Usuário:DAR7/Testes/História do Brasil/Entradas e bandeiras

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Entradas e bandeiras designam genericamente os diversos tipos de expedições empreendidas à época do Brasil Colonial, com fins tão diversos quanto a simples exploração do território, a busca de riquezas minerais, a captura de indígenas, para escravizá-los, ou de africanos escravizados fugitivos, e o ataque e destruição de tribos ou populações tidas pelos assentamentos coloniais como hostis ou indesejadas. Comemora-se o Dia do Bandeirante no dia 14 de novembro, data em que, no ano de 1625, a povoação de Santana de Parnaíba, a 42 quilômetros da capital paulista, tinha sido elevada à categoria de vila.[1][2]

Os bandeirantes foram os corsários do interior. Andavam pelos atalhos, pelas terras médias e pelas baixas, carregados de muitas e poderosas armas, com seus sons de guerra e suas bandeiras tremulando. Foram grupos paramilitares que rasgavam a mata e caçavam homens — longe da lei e das fronteiras; abaixo da ética. No seu caminho, sobrava só restos de aldeias e vilas destruídas; idosos, mulheres e menores de idade eram mortos com espada; altares eram violados, havia morte, choro e fogo. Querendo possuir tudo para si, em nome do avanço civilizatório, tiraram a liberdade dos milhares de índios. Foram definidos como uma “raça de gigantes” por determinados historiógrafos do estado de São Paulo — e não sobram dúvidas de que eles foram sujeitos corajosos e rebeldes. São conhecidos como os mais importantes encarregados por expandir o território brasileiro, ou seja, alargar as fronteiras — e realmente o eram. Tal façanha ocorreu, por analogia, da mesma forma que a corrida do ouro na Califórnia em 1848. Apesar de terem sido heróis do Brasil, se transformaram também nos maiores estelionatários de sua época.[3]

Nas três décadas mais antigas do século XVII, mais de 500 mil indígenas foram mortos ou escravizados pelos bandeirantes e seus mamelucos, que destruíram cerca de cinquenta missões jesuíticas nas regiões do Guairá, do Itatins e do Tape. As leis e os monarcas portugueses e espanhóis foram desafiados pelos sertanistas. A blasfêmia dos homens, que utilizavam gibão feito de couro, foi contrária a Roma, e o papa os excomungou. Mesmo assim, as ameaças foram ignoradas pelos líderes das bandeiras e a força das armas os conteve. A capital dos bandeirantes, São Paulo, foi transformada em um dos maiores polos da escravidão indígena do continente inteiro. Mais: os sertanistas tinham feito dela uma cidade ilegal — reino de misantropia e pobreza. Era também o centro pelo qual o Brasil meridional pôde, afinal, se desenvolver, crescer e se tornar rico. Qual era o motivo de ser exatamente São Paulo? Qual a razão da cidade, que os jesuítas fundaram, se encontrar no centro, dos caminhos ao interior, qual a justificativa dos carijós litorâneos e guaranis paraguaios estarem perto e serem presa fácil e, sobretudo, qual a explicação do pretexto de São Paulo nascer subdesenvolvida. “Procurar a solução para o seu subdesenvolvimento” — dessa forma a desculpa, pela qual o povo paulista era impelido às durezas na procura de “peças”, era explicada pelos naturais de São Paulo.[3]

Na década de 1920, dois historiógrafos dedicados, Afonso Taunay e Alfredo Ellis Jr., começaram a fabricar o mito bandeirante. Uma saga de terrores foi relevada pelos documentos achados e publicados pelos historiadores. Mesmo assim, Taunay e Ellis Jr. pretenderam forjar a figura da galhardia e da altivez do bandeirante, da forma que esses caçadores de homens tivessem sido os “Três Mosqueteiros”. No entanto, conheciam que os bandeirantes, em sua grande quantidade, caminhavam sem botas, conversavam em português errado e se dedicavam à escravidão e à matança.[3]

Caçadores de homens[editar | editar código-fonte]

Apesar da coincidência do apogeu das bandeiras com o começo do século XVII e de seu prolongamento por esse período inteiro, a prisão de índios sempre pertenceu à história paulista, constituindo sua própria essência. Antes da fundação de São Vicente por Martim Afonso, em 1532, o local era chamado de “Porto dos Escravos”, porque o explorador João Ramalho e o enigmático Bacharel de Cananeia, o degredado que seria o mais antigo português que vivia no sul do Brasil, promoveram o tráfico negreiro.[4]

A caça de indígenas sertanejos, no entanto, só se tornou um grande negócio — o maior e quase o único a manter financeiramente as famílias piratininguenses — desde 1571, em função das iniciativas de Jerônimo Leitão, na época capitão-mor de São Vicente. Esse período inicial é chamado de “bandeirismo defensivo” por alguns eruditos, uma vez que ocorre durante o despovoamento dos vales do Tietê e do Paraíba pelos paulistas para “assegurar a segurança urbana”. Em 1591, com a vinda do sétimo governador-geral do Brasil, Francisco de Sousa, começa o ciclo denominado de “bandeirismo ofensivo”.[4]

As invasões no interior foram militarizadas por Sousa, que lhes deu caminhos fixos, organização rigorosa e até capelães e escrivães. Ao sair, em 1602, o governador ajudou a fundar milícias paramilitares através das quais o poder colonial foi desafiado brevemente. Durante a fundação das missões do Guairá, no oeste do estado do Paraná de hoje, pelos jesuítas espanhóis, os paulistas viram que seriam o alvo ideal para suas incursões. Enfim, da forma que foi colocada por Capistrano de Abreu, “por que se aventurar entre gente boçal e rara, falando línguas travadas e incompreensíveis, se perto demoravam aldeamentos numerosos, iniciados na arte da paz, afeitos ao jugo da autoridade?”.[4]

