Brit milá
Brit milá (em hebraico: ברית מילה, literalmente "aliança da circuncisão"), chamado também de bris milo (na pronúncia asquenazi), ou apenas bris, é a cerimônia religiosa dentro do judaísmo na qual o prepúcio dos recém-nascidos é cortado ao oitavo dia como símbolo da aliança entre Deus e o povo de Israel.[1][2] Também é nesta cerimônia que o menino recebe seu nome aos olhos da comunidade;[1][2] cerimônia que costuma ser festiva.
Origens
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A origem deste ritual é encontrado em Gênesis 17:1-14, onde Deus ordena a Abraão que ele e todos os seus descendentes se circuncidem como sinal do pacto entre Deus e Abraão.[1][2]
O judaísmo defende que este é um sinal de pacto perpétuo que não pode ser nunca abolido. Deste modo, quando diversas situações e povos buscaram obrigar o povo judeu à não seguir a prática da brit (como por exemplo, debaixo do domínio grego), sempre desencadeou-se uma resistência a abolir a prática, o que elevou a brit milá a um evento de grande importância e significado no sentido de "ser judeu".
Terminologia da brit milá
[editar | editar código-fonte]Mohel - aquele que é responsável por efetuar a remoção do prepúcio é chamado de mohel, em hebraico. Na interpretação mais conservadora, qualquer judeu que saiba fazer a cirurgia (se o pai da criança souber realizar a brit, não é permitido que delegue a função a outra pessoa) e saiba as bênçãos específicas pode realizar a brit, mas o mohel é um especialista capaz de efetuar a circuncisão. O mohel não é necessariamente um médico, mas tem uma grande experiência na execução da brit. Classicamente a brit é feita sem anestesia, apesar de atualmente em algumas brit milá a criança receber uma pequena anestesia.
A tradição rabínica só permite que uma mulher execute a circuncisão se não houver um homem competente presente. No entanto, atualmente o rabinato conservador e reformista tem permitido que mulheres exerçam a função de mohel.
Atualmente, a validade das cerimônias é discutida, ou pelo menos analisada, em função de que corrente autorizou o celebrante, no caso o mohel. Porém, isso acontece de forma "hierárquica" em função do tradicionalismo da corrente. Assim, um reformista sempre considerará válido um brit-milá feito por um mohel ortodoxo, mas isso não é necessariamente verdade para um ortodoxo se o mohel for reformista (principalmente se for mulher).
Sandak - título derivado do grego, significa "padrinho". É a pessoa que recebe a honra de segurar a criança que receberá a circuncisão.
Kvater e kvaterin - título derivado do alemão, significa também "padrinho". Casal escolhido para trazer a criança até o lugar em que receberá a circuncisão.[3]
Cadeira de Elias (Kisê shel Eliyahu. Kisê em português significa "cadeira de honra" ou "trono") - Elias é tido como presente em todas estas cerimónias, uma cadeira vazia sendo-lhe reservada ao lado do padrinho.[4][5]
Procedimentos
[editar | editar código-fonte]A mulher do casal kvater toma a criança dos braços da mãe e entrega-la ao homem que levará e colocará a criança sobre a cadeira reservada ao profeta Elias. O pai então coloca o menino sobre o colo do padrinho, onde o mohel executa a circuncisão. O nome hebraico do menino então é anunciado a todos. Depois segue-se a refeição festiva.
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Considerações adicionais
[editar | editar código-fonte]- A brit milá é permitida no Shabat e no Yom Kippur, já que o Talmude estabelece que a circuncisão supera os outros mandamentos da Torá.
- Os homens que desejam se converter ao judaísmo devem executar a circuncisão aquando a aceitação na comunidade judaica.
- A circuncisão em adultos é um processo mais complexo que em recém-nascidos. Nesse caso, o Mohel deve ser um cirurgião autorizado, ou na falta desse, um cirurgião deve ser acompanhado pelo Mohel.
- Como alguns homens, principalmente nos EUA, já são circuncisados, existe uma versão simbólica onde apenas se tira uma gota de sangue da pele do pênis, chamada Hatafat Dam Brit.
- Mulheres não recebem brit milá. Seu nome é geralmente dado no serviço de Shabat após seu nascimento, ou em ocasiões em que a Torá é lida na sinagoga e haja um miniam.
