Culinária da Galiza

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de Cozinha galega)
Polbo á feira, conhecido fora da Galiza como polvo à galega
Cozido galego

A culinária da Galiza tem uma grande tradição e variedade, sendo um dos aspetos mais importantes na cultura e sociedade galegas. As grandes refeições em grupo, tanto em família como em eventos ou encontros é um hábito muito arreigado na Galiza, onde têm lugar um grande número de festas gastronómicas, a maioria delas no verão.[1] Um dos seus maiores estudiosos foi o escritor Álvaro Cunqueiro.

Um dos produtos mais importantes e conhecidos da cozinha galega é o marisco, sobretudo nas zonas costeiras. "Cultivado" (em viveiros) nas rias galegas, muito ricas biologicamente, a sua qualidade é reconhecida mundialmente.[2] A carne e a verdura constituem igualmente a base de grande parte dos pratos da cozinha galega, que tipicamente são abundantes e com elevado teor calórico. Supostamente, isso deve-se à longa tradição de economia de subsistência, sobretudo nas zonas rurais, e à necessidade de ingerir alimentos com gorduras para combater o frio.

Petiscos[editar | editar código-fonte]

O petisco é um elemento caraterístico da gastronomia galega. Consiste numa pequena porção de comida, inferior a uma "dose" (em galego e castelhano: ración) habitualmente servida com uma bebida, em muitas ocasiões de forma gratuita, dependendo principalmente da província ou localidade, variando no preço e quantidade conforme os locais. Ao contrário de outras regiões, os petiscos galegos são substanciais e não se reduzem a simples azeitonas ou batatas. É frequente serem gratuitos ou de preço reduzido, sobretudo na província de Lugo, onde a sua gratuitidade, acompanhada por um vinho ou uma caña (equivalente ao chope, imperial ou fino) é uma tradição convertida em reclame turístico.[3]

Alguns exemplos de petiscos são:

  • Orelha e focinho (orella e morro) de porco, temperados com sal e pimenta.
  • Raxo ou zorza — lombo de porco temperado, o segundo mais condimentado e com pimenta.
  • Tortilla — conhecida em Portugal como tortilha espanhola, é uma espécie de omelete de batata.
  • Batatas cozidas, usualmente com pimenta ou em allada (molho à base de alho); é usual que as batatas novas sejam cozidas com casca (cachelos). A batata da Galiza (pataca de Galicia) é uma Indicação Geográfica Protegida (IGP).[4]
  • Lacão (lacón) ou presunto (xamón) assado, com molho; o lacão ou chispe é a pata dianteira do porco. O lacão da Galiza é uma Indicação Geográfica Protegida.[5]
  • Cogumelos ou champignons (os galegos fazem essa distinção), temperados e com salsa.
  • Lula (chipirón) e chocos (Sepia officinalis), fritos com a sua tinta ou guisados em molhos.
  • Polbo con cachelospolvo, que pode ser á feira (polvo à galega; ver descrição abaixo) com pedaços de batatas (cachelos) que foram cozidas com casca apenas em água e sal, muitas vezes com um loureiro.

Há também pratos que tanto são consumidos como petiscos como durante as refeições:polvo á feira, pimentos de Padrón, empanadas, caldo galego, etc.

Pratos[editar | editar código-fonte]

