Segunda lei da termodinâmica

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

A segunda lei da termodinâmica ou segundo princípio da termodinâmica expressa, de uma forma concisa, que "a quantidade de entropia de qualquer sistema isolado termodinamicamente tende a incrementar-se com o tempo, até alcançar um valor máximo". Mais sensivelmente, quando uma parte de um sistema fechado interage com outro sistema em contato térmico, a energia tende a dividir-se por igual entre os sistemas até que o sistema alcance um equilíbrio termodinâmico.

Enquanto a primeira lei da termodinâmica estabelece a conservação de energia em qualquer transformação, a segunda lei estabelece condições para que as transformações termodinâmicas possam ocorrer espontaneamente. Historicamente, a segunda lei foi estabelecida como um conceito empírico, ou seja, um axioma, relacionado com a transformação de calor em trabalho em processos cíclicos. Para que houvesse trabalho líquido no ciclo, deveria haver duas fontes térmicas mantidas a temperaturas diferentes entre si.

Descrição geral[editar | editar código-fonte]

Num sentido geral, a segunda lei da termodinâmica afirma que as diferenças entre sistemas em contato tendem a igualar-se. As diferenças de pressão, densidade e, particularmente, as diferenças de temperatura tendem a equalizar-se. Isto significa que um sistema isolado chegará a alcançar uma temperatura uniforme em todos os pontos. Se houver regiões com diferentes temperaturas e estiverem em contato, haverá a transferência de energia térmica (calor) da região mais quente para a região mais fria. Isso é útil para máquinas que transformam calor (provindo de uma fonte quente) em trabalho (transferência de energia útil). A segunda lei da termodinâmica originou-se historicamente sobre o estudo de eficiência de uma máquina térmica, ou seja, um dispositivo que provê trabalho graças à diferença de temperatura entre dois corpos, transformando calor em trabalho.[1] Dado que qualquer máquina termodinâmica requer uma diferença de temperatura, se deriva que nenhum trabalho útil pode extrair-se de um sistema isolado em equilíbrio térmico, isto é, requererá de alimentação de energia do exterior.

Uma das consequências da segunda lei é o fato pelo qual não se pode criar uma máquina de movimento perpétuo com 100% de eficiência. Esses achados foram derivados do teorema de Carnot, que imaginou uma máquina térmica de motor perpétuo com eficiência máxima. Assim, o calor devia ser absorvido da fonte quente e transformado em trabalho de forma reversível, e o retorno ao ponto inicial deveria ocorrer com a máquina perdendo energia na forma de calor para uma fonte fria, também de forma reversível. Para que a máquina pudesse ser aquecida ou resfriada ela deveria passar por processos adiabáticos reversíveis. Durante esse processo cíclico, ocorrendo sempre reversivelmente (com a eficiência máxima), a quantidade de trabalho líquido gerado pela máquina sempre seria menor que a quantidade fornecida de calor pela fonte quente, de forma que a eficiência nunca poderia ser igual ou maior que 100%.

Assim, para descrever matematicamente esse axioma, mais tarde, Rudolf Clausius propôs uma nova função termodinâmica, entropia, S, cuja variação era igual ao calor reversível (que seria absorvido ou liberado durante a transformação) sobre a temperatura do sistema. Clausius percebeu que a entropia era função de estado (não dependia do caminho percorrido pela transformação), e que ela sempre deveria aumentar para processos espontâneos que ocorressem em sistemas isolados. Para transformações que ocorressem em sistemas abertos, a entropia do universo (sistema + vizinhanças) deveria aumentar até alcançar um valor máximo, quando atingiria o equilíbrio termodinâmico.

Embora essas ideias tenham sido aplicadas primariamente a processos envolvendo a expansão e o aquecimento de gases perfeitos, mais tarde, com a ajuda de Josiah W. Gibbs, adaptou-se a segunda lei da termodinâmica para processos envolvendo mudanças de fases, misturas não ideais, e reações químicas, assiciando o aumento de entropia das vizinhanças à liberação de energia pelo sistema químico devido à formação de interações químicas mais estáveis (mais fortes). Nesse sentindo, a energia tenderia a se dispersar não só pela matéria mais aleatoriamente distribuída (entropia do sistema), mas também pela liberação de energia à vizinhança devido à afinidade química (entropia da vizinhança, ou energia entálpica).

