Liberalismo conservador

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 Nota: Não confundir com Conservadorismo liberal, nem com Conservadorismo libertário.

Liberalismo conservador é uma variante do liberalismo que mescla políticas economicamente liberais[nota 1] com valores e princípios socialmente conservadores sobre questões culturais e éticas.[1][2] Estudiosos veem o liberalismo conservador como uma variante "mais positiva e menos radical" do liberalismo clássico, mas ele também é referido como uma tradição individual que se distingue do liberalismo clássico e do social-liberalismo.[3][4]

Apesar de se argumentar que existe uma linha tênue entre o liberalismo conservador e o conservadorismo liberal,[5] ambos possuem raízes filosóficas diferentes. Historicamente, o conservadorismo liberal refere-se ao caso em que os conservadores abraçam os elementos do liberalismo clássico, tornando-se moderados, enquanto o liberalismo conservador refere-se aos liberais clássicos que apoiam tanto o laissez-faire econômico, quanto o conservadorismo social.

O neoconservadorismo também foi identificado como um parente ideológico ou gêmeo do liberalismo conservador,[6] além de também existirem algumas semelhanças do último com o nacional-liberalismo.[7][8]

Visão geral[editar | editar código-fonte]

O liberalismo conservador surgiu na França do final do século XVIII, quando a burguesia moderada apoiou a monarquia dentro do campo liberal. Durante a Restauração francesa, os Doutrinários atuaram como um partido liberal conservador representativo.[9] O radicalismo surgiu como uma oposição à moderação desses liberais conservadores.

De acordo com o professor da Universidade Colgate, Robert Kraynak, em vez de seguir o "liberalismo progressista" (ou seja, social-liberalismo), os liberais conservadores recorrem a fontes pré-modernas, como a filosofia clássica (com suas ideias sobre virtude, bem comum e direitos naturais), o cristianismo (com suas ideias sobre direito natural, natureza social do homem e pecado original), e instituições antigas (como direito comum, órgãos corporativos e hierarquias sociais). Para Kraynak, isso significa que, ao seguir os ideais de Platão, Aristóteles, Sócrates, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino e Edmund Burke em vez de John Locke ou Immanuel Kant; os liberais conservadores geralmente cultivam uma profunda simpatia pela política da pólis grega, da República Romana e das monarquias cristãs. Mas, sendo realistas, eles reconhecem que a política clássica e medieval não pode ser restaurada no mundo moderno. E, como moralistas, veem que o experimento moderno de liberdade e autogoverno, além de aumentar a dignidade humana, ainda pode fornecer uma abertura (mesmo em meio à cultura de massa) a anseios referentes à eternidade. Ainda segundo Kraynak, no seu melhor, o liberalismo conservador promove a liberdade ordenada sob Deus e estabelece limites constitucionais contra a tirania. Para ele, isso mostra que um regime de liberdade baseado na moralidade tradicional e na cultura clássica-cristã é uma conquista da qual podemos nos orgulhar, ao invés de combatermos como se fossemos administradores da civilização ocidental.[10]

No contexto europeu, o liberalismo conservador não deve ser confundido com o conservadorismo liberal que é uma variante do conservadorismo que combina visões conservadoras com políticas liberais em relação à economia, questões sociais e éticas.[2] As raízes do liberalismo conservador encontram-se no início da história do liberalismo. Até as duas guerras mundiais, a classe política na maioria dos países europeus era formada por liberais conservadores. Eventos como a Primeira Guerra Mundial trouxeram a versão mais radical do liberalismo clássico para um tipo de liberalismo mais conservador.[11] Os partidos liberais conservadores tendem a se desenvolver nos países europeus onde não havia um partido conservador secular forte e a separação entre Igreja e Estado era tratada como um problema menor. Nesses países, onde os partidos conservadores eram democratas-cristãos, desenvolveu-se esse tipo conservador de liberalismo.[1]

Posição política[editar | editar código-fonte]

O liberalismo conservador é geralmente uma ideologia liberal que contrasta com o liberalismo social.[12]

O liberalismo conservador, juntamente com o liberalismo social e o liberalismo clássico, é mencionado como a principal ideologia liberal da política europeia.[4]

Mesmo que algumas vezes descritos como estando posicionados entre o centro e a centro-direita,[13][14] os liberais conservadores estão bem mais próximos da direita no espectro político convencional.

Diferenças entre o liberalismo social, clássico e conservador[editar | editar código-fonte]

O liberalismo social é uma combinação de keynesianismo e liberalismo cultural, enquanto o liberalismo clássico é o liberalismo econômico que abraça parcialmente o liberalismo cultural.

O liberalismo conservador é uma ideologia que destaca o aspecto conservador do liberalismo, de modo que pode aparecer de forma um pouco diferente dependendo da realidade local. Refere-se a ideologias que mostram tendências relativamente conservadoras dentro do campo liberal, por isso tem algum significado relativo. Nos EUA, por exemplo, o termo "liberais conservadores" chega a ser usado para se referir a liberais clássicos,[15] ao mesmo tempo que na Europa, até democratas-cristãos e ordoliberais são caracterizados assim,[16] embora possam ser mais precisamente descritos como conservadores liberais. Já no Brasil, o termo é propício para se referir àqueles que se consideram "conservadores nos costumes e liberais na economia", apesar de existir discordância quando se trata de associar liberalismo com conservadorismo.[17][18][19][20]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Notas

  1. O liberalismo econômico presente no liberalismo conservador está relacionado com liberdade de mercado e conservadorismo fiscal.

Referências

  1. a b Gallagher, Michael; Laver, M.; Mair, Peter. Representative Government in Europe (em inglês). [S.l.: s.n.] p. 221 
  2. a b «Content». Parties and Elections in Europe (em inglês). 2020. Consultado em 1 de setembro de 2022 
  3. Allen, R. T. Beyond Liberalism: The Political Thought of F. A. Hayek and Michael Polanyi (em inglês). [S.l.: s.n.] p. 2 
  4. a b van Haute, Emilie; Close, Caroline, eds. (2019). Liberal Parties in Europe (em inglês). [S.l.]: Routledge. p. 326 
  5. Johnston, Larry (2007). Politics: An Introduction to the Modern Democratic State (em inglês) 3ª ed. Peterborough, Ont.: University of Toronto Press. pp. 154–155. ISBN 978-1442600409 
  6. Scruton, Roger. «Liberal Conservatism, Not Conservative Liberalism» (PDF) (em inglês). Consultado em 21 de outubro de 2017. Cópia arquivada (PDF) em 21 de outubro de 2017 
  7. Telos (em inglês). [S.l.]: Telos Press. 1998. p. 72 
  8. Mattiace, Shannan Lorraine, ed. (1998). Peasant and Indian: Political Identity and Indian Autonomy in Chiapas, Mexico, 1970–1996 (em inglês). [S.l.]: University of Texas at Austin 
  9. Tombs, Robert, ed. (2014). France 1814–1914 (em inglês). [S.l.]: Routledge. ISBN 978-1317871439 
  10. Kraynak, Robert (2005), Living with liberalism (em inglês), The New Criterion, consultado em 2 de setembro de 2022 
  11. Allen, R.T. (1998). Beyond Liberalism: The Political Thought of F. A. Hayek and Michael Polanyi (em inglês). [S.l.]: Routledge. p. 13 
  12. Slomp, Hans (ed.). Europe, A Political Profile: An American Companion to European, Volume 1 (em inglês). [S.l.: s.n.] p. 107. ISBN 978-0313391811 
  13. Wallerstein, Immanuel, ed. (2011). The Modern World-System IV: Centrist Liberalism Triumphant, 1789–1914 (em inglês). [S.l.]: University of California Press 
  14. van Haute, Emilie; Close, Caroline, eds. (2019). Liberal Parties in Europe (em inglês). [S.l.]: Routledge. pp. 338–339 
  15. Cayla, David (ed.). Populism and Neoliberalism (em inglês). [S.l.]: Routledge. p. 62. ISBN 978-1000366709 
  16. Dyson, Kenneth, ed. (2021). Conservative Liberalism, Ordo-liberalism, and the State: Disciplining Democracy and the Market (em inglês). [S.l.]: Oxford University Press 
  17. Dombrowski, Osmir. «Conservador nos costumes e liberal na economia: liberdade, igualdade e democracia em Burke, Oakeshott e Hayek». SciELO. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  18. Velez, Ricardo (9 de julho de 2021). «PERSPECTIVAS DO LIBERALISMO CONSERVADOR NO BRASIL». ricardovelez.com.br. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  19. Catharino, Alex (15 de fevereiro de 2022). «Liberal na economia e conservador nos costumes». O Tempo. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  20. Garschagen, Bruno (2021). «Conservador nos costumes, liberal na economia?». Consultado em 3 de setembro de 2022