  • Caldo galego — Feito com grelo, couve-galega ou repolho, batatas, banha gordura de porco para dar substância, feijão e chouriço, lacão ou toucinho entremeado (com febra). Serve-se muito quente e antigamente era muitas vezes o único prato; atualmente serve-se como primeiro prato. A variedade do caldo sem verdura é conhecido como caldo branco.
  • Polbo á feira (polvo à feira) — É conhecido fora da Galiza por polvo à galega. Deve o seu nome ao facto de tradicionalmente ser preparado pelas pulpeiras (à letra: "polveiras") nas feiras de gado ou, mais recentemente, nas festas e romarias.[6] O polvo é cozido e temperado com sal grosso, pimenta e azeite. É acompanhado com cachelos.
  • Chouriço com cachelos (batatas cozidas) — Geralmente é também acompanhado com algumas verduras. É muito usual no meio rural, onde se usava um chouriço negro, confecionado especialmente para ser cozido, com as carnes menos valiosas procedentes da matança, principalmente coração e outras vísceras e gordura, junto com cebola e alho picados, pimentão e sal. Outra variedade muito popular é o "chouriço ceboleiro".
  • Cozido galego — É semelhante ao cozido madrileno, mas tende a ser mais abundante e pesado. Costuma levar toucinho, chouriço, frango ou galinha, grão-de-bico (garavanzo) e verduras.
  • Churrasco — Carne assada, geralmente na brasa (grelhada), mas também pode ser feito no forno. Usualmente servido com batatas fritas e com dois molhos (salsas), um picante e outro de alho.
  • Mariscada — Consiste num sortido de diversos mariscos, como lingueirão (navalha), lavagante (lumbrigante), lagosta, lagostim (cigala) ou camarão (gambas). Outros mariscos populares são a santola (centolo, centola), navalheira (nécora, uma espécie de caranguejo, sapateira (ou caranguejola, outra espécie de caranguejo; em galego: boi; em espanhol: buey de mar), o percebe, a vieira, a ferreirinha (ou bruxa; em galego e espanhol: santiaguiño)[7] e a ostra. A mariscada pode ser servida numa grande bandeja com os diferentes mariscos ou em bandejas com os produtos separados. Habitualmente é acompanhada com arrozes ensopados (que em Portugal se chamariam "malandros") e vinho branco.
  • Empanada — pastéis, geralmente recheados de carne ou peixe, feitos com massa de trigo, milho ou centeio; há uma grande variedade sabores e recheios. Os mais frequentes são a zorza (carne de porco) e outros tipos de carne, xouba (sardinhas pequenas), zamburiña (Chlamys varia, um bivalve semelhante à vieira, mas mais pequeno), bacalhau (geralmente com passas), atum ou vegetais.
  • Lacão (lacón) com grelos — É um prato consumido sobretudo no inverno e no entrudo (entroido), que consiste em lacão (presunto feito com as patas dianteiras do porco) que é dessalgado durante 48 horas e cozido com toucinho, chouriço, batata, grelos de nabo.[8] Tanto o lacão como o grelo galegos são produtos com Indicação Geográfica Protegida (IGP).[5][9]
  • Pimentos de Padrón — São uma variedade célebre de pimentos com caraterísticas únicas, típicas da freguesia de Herbón, no concelho de Padrón, província de Pontevedra. São consumidos sozinhos ou como acompanhamento de outros pratos. A sua produção está regulamentada pela Denominação de Origem Protegida (DOP) "Pimiento de Herbón".[10] Além dos pimentos de Padrón, as seguintes variedades galegas de pimentos têm Indicação Geográfica Protegida (IGP): pimento da Arnoia",[11] de Oímbra (comarca de Verín[12] e do Couto (comarca de Ferrol).[13]

É comum acompanhar as refeições com pão. O pão artesanal de trigo de Cea, na província de Ourense é famoso e está inclusivamente protegido por uma Indicação Geográfica Protegida (IGP).[14]

Sobremesas e doçaria[editar | editar código-fonte]

  • Tarte ou torta de Santiago — É um bolo feito com amêndoa e ovos. Distingue-se facilmente pela cruz de Santiago que é usada para decorar a parte superior,[15] feita tapando o centro com um molde com a forma da cruz e polvilhando com açúcar fino; quando o molde é retirado, a cruz fica desenhada na cor mais escura da massa, que contrasta com o brano do açúcar. Está protegida por uma Indicação Geográfica Protegida.[16]
  • Filloa ou freixós — Apresenta algumas semelhanças com os crepes ou panquecas. A massa é feita de farinha, leite e ovos, podendo também levar sangue de porco na época da matança deste animal.[17] O recheio pode ser mel, nata, chocolate ou outros cremes doces.
  • Bica ou bica mantecada — É um bolo típico sobretudo na província de Ourense, muito fofo, o que o torna adequado para acompanhar queijos gordos e acompanhar café ou licor. A bica feita nos concelhos de Avión e Beariz e na zona do Ribeiro não é doce e assemelha-se a uma empanada sem recheio, embora também por vezes seja consumida com recheio.
  • Leite fritido (frito) — Ao contrário do que o nome sugere, não é frito, mas sim cozido. Leva leite, açúcar, farinha, maizena (amido de milho), canela, casca de limão e manteiga.[18]
  • Torrijas — São basicamente rabanadas, ou seja, fatias de pão ensopado em leite, vinho, açúcar, etc., envolvido em ovo e frito.[19]
  • Leite callado (coalhada) e requeixo — São produtos derivados da coagulação de leite que são consumidos como sobremesas.
  • Torta de Mondoñedo — É um bolo tradicional de Mondoñedo, na província de Lugo, confecionada com pão de ló (biscoito), calda de açúcar (almíbar), massa folhada, amêndoas cruas, cabelo de anxo e frutas (figos e cerejas) que é cozido no forno. O cabelo de anxo ("cabelo de anjo") é um doce elaborado com as fibras caramelizadas de abóbora ou outras frutas aparentadas (da família Cucurbitaceae). É baseado em receitas medievais e recentemente tornou-se muito conhecido.
  • Amendoados de Allariz — Originários do concelho de Allariz, na província de Ourense, são uma mistura de amêndoa moída com açúcar e clara de ovo, que depois de solidificar é cortada e colocada sobre uma massa de farinha e água (oblea) e vai ao forno.
  • Castanha — É um produto muito popular na sua época (outono) e além de ser consumida como sobremesa, é também usada como acompanhamento. No passado teve um papel importantíssimo na cozinha galega, desde os povoadores primitivos, até ao século XVIII, quando a popularização do milho e da batata, produtos originários da América a substituíram como um dos principais alimentos do povo. No início de novembro celebra-se a festa do magusto um pouco por toda a Galiza, que tradicionalmente passava pela colheita de castanhas, parte das quais eram assadas e comidas com o primeiro vinho novo.[20] As castanhas são também usadas para confecionar marron-glacé e têm uma Indicação Geográfica Protegida ("Castaña de Galicia").[21]