Posteriormente, os trabalhos de mecânica estatística de Boltzmann e o desenvolvimento da teoria quântica deram um embasamento atômico-molecular para o conceito de entropia, assim como a ideia de espontaneidade envolvida em reações químicas e em mudanças de fases associando entropia como distribuição de matéria em níveis energéticos.

Enunciados[editar | editar código-fonte]

Rudolf Clausius

A segunda lei da termodinâmica tem sido expressada de muitas maneiras diferentes. Sucintamente, pode-se expressar assim:

  • É impossível construir um dispositivo que opere, segundo um ciclo, e que não produza outros efeitos, além da transferência de calor de um corpo frio para um corpo quente.[2]

Em outras palavras:

É impossível a construção de um dispositivo que, por si só, isto é, sem intervenção do meio exterior, consiga transferir calor de um corpo para outro de temperatura mais elevada
Enunciado de Clausius.

Deste enunciado, pode-se estabelecer a impossibilidade do "refrigerador ideal". Assim, todo aparato refrigerador, para retirar calor de um ambiente, produzirá mais calor externamente.

  • É impossível construir um dispositivo que opere num ciclo termodinâmico e que não produza outros efeitos além do levantamento de um peso e troca de calor com um único reservatório térmico.[3]

Em outras palavras:

É impossível a construção de um dispositivo que, por si só, isto é, sem intervenção do meio exterior, consiga transformar integralmente em trabalho o calor absorvido de uma fonte a uma dada temperatura uniforme.
Enunciado de Kelvin-Planck.

Deste enunciado, tem-se como consequência a impossibilidade do "motor ideal". Toda a máquina produzirá energia a ser utilizada com desperdício de parte desta em calor a ser perdido. Disto, já era citado por Carnot (Nicolas Léonard Sadi Carnot - físico francês 1796 - 1832): Para transformar calor em energia cinética, utiliza-se uma máquina térmica, porém esta não é 100% eficiente na conversão.

Alguns autores chamam tal enunciado como "postulado" de Kelvin e assim o descrevem: Nenhum processo é possível onde o único resultado é a absorção de calor de um reservatório e sua conversão completa em trabalho.

Destas definições pode-se associar também o enunciado de Carnot: Para que uma máquina térmica realize trabalho são necessárias duas fontes térmicas de diferentes temperaturas.

Visualizações da segunda lei[editar | editar código-fonte]

Graficamente se pode expressar imaginando uma caldeira de um barco a vapor. Esta não poderia produzir trabalho se não fosse porque o vapor se encontra a temperaturas e pressão elevadas comparados com o meio que a rodeia.

Uma outra maneira de ver a segunda lei é pela observação da sua relevância. A primeira lei é na verdade, um princípio de contabilidade de energia: as parcelas de energia devem ser somadas. Ou seja, a primeira lei trata das quantidades de energia. A segunda lei, entretanto, ao dizer que energia cinética (por exemplo) pode ser integralmente transformada em energia térmica (calor) mas não ao contrário, indica uma qualidade para a energia:

Exemplarmente, pode-se imaginar um automóvel a 50 km/h. Ele é subitamente freado. Toda a sua energia cinética será eventualmente transformada em energia interna das pastilhas de freio (e outras fontes de atrito) que se aquecerão. Finalmente, uma certa quantidade de calor será transferida para o meio ambiente. Entretanto, se eu ceder esta mesma quantidade de calor ao automóvel (ou ao freio), ele não sairá do lugar.