A escravidão de indígenas das “reduções” foi uma rigorosa ilegalidade. No entanto, morando na parte mais alta do planalto, distante do litoral brasileiro e das capitanias superdesenvolvidas de Pernambuco e da Bahia, os paulistas tinham adquirido uma mentalidade livre e revolucionária. Sentindo-se abandonados pela metrópole e sendo considerados a classe mais pobre da colônia, fundaram uma civilização própria baseada em ousadia e ganância que perturbavam a razão ou a serenidade do espírito. A própria lei de São Paulo, que tinha transformado as outras em letra-morta, foi forjada.[4]

Por cerca de um século, a maior parte da população de São Paulo (mais de 6 mil caucasianos em 1700) tinha se dedicado à caça de índios. O bandeirismo tinha se tornado uma atividade cuja técnica foi transferida de pai para filho — muitos moços partiam para o interior e as bandeiras, em sua grande quantidade, foram empresas familiares que uniram pais, filhos, tios, cunhados e genros. Apesar de sua promoção por caucasianos, as bandeiras não sobreviveriam no interior se não fossem as técnicas produzidas pelos índios. Verdadeiramente, eram mais parecidas com forças tupiniquins que patrulha da Europa: andavam em fila indiana, usavam canoas de tronco (as “ubás”), haviam sobrevivido à base de pinhões, mel e palmito (tornando quase extintas colmeias e palmiteiros no decorrer do percurso das picadas mais frequentadas). O contingente, em sua maioria, era formado de índios, escravos ou nem isso.[4]

As bandeiras se tornaram, dessa forma, uma conduta indesejável dos hábitos de guerra dos tupis-guaranis, cuja finalidade das lutas contínuas nada mais foi que a caça de certas vítimas para consumar o rito de antropofagia. Uma característica psicológica, que perturbava as bandeiras, está relacionada aos mamelucos (denominação que veio dos recrutas de uma tropa turco-egípcia composta por escravos): descendentes de pais caucasianos e de mães índias, eles haviam atacado os indígenas com raiva redobrada.[4]

A máquina da escravidão, que os bandeirantes aperfeiçoaram, iniciou a operação em grande escala desde agosto de 1627, durante a partida de Manuel Preto e Raposo Tavares a caminho do Guairá. Com sua milícia de dois mil indígenas (duvidosamente temiminós), novecentos mamelucos e 69 paulistas, Raposo, de pouca idade, e Preto, com mais de setenta anos, vieram para a beira do rio Tibagi em 8 de setembro. No começo, agiram cuidadosamente, porque, apesar de seu costume de captura de índios na região, eles assim atacariam, pela primeira vez, uma missão jesuítica.[4]

Uma desculpa inválida foi a senha para invadir San Antonio, em 30 de janeiro de 1629. Aí, escravizaram-se dois mil indígenas. No mês de março, San Miguel e Jesús Maria foram invadidas. Em maio, durante o retorno da bandeira para São Paulo, nove missões foram reduzidas a cinza. Os ataques eram totalmente iguais à invasão de San Francisco Xavier, no Tape, em 1637. Ali, após tacarem fogo na igreja, os bandeirantes esperaram do lado de fora. Durante a tentativa de fuga dos indígenas por uma fenda “à maneira de rebanho ovino que parte do curral”, “as cabeças lhe eram derribadas, braços eram truncados, pernas eram desjarretadas e corpos eram atravessados, com espadas, machetes e alfanjes” pelos paulistas. Eles provavam os fios de seus alfanjes para partir meninos em ambas as partes, rachar-lhes as cabeças e fazer-lhes os membros em pedaços.[4]

Horrores a mais como “matança de doentes, idosos, deficientes físicos e menores de idade que não deixavam os familiares viajarem” eram incluídos pela longa jornada para a vila de São Paulo. Também com muita frieza que não pareciam “seguidores do cristianismo, assassinando pessoas com idade inferior a 15 anos e indivíduos com mais de 60 janeiros, alimentando seus cães com a carne das vítimas”, contavam dois padres jesuítas de Espanha, que seguiam a caminhada. Os cativos andavam presos a espessas correntes que mediam quatro metros, cada uma com trinta colares. Ao lado do chumbo e da pólvora, aquele era o artigo de preço mais elevado que a expedição dispendia. Geralmente, o “armador”, pelo qual a bandeira era financiada, pagava.[4]

Chegando a São Paulo, os indígenas eram divididos entre os bandeirantes e seus especialistas em finanças. Ao invés do que diz a história oficial, alguns cativos eram mandados ao nordeste do Brasil. A maior parte permanecia em São Paulo — Preto ficou com mil escravos em sua propriedade na Freguesia de Nossa Senhora do Ó. No que eram utilizados esses homens? Na transportação de “farinhas e comidas ao porto de Santos e assim com esse trabalho em que se servem deles como de cavalos, se morrem infinitos”. A ração de escravos era constituída de uma espiga de milho oferecida diariamente. No que diz respeito às mulheres de “de boa aparência, casadas, solteiras ou gentis, o dono encerra-nas consigo em um aposento, com quem passa as noites à maneira que um bode em um curral de cabras”.[4]

