Nova classe média

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A pobreza diminuiu no Brasil de 2002 a 2011. A classe C teve aumento significativo, e seus novos integrantes constituem a "nova classe média". (Dados da Fundação Getúlio Vargas, FGV).

No Brasil, nova classe média é um termo criado por Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV),[1] que se refere à parte da população brasileira anteriormente classificada como classe de renda D e que, na segunda metade da década de 2000, ascende à classe de renda C.

Entre 2003 e 2008, o número de brasileiros estatisticamente considerados como pobres se reduziu em 3 milhões.[2] O aumento de renda dessas pessoas propiciou uma significativa mudança no seu padrão de consumo, mediante o acréscimo de vários novos itens, especialmente alimentos industrializados e bens duráveis. A inclusão desse grupo na classe média, com base no recente aumento do seu poder de compra, é contestada por alguns autores, que apontam a insuficiência desse critério como definidor de classe social. Segundo esses críticos, o estrato populacional de renda média não se confunde com a noção de classe média, conceito muito mais abrangente e teoricamente muito mais complexo. Assim, apesar de terem passado a consumir certos bens materiais (alimentos industrializados, roupas, aparelhos eletrônicos etc) e serviços (especialmente bancários) também consumidos pela "velha" classe média, os recém-chegados à classe C teriam valores, hábitos e visões de mundo parcialmente distintos daqueles atribuídos à classe média tradicional.[3][4][5]

Definição[editar | editar código-fonte]

A chamada nova classe média brasileira é constituída por famílias com renda per capita mensal entre 291,00 a 1.019,00 reais[6] e representava mais de 50% da população total em 2012.[7] Essa classificação foi feita pelo governo do Brasil em 2012, através da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE).[8]

Significado econômico[editar | editar código-fonte]

Responsável por injetar cerca de 1,1 trilhão de reais na economia brasileira,[9] a nova classe média tornou-se foco das empresas, que passaram a se adequar para atender a esse novo público.[10] O consumo da nova classe média aqueceu o mercado e ajudou o Brasil a minimizar os impactos da crise internacional de 2008-2011.

Um exemplo dado pelo Instituto Data Popular sobre o consumo em supermercados revela que, em 2002, a nova classe média só consumia 28 categorias de produtos, contra 40 em 2011. Este número é praticamente o mesmo das Classes A e B. Segundo análises da Pesquisa de Orçamentos Familiares feitas pela SAE,[11] o segmento de renda média já representa o maior poder de consumo no Brasil, quer se tome o consumo total (a vista e financiado), quer se tome somente o consumo financiado, o que revela o amplo acesso da classe média a serviços financeiros.

Políticas públicas específicas[editar | editar código-fonte]

Na percepção do governo brasileiro, essa importante parcela da população brasileira requer políticas públicas específicas,[12] que impeçam o seu retorno à pobreza e ofereçam oportunidades eficazes para sua contínua progressão, tais como qualificação profissional.

Com a finalidade de traçar a evolução socioeconômica e o perfil da chamada nova classe média, a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República lançou o aplicativo Nova Classe Média em Números.[13] Com ele, é possível fazer um diagnóstico dessa população ao longo da última década. Características pessoais, regionais, educacionais e habitacionais; participação no mercado de trabalho, composição familiar e consumo fazem parte dos indicadores que podem ser consultados na ferramenta.

Um grupo de trabalho[14] foi formado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) para trabalhar com o mapeamento dos dados estatísticos, a fim de obter uma definição de classe média empiricamente prática, com bases conceitual e metodológica sólidas, que seja capaz de identificar quem são os membros desta nova classe, avaliar seu tamanho e sua heterogeneidade. O Grupo é formado por representantes da Fundação Getúlio Vargas, do Ministério da Fazenda, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Internacional Center for Inclusive Growth, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, do Instituo de Ensino e Pesquisa de São Paulo, da USP e do Instituto Data Popular, entre outros. O resultado dos debates irá orientar a SAE na formulação de uma segunda geração de políticas públicas,[15] específicas para esse público, com a finalidade de evitar que retornem à pobreza e garantam oportunidades para seu desenvolvimento.

Perfil[editar | editar código-fonte]

Para o sociólogo Rudá Ricci, a nova classe média apresenta diferenças importantes em relação à classe média tradicional (anterior aos anos 2000). Entre elas, está o menor capital cultural:

A nova classe média é muito distinta, em imaginário, que a classe média tradicional de nosso país. Não têm hábito de leitura e são absolutamente pragmáticos. Assim, valores universais e regras gerais são colocados sob suspeição com facilidade, a não ser que vinculadas aos valores religiosos.

Segundo pesquisa [16] do Instituto Data Popular,[17] a nova classe média apresenta-se assim:

  • Mais de 42 milhões de brasileiros ascenderam à nova classe média na última década
  • Metade dos cartões de crédito pertence à nova classe média
  • Renda anual dos internautas da nova classe média é de 328 bilhões de reais
  • 68% dos jovens da nova classe média estudaram mais que seus pais
  • 41% da renda da nova classe média vem do trabalho da mulher, contra apenas 25% da Elite
  • A nova classe média representa 48% da renda nacional
  • 6 a cada 10 pessoas que acessam a internet são da nova classe média
  • A região sul é a que apresenta maior concentração da nova classe média, com 64% da população
  • O Nordeste lidera o crescimento da nova classe média. De cada 10 pessoas que melhoraram de vida, 3 são dessa região
  • O interior cresce mais que as regiões metropolitanas
  • A nova classe média gasta mais com serviços. Em 2002, de cada 100,00 reais, 49,50 eram gastos em serviços. Hoje são 65,00.
  • O impacto da classe C no setor aeroportuário é maior que qualquer Copa do Mundo.
  • As classes A e B compram mais produtos de baixo preço do que as classes C e D.
  • De cada 100,00 reais que uma família da classe A gasta, 25,00 vêm do trabalho da mulher; na classe C, esse número sobe para 41,00.
  • 62% da nova classe C prefere comprar produtos brasileiros, contra 25% da elite.