Tais questões de eficiência, tem profundas implicações no projeto de máquinas, equipamentos e diversos processos industriais.[4]

Equacionamento[editar | editar código-fonte]

Matematicamente, expressa-se assim:

onde S é a entropia, dt é o infinitésimo de tempo e o símbolo de igualdade só existe quando a entropia se encontra em seu valor máximo (em equilíbrio).

Outra maneira mais simples de expressar a segunda lei é: A entropia de um sistema isolado nunca decresce. Mas é uma má interpretação comum que a segunda lei indica que a entropia de um sistema jamais decresce. Realmente, indica só uma tendência, isto é, só indica que é extremamente improvável que a entropia de um sistema fechado decresça em um instante dado.

Como a entropia está relacionada ao número de configurações de mesma energia que um dado sistema pode possuir, podemos nos valer do conceito subjetivo de desordem para facilitar a compreensão da segunda lei (embora entropia não seja essencialmente desordem[5]). Ou seja, a segunda lei afirma, à grosso modo, que a desordem de um sistema isolado só pode crescer ou permanecer igual.

Citações[editar | editar código-fonte]

Disse Arthur Eddington:

A lei que afirma que a entropia cresce — a segunda lei da termodinâmica tem, segundo o meu pensamento, a posição suprema entre as leis da natureza. Se alguém insistir que a sua teoria preferida do Universo está em desacordo com as equações de Maxwell — então tanto pior para as equações de Maxwell. Se elas contradisserem a observação — bem, essas experiências às vezes dão errado. Mas se a sua teoria está em oposição à segunda lei da termodinâmica, então não posso lhe dar esperança alguma: não há nada a esperar dela, senão cair na maior humilhação.[6]

Isaac Asimov explica a tendência da entropia crescente e suas consequências de uma forma simples:

A Segunda Lei da Termodinâmica afirma que a quantidade de trabalho útil que você pode obter a partir da energia do universo está constantemente diminuindo. Se você tem uma grande porção de energia em um lugar, uma alta intensidade dela, você tem uma alta temperatura aqui e uma baixa temperatura lá, então você pode obter trabalho dessa situação. Quanto menor for a diferença de temperatura, menos trabalho você pode obter. Então, de acordo com a Segunda Lei da Termodinâmica, há sempre uma tendência para as áreas quentes se resfriarem e as áreas frias se aquecerem - assim cada vez menos trabalho poderá ser obtido. Até que finalmente, quando tudo estiver numa mesma temperatura, você não poderá mais obter nenhum trabalho disso, mesmo que toda a energia continue lá. E isso é verdade para TUDO em geral, em todo o universo. (Em The Origin of the Universe em ORIGINS: How the World Came to Be, série em vídeo, Eden Communications, EUA, 1983.)

Questões específicas[editar | editar código-fonte]

Entropia em mecânica estatística[editar | editar código-fonte]

Se para um sistema de partículas em equilíbrio térmico se conhece a função de partição Z, dada pelos métodos da mecânica estatística clássica se pode calcular a entropia mediante:

Onde kB é a constante de Boltzmann, T a temperatura e as probabilidades Pj que aparecem no somatório vêm dadas pela temperatura e a energia dos microníveis de energia do sistema:

Entropia de Von Neumann na mecânica quântica[editar | editar código-fonte]

No século XIX o conceito de entropia foi aplicado a sistemas formados por muitas partículas que se comportam classicamente, em princípios do século XX Von Neumann generalizou o conceito de entropia para sistemas de partículas quânticas, definindo para um estado mescla caracterizado por uma matriz densidade ρ a entropia quântica de Von Neumann como a magnitude escalar:

Entropia generalizada em relatividade geral[editar | editar código-fonte]

O intento de estender a análise termodinâmica convencional ao universo inteiro levou a se examinar em princípios dos anos 70 o comportamento termodinâmico de estruturas como os buracos negros. O resultado preliminar desta análise revelou algo muito interessante, que a segunda lei tal como havia sido formulada convencionalmente para sistemas clássicos e quânticos poderia ser violada em presença de buracos negros.