Esse estado de coisas foi revertido de maneira parcial durante a autorização dada aos espanhóis para armar os indígenas das missões. No ano de 1638, a bandeira de Leite seria vencida em Caazapa-Guaçu. A grande glória, no entanto, chegaria três anos depois, em 11 de março de 1641, durante o desbaratamento da bandeira de Jerônimo de Barros, constituída por 130 canoas com 300 paulistas e 600 tupis, por três mil guaranis. Estes índios liderados pelo cacique Ignacio Abiaru, com a supervisão dos clérigos Pedro Romero e Pedro de Mola e sob o auxílio de canhões de bambu. Ao final de cerca de dez horas de batalha feroz em água e terra, os invasores, em sua grande parte, se encontravam mortos. Os sobreviventes penetraram na floresta, em que a fome e os problemas de saúde dizimavam-los.[4]

O fim de uma era foi marcado pelo “desastre” de M’bororé. O ciclo da “caça ao ouro” substituiria de maneira gradual o da captura ao índio. A peripécia acrescentou diversos milhões de quilômetros quadrados para o Brasil. Seu custo pode ser calculado em meio milhão de mortes.[4]

As bandeiras e reduções destroçadas[editar | editar código-fonte]

As bandeiras[4]
Qual é a origem da denominação? Qual era a sua formação? Quais armas eram usadas? Como se vestiam? Quanto durava o ritmo de marcha? O que eles comiam? O que eram entradas? O que significavam armações? Quantos nativos foram escravizados? Quanto custavam as peças?
De acordo com o historiógrafo Capistrano de Abreu, nasceria do hábito tupiniquim de erguer uma bandeira em sinal militar. Um capitão-mor tinha o poder de vida e morte sobre os que por ele eram comandados, vinte a sessenta caucasianos, vinte a quarenta mamelucos e certos milhares de índios — às vezes até 5 mil —, dentre domésticos e cativos. As armas usadas pelos indígenas e mamelucos eram arco e flecha. Os caucasianos utilizavam mosquetes, pistolas e facas. Indígenas e mamelucos andavam pelados ou de tanga. Os caucasianos marchavam sem calçados, de chapéu, calças compridas e “gibão-de-couro de anta”, um colete forrado com colcha. Entre dez e doze quilômetros diários. O tempo de duração das jornadas podia ser entre seis meses e três anos. Eles se alimentavam de farinha, mel, palmito, caça e pesca. Foram expedições oficiais que exploravam o interior. Representavam as bandeiras que um investidor chamado de armador financiava e dificilmente se dirigia ao interior. 356 720 “peças” eram escravizadas em 150 janeiros, de acordo com Alfredo Ellis Jr. No ano de 1628, as “peças” valiam 20 mil-reis ou um quinto do de um negro.

De 1610 até 1750 — uma grande rede de missões foi estabelecida pelos jesuítas — em sua maior parte, espanhóis —, na região que compreende os rios Paraná, Uruguai, Iguaçu e Paranapanema. Elas se tornariam uma espécie de curral escravagista para as bandeiras de São Paulo.[4]

  • Guairá: a “florida cristandade”, constituída por treze missões, fundadas por Ruiz de Montoya desde 1610. Localizavam-se no estado do Paraná de hoje, sendo alcançados com facilidade desde São Paulo (entre 40 e 60 dias de caminhada). Começou a ser destruída em 1628, continuando assim com as expedições dos anos de 1629, 30, 31 e 32. Escravizaram-se cerca de mil indígenas.[4]
  • Tape: As dezoito missões, em sua maior parte, foram trabalhos do jesuíta Roque Gonzalez. Construídas no Rio Grande do Sul de hoje, foram destroçadas desde 1636, por iniciativa dos bandeirantes Raposo Tavares e Fernão Dias. Mais de 60 mil guaranis foram conduzidos a São Paulo.[4]
  • Itatins, as treze missões, situadas na beira leste do Paraguai, no atual Mato Grosso do Sul, foram construídas em 1631, “com impiedade e crueldade nunca ouvidas”, cinco reduções foram destroçadas e as outras, deixadas em abandono. Quinze novos escravos foram rendidos aos bandeirantes pelo ataque.[4]
  • Paraná-Uruguai: as missões mais importantes, também denominadas de Trinta Povos Guaranis. Construídas em diversos anos depois que o Guairá foi devastado, na região entre os rios Uruguai e Paraná, floresceram pacificamente, desde 1670, até serem abandonadas de maneira brusca com os jesuítas expulsos, em 1759. Na mesma proporção em que nada restou das mais antigas missões, dos Trinta Povos sobram atualmente ruínas monumentais.[4]

Volteios e vertigens de Raposo Tavares[editar | editar código-fonte]

Antônio Raposo Tavares era o sertanista mais importante. Ao redor dele, são lembrados muitos debates e especulações que sempre caracterizariam a biografia e o trabalho de cada bandeirante paulista. Embora ocupasse os cargos públicos de mais alto escalão de sua capitania, Raposo Tavares viveu grande parte de sua história pessoal de maneira ilegal, ao driblar mandados de prisão. Dizia que era adepto do cristianismo, no entanto, se excomungou. Era preconceituoso contra os indígenas, apesar de dever seus conhecimentos sertanejos a eles. Era ele quem mais caçava escravos em sua época, no entanto, nem sequer possuía cerca de 110 cativos — ao mesmo tempo, em que demais sertanistas reuniam por volta de mil. Conhecido como o soldado mais audacioso, não teve sucesso na única guerra convencional na qual foi participante: a luta contrária aos holandeses, no nordeste do Brasil. Alargou as fronteiras internacionais brasileiras e serviu dedicadamente ao Reino de Portugal, embora morresse em virtual abandono, duvidosamente até sem ou com pouquíssimo dinheiro em sua fazenda próxima a São Paulo. No decorrer da época em que passou a ser considerado sexagenário, ou seja, atingiu a terceira idade, viveu tudo o que se poderia esperar de um bandeirante.[5]

