a meta de transformar Antônio Vicente em padre tem seu fim. Seu pai casa-se novamente;[3] há registros de que a madrasta espancava e maltratava o menino severamente[carece de fontes?]. Em 1855 morre o pai de Antônio, e ele é obrigado a abandonar os estudos e assumir o comércio da família aos 25 anos de idade; malogram de vez quaisquer sonhos sacerdotais. Estes negócios não vão nada bem (mais tarde Antônio será processado devido a não quitação de suas dívidas)[carece de fontes?].

A Revista Ilustrada, de Angelo Agostini, veículo de propaganda republicana durante o Império, retratava Conselheiro de forma caricatural, com séqüito de bufões armados com velhos bacamartes, tentando "barrar" a República.
Exemplo de como a imprensa da época reagiu ao messianismo.

Em 1857 Antônio casa-se com Brasilina Laurentina de Lima, jovem filha de um tio seu. No ano seguinte, o jovem casal muda-se para Sobral, onde Antônio Vicente passa a viver como professor do primário, dando aulas para os filhos dos comerciantes e fazendeiros da região, e mais tarde como advogado prático, defendendo os pobres e desvalidos em troca de pequena remuneração. Passa a mudar-se constantemente, em busca de melhores mercados para seus ofícios; primeiro vai para Campo Grande (atual Guaraciaba do Norte),[2] depois Santa Quitéria e finalmente Ipu, então um pequeno povoado localizado bem na divisa entre os sertões pecuaristas e a fértil Serra da Ibiapaba. Em 1861 flagra a sua mulher em traição conjugal com um sargento de polícia em sua residência na Vila do Ipu Grande. Envergonhado, humilhado e abatido, abandona o Ipu e vai procurar abrigo nos sertões do Cariri, já naquela época um pólo de atração para penitentes e flagelados, iniciando aí uma vida de peregrinações pelos sertões do nordeste.[3]

Peregrinações

Em Sergipe, em 1874, o jornal O Rabudo traz a primeira menção pública de Antônio Maciel como penitente conhecido nos sertões:

Há seis meses que por todo o centro desta Província e da Província da Bahia, chegado (diz ele) do Ceará, infesta um aventureiro santarrão que se apelida por Antonio dos Mares. O que, a vista dos aparentes e mentirosos milagres que dizem ter ele feito, tem dado lugar a que o povo o trate por S. Antônio dos Mares. Esse misterioso personagem, trajando uma enorme camisa azul que lhe serve de hábito a forma do de sacerdote, pessimamente suja, cabelos mui espessos e sebosos entre os quais se vê claramente uma espantosa multidão de bichos (piolhos). Distingue-se pelo ar misterioso, olhos baços, tez desbotada e de pés nus; o que tudo concorre para o tornar a figura mais degradante do mundo.(O Rabudo, 22 de Novembro de 1874)

Já famoso como "homem santo" e peregrino, Antônio Conselheiro é preso em 1876 nos sertões da Bahia, pois corre o boato de que ele teria matado mãe e esposa. É levado para o Ceará, onde se conclui que não há nenhum indício contra a sua pessoa: sua mãe havia morrido quando ele tinha seis anos. Antônio Conselheiro é posto em liberdade e retorna à Bahia.[2]

Em 1877, o Nordeste do Brasil passa pela Grande Seca, uma das mais calamitosas secas de sua história; levas de flagelados perambulam famintos pelas estradas em busca de socorro governamental ou de ajuda divina; bandos armados de criminosos e flagelados promovem justiça social "com as próprias mãos" assaltando fazendas e pequenos lugarejos, pois pela ética dos desesperados "roubar para matar a fome não é crime". Cresce a notoriedade da figura de Antônio Conselheiro entre os sertanejos pobres; para eles, Antônio Conselheiro, ou o "Bom Jesus", como também passa a ser chamado, seria uma figura santa, um profeta enviado por "Deus" para socorrê-los.

Com o fim da escravidão, em 1888, muitos ex-escravos, libertos e expulsos das fazendas onde trabalhavam sem ter então nenhum meio de subsistência, partem em busca de Conselheiro.