Entretanto, os trabalhos de Jacob D. Bekenstein sobre teoria da informação e buracos negros sugeriram que a segunda lei seguiria sendo válida se fosse introduzida uma entropia generalizada (Sgen) que somada à entropia convencional (Sconv), a entropia atribuível aos buracos negros que depende da área total (A) de buracos negros no universo.

Concretamente esta entropia generalizada deve definir-se como:

Onde, k é a constante de Boltzmann, c é a velocidade da luz, G é a constante de gravitação universal e é a constante de Planck racionalizada.

Entropia na cosmologia[editar | editar código-fonte]

Em cosmologia, na evolução do universo no tempo verifica-se uma diminuição da quantidade de energia disponível para a realização de trabalho. Tal implica uma limitação no tempo da existência do universo tal como se apresenta, pois o sentido natural das mudanças da natureza é o que origina uma diminuição da qualidade da energia. Teoricamente, o universo seria o único sistema realmente isolado, e como tal, nele, a quantidade de energia útil nunca aumenta.[7]

Tal questão tem profundas implicações em filosofia no tratamento do que chamamos tempo em física[8] e num entendimento do universo com este como uma de suas dimensões e neste em sua história e evolução, implicando difíceis tratamentos no que sejam os modelos cíclicos, entre estes o modelo de universo oscilante ou "grande rebote (big bounce)".[9]

A segunda lei da termodinâmica e o criacionismo[editar | editar código-fonte]

Tais conceitos tem trazido algumas distorções desta teorização, principalmente por alguns defensores do criacionismo a respeito dos seres vivos e de sua evolução.[10][11][12][13][14]

A afirmação criacionista[editar | editar código-fonte]

A afirmação dos criacionistas é que o Universo tenderia obrigatoriamente da ordem à desordem, do mais complexo ao mais simples, tornando a origem química da vida (biopoese), o processo evolutivo dos seres vivos, sua formação e regeneração de tecidos a partir da alimentação (como a síntese de proteínas ou a formação de glicose), sua reprodução, a formação de cristais e até a agregação dos corpos celestes, impossível.[15][16][17]

O erro fundamental do argumento[editar | editar código-fonte]

Mas a segunda lei da termodinâmica não faz tais afirmações, pois a entropia da termodinâmica não mede o aumento ou diminuição da complexidade dos sistemas, nem seu aumento ou diminuição de ordem.[18] A segunda lei apenas afirma que calor não flui espontaneamente de um corpo a mais baixa temperatura para um corpo de mais alta. Equivalentemente, que a energia que pode efetivamente ser transformada em trabalho em um sistema isolado nunca aumenta.[nota 1]

Visto que o planeta Terra (assim como qualquer outro) não é um sistema fechado (e é de se observar que sistemas plenamente fechados e isolados não existem na prática), a entropia termodinâmica pode diminuir. A radiação do Sol (com baixa entropia) ilumina e aquece a Terra (com alta entropia). Desse fluxo de energia, somado as mudanças de entropia que o acompanha, podem e de fato permitem que a entropia termodinâmica diminua localmente na Terra.[19]

Richard Dawkins, no seu livro "O maior espetáculo da Terra" trata deste argumento, mostrando que quando criacionistas afirmam, até frequentemente, que a evolução biológica contradiz a segunda lei da termodinâmica, estariam mostrando unicamente que não entendem tal lei, pois já não há contradição por causa óbvia da ação do Sol, pois todo sistema, quer estejamos falando sobre a vida, quer sobre as massas de água em seu ciclo na Terra, é em última análise dependente do constante fluxo de energia proveniente desta estrela. Da mesma maneira que jamais desobedece as leis da física e da química, e nunca desobedecendo à segunda lei, a energia do Sol abastece os processos da vida, de modo que, por uma complexa rede de processos, limitada por tais leis, proporciona as estruturas e processos repletos de complexidade, diversidade, e a ilusão de improbabilidade estatística e design dos quais a vida é dotada.

