Édito de Latinidade de Vespasiano

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Inscrição funerária da Villa de Leutstetten (Stadt Starnberg, Alta Baviera, Alemanha) dedicada ao decurião da Cohors III Bracaraugustanorum equitata, Publius Julius Pintamo, natural de Bracara Augusta membro da tribo Quirina.
Inscrição: [D(is) M(anibus)] / P(ublio) Iul(io) C(ai) f(ilio) Quir(ina) Pintam[o] / domo ex Hisp(ania) citerio[re] / Augusta Brac(ara) vet(erano) ex dec(urione) a[lae] / decurioni munic(ipii) Aeli Anto[---] / Clementia Po(m)peia uxo[r eius] / marito optimo et sibi [---] / viva fecit
Tradução: Públio Júlio Pintamus, filho de Gaio, da tribo Quirina, veterano de Bracara Augusta na província da Hispânia Citerior. Serviu como capitão de cavalaria numa unidade equestre e como vereador da cidade de Aelia Anto [...]. Sua esposa Clementia Pompeia ergueu este túmulo para seu óptimo marido e para si mesmo, durante sua vida.
Vespasiano, imperador que emitiu o édito de latinidade em favor das províncias hispânicas.

O Édito de Latinidade de Vespasiano é um decreto imperial do ano de 74 d.C., da autoria do Imperador Vespasiano pelo qual outorgou a cidadania latina menor -ius latii minor- a todas as comunidades da Hispânia. O que permitia aos cidadãos obterem a cidadania romana plena se desempenhassem magistraturas municipais -Duunvirato ou edilidade- na sua comunidade, uma vez que fora transformada em município por ordem imperial, enquanto o restante dos habitantes adquiriam a cidadania latina, que lhes permitia gozar legalmente do direito de fazer negócios de acordo com a lei romana -ius comercii- e de se casar à romana -ius connubii-, em iustae nuptiae. Os cidadãos romanos assim promovidos em todos estes novos municípios foram adscritos à tribo Quirina, e assim o faziam constar na origo dentro do seu nome.[1]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Embora seja geralmente aceite que a data de publicação do édito seja o ano 74, o processo progressivo de integração das cidades hispânicas no modelo administrativo do Império é bem mais antigo. Sendo concedido parcialmente o direito a cidadania latina em algumas províncias hispânica em tempos anteriores nomeadamente com César, Augusto, Cláudio, etc. O império romano foi legalmente concebido como uma conjunção de cidades-estado no sentido de comunidades limitadas no espaço, com uma população beneficiando de direitos próprios, adquiridos por diversos meios e méritos. Em princípio, o conceito político de cidadania latina foi concebido como um meio de integração no Estado das elites dos territórios anexados por Roma, garantindo-lhes alguns direitos inerentes aos cidadãos romanos, o sufrágio, o exercício de cargos públicos, o matrimónio dentro da gens ., etc., mas também obrigações, como recrutamento militar, impostos, etc. Com o passar do tempo, às vezes passando por períodos muito violentos (ver Guerra Social) a cidadania latina se espalharia por toda a Itália [2] e pelos territórios galo-cisalpinos (norte da Itália), [3] [4] durante a era republicana e, mais tarde, para o resto do Império. Também com o claro e necessário objetivo de aumentar o número de contribuintes. [5]

Testemunho de Plínio[editar | editar código-fonte]

Embora existam outros testemunhos indiretos, a referência mais clara ao édito encontra-se numa passagem do historiador Plínio, o Velho, na sua Naturalis Historia III, 30:

Universae Hispaniae Vespasianus Imperator Augustus iactatum (o iactatus) procellis rei publicae Latium tribuit
Tradução: O imperador Vespasiano concedeu o direito latino a toda a Hispânia, abalado pelas tempestades do Estado" (ou, com iactus, em tempos difíceis para si)

.

