Caso Gradiente vs. Apple

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O Caso Gradiente vs. Apple é um imbróglio judicial no Brasil sobre os direitos do uso da palavra IPhone em produtos comercializados no país. Em 2000, sete anos antes de a Apple lançar o seu famoso smartphone, a Gradiente abriu um pedido de registro no INPI do nome "G Gradiente Iphone" (com o I maiúsculo).[1]

Apesar de a Apple ter lançado o seu iPhone em 2007, só em 2013 ela pediu à Justiça brasileira a nulidade parcial do registro da Gradiente, alegando que o uso da palavra iPhone poderia confundir os consumidores brasileiros[2] (a Apple afimar usar a marca “iPhone” para se referir a celulares desde 1998, mesmo que ainda não houvesse sido lançado o primeiro modelo do iPhone em si). Ela também ressalta que a Gradiente já registrou diversos termos genéricos como “DVD” e “3G” como marcas suas[3]. A Gradiente, por sua vez, alega que obteve primeiro o registro no INPI. Assim, desde 2012, ambas empresas comercializam no Brasil smartphones que utilizam a palavra iPhone. Após alguns revezes em instâncias inferiores, a Gradiente ingressou com o processo no Supremo Tribunal Federal (STF),[4] que começou julgar o mérito do caso em junho de 2023. Até outubro de 2023, o caso estava sendo julgado no plenário virtual do STF, quando, após pedido do ministro Dias Toffoli, o STF passou a julgá-lo no plenário físico.[5]

Histórico[editar | editar código-fonte]

Em 29 de março de 2000, a Gradiente Eletrônica S.A., atualmente IGB Eletrônica S.A., abriu um processo de direitos autorais sobre o nome iPhone[6], que foi registrado sob o número 822.112.175 na classe internacional 09. O Gradiente iphone[7], um aparelho celular com acesso à internet, foi apresentado ao mercado nacional na Telexpo daquele ano, conforme noticiado pelo jornal O Estado de São Paulo em 3 de abril de 2000.[8]

A Gradiente Eletrônica S.A. veria, porém, o seu pedido de direitos do uso da palavra iPhone se arrastar por mais alguns anos pois no dia 14 de março de 2000, ou seja, 2 semanas antes de a Gradiente Eletrônica S.A. abrir o pedido junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), a TCE Indústria Eletrônica da Amazônia já havia aberto uma solicitação junto ao INPI para uso da marca iPhone no Brasil. Com isso, o pedido da Gradiente foi arquivado, e a Gradiente não pôde comercializar o seu iPhone com este nome.[9]

Em 2006, o pedido da Gradiente foi desarquivado e voltou a ficar em análise, uma vez que a autorização do INPI para a TCE Indústria Eletrônica da Amazônia caducou, já que esta não havia lançado nenhum produto no mercado com este nome nos últimos 5 anos.[9]

Tentativa de registro do nome pela Apple junto ao INPI[editar | editar código-fonte]

No ano de 2007, a Apple tentou fazer o registro da marca no Brasil[10], mas como havia um pedido similar, o pedido foi suspenso temporariamente, até que o pedido da Gradiente fosse concluído. Em 2008, a Gradiente teve o seu pedido junto ao INPI deferido, ganhando no Brasil os direitos do uso da palavra IPhone relacionadas a aparelhos de celular.[11] Tal direito foi publicado na Revista da Propriedade Industrial (RPI) do INPI, edições 1925 e 1930. Com isso, em 13 de fevereiro daquele ano o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) negou o registro de 4 dos 11 pedidos por parte da Apple relacionadas a palavra iPhone no Brasil. Com isso, a Apple perdeu o direito de usar a marca iPhone no país "pelo menos quando usada em relação a celulares".[12]

Primeira investida da Apple na Justiça[editar | editar código-fonte]

A Apple então ingressou na Justiça e conseguiu anular parcialmente o registro da marca do IPhone da Gradiente. O juízo de 1º grau da 25ª Vara Federal do Rio de Janeiro entendeu que o INPI, no momento da concessão da marca, deveria ter considerado a situação mercadológica do termo "iPhone". Nesse sentido, o juízo singular condenou o Instituto a anular a decisão concessória de registro e republicá-la no Órgão Oficial.[13]

Nova solicitação da Apple junto ao INPI[editar | editar código-fonte]

