Batalha do Jenipapo

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Batalha do Jenipapo
Batalha do Jenipapo

Óleo sobre tela, arte pictórica de "Artes Paz" retratando o conflito
Data 13 de Março de 1823
Local Próximo ao Riacho Jenipapo, Piauí, Brasil Brasil
Desfecho
  • Vitória portuguesa
Beligerantes
Império do Brasil Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
Comandantes
Leonardo Castelo Branco João José da Cunha Fidié
Forças
2.000 soldados

2 canhões
1.600 soldados

11 canhões
Baixas
200 (mortos)

542 (prisioneiros)
116 (mortos)

60 (desaparecidos)

A Batalha do Jenipapo ocorreu às margens do riacho de mesmo nome no dia 13 de março de 1823, a qual foi decisiva para a Independência do Brasil e consolidação do território nacional.[1] Consistiu na luta de piauienses, maranhenses e cearenses contra as tropas do Major João José da Cunha Fidié, que era o comandante das tropas portuguesas, encarregadas de manter o norte da ex-colônia fiel à Coroa Portuguesa. Os brasileiros lutaram com instrumentos simples, não com armas de guerra, não tinham experiência. Perderam a batalha, mas fizeram com que a tropa desviasse seu destino. Foi uma das mais marcantes e sangrentas Batalhas travadas na guerra da independência do Brasil.

A data não consta nos livros de História e poucos sabem do ocorrido, mesmo no Piauí, onde ocorreu a batalha. Contudo, após alguns movimentos por parte de políticos, historiadores e da população, a data foi acrescida à bandeira do Piauí e está em curso a implantação do estudo da Batalha do Jenipapo na disciplina de História. Durante as comemorações e reflexões do dia 13 de março o município de Campo Maior faz a entrega da Medalha do Mérito Heróis do Jenipapo e o(a) Governador(a) do Piauí, a Ordem do Mérito Renascença do Piauí, oportunidade em que o mesmo usa a faixa governamental.

Sinopse histórica

O texto a seguir encontra-se exposto em quadros, presentes no Monumento aos Heróis do Jenipapo, que contam resumidamente a História da Batalha e relatam o desenrolar dos episódios posteriores; além de um poema em homenagem aos combatentes.

I. D. João VI, ao retornar a Portugal em 1821, reconheceu que a Independência do Brasil era impossível de conter-se. Desejava preservar o norte do país, reunido, como colônia portuguesa, Pará, Maranhão e Piauí. Este, de grande riqueza em gado bovino, poderia cortar o suprimento de carne a outras regiões brasileiras, inclusive ao sul. Para o comando das armas em Oeiras, então Capital do Piauí, o rei nomeou o militar português João José da Cunha Fidié, empossado a 9 de agosto de 1822.

II. A 7 de setembro de 1822, às margens do Ipiranga, o Príncipe Regente D. Pedro proclama a Independência do Brasil. Em Parnaíba, um grupo de patriotas, à frente dos quais João Candido de Deus e Silva e Simplício Dias da Silva, declara sua adesão à causa da Independência e aclama Imperador o Príncipe D. Pedro a 19 de outubro de 1822. Com o objetivo de sufocar o levante, Fidié marcha para Parnaíba, cerca de 700 quilômetros distante, com tropas de linha, lá chegando em 18 de dezembro de 1822. Encontrou a vila guardada pelo brigue Infante Dom Miguel, vindo do Maranhão, com tropa e armamento em seu auxílio. Os chefes da revolta refugiaram-se em Granja no Ceará.

III. Em Oeiras, a 24 de janeiro de 1823, Manuel de Sousa Martins, futuro Visconde da Parnaíba, proclama a Independência e assume a presidência da Junta do Governo do Piauí. Ao receber, a 28 de fevereiro de 1823, a notícia dos sucessos na Capital, Fidié delibera regressar, no comando de mais de 1100 homens, bem armadas. Disponha de 11 peças de artilharia e o seu exército se aumentara de contingentes do brigue Infante Dom Miguel e da guarnição de Carnaubeiras, no Maranhão. Alimentava o propósito de castigar os revolucionários de Oeiras.

