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Ultimato britânico de 1890: diferenças entre revisões

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O '''Ultimato britânico de 1890''' foi um [[ultimato]] do governo britânico - chefiado pelo primeiro ministro [[Robert Gascoyne-Cecil|Lord Salisbury]] - entregue a [[11 de Janeiro]] de [[1890]] na forma de um "Memorando" que exigia a [[Portugal]] a retirada das forças militares chefiadas pelo major [[Serpa Pinto]] do território compreendido entre as colónias de [[Moçambique]] e [[Angola]] (nos actuais [[Zimbabwe]] e [[Zâmbia]]), a pretexto de um incidente entre portugueses e [[Macololos]]. A zona era reclamada por Portugal, que a havia incluído no famoso [[Mapa cor-de-rosa]], reclamando a partir da [[Conferência de Berlim]] uma faixa de território que ia de Angola à ''contra-costa'', ou seja, a [[Moçambique]]. A concessão de Portugal às exigências britânicas foi vista como uma humilhação nacional pelos [[republicano]]s portugueses, que acusaram o governo e o rei [[Carlos I de Portugal|D.Carlos I]] de serem os seus responsáveis. O governo caiu, e [[António de Serpa Pimentel]] foi nomeado primeiro-ministro. O Ultimato britânico inspirou a letra do [[hino nacional]] português, "[[A Portuguesa]]". Foi considerado pelos historiadores Portugueses e políticos da época a acção mais escandalosa e infame da Grã-Bretanha contra o seu [[aliança luso-britânica|antigo aliado]].<ref>João Ferreira Duarte, [http://www.erudit.org/revue/TTR/2000/v13/n1/037395ar.pdf The Politics of Non-Translation: A Case Study in Anglo-Portuguese Relations]</ref>
O '''Ultimato britânico de 1890''' foi um [[ultimato]] do governo britânico - chefiado pelo primeiro ministro [[Robert Gascoyne-Cecil|Lord Salisbury]] - entregue a [[11 de Janeiro]] de [[1890]] na forma de um "Memorando" que exigia a [[Portugal]] a retirada das forças militares chefiadas pelo major [[Serpa Pinto]] do território compreendido entre as colónias de [[Moçambique]] e [[Angola]] (nos actuais [[Zimbabwe]] e [[Zâmbia]]), a pretexto de um incidente entre portugueses e [[Macololos]]. A zona era reclamada por Portugal, que a havia incluído no famoso [[Mapa cor-de-rosa]], reclamando a partir da [[Conferência de Berlim]] uma faixa de território que ia de Angola à ''contra-costa'', ou seja, a [[Moçambique]]. A concessão de Portugal às exigências britânicas foi vista como uma humilhação nacional pelos [[republicano]]s portugueses, que acusaram o governo e o rei [[Carlos I de Portugal|D.Carlos I]] de serem os seus responsáveis. O governo caiu, e [[António de Serpa Pimentel]] foi nomeado primeiro-ministro. O Ultimato britânico inspirou a letra do [[hino nacional]] português, "[[A Portuguesa]]". Foi considerado pelos historiadores Portugueses e políticos da época a ação mais escandalosa e infame da Grã-Bretanha contra o seu [[aliança luso-britânica|antigo aliado]].<ref>João Ferreira Duarte, [http://www.erudit.org/revue/TTR/2000/v13/n1/037395ar.pdf The Politics of Non-Translation: A Case Study in Anglo-Portuguese Relations]</ref>


==Antecedentes==
==Antecedentes==

Revisão das 20h37min de 14 de maio de 2014

O Mapa Cor-de-Rosa, que originou o ultimato britânico de 1890.

