Fera da Penha

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Fera da Penha
Nome Neyde Maia Lopes
Pseudônimo(s) Mulher Fera
Frankenstein de Saias
Mulher Monstro
Besta Humana
Escorpião Fêmea
Primeira Psicopata Superstar
Fera da Penha
Data de nascimento 17 de dezembro de 1938
Local de nascimento Rio de Janeiro, DF
Data de morte 2 de maio de 2023 (84 anos)
Local de morte Rio de Janeiro, RJ
Nacionalidade(s) brasileira
Crime(s) sequestro e homicídio triplamente qualificado
Pena 33 anos de prisão
Situação Liberada por bom comportamento, após cumprir 15 anos de prisão.

Neyde Maia Lopes, mais conhecida como Fera da Penha (Rio de Janeiro, 17 de dezembro de 1938 — Rio de Janeiro, 2 de maio de 2023), foi presa pelo sequestro e assassinato de uma criança de 4 anos. O caso, ocorrido em 30 de junho de 1960, chocou a sociedade brasileira da época, tendo sido amplamente divulgado pela mídia.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Neyde era filha de Benjamin Lopes e Cândida Maia Lopes. Na infância, sofreu com a superproteção dos pais, que não a deixavam brincar com outras crianças. No início de sua adolescência, sofria com comentários sobre seu nariz ligeiramente adunco, sua acne e outras características físicas. Durante sua adolescência, começou a ler contos e romances policiais, o que assustava aos pais e a irmã Marilda. Tendo o rosto coberto pela acne e insatisfeita com seu nariz, sua autoestima era baixa, e ela também não se depilava. Conforme é relatado no diário que escreveu durante os anos de prisão, namorou com um rapaz chamado William, antes do relacionamento com Antônio. Tal relacionamento consta como um fiasco, sendo que Neyde sofria com os ciúmes excessivos do namorado.

Seu novo namorado era Antônio Couto Araújo, natural de Conceição do Coité, na Bahia, nascido em 3 de março de 1933. Era casado com Nilza Coelho, natural do Rio de Janeiro e tinha duas filhas, uma delas, Tânia Maria, nascida no Rio de Janeiro em 31 de janeiro de 1956, e a outra, a mais velha, Solange.

Neyde trabalhava na empresa Ducal, no Centro da Cidade do Rio de Janeiro, e Antônio, na casa do senhor Renato Mascarenhas Branco, funcionário da empresa Vale do São Francisco no bairro de Fátima. Em meados do final do ano de 1959, Neyde conheceu Antônio. Os dois trocaram alguns olhares até que ele a abordou. Com o tempo, começaram a conversar e iniciaram um caso amoroso. Durante cerca de 3 meses, se encontraram em diversos locais da cidade do Rio de Janeiro.

Um dia, um senhor de cerca de 50 anos, abordou Neyde e disse que conhecia Antônio, e que ele tinha uma esposa e duas filhas. A partir de então, Neyde começou a seguir Antônio, e descobriu tudo sobre sua família. Durante alguns meses, ela rondou a residência do casal na rua Antônio Vargas 108, em Piedade, subúrbio carioca, utilizando a desculpa de que tinha estudado com Nilza no colégio Duque de Caxias e estava interessada amorosamente em seu irmão, Nelson Coelho. Até que um dia decidiu sequestrar Tânia Maria, filha mais nova do ex-amante, na tentativa de ameaça-lo, ao descobrir que ela era o "xodó" de Antônio. Ressalva-se que desde o surgimento desta história, havia um boato de que Antônio havia forçado Neyde a fazer um aborto. Essa informação não foi esclarecida até os dias de hoje, porém consta no diário de Neyde, onde ela diz que após a descoberta da gravidez iria romper com Antônio, explicar aos pais que estava grávida e criaria sozinha o seu filho. Se a tal história fosse verdadeira, a partir deste ocorrido Neyde ganharia o rancor suficiente para cometer o crime em questão.[1]

Crime[editar | editar código-fonte]

No dia 30 de junho de 1960, Neyde acordou disposta a por um fim na farsa do amante. Ela então ligou para o Instituto Joemar, localizado na rua Gonçalo Coelho, 223, em Piedade, e disse ser Nilza, a mãe de Tânia Maria. Ela citou o nome de uma vizinha, que se chamaria Odete, e que tinha de ir a uma consulta no seu médico em outro bairro, deixando a responsabilidade de buscar a filha mais cedo com ela. Neyde então chegou ao colégio dizendo ser Odete, e por conta da falta de prevenção e monitoramento à sequestros nos colégios nesta época, conseguiu levar a criança. Ao chegar ao Instituto, por volta das 14h, para levar a merenda de Tânia, Nilza descobriu que sua filha havia sido retirada por outra mulher, assim, junto da dona do Joemar, comunicou o sequestro à polícia.