No início de 2013, a Apple ingressou no INPI solicitando a caducidade do registro da marca pela Gradiente, sob o argumento de que a empresa brasileira não teria comercializado o produto, no período de cinco anos, a partir da concessão da marca em janeiro de 2008.[14] Em dezembro de 2012, porém, a Gradiente havia lançado uma nova versão do seu Gradiente iphone,[15] intitulado Neo One e com configurações modestas.[16]

Como a Gradiente foi noticiada pelo INPI sobre o recurso da Apple, ela afirmou que desde que obteve os direitos do uso do nome ainda não havia utilizado a marca "Iphone" porque estava focada em reestruturar a empresa e retornar às atividades.[17][18] Com isso, em 13 de fevereiro de 2013, o INPI oficializou, novamente, a decisão de negar à americana Apple o pedido de registro da marca iPhone no país.[19][20]

Segunda investida da Apple na Justiça[editar | editar código-fonte]

Em 19 de setembro de 2013, o juiz Eduardo André Brandão de Brito Fernandes do TRF da 2ª Região decidiu que "tanto a Apple quanto a Gradiente, cada um à sua forma, poderão utilizar o nome iPhone no Brasil".[21] Na prática, isso significa uma derrota para a Gradiente, que já passou quase um ano investindo nesta briga com a Apple. Com a decisão do juiz, a Gradiente não poderia utilizar somente o nome iPhone, mas sim sempre usar a marca "Gradiente iphone" ao comunicar o seu produto. Como resultado disso, o juiz ordenou que o INPI cancelasse o registro já concedido à Gradiente e republicasse-o, deixando assim clara a situação e as novas regras.[21]

Gradiente lança nova versão de seu Iphone[editar | editar código-fonte]

Em outubro de 2013, a Gradiente fez valer novamente o deferimento de seu pedido junto ao INPI, e lançou no mercado o que, até agora, foi a última versão de seu Gradiente iphone: o C600.[22]

Decisão favorável à Apple em 2ª Instância[editar | editar código-fonte]

Em junho de 2014, a Apple conquistou, em segunda instância, o direito de uso da marca no Brasil. A decisão judicial determinou que o registro da Gradiente não possui exclusividade sobre a marca. Com a decisão, a Apple pôde continuar usar livremente a marca sem pagar royalties à empresa brasileira.[23]

Decisão da 4ª Turma do STJ[editar | editar código-fonte]

Em 2018, a 4ª Turma do STJ decidiu que Gradiente não tem exclusividade sobre a marca Iphone. O relator do processo, ministro Luís Felipe Salomão, afirmou que o direito de uso exclusivo da marca não é absoluto.[24]

Centro de Conciliação e Mediação do STF[editar | editar código-fonte]

Em dezembro de 2020, o caso chegou a ser encaminhado ao Centro de Conciliação e Mediação do STF, mas o procedimento terminou no ano seguinte sem acordo entre as partes.[25]

Processo aceito no STF[editar | editar código-fonte]

Em 2021, o STF tentou resolver o caso por meio de uma mediação extrajudicial, mas sem acordo.[26]

Em 15 de julho de 2022, a PGR, por meio de seu procurador-geral da República, Augusto Aras, opinou favoravelmente à utilização da marca iPhone pela empresa estadunidense.[27]

Ainda em 2022, o STF reconheceu por unanimidade a repercussão geral da matéria, entendendo, assim, que caberia a ele julgar o mérito da questão.[13] A notícia de que o caso seria julgado pelo STF fez as ações da Gradiente (papéis IGBR3) subirem.[28]

Decisão do STF[editar | editar código-fonte]

O julgamento está suspenso, por ora, após um pedido de vista do processo por parte do Alexandre de Moraes.