Nasceu no Alentejo, em Portugal, no ano de 1598, veio para o Brasil com 20 anos, acompanhado do genitor, Fernão Vieira, que, apesar de ser suspeito de “fugir do reino com o dinheiro do rei”, tomou posse do governo da capitania de São Vicente, pelo donatário, conde de Monsanto. Pela vida inteira, Raposo também era fiel vassalo de Monsanto. Certos historiógrafos afirmam que as missões do Guairá e do Tape foram destruídas por ele, que julgou que se encontraria dentro da região que faria parte do donatário.[5]

No ano de 1627, a primeira bandeira contrária ao Guairá foi organizada por Raposo Tavares. Para os jesuítas, disse agir dessa forma porque precisava repeli-los “de uma terra que é de nós (Portugal), não de Espanha”. Voltando para São Paulo, foi nomeado juiz ordinário da vila de São Paulo e ouvidor da capitania de São Vicente por Monsanto.[5]

Em 1633, entretanto, Raposo Tavares tinha abusado de seus poderes e, invadindo a propriedade dos jesuítas de Portugal em Barueri, na periferia de São Paulo, percebeu que seu mandato foi cassado. No ano de 1635, o cargo lhe foi restituído pelo recurso, todavia, o acusado não estava interessado: estava preparando para invadir o Tape, no Rio Grande do Sul. Em 1639, durante o oferecimento do perdão pelo governo aos bandeirantes que guerreassem contra os holandeses, Raposo tinha se alistado e foi para o nordeste do Brasil. Ali, participaria da derrota, que os batavos impuseram à armada do conde da Torre, então governador-geral do Brasil. Com cerca de mil homens, Raposo participou, na época, na enorme marcha dos derrotados, a pé entre o cabo de São Roque, no Rio Grande do Norte, e a Bahia, 2 700 km num período de quatro meses.[5]

Não há coisa que pode ser mais comparável à última e grandiosa aventura do maior bandeirante: no final de 1648, com 1 142 homens — caucasianos, mamelucos e indígenas —, Raposo Tavares saiu para São Paulo para atacar a região do Itatins. Apesar da destruição das duas missões, a empresa não deixou de fracassar. Em abril de 1649, contudo, ao invés de organizar o retorno, Raposo andou a caminho do desconhecido. No mês de fevereiro de 1651, 58 homens que, segundo uma mensagem, que o padre Antônio Vieira escreveu, “pareciam mais desenterrados que vivos”, vieram para o forte de Gurupá, perto de Belém, no Pará. Em dois anos, fizeram um “enorme rodeio” por terras que antes tinham sido percorridas nunca: a partir do Itatins (atual Mato Grosso do Sul), a tropa tivera chegado aos arredores dos Andes, na Bolívia. Também naquele tempo, ao descer os rios Mamoré, Madeira e Guaporé, acompanharam o Amazonas em direção a Belém. No final do mesmo ano, familiares e amigos nem mesmo poderiam reconhecer Raposo Tavares, que chegou em São Paulo naquela época, porque o bandeirante se encontrava bastante desfigurado.[5]

O conquistador abandonado e o governador das esmeraldas[editar | editar código-fonte]

Entre a cansativa volta a São Paulo, em 1651, e a morte solitária no ano de 1658, a denominação de Raposo Tavares desapareceu virtualmente dos registros oficiais da vila de São Paulo — indicação clara de que o “ex-chefe das bandeiras” tivera se tornado uma pessoa sem credibilidade. A situação ficou secularmente obscura: antes das décadas mais antigas do século XX, praticamente não havia nada que se tivesse falado a respeito do bandeirante mais temerário. Apenas com os trabalhos realizados pelos historiadores chamados de Basílio da Gama, em 1917, e de Afonso Taunay em 1926, é que os feitos de Antônio Raposo Tavares tinham entrado nos livros de história. Da grande viagem de 1648, entretanto, ainda não se sabe muito. Apesar de sua descrição numa mensagem do jesuíta Antônio Vieira, seu roteiro, ainda, no momento atual, é incoerente. De maneira apropriada, Raposo Tavares não tinha virado nome de rua: foi homenageado por uma denominação de rodovia.[5]

Apesar de ter sido assunto duma peça de teatro e de uma conhecida poesia de Olavo Bilac, a denominação de Fernão Dias, da mesma forma como do amigo Raposo Tavares, continuou obscura por quase dois séculos depois que ele morreu ingloriamente no interior. Não obstante, Pedro Taques, o primeiro historiógrafo paulista, ser seu sobrinho-neto, no livro sobre a história pessoal de Fernão Dias sobraram várias lacunas. Nem sequer se sabe certamente o local e a data de nascimento (apesar de São Paulo e o ano de 1608 serem onde e quando provavelmente ele nasceu). Contudo, muito se sabe como ele morreu. Derrotado pela malária, seu corpo tinha sido “embalsamado”, à maneira dos bandeirantes: sobre o túmulo de dois palmos do solo, foram acesas fogueiras ardendo em vinte dias. Na época, o filho trouxe os ossos para São Paulo — não sem antes afundarem em um naufrágio no rio das Velhas. Sepultados no mosteiro de São Bento, foram exumados e descobertos novamente em 1922.[5]

Fernão Dias e a miragem final[editar | editar código-fonte]