Arraial de Canudos

Em 1893, cansado de tanto peregrinar pelos sertões e então sendo um "fora da lei", Conselheiro decide se fixar à margem Norte do Rio Vaza-Barris, num pequeno arraial chamado Canudos.[4] Nasce ali uma experiência extraordinária: em Belo Monte (como a rebatizou Antônio Conselheiro, apesar de encontrar-se em um vale cercado de colinas), os desabrigados do sertão e as vítimas da seca eram recebidos de braços abertos pelo peregrino, era uma comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras dos capatazes das fazendas tradicionais. Um "lugar santo", segundo os seus adeptos. Durante o período em que liderou o povoado de "Belo Monte", escreveu os "Apontamentos dos Preceitos da Divina Lei de Nosso Senhor Jesus Cristo, para a Salvação dos Homens",[5] [6] que consiste de uma coletânea de reflexões sobre temas diversos, de matiz fundamentalmente religioso.

O lugar atraiu milhares de agricultores pobres, índios e escravos recém-libertos, que começaram a construir uma comunidade igualitária inspirada no exemplo da doutrina Católica. Por meio do trabalho comunitário, conseguiu-se que ninguém passasse fome. Tratava-se de uma comunidade rural, com uma economia autossustentável, baseada na solidariedade. A religião era um instrumento da libertação social[7].

A Guerra de Canudos

Ver artigo principal: Guerra de Canudos
Antônio Conselheiro.

Em 1896 ocorre o episódio que desencadeia a Guerra de Canudos: em 24 de novembro desse ano, é enviada a primeira expedição militar contra Canudos, sob comando do Tenente Pires Ferreira. Mas a tropa é surpreendida pelos fiéis de Antônio Conselheiro, durante a madrugada, em Uauá. Após um combate corpo a corpo são contados mais de cento e cinquenta cadáveres de conselheiristas. Do lado do exército morreram oito militares e dois guias. Estas perdas, embora consideradas insignificantes quanto ao número nas palavras do comandante, ocasionaram o retiro das tropas.[8] Em 29 de dezembro de 1896 tem início uma segunda expedição militar contra Canudos.[3] Assim como a primeira, esta expedição foi violentamente debelada (vencida) pelos conselheiristas.

No ano seguinte tem início a terceira expedição contra Canudos; comandada pelo capitão Antônio Moreira César, conhecido como "o Corta-Cabeças", por suas façanhas na Revolução Federalista, no Rio Grande do Sul. Mas, acostumado aos combates tradicionais, Moreira César não estava preparado para eliminar Canudos, e foi abatido por tiros certeiros de homens leais a Antônio Conselheiro. A tropa foge em debandada, deixando para trás armamentos e munição. Para os conselheiristas, trata-se de uma prova cabal da santidade do beato de Belo Monte. Em 5 de abril de 1897 tem início a quarta e última expedição contra Canudos; desta vez o cerco foi implacável; até muitos dos que se rendiam foram mortos; eliminar Canudos e seus habitantes tornou-se uma questão de honra para o exército.[3]

Morte

Em 22 de setembro de 1897, morre Antônio Conselheiro. Não se sabe ao certo qual foi a causa de sua morte. As razões mais citadas são ferimentos causados por uma granada, e uma forte "caminheira" (disenteria).

Em 5 de outubro de 1897 são mortos os últimos defensores de Canudos, e o exército inicia a contagem das casas do arraial. No dia seguinte o cadáver de Antônio Conselheiro é encontrado enterrado no Santuário de Canudos, sua cabeça é cortada e levada até a Faculdade de Medicina de Salvador para ser examinada pelo Dr. Nina Rodrigues, pois para a ciência da época, "a loucura, a demência e o fanatismo" deveriam estar estampados nos traços de seu rosto e crânio (ver: frenologia). O arraial de Canudos é completamente destruído.

Em 3 de março de 1905, um incêndio na antiga Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, em Salvador (BA), destrói a cabeça de Antônio Conselheiro, que lá se encontrava desde o final da guerra de Canudos, em outubro de 1897.