Votos dos Ministros
Ministro Voto a Favor da Gradiente Voto a Favor da Apple Informações/Observações sobre o voto Ref
Dias Toffoli (relator) Sim Não
  • Votou pela reforma do acórdão do TRF-2 e propôs a tese de que o depósito de pedido de registro de marca não é afetado pelo uso posterior de um mesmo sinal distintivo por terceiros. Ele ressaltou ainda que a Apple poderia ter pedido administrativamente a anulação do registro da Gradiente em até 180 dias a partir da certificação, mas isso não ocorreu.
  • Em resumo, ele entendeu que o caso deve ser decidido a favor da Gradiente em razão da ordem cronológica dos fatos, e afirmou que o registro do INPI garante o direito da marca no Brasil.
[29]
Luiz Fux Não Sim
  • Defendeu o "uso de razoabilidade" para não "comprometer o próprio interesse social do instituto da propriedade intelectual" e não premiar quem "se manteve inerte por estar protegido pela morosidade no processo de análise da autarquia". Para defender sua tese, utilizou-se de 3 argumentos:
    • Argumento 1 - apesar de a Gradiente ter conquistado o registro no INPI, "não se trata de um direito absoluto"
    • Argumento 2 - "inobservância das alterações no mercado durante o processo de registro da marca Gradiente Iphone". Isto é, enquanto o INPI analisava o caso ao longo de sete anos, a Apple popularizou o uso do nome para si.
    • Argumento 3 - atuação do uso "semântico" do nome "iPhone" pela Apple. Ele entendeu que dar o direito da marca à Gradiente puniria a empresa norte-americana e desestimularia a economia por trazer insegurança jurídica.
[30]
Luís Roberto Barroso Não Sim
  • Entendeu que a Gradiente deve usar a marca "G Gradiente Iphone", com "i" maiúsculo e inseparável do nome da empresa, enquanto a Apple o direito da palavra "iPhone" isolada com "i" minúsculo. Para o ministro, esse entendimento não afetaria o mercado das empresas e "não causa danos emergentes a nenhuma delas"
  • Com isso, ele votou por manter a decisão do TRF-2 que não admitiu o recurso extraordinário. Segundo ele, o caso trata de uma suposta violação a princípio constitucional de "caráter indireto". Para se admitir um RE, é necessária uma violação direta. As demais alegações, para o magistrado, eram genéricas.
[31]
Gilmar Mendes Sim Não Apesar de ter acompanhado Toffoli no voto a favor da Gradiente, não juntou seu voto com a fundamentação [32]
Edson Fachin Declarou-se “suspeito” no caso, por motivo ainda desconhecido. Por isso, ele não vai votar.
Alexandre de Moraes Não Sim Considerou que a marca iPhone tornou-se notoriamente conhecida como um aparelho da Apple, pois o consumidor passou a vinculá-la diretamente ao telefone por esta produzido. Com isso, defendeu que "deferir a exclusividade marcária à IGB, permitindo o uso exclusivo do termo 'iPhone' por essa empresa, desconsiderando toda a significativa mudança ocorrida no mercado, seria vulnerar a proteção aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência." [33]
André Mendonça Sim Não Apesar de ter acompanhado Toffoli no voto a favor da Gradiente, não juntou seu voto com a fundamentação. [32]
Cristiano Zanin Não Sim Entendeu que "a recorrente jamais utilizou a marca, tampouco lançou produto com o nome “Gradiente Iphone”. Não fez, portanto, nenhum investimento financeiro ou tecnológico no desenvolvimento de produtos para uso da marca." [32]
Cármen Lúcia Não Sim
TOTAL 3 5

