Em matemática , chamamos de produto interno uma função de dois vetores que satisfaz determinados axiomas. O produto escalar , comumente usado na geometria euclidiana , é um caso especial de produto interno.
Em física , em particular em aplicações da teoria da Relatividade , o produto interno tem propriedades um pouco diferentes.
Seja
V
{\displaystyle V}
um espaço vetorial sobre um corpo
K
,
{\displaystyle \mathbb {K} ,}
um subcorpo de
C
{\displaystyle \mathbb {C} }
(veja números complexos ). Para todos os vetores
u
,
v
,
w
∈
V
{\displaystyle u,v,w\in V}
e todos os escalares
λ
∈
K
,
{\displaystyle \lambda \in \mathbb {K} ,}
uma função binária
⟨
⋅
,
⋅
⟩
:
V
×
V
→
K
{\displaystyle \langle \cdot ,\cdot \rangle :V\times V\rightarrow \mathbb {K} }
com as seguintes propriedades:[ 1]
Simetria hermitiana:
⟨
u
,
v
⟩
=
⟨
v
,
u
⟩
¯
{\displaystyle \langle u,v\rangle ={\overline {\langle v,u\rangle }}}
sendo que
z
¯
{\displaystyle {\overline {z}}}
representa o conjugado complexo de
z
∈
C
.
{\displaystyle z\in \mathbb {C} .}
Distributividade (ou linearidade):
⟨
u
+
v
,
w
⟩
=
⟨
u
,
w
⟩
+
⟨
v
,
w
⟩
{\displaystyle \langle u+v,w\rangle =\langle u,w\rangle +\langle v,w\rangle }
Homogeneidade (ou associatividade):
⟨
λ
u
,
v
⟩
=
λ
⟨
u
,
v
⟩
{\displaystyle \langle \lambda u,v\rangle =\lambda \langle u,v\rangle }
Positividade:
⟨
v
,
v
⟩
≥
0
;
⟨
v
,
v
⟩
=
0
⇔
v
→
=
0
→
{\displaystyle {\begin{aligned}&\langle v,v\rangle \geq 0;&\\&\langle v,v\rangle =0\Leftrightarrow {\overrightarrow {v}}={\overrightarrow {0}}&\end{aligned}}}
é chamada um produto interno.
A partir desses axiomas, é possível provar as seguintes consequências:
⟨
u
,
v
+
w
⟩
=
⟨
u
,
v
⟩
+
⟨
u
,
w
⟩
{\displaystyle \langle u,v+w\rangle =\langle u,v\rangle +\langle u,w\rangle }
para todos
u
,
v
,
w
∈
V
{\displaystyle u,v,w\in V}
⟨
u
,
λ
v
⟩
=
λ
¯
⟨
u
,
v
⟩
{\displaystyle \langle u,\lambda v\rangle ={\overline {\lambda }}\langle u,v\rangle }
para todos
u
,
v
,
w
∈
V
{\displaystyle u,v,w\in V}
e
λ
∈
K
{\displaystyle \lambda \in \mathbb {K} }
Um espaço vetorial de dimensão finita no qual está definido um produto interno é um espaço vetorial euclidiano . O produto escalar sobre o espaço vetorial
R
3
{\displaystyle \mathbb {R} ^{3}}
dado por
⟨
(
x
1
,
y
1
,
z
1
)
,
(
x
2
,
y
2
,
z
2
)
⟩
:=
x
1
x
2
+
y
1
y
2
+
z
1
z
2
{\displaystyle \langle (x_{1},y_{1},z_{1}),(x_{2},y_{2},z_{2})\rangle :=x_{1}x_{2}+y_{1}y_{2}+z_{1}z_{2}}
é um produto interno.
Esta definição de produto escalar pode ser referida como produto interno usual . Podemos ter uma outra definição tal qual se tenha um produto diferente do citado acima, desde que se respeitem os axiomas de produto interno.
Ainda no
R
3
,
{\displaystyle \mathbb {R} ^{3},}
podemos escrever o produto interno numa forma matricial:
⟨
(
x
1
,
y
1
,
z
1
)
,
(
x
2
,
y
2
,
z
2
)
⟩
=
x
1
x
2
+
y
1
y
2
+
z
1
z
2
=
[
x
1
y
1
z
1
]
A
[
x
2
y
2
z
2
]
{\displaystyle \langle (x_{1},y_{1},z_{1}),(x_{2},y_{2},z_{2})\rangle =x_{1}x_{2}+y_{1}y_{2}+z_{1}z_{2}={\begin{bmatrix}x_{1}&y_{1}&z_{1}\end{bmatrix}}A{\begin{bmatrix}x_{2}\\y_{2}\\z_{2}\end{bmatrix}}}
onde
A
=
[
1
0
0
0
1
0
0
0
1
]
{\displaystyle A={\begin{bmatrix}1&0&0\\0&1&0\\0&0&1\end{bmatrix}}}
De fato, podemos definir, para qualquer matriz
A
{\displaystyle A}
de ordem 3x3, a seguinte função
⟨
⋅
,
⋅
⟩
:
R
3
×
R
3
→
R
{\displaystyle \langle \cdot ,\cdot \rangle :\mathbb {R} ^{3}\times \mathbb {R} ^{3}\to \mathbb {R} }
por
⟨
(
x
1
,
y
1
,
z
1
)
,
(
x
2
,
y
2
,
z
2
)
⟩
=
[
x
1
y
1
z
1
]
A
[
x
2
y
2
z
2
]
,
{\displaystyle \langle (x_{1},y_{1},z_{1}),(x_{2},y_{2},z_{2})\rangle ={\begin{bmatrix}x_{1}&y_{1}&z_{1}\end{bmatrix}}A{\begin{bmatrix}x_{2}\\y_{2}\\z_{2}\end{bmatrix}},}
e temos, assim, que
⟨
⋅
,
⋅
⟩
{\displaystyle \langle \cdot ,\cdot \rangle }
é um produto interno se:
A Matriz A é positiva definida , ou seja, possui apenas autovalores positivos.