Suposta loucura

O diagnóstico de louco, mais especificamente de portador de uma Psicose sistemática progressiva (termo equivalente ao delírio crônico proposto por Magnan) e a paranóia dos italianos, (referindo-se à Eugênio Tanzi e Gaetano Riva) por uma célebre autoridade sanitária da época, o Dr. Nina Rodrigues (1862 - 1906), no qual se fundamentaram os escritos da época (inclusive de Euclides da Cunha), ainda hoje se constitui como um entrave para o reconhecimento de seu mérito como líder comunitário responsável pela organização de mais de 24 mil pessoas em um ambiente extremamente adverso (Martins [9]) e até mesmo como um homem religioso com verdadeiros ideais cristãos.

A pecha de loucura e fanatismo religioso com os conceitos da época de psicologia social inspiradas na obra de Gustave Le Bon (1841—1931) também são responsáveis por toda uma lógica de interpretação das revoltas sociais como ocasionadas por influência de uma personalidade psicopática, a insanidade moral proposta por Henry Maudsley (1835–1918), num ambiente de ignorância, pobreza ou degenerescência tal como se designava na época, incluindo entre esses fatores psicossociais características biológico raciais. (ver Rodrigues [10])

Memorial Antônio Conselheiro

estátua em madeira representando o Conselheiro no memorial em Quixeramobim

Há dois centros culturais relacionados a Antônio Conselheiro e à Guerra de Canudos. Um localizado em Quixeramobim no interior do Ceará, conta a história de seu filho ilustre, e está situado no centro da cidade. O imóvel, tombado pelo Ministério da Cultura em 2006, foi a casa em que Antônio Conselheiro nasceu e viveu até os seus 27 anos de idade. Após o tombamento, foi criado no local a Casa de Cultura e Memorial do Sertão Cearense.[11] O outro centro cultural está situado em Canudos, Bahia, criado pelo Decreto 33.333, de 30 de junho de 1986, (publicado no Diário Oficial de 1º de julho) mantido e administrado em parceria com a UNEB.

Lenda

Com o passar do tempo, a casa de Antonio Conselheiro em Quixeramobim foi se tornando palco de contos de assombração. Acredita-se na cultura popular, que a casa abriga espíritos e que existem tesouros enterrados em vasos de barro. Essas histórias passaram a fazer parte do folclore local.[12]

Ver também

Referências

  1. NOGUEIRA, Ataliba, António Conselheiro e Canudos. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1997
  2. a b c d Thais Pacievitch (8 de julho de 2008). «Antônio Conselheiro». InfoEscola. Consultado em 22 de setembro de 2012 
  3. a b c d e «Antônio Conselheiro». UOL - Educação. Consultado em 22 de setembro de 2012 
  4. NOVAIS SAMPAIO, Consuelo. Canudos - Cartas para o Barão, páginas 231-232.
  5. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - OS APONTAMENTOS DA DIVINA LEI DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO SEGUNDO ANTONIO CONSELHEIRO: TRAZENDO À TONA UM MANUSCRITO CENTENÁRIO. Gisele da Silva & Pedro Lima Vasconcellos. Acessado em 13/03/2018.
  6. Canudos: subsídios para a sua reavaliação histórica. Fundação Casa de Rui Barbosa, colaborador: José Augusto Vaz Sampaio Neto. 1986, pág.18, ISBN 9788570040923 Adicionado em 13/03/2018.
  7. Os santos do povo: padre Ibiapina, Antonio Conselheiro e Padre Cícero, acesso em 14 de janeiro de 2015.
  8. PIRES FERREIRA, Manuel da Silva. Relatório do Tenente Pires Ferreira, comandante da 1a Expedição contra Canudos. Quartel da Palma, 10 de dezembro de 1896.
  9. MARTINS, Paulo Emílio Matos. O empreendedor do sertão HSM Management 61 março-abril 2007 Disponível em pdf
  10. RODRIGUES, Nina. As collectividades anormaes, (Bibliotheca de Divulgação Scientifica, nº 19, RJ Civilização Brasileira, 1939
  11. «Homenagem a António Conselheiro». quixeramobimnews.com. 2 de fevereiro de 2018. Consultado em 6 de março de 2018. Cópia arquivada em 6 de março de 2018 
  12. Jotabê Medeiros (9 de janeiro de 2006). «Ceará tomba a casa de Antonio Conselheiro». O Estado de S. Paulo. Ministério da Cultura. Consultado em 6 de março de 2018. Cópia arquivada em 6 de março de 2018 

Bibliografia

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