ADPF 54

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ADPF 54
Iniciado 17 de junho, 2004
Decidido 12 de abril, 2012
Nome completo do caso Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54 (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) v. Presidente da República)
Citações ADPF 54
Decisão Opinião
Decisão
O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigos 124, 126, 128, incisos I e II, todos do Código Penal.
Membros da Corte
Presidente
Cezar Peluso
Ministros
Marco Aurélio Mello · Ayres Britto · Cármen Lúcia · Ricardo Lewandowski · Gilmar Mendes · Joaquim Barbosa · Celso de Mello · Luiz Fux · Rosa Weber
Opiniões do caso
Maioria Aurélio
Concorrência Britto, Lúcia, Mendes, Barbosa, Mello, Fux e Weber
Dissidência Peluzo e Lewandowski
Acórdão da ADPF 54, relatado pelo ministro Marco Aurélio

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 (ADPF 54/DF)[1] é a decisão final produzida em um processo judicial que tramitou no Supremo Tribunal Federal (STF) que garantiu, no Brasil, a interrupção terapêutica da gestação de feto anencéfalo, sendo um precedente que contribuiu para a formação de uma jurisprudência sobre o tema no Brasil.

A ação, formalizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS)[1] ao Supremo Tribunal Federal em 17 de junho de 2004, foi relatada pelo ministro Marco Aurélio Mello e julgada oito anos depois, em votação com a participação dos 11 ministros, durante os dias 11 e 12 de abril de 2012, e aprovada com 8 votos a favor e 2 contra. O ministro Antonio Dias Toffoli se declarou impedido de votar porque quando era advogado-geral da União (AGU) posicionou-se favorável à interrupção.[2][3]

A decisão do STF não descriminaliza o aborto, bem como não cria nenhuma exceção ao ato criminoso previsto no Código Penal Brasileiro, a ADPF 54 decidiu, porém, que não deve ser considerado como aborto a interrupção terapêutica induzida da gravidez de um feto anencéfalo.[4] A decisão do STF muda, ou põe em oficial, a interpretação que a Justiça deve ter sobre tais casos. Antes da sua aprovação, o Estado não tinha uma interpretação definida sobre o tema, fazendo com que a decisão final ficasse para cada Juiz.[5] Na maioria das vezes, a prática era aceita, mas ficaram conhecidos casos em que a paciente teve de completar a gestação de um natimorto sem ter direito a abortar ou em que a sentença foi dada num estágio muito avançado da gravidez. A ADPF 54 é considerada por alguns juristas como uma decisão judicial de grande importância para o modo como o debate sobre o aborto é tratado no Brasil. O ministro Carlos Ayres Britto disse antes da votação que o projeto é um "divisor de águas no plano da opinião pública"[6].

Durante a votação, o projeto recebeu ampla cobertura midiática, sendo destaque em jornais impressos, pela televisão e rádio. Também teve grande espaço na Internet, sendo um dos assuntos mais comentados entre os brasileiros. Gerou protestos e críticas por parte, principalmente, de grupos religiosos, entre eles católicos, espíritas e evangélicos, que condenaram a decisão do STF e defenderam a sua posição de que, mesmo sem cérebro, a vida do feto deve ser protegida. Médicos que não concordam com os preceitos destas crenças, em geral, aclamaram o resultado da votação, destacando os riscos à saúde da mulher; feministas defenderam o direito de escolha da gestante.

Votação[editar | editar código-fonte]

Votos[editar | editar código-fonte]

Marco Aurélio Mello[editar | editar código-fonte]

O relator do processo, o ministro Marco Aurélio Mello votou, no primeiro dia do julgamento, 11 de abril de 2012, a favor da legalização do aborto de fetos anencéfalos.[7] Seu voto iniciou-se na manhã de quarta-feira e durou aproximadamente duas horas.[8] Antes de iniciar a votação de facto, o ministro chamou atenção ao conceito de Estado laico, dizendo que "concepções religiosas não podem guiar as decisões estatais". Disse que as "paixões religiosas" devem ser colocadas à parte de uma votação de tamanha importância. A justificativa de seu voto girou em torno, principalmente, de que o anencéfalo não é uma "vida em potencial" e, sendo assim, não tem proteção jurídica de sua vida.[7][8] Mello também citou os riscos que a gravidez traz à mulher e apoiou-se no Código Penal brasileiro para defender mais um ponto pela constitucionalidade do projeto. O Código permite à mulher que corre risco de vida abortar o feto mesmo que esse seja completamente viável, não faria sentido, então, proibir uma situação semelhante e em que não há violação do Direito à Vida, previsto na Constituição de 1988. Ele também lembrou que, além do corpo, a gestante que da à luz um natimorto corre sérios riscos à sua saúde mental. Marco Aurélio defendeu que a mulher deve ter o direito, vistos os pontos apresentados, a interromper a gestação, se assim for de sua vontade.[7]

Apesar de atentar com ênfase às questões sociais, Mello baseou a maior parte do seu voto em argumentos científicos, apresentados por especialistas durante Audiência pública organizada pelo Supremo em 2008.[7] Entre as refutações feitas por Marco Aurélio, estão a de que o aborto de anencéfalos constituía eugenia e discriminação de deficientes físicos. Ele disse que o anencéfalo está fadado a morrer, dentro do útero ou horas depois do nascimento, afirmou que especialistas o consideram um "natimorto neurológico", reafirmando que ele não poderá sobreviver fora do corpo da mãe. Sobre eugenia, o ministro argumentou de modo semelhante, de que não se impede o nascimento de anencéfalos por eles serem "deficientes", mas sim por não terem vida.[7] Em síntese à essa argumentação, Mello disse que "anencefalia é incompatível com a vida". Sobre erros de diagnóstico, ele afirmou que o Sistema Único de Saúde tem profissionais aptos a fazer o diagnóstico com certeza sobre a anencefalia a partir da 12ª semana de gestação e que não serão abertas exceções para outras anomalias genéticas.[8]

Os então ministros Cesar Peluso e Ricardo Lewandowski votaram contrariamente à ADPF.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

7. https://jus.com.br/artigos/44378/aborto-e-anencefalia-no-supremo-tribunal-federal