A Matriz A é simétrica.
Em alguns casos pode ser mais prático para provar se determinada operação é, ou não, produto interno.
Obs: no caso complexo, essas condições não são válidas. Uma condição necessária é que a matriz seja auto-adjunta, ou seja, ela deve ser igual à transposta da sua conjugada.
No espaço
R
2
,
{\displaystyle \mathbb {R} ^{2},}
a função que associa a cada par de vetores u =
(
x
1
,
y
1
)
{\displaystyle (x_{1},y_{1})}
e v =
(
x
2
,
y
2
)
{\displaystyle (x_{2},y_{2})}
o número real:
⟨
u
,
v
⟩
=
3
x
1
x
2
+
4
y
1
y
2
{\displaystyle \langle u,v\rangle =3x_{1}x_{2}+4y_{1}y_{2}}
é um produto interno.
De fato:
⟨
u
,
v
⟩
=
3
x
1
x
2
+
4
y
1
y
2
=
[
x
1
y
1
]
[
3
0
0
4
]
[
x
2
y
2
]
{\displaystyle \langle u,v\rangle =3x_{1}x_{2}+4y_{1}y_{2}={\begin{bmatrix}x_{1}&y_{1}\end{bmatrix}}{\begin{bmatrix}3&0\\0&4\end{bmatrix}}{\begin{bmatrix}x_{2}\\y_{2}\end{bmatrix}}}
Onde A tem o termo
a
11
=
3
>
0
,
{\displaystyle a_{11}=3>0,}
o determinante é igual a 12 e a matriz é simétrica.
Se formos demonstrar, para todos os axiomas, teremos que este é um produto interno.
Se
V
{\displaystyle V}
for o espaço das funções contínuas complexas com domínio
[
0
,
1
]
,
{\displaystyle [0,1],}
a função
⟨
⋅
,
⋅
⟩
:
V
×
V
→
C
{\displaystyle \langle \cdot ,\cdot \rangle :V\times V\to \mathbb {C} }
dada por
⟨
f
,
g
⟩
=
∫
0
1
f
(
x
)
g
(
x
)
¯
d
x
,
para
f
,
g
∈
V
,
{\displaystyle \langle f,g\rangle =\int _{0}^{1}f(x){\overline {g(x)}}\,dx,{\text{ para }}f,g\in V,}
é um produto interno.
O ângulo entre dois vectores definido a partir do produto interno.
Num espaço vetorial com produto interno, é possível definir os conceitos de ortogonalidade , norma , distância e ângulo entre vetores.
Seja
V
{\displaystyle V}
um espaço vetorial real ou complexo com produto interno.
Norma
Podemos definir uma norma
‖
⋅
‖
{\displaystyle \left\|\cdot \right\|}
em
V
{\displaystyle V}
por
‖
v
‖
:=
⟨
v
,
v
⟩
{\displaystyle \left\|v\right\|:={\sqrt {\langle v,v\rangle }}}
Se
V
{\displaystyle V}
com a métrica induzida pela norma acima for um espaço métrico completo , dizemos que
V
{\displaystyle V}
é um espaço de Hilbert .
Dizemos que dois vetores
u
{\displaystyle u}
e
v
{\displaystyle v}
de
V
{\displaystyle V}
são ortogonais se, e somente se,
⟨
u
,
v
⟩
=
0.
{\displaystyle \langle u,v\rangle =0.}
Se
V
{\displaystyle V}
for um espaço vetorial real, da desigualdade de Cauchy-Schwarz temos, para dois vetores
u
{\displaystyle u}
e
v
{\displaystyle v}
de
V
,
{\displaystyle V,}
que
−
1
≤
⟨
u
,
v
⟩
‖
u
‖
.
‖
v
‖
≤
1.
{\displaystyle -1\leq {\frac {\langle u,v\rangle }{\|u\|.\|v\|}}\leq 1.}
Podemos, então, definir o ângulo θ entre esses dois vetores por:
θ
=
a
r
c
c
o
s
(
⟨
u
,
v
⟩
‖
u
‖
.
‖
v
‖
)
,
{\displaystyle \theta =\mathrm {arccos} \,\left({\frac {\langle u,v\rangle }{\|u\|.\|v\|}}\right),}
ou simplesmente
c
o
s
θ
=
⟨
u
,
v
⟩
‖
u
‖
.
‖
v
‖
.
{\displaystyle \mathrm {cos} \theta ={\frac {\langle u,v\rangle }{\|u\|.\|v\|}}.}
Referências
↑ APOSTOL, Tom (1969). Calculus . II Segunda ed. Nova Iorque: John Wiley & Sons