As rápidas viagens dos espanhóis à procura do Eldorado foram reprisadas, em terras do Brasil, pela viagem de Fernão Dias a caminho da miragem da serra de Sabarabuçu. No decorrer dos sete anos em que continuou no interior em busca de esmeraldas que não se encontravam lá, tinha se defrontado com todas as turbulências: desnutrição, epidemia, traição, matança, delações, pobreza e pais matando filhos. O único destino concedido foi permitir que, morrendo, em um delírio febril, estivesse certo de que as turmalinas foram esmeraldas que arrancara do solo.[6]

No ano de 1672, durante sua conclamação pelo monarca português para auxiliar na captura das pedras esverdeadas. Fernão Dias era um dos bandeirantes paulistas mais bem-sucedidos e experientes — e um dos mais discriminadamente velhos. Aos 64 janeiros, já tivera participado entre as “quedas de água” e as missões do Tape, em solo gaúcho, já atacara o Itatins, em território sul-mato-grossense e capturara índios por toda a periferia de São Paulo. De uma única vez tinha trazido, de Apucarana, no Paraná, 5 mil guaianás escravizados. Tinha duas grandes propriedades, a primeira em Parnaíba, no estado paulista e a segunda em Pinheiros (atual bairro paulistano), onde o trigo, comprado pelo governo para dar comida às tropas que lutavam contra os holandeses na região Nordeste do Brasil, era plantado pelos escravos. Nasceu dos “clãs vicentinos mais antigos” e era descendente de pioneiros famosos. Fernão Dias foi um dos mais endinheirados e ilustres paulistas do século XVI. Também um dos que eram mais conhecidos pela sua “piedade”: os clérigos elogiavam incansavelmente porque ele ergueu, por conta própria, o mosteiro de São Bento.[6]

Em 1647, no entanto, tudo foi largado por Fernão Dias — a esposa doente, seis filhas, as propriedades —, sua prata, seu ouro e seu gado foram vendidos. Fernão Dias saiu à procura das “escondidas pedras esverdeadas” Possuía 66 janeiros.[6]

A lenda de Sabarabuçu: a serra brilhante, há muito tempo pertencia à geografia folclórica que, desde sempre, tivera assombrado os colonizadores portugueses e de onde brotavam muitas novidades fabulosas a respeito de ricos tesouros escondidos no interior. Foi em busca das montanhas que, informado “pelos dados dos antigos” o Fernão Dias partiu de São Paulo, em 21 de julho de 1674. Saiu com quarenta pessoas de São Paulo e duzentos indígenas. Foi uma viagem problemática.[6]

Por sete anos, a bandeira viajou através do rio Jequitinhonha e do das Velhas. Os meses haviam passado, as pedras não haviam aparecido, o descontentamento aumentava. Repleto de dívidas com os comerciantes paulistas e parnaibanos, Fernão deixou sua família na pobreza — exigiu que fossem vendidas até “as joias que adornavam suas mesmas filhas”. Durante o começo das deserções, o velho bandeirante tinha reunido os restantes da tropa, anunciando que “prosseguiria a viagem até a morte e que em seu testamento precisava deixar ordem para o filho que, sob castigo de sua maldição, continuasse buscando, mesmo que fosse somente com os seus indígenas e que não tivessem trazido nem sequer enviassem seus ossos para enterrar no povoado, não que primeiramente fossem descobertas as esmeraldas”. Durante a estouro de um motim e quando Fernão Dias tomou conhecimento de que seu líder foi José Dias Pais, seu filho bastardo, mandou enforcar o moço mameluco, para espantar e aterrorizar o arraial inteiro.[6]

Em abril de 1681, pedras esverdeadas surgiram da lagoa do Vupabuçu. Aos 73 janeiros, o velho bandeirante se sentiu aliviado. Enviou 147 pedras para examinação na vila de São Paulo. No mês de maio, vencido pela malária, Fernão Dias morreu no interior do rio das Velhas, sem que soubesse que só encontrara turmalinas.[6]

O crime sem castigo de Borba Gato e a Guerra dos Bárbaros[editar | editar código-fonte]

O caso do bandeirante Manuel Borba Gato, cujo sogro foi Fernão Dias, “tenente general do mato” é exemplar do ambíguo relacionamento legal do governo da colônia com os bandeirantes de São Paulo. No ano de 1681, logo depois que o sogro morreu ingloriamente, Borba Gato ficou na região do rio das Velhas, no sudeste mineiro, tendo sido disposto para continuar buscando por ouro e esmeraldas. Foi naquela época que, tendo sido atraído pelo rumor dos pretensos descobrimentos de Fernão Dias, veio para essa região ninguém menos que dom Rodrigo Castelo Branco, nobre originário de Espanha que recentemente assumia o cargo de administrador geral das minas (apesar de certa mina ser descoberta naquela época).[7]

Em defesa dos interesses familiares, um relacionamento tenso com Castelo Branco foi estabelecido de imediato por Borba Gato. Durante a explosão final do confronto entre os dois, em 28 de agosto de 1682, um “empurrão” teria sido dado no fiscal do monarca pelo bandeirante “arrebatado de fúria”, que o jogou da parte mais elevada de um buraco “na profundidade do qual caiu morrendo”. Isso aconteceu segundo o relato do historiógrafo paulista Pedro Taques (escrito em 1713), por isso, mais de 30 janeiros depois de acontecer tudo aquilo. Ao escrever muito tempo depois, no ano de 1834, o historiador natural da Bahia, Baltazar da Silva Lisboa, amenizou a versão escrita por Taques, dizendo que os criados da pessoa de Manuel da Borba Gato, que morava no rio das Velhas, mataram dom Rodrigo.[7]