Referências

  1. Canaltech (20 de julho de 2022). «Apple ganha parecer contra Gradiente sobre direito de uso do nome iPhone». Canaltech. Consultado em 1 de junho de 2023 
  2. uol.com.br/ Gradiente x Apple: disputa no STF por marca 'iPhone' é paralisada; entenda
  3. macmagazine.com.br/ Apple vs. Gradiente: briga pela marca iPhone no STF é interrompida
  4. «Apple vs. Gradiente: disputa pela marca iPhone chega ao STF». Exame. 23 de maio de 2023. Consultado em 1 de junho de 2023 
  5. folha.uol.com.br/ STF vai julgar disputa entre Apple e Gradiente no plenário físico
  6. «STXNEWS LATAM-Brazil's IGB says registered brand 'IPHONE' in Brazil-filing». Reuters. 18 de dezembro de 2012. Consultado em 5 de fevereiro de 2013. Cópia arquivada em 27 de maio de 2022 
  7. «Jornal do Commercio (RJ) - 2000 a 2009 - DocReader Web». memoria.bn.br. Consultado em 1 de junho de 2023 
  8. Sposito, Rosa (3 de abril de 2000). «Telexpo traz celulares com navegador web». O Estado de S. Paulo. Consultado em 1 de junho de 2023 
  9. a b Camasmie, Amanda (21 de agosto de 2022). «Antes da Gradiente, outra empresa quis a marca IPHONE no Brasil». Época Negócios. Consultado em 1 de junho de 2023 
  10. Fischmann, Rafael (8 de julho de 2008). «Apple oficializa pedido de registro da marca "iPhone"». MacMagazine. Consultado em 1 de junho de 2023 
  11. G1, Helton Simões GomesDo; Paulo, em São (24 de abril de 2013). «Gradiente reverte bloqueio da marca 'iphone', alvo de disputa com a Apple». Tecnologia e Games. Consultado em 1 de junho de 2023 
  12. G1, Do; Paulo, em São (5 de fevereiro de 2013). «Apple perde para a Gradiente o direito de usar a marca iPhone no Brasil». Tecnologia e Games. Consultado em 1 de junho de 2023 
  13. a b «Gradiente x Apple: STF decidirá sobre exclusividade do termo "iPhone"». Migalhas. 18 de março de 2022. Consultado em 1 de junho de 2023 
  14. «TELETIME News - Apple recorre ao INPI alegando caducidade do direito da Gradiente sobre a marca iPhone». web.archive.org. 26 de fevereiro de 2014. Consultado em 1 de junho de 2023 
  15. «iPhone da Gradiente já está à venda por R$ 699». www.tecmundo.com.br. 18 de janeiro de 2013. Consultado em 1 de junho de 2023 
  16. «Gradiente lança Iphone que roda Android». Tecnoblog. 18 de dezembro de 2012. Consultado em 1 de junho de 2023 
  17. Canaltech (3 de março de 2016). «Gradiente e Apple vão disputar no STJ direito de uso da marca "Iphone" no Brasil». Canaltech. Consultado em 1 de junho de 2023 
  18. TudoCelular.com (4 de março de 2016). «Gradiente e Apple voltam a disputar pela marca 'iphone' no Brasil». TudoCelular.com. Consultado em 1 de junho de 2023 
  19. Petry, Rodrigo (13 de fevereiro de 2013). «INPI nega à Apple registro da marca 'iphone' no Brasil». Agência Estado. Consultado em 1 de junho de 2023. Cópia arquivada em 13 de fevereiro de 2013 
  20. G1, Do; Paulo, em São (18 de dezembro de 2012). «Apple não pode usar a marca 'iphone' no Brasil, diz instituto de patentes». Tecnologia e Games. Consultado em 1 de junho de 2023 
  21. a b «Olhar Digital: Apple vence Gradiente e pode usar nome iphone no Brasil». web.archive.org. 27 de setembro de 2013. Consultado em 1 de junho de 2023 
  22. «Gradiente apresenta o iphone C600 - TudoCelular.com». www.tudocelular.com. Consultado em 1 de junho de 2023 
  23. «Apple volta a vencer Gradiente em ação pela marca iPhone (English: Apple defeats Gradiente again in lawsuit for the iPhone brand. Veja. Consultado em 27 de agosto de 2015. Cópia arquivada em 14 de abril de 2015 
  24. conjur.com.br/ Disputa pela marca "iPhone" no STF será resolvida em conciliação
  25. portal.stf.jus.br/ Mediação de litígio envolvendo Apple e Gradiente pelo uso da marca iphone termina sem acordo
  26. «STF marca julgamento que decidirá se Apple ou Gradiente fica com marca 'iPhone' no Brasil». Valor Investe. 24 de maio de 2023. Consultado em 1 de junho de 2023 
  27. http://www.mpf.mp.br, Ministério Publico Federal-. «Apple x Gradiente: PGR opina favoravelmente à utilização da marca iPhone pela empresa norte-americana». MPF. Consultado em 1 de junho de 2023 
  28. Aguiar, Victor (22 de março de 2022). «iPhone vs. iphone: entenda como a Gradiente (IGBR3) foi ao STF para tentar um pedaço da maçã da Apple». Seu Dinheiro. Consultado em 1 de junho de 2023 
  29. [https://www.conjur.com.br/dl/stf-suspende-analise-disputa-marca.pdf conjur.com.br/ Voto de Dias Toffoli
  30. conjur.com.br/ Voto de Luiz Fux
  31. conjur.com.br/ Voto de Luís Roberto Barroso
  32. a b c jota.info/ Apple x Gradiente: Toffoli destaca caso iPhone e julgamento será reiniciado
  33. migalhas.com.br/ Marca iPhone: STF tem 3x2 a favor da Apple em caso contra Gradiente

Artigos/Trabalhos Acadêmicos[editar | editar código-fonte]