Centro de Cultura Social de São Paulo

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O Centro de Cultura Social de São Paulo (CCS-SP) é uma instituição fundada 1933 por militantes libertários e anarquistas que funciona até hoje, apesar dos intervalos em que foi fechado pela repressão estatal, funcionando clandestinamente. A trajetória do CSS é expressiva da história do anarquismo no Brasil, e seu funcionamento a partir da redemocratização é relevante para o retomada contemporânea do anarquismo.

História[editar | editar código-fonte]

Até 1937[editar | editar código-fonte]

O Centro de Cultura Social foi fundado em São Paulo em 1933, por militantes do sindicalismo revolucionário e do anarquismo. Sua sede inicial foi em um sobrado na rua Quintino Bocaiúva, n. 80, no bairro do Brás. Dividiu o espaço com o períodico A Plebe, que divulgava continuamente as atividades do Centro. Durante a década de 1930, nesse mesmo espaço, funcionou também a sede da Federação Operária de São Paulo (FOSP), organização sindicalista revolucionária filiada à Confederação Operária Brasileira. Esses três núcleos estabeleciam a dinâmica do espaço até 1937, sempre em mútua colaboração. A FOSP organizava frequentemente reuniões sindicais, enquanto que o CSS organizava palestras, cursos, festivais e uma diversidade de atividades educativas e culturais, já a Plebe divulgava esses eventos e organizava suas próprias atividades de arrecação financeira. A dinâmmica do espaço e de cada um de seus núcleos seguia o mesmo princípios libertário da autogestão, formando comissões a partir de suas Assembléias rotineiras, que também faziam decisões e intervenções nos trabalhos das comissões.[1]

O que o CCS organizou com mais frequência nesse período foram as palestras e conferências, eventos gratuitos que visavam a propaganda libertária como também a educação em geral. Analisando a divulgação feita pelo Plebe se vê os temas preferidos dessas atividades, como - "O perigo espiritualista" , as "Escolas proletárias", "Sindicalismo", "Insurreição espanhola" , "Abaixo o fascismo" , "Religião e fascismo", "Pela emancipação da mulher", "Os problemas sociais" e a "Nova sociedade" - mas não apenas esses. As palestras tinham como temas também acontecimentos específicos da história libertária, como a Comuna de Paris, os Mártires de Chicago, entre outros. Existiam eventos sobre "assuntos da atualidade e científicos", em que se lia e estudava textos da teória anarquista, como Malatesta, como também do Marxismo e das ciências sociais em geral.[1]

Os festivais visavam na maioria das vezes arrecadar fundos para o períodico, que não fazia publicidade comercial, e vendia à preços baixos os exemplares, para que tivessem a máxima circulação. Eram frequentes as apresentações do Grupo Teatral do Centro de Cultura, formado por militantes, como também orquestras, canto, espetáculos de mágica e leitura de poesias.[1] Eram organizadas também manifestações públicas, como em memória do Tratado de Latrão, que os anarquistas denunciavam veementemente. Esse protesto aconteceu em 11 de fevereiro de 1933, e teve oradores como Florentino de Carvalho, associado ao Centro.[1]

Sindicatos filiados à FOSP se reunião no local - União dos Operários em Fábricas de Tecidos de São Paulo, Liga Operária da Construção Civil, União dos Artífices em Calçados e Classes Anexas, Sindicato dos Manipuladores de Pão e Anexos, União dos Operários Metalúrgicos - entre outros. Nesse período o movimento sindical libertário sofria muitas dificuldades na sua inserção social, dado a disputa com o sindicalismo conservador e social-democrata da época, e a intensificação da repressão policial. Em 1935 a FOSP mudou de sede, dado o clima de perseguição, e mesmo assim sofreu uma invasão policial em sua nova sede.[1]

Nesse contexto estabelece-se o Estado Novo, um período de forte repressão do movimento dos trabalhadores, e que foi marcado pelo fechamento das atividades públicas do CCS.[1]

1947-1968[editar | editar código-fonte]

O Centro de Cultura Social e o periodico A Plebe retornaram em 1937, em uma nova sede na rua José Bonifácio, n. 386. A FOSP havia se desarticulado, e isso afetou significativamente a inserção social do Centro. As atividades se tornaram menos diversas, e mais reclusas ao Centro, focando em evento de conferências e educacionais em geral, mas mantendo também apresentações teatrais.[1]

Com base nas divulgações do Plebe, quem mais fez palestras nesse período foi o filósofo Mário Ferreira dos Santos, sobre os mais variados assuntos do anarquismo e da atualidade[1]. Como disse Jaime Cubero, secretário do Centro a partir da reabertura:


Mário Santos era uma figura extraordinária. Ele fazia as palestras lá no Centro... Naquela época tinha os conferencistas que eram programados, mas nunca se ligava muito, porque existia o Mário Santos. Quando ele estava lá, não se ligava muito se o conferencista ia ou não ia, ou se tinha convidado programado ou não. A sala sempre cheia... não sobrava lugar sentado no Centro, de tanta gente.[1]

Outros palestrantes frequentes eram Pedro Dantas, Luca Gabriel, Maria Lacerda de Moura, José Oiticica, Liberto Reis, Dra. Anita Carrijo, Osvaldo Salgueiro, Freitas Nobre e Edgard Leuenroth - pessoas que tinham desde formações universitárias até trabalhadores autodidatas.[1]

O objetivo das reuniões, em geral, era aproximar as famílias de "camaradas" entre si e estabelecer o seu contato com estudiosos e profissionais que se dispunham a palestrar ou ensinar assuntos relacionados aos interesses culturais do Centro. Com isso, pretendia-se oferecer aos freqüentadores acesso a conhecimentos e à possibilidade de desenvolvimento cultural, visando a uma educação resistente à "doutrinação" ou "alienação" capitalista, e também a uma dedicação à prática e à defesa dos princípios anarquistas.[1]

Nesse periodo o CCS organizou sistematicamente curso, que visavam fornecer acessos ao saber para os operários frequentadores do Centro, criando um espaço de pedagogias libertárias paralelo à educação institucional e sua estrutura de privilégios. Para isso o CSS colaborou com outras organizações de educação popular, como a Universidade Popular Presidente Roosevelt e o Centro de Estudos Franco da Rocha. Tiveram enfase o curso de Esperanto e Higiene Mental, esse primeiro estava alinhado com a recepção geral que o anarquismo fez da lingua, promovendo sua massificação como via de fortalecer a ética e política do internacionalismo fundamental à filosofia libertária. O Centro nesse período também abordou o cooperativismo, a ascensão do fascismo, a prevênção de doenças como a sífilis, e frequentemente o planejamento familiar valorizado pelo movimento libertário do período.[1]

Toda a prática de cursos e conferências constituiu uma alternativa importante ao ensino institucionalizado e à cultura e informações divulgadas por órgãos oficiais ou por outras correntes ideológicas. As atividades de encontro, lazer e debate de seus sócios e simpatizantes, construíram e formaram uma outra geração de libertários, outros militantes como Jaime Cubero, o qual continuou atuante no Centro até pouco antes de sua morte.[1]

Após a década de 1950, o anarquismo sofreu um enfraquecimento geral, e se esforçou para se sustentar em espaços localizados, como o CCS. Ainda assim os anarquistas reiventaram suas linguagens em meio aos acontecimentos da época, com a ascensão de novas dimensões de conflito social, e buscaram formar uma nova geração de militantes, como no movimento estudantil. Formou-se o Movimento Estudantil Libertário, que buscou levar ao crescente espaço estudantil secundarista e universitário uma politização libertária. A iniciativa foi breve, pois com o fortalecimento da repressão os militantes passaram à sofrer a pressão militar, e sua sede chegou à ser invadida por militares da aeronautica, que prenderam mais de dez militantes, que sofreram com torturas. O CCS fecha suas portas nesses período, em 21 de abril de 1969, e passa à sobreviver por redes de pequenos grupos, que mantém a memória libertária privadamente.[2]

1985 ao presente[editar | editar código-fonte]

O CCS retomou mais uma vez suas atividades em 14 de abril de 1985, durante o processo de redemocratização do país. Seu retorno foi objeto de reportagem na mídia. Passou à organizar atividades em sua sede novamente, e também em outros espaços, como em universidades e centros culturais municipais. Membros do CCS organizaram cursos livres e palestras sobre anarquismo na PUC-SP, na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, no Departamento de Geográfia da USP, como também no Instituto de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.[3]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. a b c d e f g h i j k l m GERALDO, ENDRICA. "PRÁTICAS LIBERTÁRIAS DO CENTRO DE CULTURA SOCIAL ANARQUISTA DE SÃO PAULO(1933-1935 e 1947-1951)"
  2. Silva, Rafael V. da; Corrêa, Felipe; Willian, Kauan (2020). Mudança Social e Participação Política: os conflitos, as transformações, as utopias. São Paulo: Edições do Programa Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política (EACH-USP). p. 192 
  3. Simão, Azis. "Os anarquistas: duas gerações distanciadas." Tempo Social 1.1 (1989): 57-69.