De qualquer maneira, não sobram dúvidas de que o genro de Fernão Dias se envolveu nesse crime de lesa-majestade. Não existe outra razão de seu refúgio nos sertões inexplorados do rio Doce, no sudeste mineiro, e de viver foragido naquele lugar por quase duas décadas. Realmente, segundo o relato de um tal de Bento Furtado, Borba Gato foi ao coração do “Reino dos Mapaxós” e ali, por mais de quinze anos, “morou de maneira bárbara, sem nenhum concurso de sacramento, nem contato com mais pessoas desse mundo”. Além disso, existia o agrupamento de índios “que foram domesticados para que ele sobrevivesse, morando entre eles, considerado como um cacique”. Estudos mais atualizados têm sugerido que “mapaxós” foram os indígenas atualmente chamados de botocudos (cujo território da tribo, na verdade, se espraiava através dos arredores do rio Doce), mas que Borba Gato não permaneceria por muito tempo sem comunicação com a civilização. Isso porque, já no ano de 1689, seria o mais importante responsável por descobrir o ouro e por fundar o arraial de Barra das Velhas, na beira do rio São Francisco.[7]

De qualquer modo, foi somente no verão de 1697 (quinze anos depois que Rodrigo Castelo Branco morreu) que Borba Gato retornou a São Paulo, cidade onde nasceu. Se encontrou com o governador Arthur de Sá e Meneses, preparado para revelar a situação geográfica das minas de ouro que tivera descoberto na periferia da hoje cidade de Sabará, em Minas Gerais. A troco desse segredo, o governador não só resolveu concedê-lo o perdão como, através de provisão promulgada em 6 de março de 1700, o tinha promovido a guarda mor da região das minas.[7]

Dois anos depois, no dia 9 de julho de 1702, Borba Gato foi nomeado superintendente-geral das minas do rio das Velhas (de modo irônico, parecido com o que Castelo Branco ocupava). O perdão e as promoções foram justificadas ao suposto estelionatário pelo Reino de Portugal e pelo governador Sá e Meneses — considerado um dos políticos mais corruptos de sua época —, que disse que Borba Gato não matou Rodrigo Castelo, mas que este sucumbiu “numa emboscada, levando três balas disparadas por estranhos”.[7]

Em torno do século XVIII, alguns historiógrafos começaram a construir uma imagem intrépida ao redor de Borba Gato, o qual, mais que todo o bandeirante, teria simbolizado o caráter audaz, atrevido e independente dos paulistas. Essa tese pode ser justificada por alguns dados concretos. De qualquer forma, desde 1962, Borba Gato passaria a se transformar em um dos bandeirantes mais famosos do enorme público, especialmente em função de uma controversa estátua, coberta por ladrilhos, construída em uma das mais importantes avenidas paulistanas. Criada pelo escultor Júlio Guerra, o trabalho “grande e bizarro” é considerada por alguns pesquisadores como um “monstrumento ao kitsch”.[7]

No mês de novembro de 1688, na época em que seu exército já havia estado perto dos Palmares — após a terrível marcha de 2 mil km, que tinha matado 196 indivíduos de fome —, Domingos Jorge Velho tinha recebido ordens do governador-geral Matias da Cunha para “que torcesse o caminho”. Tinha que ir apressadamente para o Rio Grande do Norte para lutar contra a revolta da aldeia dos janduís. Em combate contrário ao expansionismo das propriedades, os janduís mataram cerca de 100 colonizadores e mais de trinta mil cabeças de gado. Iniciava-se a Guerra dos Bárbaros ou Confederação dos Cariris (uma vez que a ela se uniram os paiacus, os caripus, os icós, os caratiús e os cariris) — uma das mais tenebrosas guerras da história do Brasil e uma das menos pesquisadas. Velho, o qual já tivera exterminado os xucurus, calabaças, os chamados de pimenteiras e os coremas, foi para a luta. Também não os prendeu: no ano de 1688, Matias da Cunha que lhe havia concedido “todas as vitórias de matança dos bárbaros”. Mesmo assim, ele não foi capaz de acabar com o conflito, cuja duração foi até o ano de 1713. É que Jorge Velho, possuía outra missão: assassinato de Zumbi.[7]

Anhanguera, o Diabo Velho[editar | editar código-fonte]

É um dos acontecimentos mais folclóricos do passado das entradas e bandeiras de São Paulo, que só se compara com o retorno de Raposo Tavares a São Paulo, quando não havia ninguém que tivesse capacidade de reconhecê-lo, ou com um delírio febril antecedendo a morte de Fernão Dias. O episódio ocorreu no ano de 1682, em Goiás, e, reza a lenda, que seria assassinado um homem chamado Bartolomeu Bueno da Silva, bandeirante de terceira geração, partindo do então povoado de Santana de Parnaíba (São Paulo) para a captura de índios nos longínquos sertões do rio Araguaia. Próximo ao rio Vermelho (no hoje Mato Grosso), veio para uma aldeia pertencente à tribo dos goiases — considerados um dos mais pacíficos agrupamentos dessa região. Reparando que o ornamento das mulheres era feito com peças de ouro, quis saber qual era o local de procedência do minério. No entanto, sem a resposta dos índios, o bandeirante atearia fogo numa aguardente que fora depositada em uma cabaça — e, depois, ameaçou fazer a mesma coisa com quaisquer dos rios e lagoas daquela região, porque não lhe fora revelado o segredo. Bartolomeu Bueno da Silva foi apelidado de Anhanguera — o Diabo Velho (ou Espírito do Mal, de acordo com demais autores) pelos goiases, que estavam apavorados com o comportamento do sertanista.[8]

