Direitos transgênero no Brasil

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Direitos transgênero no Brasil incluem o direito de mudança de nome legal e de sexo sem a necessidade de cirurgia ou avaliação profissional, e o direito à cirurgia de redesignação sexual fornecida pelo serviço público de saúde do Brasil, o Sistema Único de Saúde.

Reconhecimento de gênero[editar | editar código-fonte]

Em 1993, foi realizado o primeiro encontro nacional brasileiro entre pessoas trans.[1] Este encontro ficou conhecido como Encontro Nacional de Travestis e Liberados.[1] Em 1995, as reuniões nacionais de gays e lésbicas contavam com a participação de grupos ativistas transgêneros.[1] Depois, em 1996, foi realizado o Encontro Nacional de Travestis e Liberados que Lutam Contra a Aids.[1]

O Brasil participou da elaboração da Declaração sobre Direitos Humanos, Orientação Sexual e Identidade de Gênero. Este documento foi apresentado em dezembro de 2008.[2] O Brasil ajudou a organizar o lançamento dos Princípios de Yogyakarta em 2007.[2]

Alterar a atribuição de gênero é legal de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, conforme declarado em decisão proferida em 17 de outubro de 2009.[3] Por unanimidade, a 3.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça aprovou permitir a opção de mudança de nome e gênero na certidão de nascimento de pessoa trans que tenha sido submetido a cirurgia de redesignação sexual. O entendimento dos ministros era de que não fazia sentido permitir que as pessoas fizessem tais cirurgias no sistema de saúde federal gratuito e não permitir que mudassem de nome e sexo no registro civil.[4] Os ministros acompanharam o voto da relatora, Nancy Andrighi, que argumentou: "Se o Estado consente com a possibilidade de realizar a cirurgia, logo deve prover os meios necessários para que o indivíduo tenha vida digna como se apresenta perante sociedade". Na opinião do relator, impedir a mudança de registro de uma pessoa transgênero que passou por cirurgia de redesignação sexual poderia constituir uma nova forma de preconceito social e causar mais instabilidade psicológica.[5] Ela explicou:

"A questão é delicada. Quando se iniciou a obrigatoriedade do registro civil, a distinção em dois sexos era feita pela genitália. Hoje são outros fatores que influenciam e essa identificação não pode mais ser limitada ao sexo aparente. Há um conjunto de fatores sociais, psicológicos que devem ser considerados. Vetar essa troca seria insustentável colocando em posição de angustias incertezas de mais conflitos para a pessoa."[6]

Segundo o Ministro João Otávio de Noronha do Superior Tribunal de Justiça, as pessoas trans devem ter sua integração social assegurada com respeito à sua dignidade, autonomia, intimidade e privacidade, que deve, portanto, incorporar seu registro civil.[7]

Leis sobre identidade de gênero-expressão por país ou território
  Mudança de identidade legal sem exigência de cirurgia
  Mudança de identidade legal com exigência de cirurgia
  Nenhuma mudança de identidade legal
  Desconhecido/Ambíguo

O Supremo Tribunal Federal decidiu, em 1.º de março de 2018, que a pessoa trans tem o direito de alterar seu nome oficial e sexo sem necessidade de cirurgia ou avaliação profissional, apenas mediante autodeclaração de sua identidade psicossocial. No dia 29 de junho, a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça, publicou as regras a serem seguidas pelos cartórios sobre o tema.[8]

Em 2020, foi realizado um estudo para compreender a qualidade de vida de crianças trans brasileiras.[9] 32 participantes estiveram envolvidos no estudo e foram entrevistados ou colocados em grupos focais para reunir a sua perspectiva.[9]

Cirurgia de redesignação de gênero[editar | editar código-fonte]

Ver artigo principal: Processo transexualizador

Em 2008, o sistema público de saúde do Brasil começou a oferecer cirurgias de redesignação sexual gratuitas em cumprimento a uma ordem judicial, o Processo Transexualizador. Os promotores federais argumentaram que a cirurgia de redesignação sexual estava coberta por uma cláusula constitucional que garantia assistência médica como um direito básico.[10]

O Tribunal Regional Federal concordou, afirmando em sua decisão:

"do ponto de vista biomédico, a transexualidade pode ser descrita como uma perturbação da identidade sexual em que os indivíduos necessitam de mudar a sua designação sexual ou enfrentam consequências graves nas suas vidas, incluindo sofrimento intenso, mutilação e suicídio."

Os pacientes devem ter no mínimo 18 anos e ser diagnosticados como transgênero, sem transtorno de personalidade, e devem passar por avaliação psicológica com equipe multidisciplinar há pelo menos dois anos, a partir dos 16 anos. A média nacional é de 100 cirurgias por ano, segundo o Ministério da Saúde do Brasil.[11]

Discriminação transgênero[editar | editar código-fonte]

Houve cerca de 200 homicídios de indivíduos trans no Brasil em 2017, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais.[12] Além disso, o Brasil foi responsável por 40% de todos os assassinatos de indivíduos trans desde 2008, de acordo com a Transgender Europe.[12] Mais recentemente, o número de mulheres trans assassinadas no Brasil aumentou 45% em 2020.[13]

A vereadora de São Paulo Erika Hilton, a primeira mulher trans a ser eleita vereadora, recebeu ameaças de morte e, por isso, teve que mudar seus hábitos por questões de segurança.[13]

Notas[editar | editar código-fonte]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c d Corrales, Javier; Pecheny, Mario (2010). The Politics of Sexuality in Latin America (em inglês). [S.l.]: University of Pittsburgh Pre. ISBN 978-0-8229-7371-3 
  2. a b Nogueira, Maria Beatriz Bonna (2017). «The Promotion of LGBT Rights as International Human Rights Norms: Explaining Brazil's Diplomatic Leadership». Global Governance. 23 (4): 545–563. ISSN 1075-2846. JSTOR 44861146. doi:10.1163/19426720-02304003 
  3. Transgenders can change their name, as decided by the Supreme Court of Justice (em português)
  4. Gender reassignment surgery is free in Brazil (em português)
  5. Jurisprudence of the Changing legal gender assignment in Brazil by Superior Court (em português)
  6. The Superior Court of Justice allows transsexuals to change name and sex on birth certificate (em português)
  7. Legal change of name in Brazil (em português) Arquivado em 23 dezembro 2009 no Wayback Machine
  8. Transexuals can now change their names in documents at registry offices throughout the country (em português)
  9. a b Nascimento, Fernanda Karla; Reis, Roberta Alvarenga; Saadeh, Alexandre; Demétrio, Fran; Rodrigues, Ivaneide Leal Ataide; Galera, Sueli Aparecida Frari; Santos, Claudia Benedita dos (6 de novembro de 2020). «Brazilian transgender children and adolescents: Attributes associated with quality of life». Revista Latino-Americana de Enfermagem (em inglês). 28: e3351. ISSN 1518-8345. PMC 7647416Acessível livremente. PMID 33174991. doi:10.1590/1518-8345.3504.3351 
  10. Sex-change in Brazil (em português)
  11. «Brazil to provide free sex-change operations (em inglês)». Consultado em 23 de abril de 2013. Arquivado do original em 24 de abril de 2013  Brazil to provide free sex-change operations (em inglês)
  12. a b Malta, Monica (2 de novembro de 2018). «Human rights and political crisis in Brazil: Public health impacts and challenges». Global Public Health (em inglês). 13 (11): 1577–1584. ISSN 1744-1692. PMID 29368578. doi:10.1080/17441692.2018.1429006 
  13. a b Nugent, C. (2021). Erika Hilton. Time International (Atlantic Edition), 198(15/16), 91.