Queijos[editar | editar código-fonte]

  • Arzúa-Ulloa — Também conhecido como queijo de Lugo ou queijo de Chantada, é feito com leite de vaca e as suas caraterísticas e ingredientes estão regulamentados pela Denominação de Origem Protegida (DOP) Arzúa-Ulloa, que inclui três variedades: o Arzúa–Ulloa propriamente dito, o Arzúa–Ulloa de Granxa e o Arzúa–Ulloa Curado, este último com uma maturação mais longa, de pelo menos seis meses.[22]
  • Tetilla — Por vezes considerado uma variedade de Arzúa-Ulloa, é outro tipo de queijo de vaca, com Denominação de Origem Protegida. Deve o seu nome à sua forma cónica que faz lembrar um seio feminino. É comum ser consumido acompanhado com marmelada. Produz-se um pouco por toda a Galiza.[23]
  • San Simón da Costa — Outro queijo de vaca, com Denominação de Origem Protegida, produzido em vários concelhos da província de Lugo. É fumado, de meia-cura e tem uma característica forma cónica ou de pera, que termina com um bico semelhante a um mamilo.[24]
  • Cebreiro — Produzido em vários concelhos da província de Lugo. É branco, picante, com um sabor ligeiramente metálico e aroma caraterístico. Tem a forma de um chapéu de cozinheiro ou de cogumelo. Está protegido e regulamentado por uma Denominação de Origem Protegida.[25] Esta só permite o uso de leite de vaca, mas também se produz com uma mistura de leite de vaca e de cabra, este no máximo de 40%.

Notas e referências[editar | editar código-fonte]

  1. Pérez, P. (13 de julho de 2006). «El verano en Galicia: una ruta sin perder bocado». www.20minutos.es (em espanhol). 20 minutos. Consultado em 24 de julho de 2013 
  2. «Galicia». cocinayhogar.com (em espanhol). Consultado em 25 de julho de 2013. Arquivado do original em 2 de janeiro de 2010 
  3. Liz, Laura (26 de agosto de 2000). «Lugo, El paraíso de las tapas». www.lavozdegalicia.es (em espanhol). La Voz de Galicia. Consultado em 24 de julho de 2013. Arquivado do original em 9 de abril de 2010 
  4. «Indicación Geográfica Protegida "Patata de Galicia" / "Pataca de Galicia"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  5. a b «Indicación Geográfica protegida "Lacón Gallego"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  6. «Pulpo a feira». acocinar.com (em espanhol). Consultado em 25 de julho de 2013. Arquivado do original em 28 de fevereiro de 2009 
  7. «Los despreciados santiaguiños». www.enciclopediadegastronomia.es (em espanhol). Taninos, S.L. 2009. Consultado em 24 de julho de 2013. Arquivado do original em 14 de março de 2010 
  8. Álvarez, Cristino (1 de março de 2006). «Cocina gallega, La verdura nacional» (em espanhol). www.lavozdegalicia.es. Consultado em 24 de julho de 2013. Arquivado do original em 4 de março de 2016 
  9. «Indicación Geográfica Protegida "Grelos de Galicia"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  10. «www.magrama.gob.es/es/alimentacion/temas/calidad-agroalimentaria/calidad-diferenciada/dop/hortalizas/DOP_pimiento_herbon.aspx». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  11. «Indicación Geográfica Protegida "Pemento da Arnoia"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  12. «Indicación Geográfica Protegida "Pemento de Oímbra"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  13. «Indicación Geográfica "Pemento do Couto"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  14. «Indicación Geográfica Protegida "Pan de Cea"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  15. «Tarta de Santiago». www.recetas-caseras.es (em espanhol). Consultado em 27 de julho de 2013. Arquivado do original em 20 de outubro de 2013 
  16. «Indicación Geográfica Protegida "Tarta de Santiago"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  17. Cunqueiro, Álvaro (1983), A cociña galega, ISBN 9788471544414 (em galego), Vigo: Galaxia, pp. 152-154, consultado em 24 de julho de 2013 
  18. «Leite fritido». www.muchogusto.net (em galego). Consultado em 24 de julho de 2013 
  19. «Como hacer Torrijas de Pan». javirecetas.hola.com (em espanhol). 30 de março de 2009. Consultado em 24 de julho de 2013 
  20. «Las castañas en O Caurel». cocinalia.eu (em espanhol). 20 de março de 2007. Consultado em 25 de julho de 2013. Arquivado do original em 26 de janeiro de 2010 
  21. «Indicación Geográfica Protegida "Castaña de Galicia"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  22. «Denominación de Origen Protegida "Arzúa-Ulloa"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  23. «Denominación de Origen Protegida "Queso Tetilla"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  24. «Denominación de Origen Protegida "San Simón da Costa"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 
  25. «Denominación de Origen Protegida "Cebreiro"». www.magrama.gob.es (em espanhol). Ministerio de Agricultura, Alimentación y Medio Ambiente. Consultado em 27 de julho de 2013 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

O Commons possui uma categoria com imagens e outros ficheiros sobre Culinária da Galiza