Matar Saudades

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Matar Saudades
Portugal Portugal
1988 •  cor •  85 min 
Género drama
Direção Fernando Lopes
Produção José Luís Vasconcelos
Roteiro Fernando Lopes
Carlos Saboga
António-Pedro Vasconcelos
Elenco Rogério Samora
Teresa Madruga
Música Diogo Seixas Lopes
Diretor de fotografia António Escudeiro
Edição Alexandre Gonçalves
Distribuição Portugal Filmes Lusomundo
Lançamento Portugal26 de agosto de 1988
Idioma português

Matar Saudades é um filme português de 1988 do género drama (com elementos de western), realizado por Fernando Lopes e escrito em conjunto com Carlos Saboga e António-Pedro Vasconcelos.[1] A longa-metragem de ficção é protagonizada por Rogério Samora, no papel de Abel, um homem que, depois de ter emigrado para França, regressa à sua aldeia transmontana preparado para se vingar.[2] O filme foi rodado, na sua maioria, na aldeia de Sonim (Valpaços).[3] Matar Saudades foi lançado comercialmente nos cinemas de Portugal a 26 de agosto de 1988.[4]

Sinopse[editar | editar código-fonte]

Abel, de 47 anos, emigrado em França, é um homem marcado pela experiência da Guerra Colonial, bem como por uma vida dura e difícil num país estranho. Transporta várias cicatrizes psicológicas de muitas batalhas perdidas. Decide regressar a salto a Portugal, muito apreensivo devido a uma carta do irmão Pedro, onde este o avisava que tudo tinha mudado, incluindo Teresa, a mulher que deixara no país. Abel pretende ajustar contas com as traições que lhe foram feitas e recuperar o amor da mulher que o esqueceu. Um camionista leva-o até à sua aldeia perto da fronteira, na região de Valpaços (Trás-os-Montes).[5]

Abel avista dos montes da sua infância a aldeia de Sonim. Tudo, de longe, parece nos mesmos lugares. Até o seu velho cão é o que resta do passado. A aldeia aparenta estar imutável, mas em breve vai descobrir que tudo não passa de uma ilusão. Em Sonim prepara-se a representação do "Ato da Paixão", em que Teresa participa. Abel retoma os gestos antigos e monta um plano de vingança. Pretende eliminar, um a um, os pretendentes de Teresa, até consumar no "Ato da Paixão", em plena representação, a morte da própria Teresa.[6]

Elenco[editar | editar código-fonte]

Equipa técnica[editar | editar código-fonte]

Produção[editar | editar código-fonte]

Desenvolvimento[editar | editar código-fonte]

Após realizar filmes como Belarmino e Crónica dos Bons Malandros, Fernando Lopes relatou um desejo de se confrontar com a abordagem de escrita de um argumento e de todo o trabalho prévio que isso acarreta. Nas suas palavras, "achei que era preciso recuperar as narrativas no cinema, voltar a contar histórias e a criar personagens. Eu costumava dizer por altura do Matar Saudades que no cinema português havia décor a mais e personagens a menos."[13] A ideia para o filme surgiu quando Lopes leu uma notícia de jornal sobre um emigrante que regressa a Portugal para matar a esposa, e desenvolveu-se em conversas com António-Pedro Vasconcelos. O realizador convidou depois Carlos Saboga, quem mais contribuiu para a escrita do argumento, através dos diálogos e definição da narrativa.[14]

Matar Saudades é uma produção portuguesa da Opus Filmes, com a participação financeira do Instituto Português de Cinema, Radiotelevisão Portuguesa e Fundação Calouste Gulbenkian.[15]

Rodagem[editar | editar código-fonte]

A rodagem de Matar Saudades decorreu entre outubro e dezembro de 1986. Apesar de, na sua maioria, as gravações terem decorrido na aldeia de Sonim (Valpaços), algumas cenas foram também rodadas em Vilar Formoso.[3] A equipa contou com a colaboração da Guarda Nacional Republicana para a utilização do cão Tuy.[11]

Lopes revelou que surgiram inúmeros contratempos ao longo deste processo, acima de tudo pela falta de profissionalismo e de disciplina de produção da equipa: "Não era só de uma questão de meios, porque esses até os tinha, mas foi tudo feito muito entre amigos e naquela época já não se podia produzir um filme em termos de amiguismo".[13] Outro constrangimento decorreu da escolha da película Fuji para rodar Matar Saudades. Sendo uma novidade na Europa, o diretor de fotografia não a conhecia bem e decorreram problemas com as tonalidades do filme. Esta obra marca a primeira colaboração do realizador com Rogério Samora que, apesar de inicialmente não ter sido desprovida de percalços, se viria a repetir no futuro.[7]