Interpretações[editar | editar código-fonte]

A interpretação desta frase não é isenta de controvérsias entre os investigadores, pois os manuscritos que transmitem o texto de Plínio às vezes diferem no uso de termos específicos, por exemplo, para o termo “iactatum”, às vezes “iactatus”. A tradução e interpretação de uma forma ou de outra influenciam até mesmo a datação do édito, pois pode situá-lo em momentos em que Vespasiano tinha grande necessidade de apoio nas províncias, como no ano 70-71, [6] [7] quando o poder imperial deveria ser estabilizado durante a guerra, o ano dos quatro imperadores, ou que levaria a publicação para o ano de 69 [8] , enquanto a maioria dos historiadores situa o edital no ano 74, [9] [10] logo após o censo da população feito por Lúcio Júnio Quinto Víbio Crispo entre 71 e 73[1], e quando Vespasiano juntamente com seu filho Tito, associado ao trono em igualdade de condições, empreenderam uma série de reformas administrativas em todo o Império, e também nas províncias hispânicas.

Alcance do edital[editar | editar código-fonte]

Os investigadores encontram as mesmas dificuldades para determinar se o direito ao ius latii contido no édito abrangia toda a Península, se os cidadãos gozariam dele individualmente ou como parte de uma comunidade privilegiada, bem como se o efeito era imediato ou seria desenvolvido através de leis posteriores. [11] [12] No entanto, parece que pelo menos 350 cidades hispânicas nas áreas mais romanizadas poderão ter sido promovidas municípios romanos durante a dinastia Flaviana, como testemunham muitos textos gravados em bronze, como os das cidades de Malaca, Salpensa ou as 6 tabuletas de Irni. Essas leis acabariam por eliminar as configurações organizacionais dos povos indígenas ao serem substituídas pelo modelo urbano romano.

Veja também[editar | editar código-fonte]


Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Roldán Hervás, José Manuel (2007). Historia Antigua de España. [S.l.]: Universidad Nacional de Educación a Distancia. ISBN 978-84-362-4396-3 
  • Estela Beatriz García Fernández, El "ius Latii" y la municipalización de Hispania: aspectos constitucionales, Universidad Complutense, 2001. ISBN 84-8466-050-8.

Referências

  1. a b Tranoy, Alain (1981). Diffusion de Boccard, ed. La Galice romaine (em francês). Paris: [s.n.] p. 30 
  2. «Lex Plautia Papiria» 
  3. «Oxford Classical Dictionary: Cisalpine Gaul (northern Italy)» 
  4. «Lex Roscia» 
  5. «artehistoria.jcyl.es». Cópia arquivada em 31 de janeiro de 2012 
  6. Así A. B. Bosworth, “Vespasian and the provinces. Some problems of the early 70 s A.D.”, en Athenaeum 1973, 49-78; A.N. Sherwin-White, The Roman Citizenship, 1980, p. 36l
  7. G. Zecchini, “Plinio il Vecchio e la lex Flavia municipalis”, en ZPE 84, 1990, 139 ss.
  8. Alicia M. Canto, "Oppida stipendiaria: Los municipios flavios en la descripción de Hispania de Plinio", CuPAUAM 23, 1996, págs. 212-243 alega que no ano 70-71 Vespasiano necessitava do apoio provincial, contra troca de favores, como outros imperadores anteriores
  9. H. von Braunert, «Ius Latii in den Staatsrechten von Salpensa und Malaca, Corolla memoriae E. Swoboda dedicata, Graz/Colonia, 1966, pp, 70 ss.
  10. R. Wiegels, “Das Datum der Verleihung des Ius Latii an die Hispanier”, en Hermes 106, 1978, 196 ss., etc.
  11. «Dr. Christopher J. Dart:The Social War, 91 to 88 BCE.A History of the Italian Insurgency against the Roman Republic» 
  12. «Enciclopedia Treccani: Guerra social (91-89 a.C.)»