Lei dos Círculos

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Luís Pedreira do Couto Ferraz, principal arquiteto da Lei dos Círculos.

A Lei dos Círculos foi uma reforma eleitoral realizada no Império do Brasil e estabelecida pelo Decreto nº. 842 de 19 de setembro de 1855 e alterada pelo Decreto nº. 1.082 de 18 de agosto de 1860. Em sua primeira versão, a lei estabelecia que cada "círculo", ou distrito eleitoral, elegeria um deputado. Na segunda versão, o número de deputados eleitos passaria para três.

Contexto[editar | editar código-fonte]

No contexto da chamada "Conciliação", levada a cabo pelo Imperador D. Pedro II, iniciou-se o debate a respeito da necessidade de se reformar o sistema eleitoral brasileiro, visto que o gabinete organizado pelo Marquês do Paraná dois anos antes era alvo de duras críticas devido à alegada lentidão com que encaminhava os negócios públicos. Além disso, a legislação eleitoral vigente ainda era regida majoritariamente pelas Instruções de 1824, embora outras medidas tivessem sido aprovadas posteriormente, o que deixava lacunas no processo eleitoral e margem para revoltas como a Revolução Praieira, por exemplo.[1]

A reforma teve origem no projeto de lei do liberal Francisco de Paula Sousa e Melo, de 1848, sendo ligeiramente alterado pelo senador Luís Pedreira do Couto Ferraz, Visconde do Bom Retiro, então ministro dos Negócios do Império, mas mantendo suas principais características: o voto distrital e as incompatibilidades eleitorais. Porém, a nova lei esteve em vigor somente durante as eleições de 1857, sendo substituída por uma segunda Lei dos Círculos, em 1860, visando ampliar os distritos eleitorais e a margem de manobra eleitoral das elites políticas.

Reforma[editar | editar código-fonte]

A primeira Lei dos Círculos[editar | editar código-fonte]

Segundo o Decreto nº. 842 de 1855[2], em seu Artigo 1º, parágrafo 5º:

O Governo designará para cabeça de cada Districto Eleitoral a Cidade, ou Villa mais central, onde se reunirão em um so Collegio no dia marcado para a eleição dos Deputados á Assembléa Geral, e no edificio, que o Governo tambem designar, todos os Eleitores do Districto; e depois de observadas as formalidades para a organização do Collegio, e as mais de que trata o Capitulo 1º do Titulo 3º da Lei, procederão á eleição de hum Deputado, votando cada Eleitor por cedula não assignada, e escripta em papel fornecido pela Mesa. Recolhidos os votos em escrutinio secreto, contados e apurados, ficará eleito Deputado o Cidadão que obtiver maioria absoluta de votos.

Dessa forma, cada província seria dividida em círculos eleitorais de acordo com o número de deputados de que dispunha, abandonando o voto por lista e substituindo o sistema de maioria simples pelo de maioria absoluta. Além disso, a lei estabelecia o princípio de incompatibilidade, vetando a participação de membros do Executivo e do Judiciário de se candidatarem no círculo em que exercessem função ou jurisdição. Assim, a lei tinha por objetivo principal pluralizar a representação parlamentar, permitindo a entrada de políticos locais, mas também de acabar com as "câmaras unânimes", diminuir a interferência do governo nas eleições e no Legislativo e fortalecer a política conciliadora dos governos anteriores.[3]

A Lei dos Círculos foi inspirada na legislação eleitoral francesa de 1789, que estabelecia o conceito de majorité absolute e o voto distrital. O sistema também era utilizado em países como o Reino Unido e os Estados Unidos.[4]

A segunda Lei dos Círculos[editar | editar código-fonte]

Uma segunda Lei dos Círculos foi aprovada em 1860, alterando sua anterior após o pleito de 1857. Segundo o Decreto nº. 1.082[5], em seu Artigo 1º, parágrafo 2º:

As provincias do Imperio serão divididas em districtos eleitoraes de tres Deputados cada hum. Quando porém derem só dous Deputados, ou o numero destes não fôr multiplo de tres, haverá hum ou dous districtos de dous Deputados.

A nova lei, aprovada pelo deputado João de Almeida Pereira Filho, então ministro dos Negócios do Império do Gabinete Ferraz, aumentava para três o número de deputados eleitos por cada círculo, em uma tentativa de mitigar os "excessos renovadores" da reforma anterior.

Resultados[editar | editar código-fonte]

A Lei dos Círculos teve resultados controversos. Por um lado, ela não acabou com as câmaras unipartidárias de forma efetiva, nem com as fraudes, a violência e a interferência governamental. Por outro lado, contudo, ela trouxe, de fato, uma renovação efetiva para os quadros parlamentares. Nas eleições de 1857, muitos dos deputados eleitos eram desconhecidos e inexperientes, fato que desagradava os chefes políticos tradicionais. Por esse motivo, a lei foi alterada em 1860, aumentando o número de círculos eleitorais e a margem de manobra das elites políticas tradicionais. Contudo, o processo de renovação parlamentar permaneceu, causando impactos duradouros na política imperial.[6]

A reforma e suas alterações seriam substituídas pela chamada Lei do Terço, em 1875.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Ferraz, Paula Ribeiro (2015). «A primeira lei dos círculos : debates parlamentares e experiência eleitoral no Brasil do segundo reinado»: 5. Consultado em 30 de abril de 2024 
  2. «Lei dos Círculos». Justiça Eleitoral. Consultado em 30 de abril de 2024 
  3. Estefanes, Bruno Fabris; Dantas, Monica Duarte (2010). «Conciliar o império: Honório Hermeto Carneiro Leão, os partidos e a política de conciliação no Brasil monárquico (1842-1856)»: 181. Consultado em 30 de abril de 2024 
  4. «Você sabe o que foi a Lei dos Círculos? Confira a história no Glossário». Justiça Eleitoral. Consultado em 30 de abril de 2024 
  5. «Portal da Câmara dos Deputados». www2.camara.leg.br. Consultado em 30 de abril de 2024 
  6. Ferraz, Paula Ribeiro (2015). «A primeira lei dos círculos : debates parlamentares e experiência eleitoral no Brasil do segundo reinado»: 14. Consultado em 30 de abril de 2024 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. Brasília : Senado Federal, Conselho Editorial, 2001.