Durante a tarde, Neyde passeou com a menina em várias ruas e bairros do Rio, dando-lhe balas, pipoca e comprando um frasco de álcool, que segundo ela seria para fazer um remédio para um resfriado. Chegou a levar a menina até a casa de Zizélia, residente no conjunto habitacional Iapi da Penha na época. Zizélia havia sido inquilina de sua avó, e tinha forte amizade com ela. Conversaram e ela disse que a menina era filha de sua amiga que vivia no bairro de Cavalcanti. Neste momento, a amiga estranhou o fato de Neyde ter retirado uma mecha de cabelo da menina (provavelmente para que pudesse provar à Antônio que tinha raptado sua filha). Durante esse período, Neyde ligou diversas vezes para a casa da família, dizendo estar com a menina.[2][3] Ao cair da noite, por volta das 20h, Neyde levou Tânia a um galpão do Matadouro da Penha. Munida de um revólver calibre 32, atirou na nuca da criança à queima roupa. Tentando ocultar o cadáver, pois o local era habitado por urubus que carregavam as carcaças dos animais ali jogadas, Neyde incendiou o corpo de Tânia, evadindo-se do local pouco tempo depois.[4] Porém, foi vista por funcionários do matadouro que comunicaram o ocorrido à polícia. O corpo de Tânia estampou os jornais do dia seguinte, comovendo toda a população.

Investigações[editar | editar código-fonte]

Por volta das 23h, um funcionário do Matadouro da Penha passava com seu cavalo pelos arredores do local, quando subitamente o animal se assustou com uma fogueira. Após apear do animal, o funcionário descobriu o corpo carbonizado de Tânia no interior da fogueira.[5] A notícia se espalhou rapidamente e, pouco tempo, a polícia chegou ao local. Confrontada pela polícia e pela imprensa com a notícia da descoberta do corpo, Neyde confessou o crime durante entrevista ao jornalista Saulo Gomes.[6]

Durante investigações sobre o sequestro de sua filha Tânia, Antônio confessa à polícia que manteve um relacionamento extraconjugal com Neyde durante 6 meses, o que leva a polícia a detê-la para averiguações durante todo o dia 1º de julho. Pressionada, Neyde, a princípio, nega o crime diante das autoridades e da imprensa presentes.

Detida no 24º distrito, no bairro de Encantado, Neyde precisou ser transferida ao prédio da Polícia Central, por conta do risco de invasão da delegacia por parte de populares. Durante a transferência, cerca de 300 pessoas depredaram uma viatura de polícia, utilizada para despistar a viatura que conduzia a criminosa. Nesse momento, a imprensa cria a alcunha de Fera da Penha para batizar o caso. Alguns dias depois, a polícia cancelou a reconstituição do caso após centenas de moradores da Penha terem se organizado para linchar Neyde, no local do crime.[7] Após alguns dias detida na Polícia Central, a assassina foi transferida para a Penitenciária Lemos Brito, em Bangu.[8]

Julgamento[editar | editar código-fonte]

O julgamento ocorreu entre 4 e 5 de outubro de 1963. Após 16 horas de sessão, o júri votou pela condenação de Neyde, pelo sequestro (7 votos a 0) e pelo homicídio (6 votos a 1). O juiz Bandeira Stampa, presidente do II Tribunal do Júri, proferiu a sentença de 33 anos de prisão (30 pelo homicídio e 3 pelo sequestro) em regime fechado.[9] Por conta da pena ter ultrapassado mais de 20 anos, um segundo julgamento foi solicitado pelo advogado de defesa. Esse julgamento ocorreu apenas entre 20 e 21 de abril de 1964.[10] Esse segundo julgamento apenas confirmou a sentença (por 6 votos a 1). A decisão dos julgamentos só seria confirmada pela justiça em 1966.[1]

Consequências[editar | editar código-fonte]

Ao cumprir 15 anos de prisão (sendo sua pena reduzida através de indulto de 33 para 21 anos), Neyde Maia Lopes foi solta em 9 de outubro de 1975.[11] Viveu durante todo o seu tempo restante com seus pais até eles morreram. Possuía como “hobbies” apenas atividades comuns de uma idosa, como assistir programas de televisão e era uma senhora reclusa.

Os pais de Tânia permaneceram juntos após a tragédia. Nilza perdoou o marido e o casal teve mais três filhas. A menina foi enterrada no cemitério de Inhaúma. Seu túmulo tornou-se ponto de peregrinação de fiéis de diferentes denominações religiosas, que associam a menina como benfeitora de muitos milagres.[12]

Neyde Maia Lopes faleceu em 2 de maio de 2023, no hospital Souza Aguiar, no Rio de Janeiro. A causa da morte foi acidente vascular cerebral.[13]. Foi sepultada no dia seguinte no cemitério do Caju, na cidade do Rio de Janeiro.

