Palavras gregas para o amor

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A língua grega é constituída de muitos vocábulos conceituais. Assim, em grego antigo, não há uma única palavra para descrever o amor, a filosofia da Grécia Antiga classifica o amor em diversas formas:

  • Ágape (ἀγάπη agápē[1]): significa “amor” no grego moderno. A palavra foi usada de maneiras diferentes por uma variedade de fontes contemporâneas e antigas, incluindo os escritores da Bíblia. Muitos pensavam que essa palavra representava apenas o amor divino, incondicional, com autosacrifício, pela vontade e pelo pensamento, embora também possa ser praticado por humanos inspirados por esse sentimento, mas em grau bem inferior, obviamente, em função das imperfeições e limitações humanas. Os filósofos gregos nos tempos de Platão e outros autores antigos usaram o termo para denotar uma afeição em contraste com philia (uma afeição que poderia ser encontrada entre amigos e de forma não sexual) e eros (uma afeição de natureza sexual e romântica). Aparece no Novo Testamento e descreve, entre outras coisas, o relacionamento entre Jesus e os seus discípulos. Na literatura bíblica, seus significados são ilustrados como autossacrifício e a disposição de amor a todas as pessoas, amigos e inimigos, o chamado amor ao próximo. Por causa do seu uso frequente no Novo Testamento, os escritores cristãos desenvolveram uma quantidade significativa de teologia baseada unicamente na interpretação desta palavra.[2][3]
  • Eros (ἔρως érōs): remete à palavra grega moderna “érotas”, com a sua significação de “amor romântico". Entretanto, eros não necessariamente evoca uma natureza sexual, embora muitas vezes esteja associado ao desejo de erotismo, à atração física, ao prazer e ao sexo propriamente dito. O eros pode ser interpretado como um amor a quem se ama mais do que o amor de philos, podendo também se aplicar a definição de relacionamentos afetivos propriamente ditos. Seria o amor entre os apaixonados. Filosoficamente, Platão refina uma definição própria de eros: para ele, embora esta forma de amor seja sentida inicialmente em disposição a uma pessoa, contemplando-se este alguém o amor é transformado numa apreciação da beleza trazida na alma, ou mesmo na apreciação da beleza formalmente definida (ver: Teoria das ideias). Deve-se apontar que Platão não observa na atração física uma parte necessária do amor erótico, donde o “amor platônico” significa um amor sem atração física. Para Platão, o eros promove o conhecimento da recordação da beleza da alma e contribui para a compreensão da verdade espiritual. Os amantes e os filósofos são, para ele, inspirados a procurar a verdade pelo eros. O trabalho mais famoso de Platão sobre o assunto é O Banquete, tratando-se de uma discussão entre os estudantes de Sócrates sobre a natureza do eros.[4][5]
  • Philia (φιλία philía/filia): “amizade” no grego moderno, indica um amor virtuoso e desapaixonado. É o tipo de amor relacionado à amizade e companheirismo, onde não há a presença do eros. É descrito como o amor entre amigos e irmãos. Foi desenvolvido conceitualmente por Aristóteles, a incluir a lealdade aos amigos e à comunidade e requerendo igualdade e familiaridade. Esta é a única outra palavra para o “amor” usada nos textos antigos do Novo Testamento além de ágape, mas é usada substancialmente com menor frequência. Aristóteles diz que a philia é necessária como um meio para atingir a felicidade (“ninguém escolheria viver sem amigos mesmo se tiver todos os outros bens, a nobreza ou gentileza para si”).[6][7]
  • Philos (φίλος filos/phílos[8]): "confiabilidade", "amado" ou "querido", afinidade, amigabilidade[9] (ou amabilidade)[10] e lealdade baseada na confiança.[11] Descreve o amor amical e companhia amiga ou amistosa, um tipo de amizade no valor caracteristicamente grego profundamente enraizado no conceito de reciprocidade, pela troca de favores e apoio, com um senso íntimo de respeito um para o outro, tendo atitudes amigáveis e confiáveis de companheiro/parceiro.[12] É o oposto de hostil, odiador e inimigo (ἐχθρός ekhthrós/echthros), separado de xénos (ξένος estranho ou desconhecido).[13][14]
  • Storge (στοργή storgē): “afeição” do grego moderno. É usada para indicar a afeição natural como aquela que os pais sentem pela prole. É considerado o mais benéfico dos afetos. Acontece especialmente na família, entre seus membros. Normalmente é caracterizada como o amor dos pais aos filhos e outros membros do núcleo familiar. É o tipo de amor que nasce naturalmente, muitas vezes biologicamente e diferentemente de philia e eros, em que o amor aparece de formas circunstanciais. É um amor considerado “pronto”, do nascimento.[15]
  • Filautia (φιλαυτία philautía): "amor-próprio", sinônimo de egoísmo.[16][17] Se refere a uma atitude mental positiva e se engaja no autocuidado, autorreconhecimento e autovisibilidade (ou autoconsciência). Isto não é um senso de vaidade, mas uma consciência e aceitação de quem você realmente é, mostrando-se compaixão em tempos mais escuros. Os gregos dividiram ainda mais esse amor em positivo e negativo: um na versão doentia é o amor auto-obcecado e o outro é o conceito de autocompaixão.[18]
  • Xênia (ξενία xenía): "hospitalidade", a generosidade e cortesia mostradas aos que estão longe de casa e/ou associados da pessoa que oferece amizade aos hóspedes.[19] Os rituais de ceder hospitalidade criaram e expressaram uma relação recíproca entre hóspede e anfitrião, expressa tanto em benefícios materiais (como a doação de presentes a cada parte) quanto em imateriais (como proteção, abrigo, favores ou certos direitos normativos).