Nunca se comprovou plenamente a lenda, e existem estudiosos que pretendem atribuir o porquê do apelido para a tribo dos Inhanguera, índios tocantinenses que Bartolomeu Bueno teria escravizado. De qualquer maneira, ainda que Bueno não tenha aplicado o golpe de “atear fogo na água”, parece que não há dúvida de que, anos antes, um tal de Bento Pires, um dos que descobriram o ouro nas Gerais e uma das primeiras mortes da Guerra dos Emboabas, utilizou o truque, em Minas.[8]

Apesar de o caso da aguardente tornar Anhanguera em um dos bandeirantes mais ilustres, seu filho do mesmo nome, chamado de o segundo Anhanguera, foi um personagem bem mais atuante e decisivo no passado das entradas e bandeiras. Aos 15 janeiros, ele já tinha estado no interior acompanhado do pai — e, caso o teatro do incêndio na água ocorresse, o moço “Diabo Velho” o presenciaria. Nessa expedição, no entanto, os de sobrenome Bueno, mais que minérios, se interessaram no “ouro vermelho” (“seu propósito foi caçar indígenas e tirar isso de suas veias que sempre era a legítima mina dessas províncias”, escreveu Antônio Vieira em 1656, ao se referir às essas expedições).[8]

Anos depois, depois que o pai morreu, em torno de 1716, o segundo Anhanguera retornou ao interior à procura de ouro e tinha se tornado o primeiro minerador e descobridor de Goiás — fundando a cidade homônima. Apesar de achar minério e requerer “direito de passagem” sobre quaisquer dos rios que levavam para a região, o segundo Anhanguera não somente morreu pobre como nunca tinha encontrado a serra dos Martírios. A frase “pedernais de cristais que, por trabalho da natureza, possuíram uma das similaridades da coroa, da lança e dos cravos do amor de Cristo” foi uma miragem a qual o moço Anhanguera jurava que tinha visto quando andou com o pai. Como Sabarabuçu, essa ilusão tinha se tornado uma das loucuras, cuja procura tinha arruinado várias vidas e riquezas.[8]

O bárbaro Domingos Jorge Velho[editar | editar código-fonte]

Era um breve encontro, no entanto, suficiente para o bispo de Pernambuco, Francisco de Lima, concluir: “Trata-se de um dos maiores selvagens com quem tenho topado”, tinha dito ele. Estava fazendo referência ao bandeirante Domingos Jorge Velho — um dos mais ilustres sertanistas de sua época. Um intérprete acompanhou a conversa entre os dois, iniciada em março de 1687: Domingos Jorge Velho, na prática, não conversava em português; demonstrava fluência somente em tupi, a “língua geral”.[9]

Essa foi uma das poucas ocasiões em que Velho iniciava uma conversa com a civilização: habituado às distâncias do interior, se encontrava na cidade para fazer negócios. Contratado pelo poder executivo para acabar com o quilombo dos Palmares, combinou qual teria sido sua parte no roubo. Assinou-se um contrato no dia 3 de março de 1687, confirmado em 3 de dezembro de 1691 e ratificado por carta régia de 7 de abril de 1693. Só se iniciou a campanha no começo de 1694, e o conflito contrário aos negros durou quase um ano. Era “a mais difícil, gananciosa, cobiçosa e desprotegida que até hoje ocorreu no dito interior”, como diria o mesmo Jorge Velho. Apesar da devastação do quilombo e da decapitação de Zumbi, o Conselho Ultramarino teria dito que “os homens de São Paulo são piores que os próprios negros dos Palmares”. O governador Melo e Castro tinha concordado: “é muita barbárie dessa gente, que se sustenta com o que rouba”.[9]

Não há argumento para dizer que o governador Melo e Castro exagerou. Jorge Velho, que nasceu em São Paulo no ano de 1644, foi senhor de grandes latifúndios no interior do Piauí e do rio São Francisco, roubados à força. O sertanista tinha um exército privado: cerca de mil indígenas oruazes, tabajaras e copinharaéns munidos com arco e flecha, e duzentos carregados de espingardas. Com eles, não só conquistou a região inteira e derrotou os Palmares como participaria decisivamente na violenta Guerra dos Bárbaros.[9]

Não se tem conhecimento de como foram as fisionomias de Domingos Jorge Velho, da mesma forma que não se sabe como era a face de Raposo Tavares, de Fernão Dias nem sequer de Anhanguera. Visto na pintura a óleo, feita por Benedito Calixto, o quadro é um exemplo: criado na década de 1930, pertenceu à série de pinturas encomendadas por Afonso Taunay, que dirigia o Museu Paulista, para garantir que a casa fosse “ornamentada”. O braço pictórico da invenção do mito bandeirante era constituído por tais pinturas. Na verdade, os corsários do interior não eram parecidos nem um pouco com os Três Mosqueteiros. Mesmo assim, basta visitar o mesmo Museu Paulista para deixar claro o papel destes bravos homens que expandiram o território brasileiro: na “escada monumental”, mais precisamente no corredor de entrada, seis estátuas simbolizam seis bandeirantes e os seis estados que tinham conquistado. São eles: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.[9]

As monções[editar | editar código-fonte]

Mais que uma versão fluvial das jornadas bandeirantes, as monções eram um desdobramento — de algum modo uma evolução — do expansionismo sertanista. Suas mais importantes características e particularidades mais curiosas, estão abreviadas a seguir:[10]