Uma das maneiras mais simples de mostrar que o argumento criacionista é equivocado do ponto de vista químico (e consequentemente no bioquímico) é apresentar reações químicas simples, que ocorrem naturalmente com complexidade crescente formada, como a formação de ácido carbônico, sulfuroso e sulfúrico, a partir da reação de óxidos (respectivamente dióxido de carbono, dióxido e trióxido de enxofre) com água:[nota 2]

CO2 + H2O → H2CO3
SO2 + H2O → H2SO3
SO3 + H2O → H2SO4

Além de todas as polimerizações, onde há crescente complexação molecular, como a polimerização do polietileno:

n C2H2(CH2-CH2)n

Ou, por vias completamente naturais, a polimerização da glicose formando a celulose:

Apesar de entropia termodinâmica e desordem serem muitas vezes correspondentes, nem sempre o são. Algumas vezes a ordem aumenta junto com a entropia.[18][20] O aumento de entropia termodinâmica pode até produzir ordem, como ordenar moléculas por seu tamanho, incluindo o próprio DNA dos seres vivos, ou partículas coloidais em soluções de eletrólitos.[21][22][23] Mesmo em um sistema considerado para efeitos práticos fechado, regiões de baixa entropia podem se formar se eles estão separados de outros locais com alta entropia no sistema.[24]

Muitas vezes, uma ordem aparentemente surpreendente aparece naturalmente, em processos geológicos, por exemplo. O Calçada dos Gigantes (Giant's Causeway) na Irlanda do Norte consiste de grandes colunas de pedra apresentando secção reta hexagonal, dando a impressão de terem sido projetadas. Foram formadas quando o magma incandescente chegou à superfície da Terra e resfriou-se. Tais tipos de ordem originando-se do caos (emergência) podem ser vistos igualmente em círculos de cascalho e pedras que ocorrem naturalmente numa ilha do norte da Noruega. Pode-se discutir os processos específicos de organização das colunas e dos círculos de pedras, mas a entropia do magma e das pedras diminuiu, ainda que a entropia de seus ambientes tenha aumentado.[25]

Ao nível microscópico ou molecular, exemplos concretos da não correspondência entre entropia e desordem são comuns:[18][26][27]

  • A comparação da entropia de gases de diferentes massas moleculares, como o hélio e o neônio, sob iguais condições físicas, por exemplo, evidenciará que as moléculas de hélio (no caso, seus átomos isolados, pois um gás nobre), sendo de menor massa, apresentarão maiores velocidades, o que implicará numa "desordem" maior. Mas realmente a entropia do neônio será mais alta.
  • O fenômeno de fases reentrantes, que é observado em diversos cristais líquidos, em materiais com propriedades de supercondução, e até em sistemas mais convencionais, como as misturas de nicotina e água.[28] Nestas misturas, entre diversas características, o diagrama temperatura–composição apresenta uma temperatura crítica de solução superior e outra inferior. Deste modo, em temperatura suficientemente elevada, uma mistura de nicotina e água forma uma fase homogênea. Com o abaixamento da temperatura, num espectro relativamente estreito de composições observa-se a separação em duas fases típicas, uma rica em água, e a outra rica em nicotina. Com a continuidade do resfriamento, a um dado ponto surgirá uma só fase homogênea. A separação destas duas fases sugere uma diminuição da "desordem", enquanto a segunda transformação aponta para uma "ordem". Entretanto, a entropia diminuirá continuamente ao longo de todo o processo, pois o resfriamento implica a energia ter sido continuamente retirada.
  • Outro exemplo é a cristalização em soluções sobressaturadas, quando é considerada uma solução sobressaturada num recipiente adiabático, onde, espontaneamente, deverá ocorrerá a deposição de cristais do soluto. Este fenômeno sugere a diminuição da "desordem", dado que as moléculas ou íons de soluto estarão mais organizadas no cristal do que em solução. Mas sendo o sistema isolado, a entropia deverá aumentar durante o processo, como prenuncia a Segunda Lei da Termodinâmica. Esta conclusão é válida para o caso em que a cristalização seja exotérmica e a temperatura da mistura aumente durante o processo, ou no caso em que a cristalização for endotérmica e a temperatura diminua. No caso exotérmico, o aumento da temperatura da mistura justificaria o aumento da entropia, em contrabalanço à perda associada à cristalização. Entretanto, no caso endotérmico, esse argumento não pode ser aplicado. Como exemplo: as soluções sobressaturadas de sulfato de sódio, resfriam com a formação do sal na forma sólida.