Perspectiva médica
[editar | editar código-fonte]Ainda que seja por vezes comparada à "circuncisão feminina", mais aptamente chamada de mutilação genital feminina, os riscos não são comparáveis.[6]
Face aos riscos, há ainda assim algumas vantagens para os bebés rapazes num procedimento feito com boas práticas médicas, mas mesmo assim a circuncisão não é aconselhada como prática padrão.[7] Ademais, apesar de estudos israelitas indicarem que leigos em medicina podem ser treinados para administração, realçam os riscos potenciais em realizá-la sem devido treino médico, e de forma excessivamente tradicional.[8]
Circuncisão com sucção oral metzitzah b’peh
[editar | editar código-fonte]Algumas práticas tradicionais milenares são tidas como particularmente irresponsáveis, como o metzitzah b’peh, em que a ferida é limpa oralmente após ingestão de vinho (como um primitivo antisséptico), potenciando ainda assim o risco de infeção por vias das bactérias da boca, ou mesmo vírus potencialmente letais como o da herpes, estando em última análise a prática associada a casos de morte infantil, levada a cabo principalmente por grupos ultra-ortodoxos.[9][10] Este contacto sexual levanta questões éticas adicionais, relacionadas com o consentimento do paciente menor ou de delegação parental. Alguns centros religiosos usam uma pipeta para evitar contacto, mas é opinião de vários especialistas que esta prática deveria ser banida no seu todo,[11][12][13] a despeito de resistência dos ultra-religiosos.[14][15]
Mesmo em Israel, esta questão é controversa, o estado recentemente realizando campanhas de informação sobre os riscos da prática.[16]
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ a b c Isaacs, Ronald H. (1992). Rites of Passage: A Guide to the Jewish Life Cycle (em inglês). Nova Iorque: KTAV Publishing House. pp. 21–25
- ↑ a b c Ph.D, Victoria Williams (2016). Celebrating Life Customs around the World: From Baby Showers to Funerals [3 volumes] (em inglês). Santa Bárbara: ABC-CLIO. pp. 59–62
- ↑ «The Sandak and the Kvater». The Forward (em inglês). 7 de julho de 2006. Consultado em 18 de fevereiro de 2025
- ↑ "Elijah, Chair of." Encyclopaedia Judaica (em inglês). Jerusalém: Keter Publishing House, 1971.
- ↑ Unterman, Alan. "Elijah's Chair." Dictionary of Jewish Lore and Legend (em inglês). Londres: Thames and Hudson, 1991.
- ↑ Zimmermann, Eleanor F. (14 de fevereiro de 2025). «Male circumcision is not comparable to female genital mutilation» (em inglês). Consultado em 17 de fevereiro de 2025
- ↑ Anwar, Mohammed Saqib; Munawar, Farhan; Anwar, Qashif (1 de janeiro de 2010). «Circumcision: a religious obligation or 'the cruellest of cuts'?». British Journal of General Practice (em inglês) (570): 59–61. ISSN 0960-1643. doi:10.3399/bjgp10X482194. Consultado em 17 de fevereiro de 2025
- ↑ Kacker, Seema; Tobian, Aaron AR (janeiro de 2013). «Male Circumcision: Integrating Tradition and Medical Evidence». The Israel Medical Association journal : IMAJ (em inglês) (1). Consultado em 17 de fevereiro de 2025
- ↑ «EUA: Ritual judaico em discussão após morte de bebé». www.sabado.pt. Consultado em 18 de fevereiro de 2025
- ↑ News, A. B. C. «Jewish Groups Challenge Law on Circumcision Ritual». ABC News (em inglês). Consultado em 18 de fevereiro de 2025
- ↑ «Safe Bris - NYC Health». www.nyc.gov. Consultado em 17 de fevereiro de 2025
- ↑ Davis, Dena S (2013). «Ancient rites and new laws: how should we regulate religious circumcision of minors?». Journal of Medical Ethics (7): 456–458. ISSN 0306-6800. Consultado em 17 de fevereiro de 2025
- ↑ «Genital Modifications in Prepubescent Minors: When May Clinicians Ethically Proceed?». The American Journal of Bioethics: 1–50. ISSN 1526-5161. PMID 39018160 Verifique
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(ajuda). doi:10.1080/15265161.2024.2353823. Consultado em 17 de fevereiro de 2025 - ↑ Otterman, Sharon (13 de setembro de 2012). «Denouncing City's Move to Regulate Circumcision». The New York Times (em inglês). ISSN 0362-4331. Consultado em 18 de fevereiro de 2025
- ↑ Board, The Editorial (28 de fevereiro de 2015). «Opinion | A Bad Call on Risky Circumcisions». The New York Times (em inglês). ISSN 0362-4331. Consultado em 18 de fevereiro de 2025
- ↑ «Israel To Warn Against Metzitzah Rite in Breakthrough Circumcision Pamphlet». The Forward (em inglês). 3 de março de 2016. Consultado em 18 de fevereiro de 2025
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Brit Milá(About.com)
- Circuncisão(Jewish Virtual Library)
- Bris milah - Beleza ou barbaridade?(Aish.com) (Perspectiva ortodoxa)
- O que é circuncisão?(Chabad.org.br)
- Advocating Circumcision Today- Site que contém detalhes e a história da cerimônia da Brit Milá.
Sites contra o brit milá
[editar | editar código-fonte]- Jewish Circumcision.org- Um site anti-circuncisão que prega que os judeus abandonem a Brit Milá.
- Noharmm.org- Artigo anti-brit de uma perspectiva feminista.
- City Risking Babies' Lives...- Controvérsia sobre metzitza be'peh.
- Af-Mila- Organização israelense anti-circuncisão.
- Jews Against Circumcision- Grupo de judeus contra a circuncisão.