Na cultura popular[editar | editar código-fonte]

O caso da Fera da Penha causou grande impacto na sociedade brasileira na década de 1960, tendo sido retratado nos principais jornais e revistas do país, além de ter sido relatado em livros e utilizado como base para filmes e programas de televisão. O interesse pelo caso foi diminuindo nas décadas seguintes, de forma que acabou caindo no esquecimento.

Filmes[editar | editar código-fonte]

Televisão[editar | editar código-fonte]

  • Culpado ou inocente (1983) — Rede Bandeirantes.[16]
  • Linha Direta Justiça (2003) — Rede Globo.[17]

Livros[editar | editar código-fonte]

  • Os olhos dourados do ódio (1962), de José Carlos Oliveira.
  • Cracterísticas do crime esquizofrênico (1965), de José Alves Garcia.
  • Alguns casos de polícia (1978), de José Monteiro.[18]
  • Crimes que abalaram o Brasil (2007), de Marcelo F. de Barros, Wilson Aquino, George Moura e Flávio Araújo.[19][20]
  • Mulheres do Brasil, a história não contada (2018), de Paulo Rezzutti.

Referências

  1. a b Fritz Utzéri (28 de outubro de 1979). «Os juris que fizeram história- Junho de 1960 - A fera da Penha». Jornal do Brasil, Ano LXXXIX,edição 203, caderno Especial, página 3-republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. Consultado em 25 de março de 2014 
  2. «Depois de sequestrarem a menor (4 anos) mataram-na: presa uma das criminosas». Folha de S. Paulo, Ano XXXVI, edição 134, página 5. 2 de julho de 1960. Consultado em 25 de março de 2014 
  3. «Moça loura raptou Tânia». Jornal do Brasil , Ano LXX, número 153, páginas 1 e 10. 1 de julho de 1960. Consultado em 25 de março de 2014 
  4. «Neide confessa:matou.». Jornal do Brasil, Ano LXX, edição 151, páginas 1 e 7- republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 2 de julho de 1960. Consultado em 25 de março de 2014 
  5. «Monstruoso: criança de 4 anos é raptada e assassinada na Penha». Última Hora, Ano X, edição 3060, páginas 1 e 2 - republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 1 de julho de 1960. Consultado em 25 de março de 2014 
  6. Linha Direta-Justiça (30 de outubro de 2003). «Casos- Fera da Penha». Rede Globo. Consultado em 25 de março de 2014 
  7. «Povo esperou a assassina da menina Tânia Maria para linchá-la». Jornal do Brasil, Ano LXX,edição 156, página 10-republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. Consultado em 25 de março de 2014 
  8. «Neide Maia irá para Bangu amanhã se melhorar seu estado físico: muito fraca». Jornal do Brasil, Ano LXX, edição 161, página 9-republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 10 de julho de 1960. Consultado em 25 de março de 2014 
  9. «Mulher que matou menina na Penha foi condenada a 33 anos de prisão». Jornal do Brasil, Ano LXXIII, número 234, páginas 1 e 25- republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 6 de outubro de 1963. Consultado em 25 de março de 2014 
  10. «Juri de Neide finda hoje». Jornal do Brasil , Ano LXXIV, edição 93, página 18-republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 21 de abril de 1964. Consultado em 25 de março de 2014 
  11. «Mulher que matou e queimou menina na Penha há 15 anos ganha liberdade condicional». Jornal do Brasil, Ano, edição, página - republicado pela Biblioteca Nacional- hemeroteca digital brasileira. 10 de outubro de 1975. Consultado em 25 de março de 2014 
  12. Bruno Rohde (5 de março de 2011). «Mãe de Taninha, morta pela Fera da Penha há 50 anos, ainda chora pela filha». Extra. Consultado em 25 de março de 2014 
  13. Certidão TJRJ
  14. Banco de Conteúdos Culturais. «Crime de Amor». Cinemateca Brasileira. Consultado em 25 de março de 2014 
  15. Rodrigo Fonseca (7 de outubro de 2013). «'O lobo atrás da porta' tem melhor boca a boca da competição». O Globo. Consultado em 25 de março de 2014 
  16. «Propaganda da Rede Bandeirantes sobre o caso- Programa Culpado ou Inocente». Jornal do Brasil, Ano XCIII, edição 169, página 4-republicado pela Biblioteca nacional - Hemeroteca digital brasileira. 24 de setembro de 1983. Consultado em 25 de março de 2014 
  17. Linha Direta Justiça (2003). «Fera da Penha». Rede Globo. Consultado em 25 de março de 2014 
  18. «Reporter policial lança livro». Jornal do Brasil, Ano LXXXVIII, edição 160, página 22. 15 de setembro de 1978. Consultado em 25 de março de 2014 
  19. Marcelo F. de Barros, Wilson Aquino, George Moura e Flávio Araújo (2007). «Crimes que abalaram o Brasil». Google books. Consultado em 25 de março de 2014 
  20. Jorge Antonio Barros (9 de julho de 2007). «O diário da Fera da Penha». O Globo. Consultado em 25 de março de 2014