Esta argumentação de uma associação direta entre entropia termodinâmica e a ordem ou desordem de sistemas é apresentada nos textos criacionistas seguidamente associada com uma passagem de um livro de divulgação científica de Isaac Asimov, que embora didática, é um tanto infeliz ao associar diretamente o conceito de entropia da termodinâmica com o que seja a deterioração de um sistema julgado como organizado pelo ser humano:

Outra maneira de expressar a segunda lei é, "O universo está constantemente se tornando mais desordenado!" Visto dessa maneira nós podemos ver a segunda lei por toda parte sobre nós. Precisamos trabalhar duro para arrumar uma sala, mas quando a deixamos por si mesma ela se torna bagunçada outra vez muito rapidamente e muito facilmente. Mesmo se nunca entrarmos nela, ela fica empoeirada e mofada. Como é difícil manter casas, máquinas e nossos próprios corpos em perfeita ordem de funcionamento: e como é fácil deixá-los se deteriorarem. De fato, tudo que precisamos fazer é não fazer nada, e tudo se deteriora, entra em colapso, se quebra, desbota, tudo por si mesmo - e é disso tudo que a segunda lei trata.[29]

História do argumento[editar | editar código-fonte]

A ideia de que entropia da termodinâmica é o mesmo que desordem foi primeiro divulgada por Duane T. Gish, do Institute for Creation Research (Instituto para Pesquisa da Criação).[30] Outros autores defensores destas ideias são Henry M. Morris e Harold L. Armstrong.[31][32][33]

Entropia e Evolução das espécies[editar | editar código-fonte]

A Segunda Lei da termodinâmica explica que a energia que pode efetivamente ser transformada em trabalho, em um sistema fechado, nunca aumenta. Portanto, com base essa lei da física as formas de vida primitivas que eram mais simples tendo menos capacidades e sistemas menos complexos, nunca poderiam ter evoluído tornando-se organismos melhor ordenados ao longo do tempo. Assim, tanto a teoria evolutiva e a segunda lei da termodinâmica não poderiam ser ambas corretas.[34]

Contudo, o planeta Terra não é um sistema fechado (a luz do Sol penetra a atmosfera, ilumina e esquenta a Terra). Esse fluxo de energia, e as mudanças de entropia que o acompanha de fato fazem a entropia diminuir localmente na Terra. Porém, todos os três princípios principais da evolução (variação, herdabilidade e seleção) acontecem e a entropia não impede a ocorrência deles. De fato, conexões entre evolução e entropia já foram estudadas profundamente, e a entropia nunca foi um impedimento à evolução [35][36][37][38][39]. Alguns físicos se propuseram a calcular o impacto da evolução no aumento de entropia da biosfera e suas adjacências e compará-lo com o aporte de energia fornecido pelo sol.[40] Daniel Styler demostrou em seu trabalho que o planeta Terra é banhado por cerca de um trilhão de vezes a quantidade de fluxo de entropia necessária para suportar a evolução da vida complexa.[41] De forma semelhante o físico Emory Bunn mostrou que a evolução da vida complexa existente é perfeitamente compatível com a segunda lei da termodinâmica.[42]

Diversos cientistas têm apresentado hipóteses que a evolução e a origem da vida tem como impulso a entropia.[43] Alguns deles veem a informação dos organismos sujeitos à diversificação de acordo com a segunda lei da termodinâmica, com organismos buscando o preenchimento de nichos vazios como um gás em expansão em um recipiente vazio.[44] Outros ainda propõe que sistemas complexos altamente organizados formam-se e modificam-se no tempo (evoluem) para dissipar energia (e aumentar a entropia) de forma mais eficiente.[45][46]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Notas[editar | editar código-fonte]