O Ultimato britânico de 1890 foi um ultimato do governo britânico - chefiado pelo primeiro ministro Lord Salisbury - entregue a 11 de Janeiro de 1890 na forma de um "Memorando" que exigia a Portugal a retirada das forças militares chefiadas pelo major Serpa Pinto do território compreendido entre as colónias de Moçambique e Angola (nos actuais Zimbabwe e Zâmbia), a pretexto de um incidente entre portugueses e Macololos. A zona era reclamada por Portugal, que a havia incluído no famoso Mapa cor-de-rosa, reclamando a partir da Conferência de Berlim uma faixa de território que ia de Angola à contra-costa, ou seja, a Moçambique. A concessão de Portugal às exigências britânicas foi vista como uma humilhação nacional pelos republicanos portugueses, que acusaram o governo e o rei D.Carlos I de serem os seus responsáveis. O governo caiu, e António de Serpa Pimentel foi nomeado primeiro-ministro. O Ultimato britânico inspirou a letra do hino nacional português, "A Portuguesa". Foi considerado pelos historiadores Portugueses e políticos da época a ação mais escandalosa e infame da Grã-Bretanha contra o seu antigo aliado.[1]

Antecedentes

Em meados do século XIX, durante a chamada "partilha de África", Portugal reclamou vastas áreas do continente africano baseado no "direito histórico", alicerçado na primazia da ocupação, entrando em colisão com as principais potências europeias. A crescente presença inglesa, francesa e alemã no continente ameaçavam a hegemonia portuguesa, como alertou Silva Porto, comerciante sedeado no planalto do Bié que, assistindo aos movimentos, solicitou um destacamento português.[2] A partir da década de 1870 ficou claro que o direito histórico não bastava: à intensa exploração científica e geográfica europeia seguia-se muitas vezes o interesse comercial. Entre 1840 e 1872 David Livingstone explorou a África central, onde pouco depois se instalou a Companhia Britânica da África do Sul. Em 1874 Henry Morton Stanley explorou a bacia do rio Congo e foi financiado pelo rei Leopoldo II da Bélgica, que em 1876 criou uma associação para colonizar o Congo ignorando os interesses portugueses na região.[3]

Em 1875 setenta e quatro subscritores, entre os quais Luciano Cordeiro, fundaram a Sociedade de Geografia de Lisboa para apoiar a exploração, tal como as congéneres europeias[4]. Foi então criada a Comissão de África que preparou as primeiras grandes expedições de exploração científico-geográfica, financiadas por subscrição nacional, de Hermenegildo Capelo, Roberto Ivens e Serpa Pinto, que entre 1877 e 1885 mapearam o território. Pretendiam fazer o reconhecimento do rio Cuango, das suas relações com o rio Congo e comparar a bacia hidrográfica deste com a do Zambeze, concluindo assim a carta da África centro-austral (o famoso Mapa cor-de-rosa) e mantendo "estações civilizadoras" portuguesas no interior do continente. Entretanto, o ministro dos negócios estrangeiros João de Andrade Corvo procurou reafirmar a tradicional aliança Luso-Britânica, propondo abrir Moçambique e Goa ao comércio e navegação britânicos[5] que em troca reconheciam as suas exigências no Congo.

Em 1883 Portugal ocupou a região a norte do rio Congo. Contudo, na Conferência internacional de Berlim (18841885) convocada por Bismark para fixar as zonas de influência de cada potência em África e dirimir conflitos - incluindo a oposição Portuguesa e Britânica à expansão de Leopoldo II- a aliança decepcionou. Sob pressão da Alemanha e da França, Portugal perdeu o controlo da foz do Congo para Leopoldo II da Bélgica.[6] Do Congo português apenas Cabinda se manteve: em Fevereiro de 1885, os notáveis de Cabinda assinaram o Tratado de Simulambuco, pelo qual aceitavam ser um protectorado da coroa portuguesa.[7]

A exigência da «ocupação efectiva» sobre a ocupação histórica, determinada pela Conferência de Berlim [8] obrigou a agir. O estado português diversificou então os contactos internacionais, cedendo à França na Guiné, e à Alemanha no Sul de Angola,[9] em troca do reconhecimento às terras interiores entre Angola e Moçambique. Nascia assim o chamado Mapa Cor-de-Rosa, tornado público em 1886, reclamando uma faixa de território que ia de Angola à contra-costa ou seja, a Moçambique. Para sustentar a reclamação de soberania foram desencadeadas diversas campanhas de exploração e avassalamento dos povos do interior e a resistência foi combatida com as chamadas Campanhas de Conquista e Pacificação conduzidas pelas forças armadas.