As monções
Pergunta[10] Resposta[10]
O que foram? As monções foram enormes caravanas nos rios que saíam do povoado de Araritaguaba — atualmente denominado Porto Feliz —, na beira sudeste do rio Tietê, a 155 km de São Paulo e, por uma via fluvial “de cerca de mil léguas de comprimento”, foram em direção a Cuiabá (MT).
Porque recebeu esse nome? Termo que vem do árabe mauasin (“ocasião do ano em que acontece alguma coisa”). Dentre os marinheiros portugueses, começou a chamar as estações com ventos favoráveis para as grandes navegações marítimas.
Como era o itinerário? No começo, as monções não se faziam com itinerário fixo nem com data determinada. Desde 1720, as canoas acompanhavam o rio Tietê em direção à sua desembocadura, corriam o Paraná até a foz do Pardo, percorriam o mesmo até o Anhanduí, o qual as conduzia até o Miranda, tributário do Paraguai. O rio Paraguai levava o comboio em direção às minas de Cuiabá, por intermédio de dois tributários: São Lourenço e Cuiabá. Desde 1795, foi descoberto pelos irmãos Lourenço e João Leme que foi melhor que eles continuassem a subir o Pardo e, nas imediações do ribeirão denominado de Sanguessuga, conduzir as cargas e canoas por via terrestre, por uma distância de 15 km, e acompanhar através dos rios Coxim e Taquari. Nesse varadouro foi fundado um pouso chamado de Camapuã, onde os viajantes dormiam e reabasteciam-se as canoas, até viajar mais 1 000 km. Percorriam-se ao todo 3 664 km.
Como se originou o movimento? O ouro foi descoberto em Bom Jesus de Cuiabá (MT), em outubro de 1722, pelo bandeirante Miguel Sutil, e isso causou uma corrida para as novas minas. Se dizia que, lá, o ouro se encontrava à flor da terra, o que era verdade.
Quanto durava a jornada? Quando iam, com canoas cheias e correntes contrárias, a duração da viagem era de cinco meses — a mesma coisa que entre Lisboa e a Índia. Quando voltavam, mais de dois meses — a mesma coisa que entre a cidade de Salvador, capital da Bahia, até Portugal.
Quando ocorria a partida? A época de partida era de março até abril, durante a cheia dos rios.
Os comboios eram grandes ou pequenos? Toda expedição possuía de 300 a 400 canoas. Geralmente, saía um só comboio anualmente, com até três mil pessoas.
Como eram as canoas? As denominadas “ubás”, eram fabricadas à moda dos índios, escavadas em um tronco feito de árvore (peroba ou timbaúva). Possuíam em média entre 12 e 13 metros de comprido e 1,5 m de largo, apesar de haver alguma com 17,5 e 2,8 m de altura. Conduziam até 4 t de carga e trinta pessoas. Cargas são revestidas por lona e os indivíduos com mosquiteiro.
Como era a tripulação? Era composta por um piloto, um proeiro e seis remeiros (continuamente em pé). O proeiro foi a imagem principal; possuía a chave do caixão onde se guardavam carnes temperadas com sal e definia o ritmo dos remos.
O que se comia? Os bandeirantes comiam um kg de farinha, ½ de feijão e 100 g de toucinho diariamente por pessoa.
Quais eram os principais problemas? Além das 113 quedas de águas, cachoeiras ou saltos, as expedições precisavam encarar os caiapós da beira do rio Paraná, os guaicurus, os quais foram cavaleiros audazes, e os tenebrosos paiaguás, importantes canoeiros, os quais foram chamados de “piratas do Paraguai”.
Quais eram as ameaças folclóricas? As pítons, as canoas-fantasmas dos monçoneiros que morreram e as iaras eram os perigos lendários.
Quais eram as consequências? A capitania de Mato Grosso começou a ser povoada e 25 t de ouro foram extraídas. A última monção saiu no ano de 1838.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Generalidades[editar | editar código-fonte]

Bandeirantes[editar | editar código-fonte]

História das unidades federativas do Brasil[editar | editar código-fonte]

Representações culturais[editar | editar código-fonte]

Notas

Referências

  1. Prefeitura de Santana de Parnaíba. «Cidade». Consultado em 22 de março de 2019 
  2. FERNANDES, Cláudio. “14 de novembro — Dia do Bandeirante”; Brasil Escola. Disponível em <https://brasilescola.uol.com.br/datas-comemorativas/dia-do-bandeirante.htm>. Acessado em 22 de março de 2019.
  3. a b c Bueno 2003, p. 58–59
  4. a b c d e f g h i j k l m n o p q r Bueno 2003, pp. 60–63
  5. a b c d e f g Bueno 2003, pp. 63–64
  6. a b c d e f Bueno 2003, pp. 64–66
  7. a b c d e f g Bueno 2003, pp. 66–67
  8. a b c d Bueno 2003, p. 68
  9. a b c d Bueno 2003, p. 69
  10. a b c Bueno 2003, pp. 70–71

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Bueno, Eduardo (1997). História do Brasil: os 500 anos do país em uma obra completa, ilustrada e atualizada. São Paulo: Folha de São Paulo 
  • Bueno, Eduardo (2003). Brasil, uma história: a incrível saga de um país. 2ª ed. São Paulo: Ática 
  • Bueno, Eduardo (2012). Brasil, uma história: cinco séculos de um país em construção. Rio de Janeiro: Leya 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

  • «Museu Paulista». Website oficial da instituição cultural. Consultado em 22 de março de 2019 

[[Categoria:Colonização do Brasil]] [[Categoria:Século XVI no Brasil]] [[Categoria:Século XVII no Brasil]]