Transubstanciação

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Transubstanciação é a mudança da substância do pão e do vinho na substância do Corpo e Sangue de Jesus Cristo no ato da consagração. A doutrina — adotada pela Igreja Católica — defende e acredita na Presença Real de Cristo na Eucaristia. As Igrejas Luteranas e Calvinistas creem na Presença Real, mas não na Transubstanciação. A crença da Transubstanciação se opõe à da Consubstanciação, que sustenta que as substâncias do corpo e do sangue de Cristo coexistem com as substâncias do pão e do vinho.

O termo é a conjunção das palavras latinas trans (além) e substantia (substância).

Na Igreja Católica[editar | editar código-fonte]

A Última Ceia, de Leonardo da Vinci (1452-1519).
Vitrais do sacramento da Eucaristia, obra de Józef Mehoffer na catedral São Nicolau em Friburgo, Suíça

O dogma da Transubstanciação baseia-se nas passagens do Novo Testamento em que Jesus diz no discurso do Pão da Vida: O Pão que eu hei de dar é a minha Carne para Salvação do mundo; O Meu Corpo é verdadeiramente uma comida e o Meu Sangue é verdadeiramente uma bebida,[1] e no fato de que Jesus, ao tomar o pão em Suas mãos na Última Ceia, deu a seus discípulos dizendo: Tomai todos e comei. Isto [o pão] é o Meu Corpo, que é entregue por vós, afirmada como união do fiel a Cristo, de maneira analógica à união da Vida Trinitária: Assim como o Pai, que vive, Me enviou e Eu vivo pelo Pai, assim também o que Me come viverá por Mim.[2] A primeira vez que Jesus anunciou este alimento, os ouvintes ficaram perplexos e desorientados, e Jesus insistiu na dimensão das suas palavras: Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a Carne do Filho do Homem e não beberdes o Seu Sangue, não tereis a vida em vós.[3] A Igreja ensina que há uma transformação da substância, mas não dos acidentes, ou seja, os acidentes como odor, sabor, textura, forma, cor permanecem, mas já não são mais pão e vinho, e sim Corpo e Sangue, por um milagre de Cristo ao proferir as palavras sagradas.

Substância (do grego Ousia) significa o que faz uma coisa ser ela mesma, ou seja, sua essência; por exemplo, a forma de um chapéu não é o chapéu próprio, nem é sua cor, nem é seu tamanho, nem é sua aspereza, nem qualquer outra coisa sobre o chapéu perceptível aos sentidos. O chapéu próprio (a "substância") tem a forma, a cor, o tamanho, a aspereza e as outras aparências, mas é distinto dessas. As aparências, que são referenciadas pelo termo filosófico acidentes, são perceptíveis aos sentidos, mas a substância não é.

Quando em sua última ceia, Jesus disse: isto é meu corpo, o que Ele tinha em suas mãos tinha todas as aparências do pão. Entretanto, a Igreja acredita que a realidade subjacente foi mudada de acordo com o que Jesus disse, e que a substância do pão foi convertida à substância de Seu Corpo. Ou seja, era realmente Seu Corpo, mesmo que todas as aparências que são abertas aos sentidos ou à investigação científica sejam ainda aquelas do pão, exatamente como antes.

A Igreja acredita que a mesma mudança da substância do pão e do vinho ocorre em cada celebração da Eucaristia. O pão é mudado no Corpo de Cristo; mas dado que Jesus, ressuscitado dos mortos, está vivendo, não somente Seu Corpo está presente, mas Jesus ao todo, Corpo e Sangue, Alma e Divindade. A mesma crença é válida ao Seu Sangue.

Para a Igreja, por meio da Transubstanciação, Cristo está real, verdadeira e substancialmente presente sob as aparências remanescentes do pão e do vinho. A transformação permanece pelo tempo em que as aparências remanescerem, ou seja, durarem. Por esta razão os elementos consagrados são preservados, geralmente em um tabernáculo (também chamado de Sacrário) para que a Sagrada Comunhão possa ser dada aos doentes ou a quem está morrendo e também, de forma secundária, mas ainda muito estimada, para a finalidade de adoração.

Tradição[editar | editar código-fonte]

Ostensório com hóstia transparente (detalhe da janela do sacramento da Eucaristia por J. Mehoffer na Catedral de São Nicolau em Friburgo/Suíça)

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Ostensório com hóstia transparente (detalhe da janela do sacramento da Eucaristia por J. Mehoffer na Catedral de São Nicolau em Friburgo/Suíça)

Na Tradição da Igreja, que se originou com Santo Inácio de Antioquia (107 d.c.), Discípulo de São João: Ao confrontar os docetas, grupo gnóstico do primeiro século, que não acreditava que Jesus tenha tido um corpo carnal, mas era um Deus com um corpo etéreo - a crença gnóstica era de que a matéria seria um invólucro mau aprisionando um espírito bom - portanto não aceitavam que se comesse o Corpo de Cristo, já que, para eles, era matéria, portanto, mau em essência. Dizia, pois, Santo Inácio em sua Carta aos Esmirnenses no versículo 5:

De que me vale um homem – ainda que me louve – se blasfema contra o meu Senhor, não confessando que Ele assumiu Carne? E na mesma carta, no versículo 7: Abstêm-se eles (os docetas) da Eucaristia e da Oração, porque não reconhecem que a Eucaristia é a Carne de Nosso Salvador Jesus Cristo, Carne que padeceu por nossos pecados e que o Pai em sua bondade Ressuscitou.