Conflito e ultimato

Mapa mostrando o controlo britânico quase completo da rota do Cabo ao Cairo, 1914

Em 1887, ao saber dos planos portugueses, o primeiro-ministro britânico lord Salisbury recusou reconhecer os territórios que considerou não "ocupados com forças suficientes para manter a ordem, proteger estrangeiros e controlar nativos". Portugal tentou fechar o Rio Zambeze à navegação, reclamou o vale do Niassa, numa faixa que isolava as colónias britânicas a sul.[10]

Em Janeiro de 1890 Paiva Couceiro estacionara com 40 soldados no Bié, em Angola, a caminho do Barotze para tentar obter a "avassalamento" do soba Levanica.[11]. Simultaneamente, junto ao lago Niassa, em Moçambique, as forças de Serpa Pinto arreavam as bandeiras inglesas, num espaço cobiçado e monitorizado pelo Reino Unido.

A 11 de Janeiro de 1890, a pretexto do «incidente Serpa Pinto», é exigida pelo Reino Unido a imediata retirada das forças militares portuguesas no território compreendido entre Moçambique e Angola, no actual Zimbabwe. Portugal abandonou as suas pretensões que Lord Salisbury considerava baseadas "argumentos arqueológicos" de ocupação:[10] a expansão colonial africana terminou.

As pretensões portuguesas expressas no mapa cor-de-rosa entravam em conflito com a Companhia Britânica da África do Sul e o megaprojecto inglês de criar uma ferrovia que atravessaria o todo o continente africano de norte a sul, ligando o Cairo à Cidade do Cabo. Este projecto promovido por Cecil Rhodes acabaria por nunca se realizar, pelas enormes dificuldades posta pela sua dimensão, os obstáculos do clima e geografia, e a oposição portuguesa com o mapa cor-de-rosa seguindo-se o Incidente de Fachoda entre 1898 e 1899, que colocou a França e Inglaterra à beira de uma guerra.

Impacto

A impossibilidade de resistência levou à imediata queda do governo português, sendo nomeado a 14 de Janeiro um novo ministério presidido por António de Serpa Pimentel. Inicia-se um profundo movimento de descontentamento social, implicando directamente a família reinante, vista como demasiado próxima dos interesses britânicos, na decadência nacional patente no ultimato. Os republicanos capitalizam este descontentamento, iniciando um crescimento e alargamento da sua base social de apoio.

Alimentando esse ambiente de quase insurreição, a 23 de Março, António José de Almeida, estudante universitário em Coimbra e futuro presidente da república, publica um artigo com o título Bragança, o último, que será considerado calunioso para o rei e o levará à prisão. A 1 de Abril, no Cuíto, em Angola, o velho explorador Silva Porto imolou-se envolto numa bandeira portuguesa após negociações falhadas com os locais, sob ordens de Paiva Couceiro, que atribuiu ao ultimatum. A morte do que fora um dos rostos da exploração interior africana (chegando ao Barotze) gerou uma onda de comoção nacional[12] e o seu funeral foi seguido por uma multidão no Porto.[13] [14]. A 11 de Abril é posto à venda o Finis Patriae de Guerra Junqueiro ridicularizando a figura do rei.