Críticas ao conceito[editar | editar código-fonte]

Diversas críticas já foram feitas ao conceito de nova classe média. Para a filósofa Marilena Chaui, a ideia se baseia em uma concepção errada do que é uma classe social. A causa de uma classe, isto é, o que a gera, é a forma da propriedade. Deste modo, no capitalismo industrial, há a classe dos proprietários (a elite) e a dos trabalhadores. Entre as duas, há uma classe que não faz parte do núcleo central do capitalismo, isto é, uma classe que não é nem dona dos meios de produção e nem trabalhadora, no sentido do capitalismo industrial. Esta é a classe média, composta de profissionais liberais, funcionários públicos, integrantes da burocracia empresarial, entre outros. Portanto, segundo essa concepção, o que houve, entre 2003 e 2011, foi um aumento da classe trabalhadora, não da classe média, a qual, inclusive, diminuiu nesse período.[18]

Após a crise de 2014[editar | editar código-fonte]

Depois do governo Lula, e depois de terminado o primeiro mandato de Dilma Rousseff, o país adentra um período de longa crise econômica. Entre 2014 e 2018 — aproximadamente, o período mais grave da crise —, 6 milhões de brasileiros deixaram a Classe C. Em 2014, a nova classe média representava, de acordo com Neri, 56,8% da população brasileira. Esse número passou para 53,9% em 2018.[19] Na opinião de Neri, contudo, essa parcela da sociedade tem grande resiliência:[1]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b «O que aconteceu com a nova classe média: economista faz diagnóstico do antes e depois da crise econômica». Extra (jornal). 18 de dezembro de 2016. Consultado em 29 de março de 2019 
  2. A classe média e conformada Arquivado em 24 de setembro de 2015, no Wayback Machine.. Por José de Souza Martins. Instituto Humanitas Unisinos - IHU, 10 de agosto de 2008
  3. A nova classe média existe?. Por André Barrocal . Carta Capital, 5 de setembro de 2014.
  4. Conjuntura da Semana. A nova classe média brasileira Arquivado em 24 de setembro de 2015, no Wayback Machine.. Instituto Humanitas Unisinos, 1º de dezembro de 2010.
  5. Vídeo: Marcio Pochmann fala sobre seu livro Nova classe média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira Arquivado em 23 de setembro de 2015, no Wayback Machine.. Boitempo Editorial.
  6. «Governo define que a classe média tem renda entre R$ 291 e R$ 1.019 (valores de 2012)». Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. 24 de julho de 2013. Consultado em 24 de outubro de 2014. Arquivado do original em 24 de outubro de 2014 
  7. «Classe C cresceu mais no Nordeste». Carta Capital. 11 de agosto de 2012. Consultado em 16 de julho de 2012 
  8. «Classe média tem renda per capita entre R$ 291 e R$ 1.019, diz governo». G1. 30 de maio de 2012. Consultado em 29 de março de 2019 
  9. Fábio Chaib (17 de novembro de 2011). «Nova Classe C consumirá mais de R$ 1 tri em 2011». Jovem Pan Online. Consultado em 16 de julho de 2012 [ligação inativa]
  10. Margareth Castro e Evaldo Pighini (Fevereiro de 2011). «A força que vem debaixo». Revista Mercado. Consultado em 16 de julho de 2012 
  11. «Classe C tem mais gastos pessoais que A e B, diz pesquisa». Agência Brasil. Terra. 8 de agosto de 2011. Consultado em 16 de julho de 2012 
  12. Francisco Carlos de Assis e Elizabeth Lopes (6 de agosto de 2011). «Risco de retrocesso da nova classe média preocupa». IstoÉ Dinheiro. Consultado em 16 de julho de 2012 [ligação inativa]
  13. «Brasil tem uma nova classe média». Diário de Pernambuco. 9 de agosto de 2011. Consultado em 16 de julho de 2012. Arquivado do original em 3 de março de 2016 
  14. «Grupo de Trabalho vai traçar perfil da nova classe média brasileira». Portal Brasil. 28 de setembro de 2011. Consultado em 16 de julho de 2012 
  15. «País precisa de segunda geração de políticas públicas, afirma ministro da SAE». Portal Fator Brasil. 9 de agosto de 2011. Consultado em 16 de julho de 2012 
  16. pesquisa
  17. Daiane Souza. «Instituto Data Popular divulga perfil da nova classe média brasileira». Blog Heli Fidelis. Consultado em 16 de julho de 2012 
  18. Marilena Chauí - As classes sociais: classe trabalhadora, classe média, capitalista e o Brasil, consultado em 4 de setembro de 2022 
  19. Nunes, Vicente (17 de outubro de 2019). «Crise expulsou quase 6 milhões de brasileiros da nova classe C». Correio Braziliense. Consultado em 25 de novembro de 2020 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]