Temas e estética[editar | editar código-fonte]

Em Matar Saudades refletem-se alguns dos temas mais caros ao cinema de Lopes, como a nostalgia do passado e as dificuldades de adaptação à inevitabilidade transformadora do presente.[5] Tal como em Nacionalidade: Português e Nós Por Cá Todos Bem, Fernando Lopes aborda a temática da imigração portuguesa, mas nesta obra não propõe qualquer discurso (sociológico ou metafísico) para explicar as características de Abel. Segundo o cinéfilo João Bénard da Costa, "para uma visão tão radicalmente panteísta, Fernando Lopes não procurou apoios em textos. Mas no imaginário cinematográfico português que já fora a essas terras para ver (Oliveira, certamente, mas mais ainda António Reis) e no imaginário mítico cinematográfico, onde as paixões dos homens mais radicais foram."[16] Nesta sua abordagem, tentando relacionar a ideia de viagem e as viagens interiores, Fernando Lopes procurou recuperar o modelo de Odisseia: Do mesmo modo que Ulisses volta a Ítaca, Abel regressa a Trás-os-Montes.[13]

A estética do filme remonta igualmente a referências do cinema western (em particular de King Vidor, Raoul Walsh e John Ford). A personagem de Teresa foi mesmo comparada a Mercedes McCambridge de Johnny Guitar. Bénard da Costa caracterizou ainda o filme, a par com Uma Abelha na Chuva e Nós Por Cá Todos Bem, de fruto da visão "de um lisboeta sobre a Beira Litoral, ou Trás-os-Montes".[17]

Distribuição[editar | editar código-fonte]

Matar Saudades teve uma ante-estreia a 6 de novembro de 1987, na Cinemateca Portuguesa (Lisboa). A distribuição comercial do filme em Portugal, pela Filmes Lusomundo, iniciou-se a 26 de agosto de 1988, data em que estreou nos cinemas Quarteto e Amoreiras (Lisboa).[18] Na Holanda, a longa-metragem foi também distribuída, a partir de 16 de agosto de 1991.[19]

Receção crítica[editar | editar código-fonte]

Numa recensão de mesmo nome sobre Matar Saudades, Joaquim Leitão defende: "penso que o filme começa a ser vítima do talento do próprio realizador, levando-o a menorizar os riscos de um argumento «inacabado», confiante na sua capacidade mais que provada - nos seus filmes e não só 4 - em «criar» o filme na montagem. Mas a estrutura simples, linear - incontornável - de Matar Saudades não dá muito espaço para «golpes de asa» de montagem que preenchessem o «vazio» que vem do argumento. Um «vazio» que o estilo de filmagem -a opção por um olhar sóbrio, que nunca é «frio» mas, no entanto, se mantém «distante» - não ajudou a colmatar."[20]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Matar Saudades (1988) (em inglês), consultado em 29 de janeiro de 2021 
  2. Público. «Matar Saudades». Cinecartaz. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  3. a b «Notícias de Valpaços: Memórias e Curiosidades - Filme "Matar Saudades (1987)"». Notícias de Valpaços. 21 de julho de 2016. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  4. «Fernando Lopes: Uma vida ao serviço do cinema». Camões, I.P. 5 de fevereiro de 2012. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  5. a b Portugal, Rádio e Televisão de. «Matar Saudades - Filmes - Drama - RTP». www.rtp.pt. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  6. Matar Saudades (em inglês), consultado em 29 de janeiro de 2021 
  7. a b «″Vou para qualquer lugar com o Fernando″ - DN». www.dn.pt. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  8. «MATAR SAUDADES (1987)». BFI (em inglês). Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  9. «MIDAS FILMES APRESENTA FANTASPORTO 08 – Semana dos Realizadores Prémio Especial do Júri» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  10. Infopédia. «Fernando Lopes - Infopédia». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  11. a b Nascimento, Frederico Lopes / Marco Oliveira / Guilherme. «Matar Saudades». CinePT-Cinema Portugues. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  12. «Matar saudades - vpro cinema». VPRO Gids (em neerlandês). Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  13. a b c «"Fernando Lopes - Profissão: Cineasta" by Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema - Issuu». webcache.googleusercontent.com. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  14. «Carlos Saboga». BFI (em inglês). Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  15. Matar Saudades (1988) (em inglês), consultado em 29 de janeiro de 2021 
  16. «FERNANDO LOPES» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  17. «Fernando Lopes» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  18. «Cinema Português». cvc.instituto-camoes.pt. Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  19. «Gevonden in Delpher - NRC Handelsblad». www.delpher.nl (em neerlandês). Consultado em 29 de janeiro de 2021 
  20. «fernando lopes.indd» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 29 de janeiro de 2021 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]