Formalizando a cedência portuguesa, a 20 de Agosto é assinado o Tratado de Londres entre Portugal e a Grã-Bretanha, definindo os limites territoriais de Angola e Moçambique. O tratado foi publicado no Diário do Governo de 30 de Agosto e apresentado ao parlamento na sessão de 30 de Agosto, o que desencadeia novos protestos e nova queda do governo. Um ano depois, em 11 de junho de 1891, a Questão do Barotze, referente ao estabelecimento das fronteiras de Angola nos limites ocidentais do território de Barotze foi resolvida entre Portugal e a Grã-Bretanha foi declarado que o reino Barotse estava dentro da esfera de influência britânica com a arbitragem de Vítor Emanuel III da Itália.[15]

Em consequência da cedência aos interesses britânicos, aparece em Lisboa a Liga Liberal, movimento de protesto presidido por Augusto Fuschini com a participação de João Crisóstomo contra o Tratado de Londres. A Liga promoveu uma reunião, no Teatro de São Luís, em que participaram cerca de 400 oficiais fardados. Após 28 dias de crise política é nomeado a 14 de Outubro um governo extra-partidário, presidido por João Crisóstomo. O governo é apoiado pela Liga Liberal, retomando-se progressivamente a calma.

Estes acontecimentos desencadeados pelo ultimato britânico de 11 de Janeiro de 1890 marcaram de forma indelével a evolução política portuguesa, desencadeando uma cadeia de acontecimentos que levará ao fim da monarquia constitucional e à implantação da república em 5 de Outubro de 1910 e ao reforço na consciência colectiva portuguesa do apego ao império colonial, que depois teve pesadas consequências ao longo do século XX.

Ver também

Referências

  1. João Ferreira Duarte, The Politics of Non-Translation: A Case Study in Anglo-Portuguese Relations
  2. Santos, Maria Emília Madeira (1983). Silva Porto e os problemas da África portuguesa no século XIX. Série Separatas / Centro de Estudos de Cartografia Antiga. 149. Coimbra: Junta de Investigações Científicas do Ultramar. 27 páginas 
  3. Educaterra/ História por Voltaire Shilling. «Stanley e Leopoldo II». 2002. Consultado em 22 de Outubro de 2010 
  4. Sociedade de Geografia de Lisboa. «História». 2010. Consultado em 22 de Outubro de 2010 
  5. Ramos 2009, pp. 550—551.
  6. Ramos 2009, pp. 550—551.
  7. Porto, João Gomes. «Cabinda. Notes on a soon-to-be-forgotten war». Institute for Security Studies. Consultado em 15 de outubro de 2009 
  8. Hammond, Richard James (1966). Portugal and Africa, 1815-1910: a study in uneconomic imperialism. [S.l.]: Stanford University Press. ISBN 0804702969  horizontal tab character character in |id= at position 5 (ajuda); Ligação externa em |título= (ajuda)
  9. Ramos 2009, p. 551.
  10. a b A.W. Ward, G.P. Gooch (1922). The Cambridge history of British foreign policy 1783-1919. [S.l.]: Cambridge University Press  Ligação externa em |título= (ajuda)
  11. «Vasco Pulido Valente, "Henrique Paiva Couceiro — um colonialista e um conservador". Análise Social, volume XXXVI (160), 2001, pp. 767-802.» (PDF) 
  12. Santos, Maria Emília Madeira (1983). Silva Porto e os problemas da África portuguesa no século XIX. Série Separatas / Centro de Estudos de Cartografia Antiga. 149. Coimbra: Junta de Investigações Científicas do Ultramar. 27 páginas 
  13. «Silva Porto: do Brasil a África». 24 de fevereiro de 2008. Consultado em 7 de maio de 2010 
  14. Pélissier, René (2006). Campanhas coloniais de Portugal, 1844-1941. [S.l.]: Estampa. 27 páginas. ISBN 9723323052 
  15. Encyclopædia Britannica (1911). «1911 Encyclopædia Britannica/Barotse and Barotseland». Consultado em 25 de Outubro de 2010 

Ligações externas