  1. Aqui os criacionistas distorcem as afirmações da termodinâmica, afirmando que a energia que poderia ser transformada em trabalho poderia aumentar com interferência externa, de forma intencional, o que descaracterizaria o sistema como fechado e mais uma vez, quebrando o que chama-se em Filosofia da Ciência "demarcação", colocando uma hipótese sobrenatural não falseável como causa de um fenômeno natural.
  2. Afirma-se que as reações químicas poderiam ter a ação indetectável de uma divindade pode até ter um nexo filosófico, mas igualmente seria uma argumentação não científica, pois infalseável e além da demarcação científica, tratando-se apenas de uma inserção de uma falácia do tipo "Deus das lacunas". Uma afirmação que determinados passos da reações químicas biológicas, estando estas relacionadas ou não ao processo evolutivo ou mesmo à origem da vida, tenham sido coordenadas por uma divindade pois desconhecemos como tenham se dado seria uma falácia do tipo argumentum ad ignorantiam.

Referências

  1. TIPLER, Paul A. (1978). Física. 1. Rio de Janeiro: Guanabara Dois. p. 448 
  2. VAN WYLEN, G.J.; SONNTAG, R.E.; BORGNAKKE, C. Fundamentos da termodinâmica. 5. ed. São Paulo: Edgard Blucher Ltda., 1998. 537p.
  3. A.W. Smith e J.N. Cooper, Elements of Physics, 8th edition (New York, New York: McGraw-Hill Publishing, 1972), p. 241.
  4. John McCarthy; The Second Law of Thermodynamics and Low Grade Mineral Ores; August 21, 1997; Stanford University - www-formal.stanford.edu
  5. Kestenbaum, David, 1998. Gentle force of entropy bridges disciplines. Science 279: 1849.
  6. Paul DAVIES, The Cosmic Blueprint. New York: Simon & Shuster, 1988, p. 20
  7. S. Gasstone, Textbook of Physical Chemistry (New York: D. Van Nostrand Company, 1946).
  8. Thermodynamic Asymmetry in Time - plato.stanford.edu (em inglês)
  9. Time Reversal Invariance - www2.slac.stanford.edu (em inglês)
  10. A Acalorada Questão TERMODINÂMICA - www.evo.bio.br
  11. Evolution and the Second Law of Thermodynamics - ai.stanford.edu (em inglês)
  12. Five Major Misconceptions about Evolution - "Evolution violates the 2nd law of thermodynamics." - www.talkorigins.org (em inglês)
  13. The Second Law of Thermodynamics, Evolution, and Probability - www.talkorigins.org (em inglês)
  14. Attributing False Attributes to Thermodynamics - www.talkorigins.org (em inglês)
  15. A 2a Lei da Termodinâmica invalida a TE - erros-criacionistas
  16. Frank Steiger; Segunda Lei da Termodinâmica, Evolução e Probabilidade - str.com.br
  17. Vasconcelos, L. (2005) Entropia e Segunda Lei da Termodinâmica. Projeto Evoluindo - Biociência.org.
  18. a b c FERREIRA, J. P. M. Como interpretar a entropia? SPQ – Sociedade Portuguesa de Química. Boletim 96, janeiro-março 2005.
  19. Marcus Valerio XR; A Acalorada Questão TERMODINÂMICA; Janeiro de 2001 - www.evo.bio.br
  20. Aranda-Espinoza, H., Y. Chen, N. Dan, T. C. Lubensky, P. Nelson, L. Ramos and D. A. Weitz, 1999. Electrostatic repulsion of positively charged vesicles and negatively charged objects. Science 285: 394-397.
  21. Han, J. and H. G. Craighead, 2000. Separation of long DNA molecules in a microfabricated entropic trap array. Science 288: 1026-1029.
  22. Jianzhong Wu, Dusan Bratko, and John M. Prausnitz; Interaction between like-charged colloidal spheres in electrolyte solutions; PNAS; The National Academy of Sciences, 1998