IV. Na viagem de volta, o militar português, sabendo que o centro das forças nacionalistas estava em Campo Maior, que aderira à Independência a 2 de fevereiro de 1823, para lá segue em marcha forçada. Na vila, o capitão Luís Rodrigues Chaves convocou os piauienses, mais de mil, a que se juntaram 500 cearenses, uns e outros mal armados de foices, espadas, chuços, facões e velhas espingardas de caça. Fidié desconhecia o número das forças inimigas, entretanto não ignorava que tinha de enfrentar matutos sem disciplina nem instruções militar, mas dispostos a morrer pela causa da Independência.

Diz Abdias Neves: "E só a loucura patriótica explica a cegueira desses homens que iam partir ao encontro de Fidié quase desarmados."

V. O mato às margens do rio Jenipapo se compõe de vegetação baixa. O caminho dos patriotas se bifurcava. O comandante João da Costa Alecrim e seus comandados tomaram à direita e pela esquerda seguiram o comandante Luís Rodrigues Chaves e os seus soldados. Era 13 de março de 1823, 9 horas da manhã. O primeiro encontro foi fortemente repelido pelos patriotas sob o comando dos primos de Manuel de Sousa Martins, o Capitão Inácio Francisco de Araújo Costa e seu Irmão, o Padre Marcos de Araújo Costa, filhos do antigo ouvidor de Oeiras Capitão Marcos Francisco de Araújo Costa, mas Fidié atravessou o Jenipapo, escolheu posição e dispôs os seus homens. Logo se alvejaram os brasileiros por peças de artilharia. O recurso estava em atacar os portugueses ao mesmo tempo de todos os lados e separá-los. Houve tentativa, rechaçada. Outros ataques se deram, com grandes perdas de vidas. A fuzilaria inimiga arrasava o campo. O combate durou até as 2 horas da tarde. Algumas fontes afirmam que houve 200 brasileiros entre mortos e feridos. Outras registram 400[2].

Major Fidié: o comandante das tropas portuguesas

VI. Fidié conquistou vitória aparente. Perdeu parte de sua bagagem de guerra. Acampou a um quilômetro de Campo Maior, na fazenda Tombador. Poucos dias depois, partiu no rumo do Estanhado, hoje União, e daí passou a aquartelar-se em Caxias, no Maranhão, onde piauienses e cearenses o cercaram e fizeram que ele se rendesse a 31 de julho de 1823. Assim se fez a Independência em terras piauienses[3]. Aqui foi preservada a unidade nacional. Escreve João Cândido de Deus e Silva: "As próprias mulheres não ficavam indiferentes: mandavam os maridos, os filhos, os irmãos para a guerra e a fim de que levassem munições e armas vendiam as jóias, se mais nada tinham a vender. A mulher piauiense mostrou, nessa ocasião, a grande fortaleza, o ânimo varonil de lendárias heroínas. Foi inexcedível de amor pelo triunfo completo da Independência - que abraçara, desde as primeiras proclamações."

VII. Glória aos vaqueiros e roceiros humildes, que lutaram sob o comando dos bravos Luís Rodrigues Chaves, João da Costa Alecrim, Inácio Francisco de Araújo Costa, Salvador Cardoso de Oliveira, Alexandre Nery Pereira Nereu, Pedro Francisco Martins, Simplício José da Silva e José Pereira Filgueiras. Eles permaneceram durante muitos anos no esquecimento. Apenas algumas toscas pedras marcavam o lugar das sepulturas com restos desses valentes, mortos sem que deixassem à posteridade ao menos os modestos nomes. A gratidão dos piauienses, porém, um dia se positivou neste Monumento do Jenipapo, na campina formosa - o lugar mais sagrado da história.

VII. (mapa da rota de Fidié e dos combatentes)

IX. O Combate do Jenipapo

"Parda manhã de março. Espessos nevoeiros

Cobrem o campo fatal de flores matizado.

Propaga o eco o som estrídulo e pausado

Das vezes de avançar em carga dos guerreiros.

Sou o clarim marcial num brado agudo e forte,

Monumento do Jenipapo, Campo Maior

Os bravos impelindo às fúrias do combate.

O tropel dos corceis mais brusco torna o embate

Dos férreos batalhões marchando para a morte.

Povo do Piauí, vaqueiros ou soldados,

Quando a pátria te chama, aflita, nesses dias,

Nessas horas fatais de transes desgraçados.

É que sabes mostra-te abnegado e valente!

Se Fidié triunfou, tu, ao morrer, sabias

Que a nossa boa terra ficava independente!"

Clodoaldo Freitas

A bandeira do Piauí: o 13 de março

Bandeira do estado do Piauí, com a modificação de 2005

Em 1922, a Bandeira e o Brasão do Piauí foram aprovados pela Assembléia Legislativa do Piauí. Constituíam-se de elementos que representavam a riqueza do estado e a composição de elementos nativos do Piauí, como a Carnaúba, o Babaçu, o Algodão, a Cana-de-açúcar e o Buriti. Foram criados por iniciativa do então governador do Estado, João Luís Ferreira e por seu secretário de Obras e Viação Pública, Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves. A bandeira constituía-se das mesmas cores da bandeira brasileira e a estrela corresponde ao Piauí como um estado da Nação.

Transcorridos 83 anos, desde a aprovação dos símbolos originais, eis que a Assembléia Legislativa, no ano de 2005 aprova, por unanimidade, a inclusão da data 13 de março de 1823, dia da Batalha do Jenipapo, na bandeira do Piauí. O projeto, de autoria do deputado Homero Castelo Branco (PFL) a partir de relatos do escritor Adrião Neto, corresponde a um anseio antigo da comunidade de historiadora e da população conhecedora do fato, o reconhecimento da data e de sua importância com relação à Independência do Brasil.

Ainda assim, houve veto do governador Wellington Dias (PT), sob a alegação de que em bandeira nenhuma no mundo existia a indicação de data. O veto foi derrubado pela Assembléia e a data foi incluída na bandeira do Piauí.

A expectativa daqueles que lutaram para a modificação do símbolo estadual é de que a inscrição na bandeira desperte a curiosidade das pessoas; e que elas busquem maior informação sobre o ocorrido e tenham consciência da vitalidade da Batalha do Jenipapo.

As outras datas que marcaram a Independência do Piauí, 19 de outubro de 1822 e 24 de janeiro de 1823, já tiveram destaque. A primeira, marca a adesão do Piauí à Independência do Brasil, ocorrida em 7 de setembro de 1822 às margens do Rio Ipiranga, em São Paulo; teve destaque ao ser condecorada como dia do Piauí. A última, independência em Oeiras, foi agraciada com a inclusão no Brasão Estadual. Já a data da Batalha do Jenipapo, considerada por muitos a mais importante das três, esteve esquecida até ao início da discussão do projeto.

No entanto, tem-se verificado que a utilização da nova bandeira não vem sendo aplicada de maneira global. Apenas em cerimônias oficiais nota-se a nova bandeira. Nos meios de comunicação em geral, nos livros didáticos, em ocasiões em que não demandam diretamente dos governos e até em órgãos governamentais percebe-se que não estão sendo aplicadas as modificações. Sendo assim, a perceptividade da inclusão do 13 de março de 1823 na bandeira do Piauí fica comprometida.

Batalha do Jenipapo: Contextualização global

Obelisco da Batalha do Jenipapo construído em 1922 no cemitério onde estão os corpos dos combatentes, Monumento do Jenipapo
Prefeito de Campo Maior Paulo Martins discursando, em 17/08/2013 na cerimônia de lançamento do selo postal em homenagem ao Cemitério do Batalhão, sepultura coletiva dos mortos na Batalha do Jenipapo (Foto: Assis Lima)

A Batalha do Jenipapo

Quando Dom Pedro I, às margens do Ipiranga, deu o grito de independência, não houve derramamento de sangue. Foi no Piauí, às margens do Rio Jenipapo, na cidade de Campo Maior, que os portugueses perderam a esperança de ter uma colônia na América, sendo afastados definitivamente das terras brasileiras. A Batalha do Jenipapo, luta e glória do povo piauiense, assegurou a unidade territorial do Brasil.

O Piauí como província

Até o final do século XVIII, Portugal não dava a mínima importância para o Piauí, apesar de o Brasil ser uma colônia lusitana. A província foi entregue a exploradores maranhenses e baianos. A província era subordinada à Bahia pelo lado jurídico e, pelo lado administrativo e religioso, estava sujeitos ao Maranhão. Muito embora a Freguesia da Mocha tenha sido instalada em 1697 sob a invocação de Nossa Senhora da Vitória, somente em 1715 foi criada a Capitania de São José do Piauí. A terra de Mafrense¹ era muito grande, territorialmente falando, para tão poucos habitantes.

Para se ter um quadro mais revelador dessa situação, Oeiras, por essa época, tinha pouco mais de mil habitantes e era a capital imperial do Piauí. Parnaíba dava os primeiros passos com o comércio de exportação de carnes e de algodão. O gado era mais importante do que o ser humano. Até as três primeiras décadas do século XIX, não havia sequer uma única escola regular, não obstante já existisse desde 1770 um serviço postal ligando os mais distantes rincões do território. Havia comunicação postal, mas não havia escola. Saber ler e escrever era um privilégio de poucas pessoas, apenas as mais altas autoridades ligadas à administração. Em âmbito nacional, o sentimento de independência no Brasil teve inicio no século XVIII com a chamada Conjuração Mineira de 1789, a Inconfidência Carioca de 1794 e a Inconfidência Baiana de 1798, todas imbuídas numa causa comum que girava em torno de idéias liberais, segundo as quais a soberania reside na vontade do povo, na liberdade de expressão e de culto. A partir de então consignou-se o sentimento de liberdade que culminaria de um modo mais intenso com a participação popular na Revolução Pernambucana de 1817.

Em 1808, a chegada da família real ao Brasil marcou definitivamente esse sentimento de nacionalidade, com o Brasil se tornando a sede da Coroa Portuguesa e com os desdobramentos desse fato: a abertura do porto às nações amigas, a fundação do Colégio de Medicina e Cirurgia e da Escola de Comércio, a abertura da Escola de Belas Artes, a fundação do Banco do Brasil, a inauguração do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, a elevação do País a Reino Unido, a criação da Imprensa Oficial e a edição do jornal Gazeta do Rio de Janeiro (em 10 de setembro de 1808). O reconhecimento dos direitos naturais e imprescritíveis da pessoa humana estava na ordem do dia, e o Piauí, apesar do isolamento e da distancia em relação ao Rio de Janeiro, não ficou dessa epopéia libertária, que deu outros rumos ao destino do Brasil.

Ao contrário da situação dos dias atuais, o quadro financeiro do Piauí, em 1821, era considerado bom. A atividade agropecuária crescia vertiginosamente. Quinze mil bois eram abatidos em Parnaíba para abastecer de carnes os mercados do Maranhão, Ceará e Bahia; o comércio de algodão era considerado o melhor do Brasil, além do fumo, cana-de-açúcar e outros produtos. Cerca de 50% da renda bruta das numerosas fazendas de gado do Piauí ia parar nos cofres das cortes portuguesas. O dinheiro que ficava no Piauí pagava os gastos com atividades militares e preservava a carrancuda máquina administrativa.

Em abril de 1821, D. João VI deixou o Brasil e foi para Portugal. A comitiva, de quatro mil pessoas, era formada principalmente por membros da realeza, ricos comerciantes portugueses e outras autoridades, o ossário de D. Maria I, a Rainha Louca, e 50 milhões em cruzados, isto é, todo o dinheiro dos cofres do Brasil.

Com a volta da família real para a Europa, a responsabilidade pelo destino do Brasil ficou a cargo de D. Pedro I. A questão internacional provocada pela Revolução do Porto (1820), no bojo da qual se admitia a volta do Brasil à condição de colônia portuguesa, com a administração ligada diretamente a Lisboa, levou muitas províncias a se rebelarem, como a Bahia, Pernambuco, São Paulo, Minas Gerais, Sergipe, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Ao que apoiavam D. Pedro I e os setores favoráveis às cortes portuguesas mergulharam num vai-e-vem de interesses sem precedentes na história política do País.

Piauí era visto como Portugal em plena caatinga

Do outro lado, Piauí, Maranhão, Pará, Mato Grosso e Goiás deviam obediência e lealdade a Portugal. O Piauí compunha a nação portuguesa. Era uma espécie de Portugal em plena caatinga piauiense. Oeiras, a capital imperial do Piauí, era infestada de portugueses que queriam a todo custo ficar com a parte mais rica do Brasil.

Assim, dividido entre as pretensões dos brasileiros que queriam a independência e a dos portugueses que desejavam continuar com a política colonialista, D. Pedro I, no dia 7 de setembro de 1822, às margens do Riacho Ipiranga, arrancou os laços que uniam o Brasil a Portugal com o grito “Independência ou Morte”. No Piauí, a noticia chegou no dia 30 de setembro.

Com a independência brasileira levada a efeito em São Paulo, Portugal voltou-se para a parte mais rica da nação, que era o Norte. E foi justamente para efetivar essa posse que os portugueses mandaram para o Piauí o oficial graduado João José da Cunha Fidié, que chegou em Oeiras no segundo semestre de 1822.

A presença militar lusitana em terras piauienses, entretanto, não intimidou o ânimo emancipador dos mafrenses. A independência caminhava lenta e gradualmente, mas com passos firmes e decisivos rumo à liberdade.

As idéias revolucionárias desenvolvidas por piauienses ilustres vinham de Portugal, Estados Unidos e França. Essas idéias entravam no Piauí por Parnaíba, que era a porção mais rica da província.Em 19 de outubro de 1822 a Câmara Provincial de Parnaíba, em sessão solene, reconheceu a independência do Brasil. Isso foi aceito como convite à ação libertadora e um não à presença militar portuguesa em terras piauienses. Nesta sessão estavam presentes os líderes Simplício Dias da Silva, Leonardo das Dores Castelo Branco e o juiz Cândido de Deus e Silva.

Uma platéia lotava as dependências da Câmara. Apesar de um certo alinhamento às cortes portuguesas, os parnaibanos reconheciam a autoridade de D. Pedro de Alcântara, o Defensor Perpétuo do Brasil. Campo Maior era também um caldeirão de idéias libertadoras. A 17 de setembro de 1822, a junta governista chamou a Oeiras Lourenço de Araújo Barbosa, o precursor da independência no Piauí, para prestar esclarecimentos a respeito dos boatos sobre atividades emancipacionistas. Segundo informações dos espiões oeirenses infiltrados em Campo Maior, ele possuía uma fábrica de pólvora que seria usada num possível ato revolucionário, que a cada dia se tornava mais urgente.

Com a declaração parnaibana de independência em relação a Portugal, não restou outra alternativa a Fidié, Governador das Armas do Piauí, senão sufocar militarmente o levante revolucionário no litoral e, ao mesmo tempo, ver in loco a situação explosiva em Campo Maior. A preocupação meio de Fidié era fazer nas “terras dos carnaubais” um foco de resistência portuguesa diante do sentimento nacionalista dos campo-maiorenses.

Corroborando o boato de que Portugal queria ficar com o norte do Brasil, que na época compreendia o Piauí, o Maranhão e o Pará, os portugueses enviaram para o Piauí uma quantidade enorme de armas por volta de 1820, alem da vinda de Fidié a Oeiras como Governador das Armas.

Quinze anos antes de vir para o Piauí, defender a última esperança portuguesa de ter uma colônia lusitana nas Américas, Fidié, militar de alta patente, já era herói em Portugal, por ter lutado contra os exércitos napoleônicos quando a França invadiu Portugal em 1807. Lutou bravamente na defesa de Portugal contra as forças francesas do general Junot.

O general desloca-se para Parnaíba

Quando Fidié soube da proclamação da independência feita pelos parnaibanos em 19 de outubro de 1822, rompendo os laços que uniam o Piauí a Portugal, tomou a decisão de marchar com quase todo o efetivo militar rumo a Parnaíba com o objetivo de manter a dominação portuguesa sobre o Piauí e sufocar o movimento libertador.

De Oeiras para Parnaíba, a distância era muito grande para os padrões da época, cerca de 660 quilômetros. Fora o grupo de oficiais que iam a cavalo, os soldados teriam de fazer o trajeto a pé, o que constituía tarefa das mais árduas, mesmo para um exército bem treinado e disciplinado. Fidié partiu em 13 de novembro de 1822 de Oeiras, capital imperial do Piauí, com destino a Parnaíba, passando por Campo Maior.

Fidié chegou a Campo Maior em 24 de novembro, depois de onze dias de marcha acelerada. Antes da chegada de Fidié em Campo Maior, o clima na cidade era de alegria. Com a chegada dele e de toda sua tropa, tudo mudou. Alguns passaram a dar vivas ao imperador D. João VI e a Portugal, sendo que estes que passaram a festejar eram lusitanos ali residentes, alguns colaboradores e uma pequena parte do povo, os últimos temendo represálias.

Para mostrar sua força, Fidié passou treze dias acampado em Campo Maior antes de seguir para o litoral.

Como o objetivo de Fidié era prender os insurretos parnaibanos e restabelecer o império português no litoral, destituído desde 19 de outubro, ele partiu para Parnaíba em 8 de dezembro de 1822 deixando Campo Maior sob a responsabilidade do tenente-coronel João da Cunha Rebelo com cem praças, cem granadeiros e alguns instrumentos bélicos, além de milicianos que serviam de artilheiros para as peças de campanha.

Ao saber da aproximação de Fidié, os independentes parnaibanos fogem para o estado vizinho Ceará. O exército de Fidié era composto por seis mil homens. Os portugueses ainda contavam com o apoio de navios e barcos instalados na costa parnaibana para ajuda no caso de uma emergência.

Fidié chegou em Parnaíba no dia 18 de dezembro de 1822. Sem a presença dos líderes que tinham proclamado a independência do Piauí, ele não encontrou qualquer resistência. Logo na sua chegada houve festas, missas e até fogos de artifício. Fidié se sentia o próprio rei.

Manoel de Sousa Martins age em Oeiras

Enquanto Fidié vivia em Oeiras, no litoral do Piaúi, de onde ele partira para sufocar o levante libertário em Parnaíba, começava também o movimento separatista, tendo à frente o brigadeiro Manoel de Sousa Martins. Diferentemente dos parnaibanos, que agiram por impulso, o brigadeiro trabalhava silenciosamente a causa da independência do Piauí. Em 24 de janeiro de 1823, Oeiras declarou-se independente, rompendo os laços que mantinha com Portugal.

Quando Fidié soube do ocorrido em Oeiras, ficou enfurecido. Considerou uma grande traição. No dia 28 de fevereiro de 1823, convocou novamente a tropa, desta vez composta por 1.100 homens, e nessa data declarou os piauienses como inimigos de Portugal. Com muito júbilo partiu de Parnaíba numa viagem de volta para Oeiras, chegando em Campo Maior no dia 1º de março de 1823.

No caminho de volta ocorre um pequeno confronto na Lagoa do Jacaré entre os independentes piauienses e o exército português, com perdas apara ambos os lados. Após isso os portugueses marchavam com mais cautela. Em Piracuruca a independência tinha sido declarada em 22 de janeiro por Leonardo Castelo Branco. O mesmo Leonardo também proclamou a independência de Campo Maior, em 5 de março de 1823. A concretização da liberdade aflorava no coração dos piauienses. Fidié tinha de ser barrado em Campo Maior de qualquer jeito porque, se chegasse a Oeiras, a independência seria jogada por “água abaixo” e assim os portugueses consolidariam uma colônia portuguesa no norte do Brasil, mesmo com o Grito do Ipiranga.

Em Piracuruca, Fidié encontrou a cidade abandonada. Os habitantes tinham fugido na noite anterior. Sem ter com quem lutar, seguiu em frente deixando para trás uma cidade fantasma, sem nenhum sinal de vida.

busto de Leonardo Castelo Branco, um dos líderes dos combatentes brasileiros, Monumento do Jenipapo, Campo Maior

O confronto

Ficheiro:Brasaocm.png
Foice e trabuco lembrando o combate da Batalha do Jenipapo no Brasão de Campo Maior (Piauí).

A população de Campo Maior, ao saber que Fidié vinha de Parnaíba com destino a Oeiras e passaria ali, se mobilizou com o intuito de impedi-lo de continuar viagem.

Na noite de 12 de março, os homens da cidade e das redondezas foram arregimentados. Todos queriam lutar para livrar o Piauí do domínio português. As mulheres estimularam os seus maridos, parentes e amigos, arrumaram o que puderam, venderam suas jóias; todos estavam empenhados a se unirem em só ideal: lutar.

O amanhecer do dia 13 de março de 1823 prenunciava um dia claro, com poucas nuvens e muito calor. Era um ano em que a seca castigava a nordestino.

Ao sinal de comando, todos os homens se reuniram em frente à Igreja de Santo Antônio. Os combatentes piauienses e cearenses não vestiam fardas. Na saída da cidade, para encontrar-se com Fidié, houve uma apresentação com a banda de música na qual houve um desfile militar. A massa de combatentes que iam lutar pelo Brasil saiu exultante ao som dos tambores. Mesmo sem acertarem os passos eles levavam consigo a chama da liberdade queimando no peito. A certeza da morte não tirou o ânimo dos que iam morrer pela pátria. Cerca de dois mil homens marcharam para o combate. As armas que eles usaram foram espadas velhas, chuços, machados, facas e foices, paus e pedras e algumas espingardas usadas.

Sem nenhuma experiência em guerras, os piauienses chegaram às margens do Rio Jenipapo, de onde pretendiam impedir a passagem de Fidié. Como o riacho estava quase seco, a maioria dos patriotas ocultou-se no próprio leito do riacho, enquanto a outra parte se escondeu nas moitas de mato ralo perto da ribanceira. E ficaram esperando o exercito português, que, com certeza, tinha de passar por ali. De onde estavam dava para ver quando os portugueses se aproximassem do palco da luta porque o terreno era bem plano, com várzeas imensas, abertas sem amparo algum.O povo com espírito de tornar-se independente estava entrincheirado e sabiam que à frente deles havia uma estrada que se dividia em duas, uma pela direita e outra pela esquerda. Só que estavam em dúvida por qual dos caminhos viria Fidié. Logo após as oito horas, o capitão Rodrigues Chaves mandou uma patrulha sondar o lugar onde seria travada a batalha. Ao chegar no local onde a estrada se dividia, Fidié resolveu mandar uma metade do exército por um lado e outra metade pelo outro lado. Ele seguiu com uma das metades pela esquerda e a cavalaria foi pela direita. Os independentes, sem saber da divisão que Fidié tinha feito no seu contigente, foram pela estrada da direita encontrando-se com a cavalaria portuguesa, sendo surpreendidos. Os mesmos avançaram bravamente contra a cavalaria. Os portugueses espantaram-se com a coragem e com a bravura dos piauienses, e acabaram recuando. Neste momento os piauienses perseguiram os portugueses estrada adentro.

Os combatentes piauienses, ouvindo o tiroteio, acharam que o confronto havia começado. Saíram das trincheiras na qual utilizavam como posição defensiva e precitadamente foram pela estrada da direita atrás do inimigo. Só que as tropas portuguesas não se encontravam mais ali.

Ao saber do ocorrido, Fidié atravessou o rio Jenipapo pela estrada da esquerda, construiu de forma apressada umas barricadas, distribuiu o armamento pesado, organizou os atiradores em posição de frente de combate (em linha) nas trincheiras onde antes estavam os piauienses e esperou que eles voltassem para lá. Antes os piauienses estavam em posição favorável, mas então tudo se reverteu.

Quando os piauienses viram a situação adversa só encontraram uma alternativa: atacar Fidié ao mesmo tempo e em todas as direções ao longo das margens do rio. No primeiro instante do combate houve muitas baixas por parte dos piauienses. Dezenas de corpos caíram pelas balas do exercito português. Os poucos que conseguiram atravessar a linha de fogo deram o último suspiro à boca dos canhões, com grande destemor, não temendo pela vida e a dando pela pátria, em tremenda representação de amor por ela. Com essa demonstração de amor e bravura, os piauienses fizeram com que os portugueses ficassem assustados, pois eles nunca tinham visto tanta audácia em nenhum outro lugar do mundo.

Os sucessivos ataques dos piauienses tinha como resultado muitos mortos pelo chão. A fuzilaria e os tiros de canhão dos portugueses varriam o campo de luta de um lado para o outro. Os que conseguiam passar pelo bloqueio de fogo conseguiam lutar corpo a corpo com os portugueses.

No meio-dia, os piauienses estavam cansados e certos de que não venceriam os portugueses; neste momento já não lutavam, mas se rastejavam ao encontro com a morte.

Às duas horas da tarde, depois de cinco horas de combate, os libertadores retiraram-se em desordem, deixando 542 prisioneiros, 200 mortos e feridos, Fidié, que cujas perdas foram estimadas em 116 mortos e 60 feridos, estacionou na fazenda Tombador, à cerca de um quilômetro de Campo Maior.

Fidié e seu exército caiam de cansaço. O sol escaldante e o medo da valentia dos piauienses não permitiram que as tropas portuguesas os perseguissem, mesmo sabendo que já tinham derrotado a eles. Os cearenses do Capitão Nereu na hora da retirada levaram a maior parte da bagagem dos portugueses, composta de comida, água, algumas armas e até mesmo um pequeno tesouro que Fidié trazia do saque que havia feito na cidade de Parnaíba.

Fidié passou dois dias na cidade de Campo Maior enterrando os seus mortos. No dia 16 de março de 1823, saiu da cidade indo para o Estanhado.

Meses depois, Fidié foi preso em Caxias, no Maranhão, por tropas vindas da região do Cariri Cearense e comandadas pelo capitão-mor do Crato-CE José Pereira Filgueiras e por Tristão Alencar Araripe, de lá levado para Oeiras de onde foi mandado para o Rio de Janeiro. Do Rio ele foi mandado de volta para Portugal, onde foi recebido com honras militares pelos serviços prestados à Coroa Portuguesa. Entre os títulos recebeu o de comendador da Ordem de Avis, a mais antiga condecoração militar portuguesa, fundada por Afonso Henriques em 1162. Só recebia essa comenda o soldado que demonstrasse extrema valentia, ousadia e coragem. No local onde houve a Batalha foi erguido um Monumento em memória aos piauienses que ali morreram pela independência de nosso país. Situado à margem esquerda do rio, é, na verdade, um grande atrativo turístico. No local também se encontra uma parte do acervo bélico usado pelos combatentes. Essas peças pertenciam ao antigo Museu do Couro, e para lá foi transferido.

Museu do Couro: Monumento do Jenipapo, Campo Maior

Consequências da batalha

A luta no Piauí decidiria a unidade brasileira. A iniciativa coube ao coronel Simplício Dias da Silva, rico e viajado. Sobre os destroços da sua riqueza, edifica-se a unidade da pátria. A obra de Simplício foi gigantesca. O Norte era autêntico satélite de Portugal. No Sul, a Independência foi aplausos e festas. No norte, fome e peste, sangue e morticínio. Jenipapo foi o retrato da bravura de um povo em luta pela sua liberdade.

O poeta Carlos Drummond de Andrade, em reconhecimento à bravura dos combatentes independentes, imortalizou-os no poema "Cemitérios":[4]

Em 24 de outubro de 2010, o programa De Lá pra Cá, da TV Brasil, veiculou uma matéria sobre a Batalha do Jenipapo, evidenciando o processo de lutas pela independência no norte do Brasil.

"Ao contrário do que se imagina, a independência do Brasil não se limitou ao grito de Dom Pedro I no riacho do Ipiranga e nem se deu de forma pacífica como relata a história oficial. Ela foi um processo que demorou quase dois anos, marcado por lutas violentas e sangrentas, como a da Batalha do Jenipapo ocorrida no Piauí em 13 de março de 1823. Além de consolidar a independência na região, o embate pôs fim aos planos portugueses de manterem uma colônia no norte do Brasil" (TV Brasil).[5]

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Ver também

Referências

  1. MATTOS, João Batista de (Tenente-coronel). Os Monumentos Nacionais - Piauí. Rio de Janeiro; Imprensa Militar, 1949.
  2. LIMA, Francisco de Assis de. A Batalha, o reconhecimento. Campo Maior; edição autor, 2009
  3. GOMES, Laurentino. 1822: como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram D. Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado / Laurentino Gomes - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2010, ISBN 978-85-209-2409-9
  4. In Fazendeiro do Ar. Item II. Campo Maior.
  5. [A Batalha de Jenipapo:O programa{De lá prá cá] relembra um capítulo pouco conhecido do processo de independência do Brasil http://tvbrasil.org.br/novidades/?p=6158]Programa De lá prá cá/TV Brasil. Acesso em 02/08/2013
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