  • Pragma (πραγμα/τικότητα prágma/tikótita): "realidade", uma forma amadurecida e pragmática de amor,[20] tendo envelhecido como bom vinho com o tempo. É comumente visto em cônjuges que são casados há décadas, e é algo pelo qual todos inconsciente ou secretamente ansiamos — a companhia que olha além de nossas limitações, mas nos ama por nossa frágil humanidade. Um amor em que somos aceitos incondicionalmente e nunca nos afastaremos. É difícil encontrar e leva muito tempo e paciência para cultivar companheirismo.[21]
  • Mania (μανία manía): "transtorno mental" do qual o termo "maníaco" ou "mânico" é derivado. Um desejo de manter o parceiro em alta estima e querer amar e ser amado dessa maneira, vendo especialidade na interação. Esse tipo de amor tende a levar um parceiro a um tipo de loucura e obsessão. Na roda de cores, é representada pela cor púrpura, pois é uma mistura ou desequilíbrio entre ludus (λυδός, em latim: lūdus/ludós) e eros.[22] Isto é o que acontece quando o amor se torna assustador, e é a competência de stalkers (bisbilhoteiros) e ilusão. Aqueles que experimentam/vivenciam essa forma de amor também se tornam codependentes e podem ser autores de abuso de seus entes queridos.[23]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Liddell, Henry George; Scott, Robert. «A Greek-English Lexicon» [Léxico Grego-Inglês] (em inglês). Consultado em 10 de julho de 2018 
  2. «O Que Significa Amor Ágape, Philos e Eros». estiloadoracao.com. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  3. «"Ágape é uma palavra de origem grega que significa o amor divino, o amor de Deus pelos seus filhos e ainda o amor que as pessoas sentem umas pelas outras inspiradas por esse amor divino." | Minhas Frases». Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  4. «The 7+ Types Of Love You'll Probably Experience In This Life». Thought Catalog (em inglês). 9 de fevereiro de 2016. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  5. «3 Types of Love: Eros, Agape, and Philos». The Date Mix (em inglês). 6 de março de 2019. Consultado em 19 de junho de 2020 
  6. «These Are the 7 Types of Love». Psychology Today (em inglês). Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  7. Coelho, Paulo (5 de abril de 2013). «Love as Eros, Philos and Agape». Paulo Coelho (em inglês). Consultado em 19 de junho de 2020 
  8. «Tradução de φίλος no Dicionário Infopédia de Grego». Infopédia 
  9. «amigabilidade». Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. Consultado em 12 de dezembro de 2023 
  10. «Amabilidade». Michaelis On-Line. Consultado em 12 de dezembro de 2023 
  11. «Lectures Bureau | CLASSICAL GREEK LOVE: EROS, PHILOS, AND AGAPE (LOU MARINOFF)» (em inglês). Consultado em 19 de junho de 2020 
  12. Walcot, P. (1987). «Romantic Love and True Love: Greek Attitudes to Marriage». Ancient Society: 5–33. ISSN 0066-1619. Consultado em 12 de dezembro de 2023 
  13. Lowe, N. J. (2000). The classical plot and the invention of Western narrative. [S.l.]: Cambridge University Press. OCLC 42680495 
  14. Riva, Victor. A Virtude Da Castidade. [S.l.]: Clube de Autores (managed) 
  15. «Storge definition and meaning | Collins English Dictionary». www.collinsdictionary.com (em inglês). Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  16. «Philautia | Meaning of Philautia by Lexico». Lexico Dictionaries | English (em inglês). Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  17. «Henry George Liddell, Robert Scott, A Greek-English Lexicon, ἔρως». www.perseus.tufts.edu. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  18. «What Are The 7 Types of Love?». E-Counseling.com (em inglês). 19 de novembro de 2019. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  19. «The Odyssey: Be Our Guest with Xenia | Classical Wisdom Weekly». classicalwisdom.com. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  20. «The Ancient Greeks' 6 Words for Love (And Why Knowing Them Can Change Your Life)». Yes! Magazine (em inglês). Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  21. «Learn the Different Types of Love (and Better Understand Your Partner)». Lifehack (em inglês). 16 de novembro de 2018. Consultado em 7 de fevereiro de 2020 
  22. Lee, John Alan (1973). Colours of Love: An Exploration of the Ways of Loving (em inglês). [S.l.]: New Press 
  23. by (20 de maio de 2016). «8 Different Types of Love According to the Ancient Greeks ⋆ LonerWolf». LonerWolf (em inglês). Consultado em 7 de fevereiro de 2020