Seguindo a Tradição, o Quarto Concílio de Latrão (1215) defendeu a veracidade da doutrina da transubstanciação:[4] "Seu corpo e sangue estão verdadeiramente contidos no sacramento do altar sob as formas de pão e vinho, o pão e o vinho tendo sido transubstanciados, pelo poder de Deus, em seu corpo e sangue"[5] e o Concílio de Trento (1545-1563) reafirmou que:

pela consagração do pão e do vinho opera-se a conversão de toda a substância do pão na substância do Corpo de Cristo Nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na substância do Seu Sangue; a esta mudança, a Igreja Católica chama, de modo conveniente e apropriado, Transubstanciação.[6]

A Transubstanciação ocorre durante a Santa Missa quando o sacerdote ministerial (Padre, Bispo) realiza o Sacrifício Eucarístico fazendo as vezes de Cristo (in persona Christi),[7] repetindo as palavras ditas por Jesus na última ceia: Isto é o Meu Corpo... Este é o cálice de Meu Sangue… A expressão "in persona Christi" refere-se a algo mais do que em nome, ou então nas vezes de Cristo; para a Igreja, essa expressão significa na específica identificação com Cristo, que é considerado, ao mesmo tempo, Autor e Sujeito deste Seu próprio Sacrifício, no que verdadeiramente não pode ser substituído por ninguém.[8] Há uma diferença entre católicos e ortodoxos, os primeiros creem que a Transubstanciação ocorre pela repetição das palavras de Cristo, que tem o poder de transformar o pão em Carne e o vinho em Sangue. Os Ortodoxos não creem na Transubstanciação, mas na Transmutação do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Cristo, e isto ocorre na epiclese - recedente às palavras de onde se invoca o Espírito Santo sobre as Santas Oferendas (pão e vinho). A Eucaristia é um mistério de fé, dizia São Cirilo de Jerusalém:

Não hás-de ver o pão e o vinho simplesmente como elementos naturais, porque o Senhor disse expressamente que são o Seu Corpo e o Seu Sangue: a fé te assegura, ainda que os sentidos possam sugerir-te outra coisa.[9] Segundo Paulo VI, toda a explicação teológica que queira penetrar de algum modo neste mistério, para estar de acordo com a fé católica deve assegurar que na sua realidade objetiva, independentemente do nosso entendimento, o pão e o vinho deixaram de existir depois da consagração, de modo que a partir desse momento são o Corpo e o Sangue adoráveis do Senhor Jesus que estão realmente presentes diante de nós sob as espécies sacramentais do pão e do vinho.[10]

Afirma o Catecismo da Igreja Católica no §1376: O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício":

É uma só e mesma vítima e Aquele que agora Se oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que outrora Se ofereceu a Si mesmo na cruz; só a maneira de oferecer é que é diferente . E porque neste divino sacrifício, que se realiza na missa, aquele mesmo Cristo, que a Si mesmo Se ofereceu outrora de modo cruento sobre o altar da cruz, agora está contido e é imolado de modo incruento […], este sacrifício é verdadeiramente propiciatório

Milagres Eucarísticos[editar | editar código-fonte]

De acordo com a Igreja Católica, ocorreram alguns milagres eucarísticos que comprovam a doutrina da Transubstanciação. Há uma grande variedade destes, sendo que, entre os principais, e os quais foram analisados cientificamente, temos o milagre eucarístico de Lanciano, na Itália, e o milagre eucarístico de Santarém, em Portugal. Existem muitos outros, embora de menor divulgação, mas não menos importantes para o Catolicismo.[11]

No Protestantismo[editar | editar código-fonte]

A doutrina protestante se opõe a ideia da Transubstanciação, exceto na ala anglo-católica (High Church), da Igreja Anglicana, que também crê na mesma.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. João 6, 55.
  2. João 6, 57.
  3. João 6, 53.
  4. CATHOLIC ENCYCLOPEDIA (1913). «Fourth Lateran Council (1215)» (em inglês). Newadvent.org. Consultado em 26 de Setembro de 2010 
  5. Este artigo incorpora texto da Catholic Encyclopedia, publicação de 1913 em domínio público. . of Faith Fourth Lateran Council: 1215, 1. Confession of Faith, retrieved 2010-03-13
  6. Sess. XIII, Decretum de ss. Eucharistia, cap. 4: DS 1642.
  7. Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium, 10 e 28; Decr. sobre o ministério e a vida dos sacerdotes Presbyterorum ordinis, 2.
  8. Carta ap. Dominicæ Cenæ (24 de fevereiro de 1980), 8: AAS 72 (1980), 128-129.
  9. Catequeses mistagógicas, IV, 6: SCh 126, 138.
  10. Solene profissão de fé (30 de junho de 1968), 25: AAS 60 (1968), 442-443.
  11. «MIRACOLI EUCARISTICI - Mostra Internazionale Ideata e Realizzata da Carlo Acutis e Nicola Gori». www.miracolieucaristici.org. Consultado em 12 de novembro de 2022 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]