  23. M. B. McBride and P. Baveye; Diffuse Double-Layer Models, Long-Range Forces, and Ordering in Clay Colloids; Soil Science Society of America Journal 66:1207-1217 (2002)
  24. Haynie, Donald, T. (2001). Biological Thermodynamics. Cambridge: Cambridge University Press. ISBN 0-521-79549-4.
  25. Halliday D, Resnick R, Walker J. Fundamentos da Física. Vol. 2. 4 ª Edição. Livros Técnicos e Científicos.
  26. Lambert, F. L., Entropy is simple, qualitatively. J. Chem. Edu., 79 (2002,b) 1241-1246
  27. Wright, P. G., Entropy and disorder. Contemp.Phys., 11 (1970) 581-588
  28. Styer, D. F., Insight into entropy. Am. J. Phys., 68 (2000) 1090-1096
  29. Isaac Asimov, "In the Game of Energy and Thermodynamics You Can't Even Break Even", Smithsonian Institution Journal (June 1970), p. 6
  30. Duane T. Gish, "A Consistent Christian-Scientific View of the Origin of Life"; Creation Research Society Quarterly, Vol. 15, No. 4 (March 1979), pp. 185-203
  31. Henry M. Morris, The Biblical Basis for Modern Science (Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1984), pp. 185-215
  32. Henry M. Morris and Gary E. Parker, What Is Creation Science? (Santee, California: Master Books, 1982), pp. 153-188.
  33. Harold L. Armstrong, "Evolutionistic Defense Against Thermodynamics Disproved"; Creation Research Society Quarterly, Vol. 16, No. 4 (March 1980), pp. 226-227, 206, and Vol. 17, No. 1 (June 1980), pp. 72-73, 59.
  34. Gimbel, Steven; Schreiber, Alexander (março de 2010). «Evolution and the Second Law of Thermodynamics: Effectively Communicating to Non-technicians». Evolution: Education and Outreach (em inglês). 3 (1). 99 páginas. ISSN 1936-6434. doi:10.1007/s12052-009-0195-3 
  35. Demetrius, Lloyd, 2000. Thermodynamics and evolution. Journal of Theoretical Biology 206(1): 1-16.
  36. Atkins, P.W.; The Second Law. New York: Scientific American Books, 1984.
  37. Dickerson, R.E.; Molecular Thermodynamics. Menlo Park, CA: Benjamin, 1969.
  38. Klotz, I.M.; Energy Changes in Biochemical Reactions. New York: Academic Press, 1967.
  39. Kauffman, Stuart A.; The Origins of Order. New York: Oxford, 1993.
  40. «Termodinâmica e evolução: O velho argumento da segunda lei». Evolucionismo. 19 de junho de 2010 
  41. Styer, Daniel F. (13 de outubro de 2008). «Entropy and evolution». American Journal of Physics. 76 (11): 1031–1033. ISSN 0002-9505. doi:10.1119/1.2973046
  42. Bunn, Emory F. (16 de setembro de 2009). «Evolution and the second law of thermodynamics». American Journal of Physics. 77 (10): 922–925. ISSN 0002-9505. doi:10.1119/1.3119513
  43. McShea, Daniel W., 1998. Possible largest-scale trends in organismal evolution: eight live hypotheses. Annual Review of Ecology and Systematics 29: 293-318
  44. Brooks, D. R. and E. O. Wiley, 1988. Evolution As Entropy, University of Chicago Press.
  45. Schneider, Eric D. and James J. Kay, 1994. Life as a manifestation of the second law of thermodynamics. Mathematical and Computer Modelling 19(6-8): 25-48.
  46. GARROTE FILHO, M. S., PENHA-SILVA, N. Uma abordagem termodinâmica da vida. Revista Ciência Hoje, vol. 37, n° 221, novembro 2005.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

Tratamentos didáticos e em nível médio:

Em nível universitário: