Saltar para o conteúdo

Intersexo: diferenças entre revisões

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
Desfeita a edição 57043320 de HVL
Etiqueta: Desfazer
Fontes trocadas, a wikipedia não pode ser fonte dela mesma, sendo assim foram introduzidas as adequadas.
Etiquetas: Possível conteúdo ofensivo Editor Visual
Linha 1: Linha 1:
{{DISPLAYTITLE:Intersexo}}{{Expandir|data=dezembro de 2013}}[[Ficheiro:Intersex Pride Flag.svg|thumb|Bandeira intersexo, criada em 2013, por [https://morgancarpenter.com/ Morgan Carpenter], da [https://ihra.org.au/ Intersex Human Rights Australia]]]'''Intersexo''', é uma pessoa que '''naturalmente,''' ou seja, sem ser a partir de intervenções médicas, desenvolve características sexuais parte da definição típica de [[Macho|sexo masculino]] e do [[Fêmea|sexo feminino]].<ref name=":0">{{citar web|url=https://www.unfe.org/wp-content/uploads/2017/05/UNFE-Intersex.pdf|titulo=UNFE Intersex Fact Sheet}}</ref>
{{DISPLAYTITLE:Intersexo}}{{Expandir|data=dezembro de 2013}}[[Ficheiro:Intersex Pride Flag.svg|thumb|Bandeira intersexo, criada em 2013, por [https://morgancarpenter.com/ Morgan Carpenter], da [https://ihra.org.au/ Intersex Human Rights Australia]]]'''Intersexo''', é um termo para pessoas que '''naturalmente,''' ou seja, sem ser a partir de intervenções médicas, desenvolvem características sexuais parte da definição típica de [[Macho|sexo masculino]] e do [[Fêmea|sexo feminino]].<ref name=":0">{{citar web|url=https://www.unfe.org/wp-content/uploads/2017/05/UNFE-Intersex.pdf|titulo=UNFE Intersex Fact Sheet}}</ref>


Não existe somente uma maneira de ser intersexo. Algumas pessoas intersexo nascem com genitais fora do típico, outras nascem com genitais completamente comuns, umas possuem cromossomas XX e desenvolveram genitais externos parte da definição típica de [[Macho|sexo masculino]], outras possuem cromossomas XY e desenvolveram genitais externos da definição típica de [[Fêmea|sexo feminino]], entre outras maneiras de ser intersexo.<ref name=":0" /> Ou seja, algumas variações intersexo são visíveis ao nascimento, enquanto outras, não são aparentes até à puberdade. Algumas variações podem inclusive não ser fisicamente aparentes.<ref name=":0" />
Não existe somente uma maneira de ser intersexo. Algumas pessoas intersexo nascem com genitais fora do típico, outras nascem com genitais completamente comuns, umas possuem cromossomas XX e desenvolveram um pénis e escroto, outras possuem cromossomas XY e desenvolveram uma vulva e vagina, entre outras maneiras de ser intersexo.<ref name=":0" /> Algumas variações intersexo são visíveis ao nascimento, enquanto outras, não são aparentes até à puberdade. Algumas variações podem inclusive não ser fisicamente aparentes.<ref name=":0" />


Segundo especialistas, entre 0,05% e 1,7% da população mundial é intersexo, a maior estimativa é semelhante ao número de pessoas naturalmente [[Rutilismo|ruivas]].<ref name=":0" />
Segundo especialistas, entre 0,05% e 1,7% da população mundial é intersexo, a maior estimativa sendo semelhante ao número de pessoas naturalmente [[Rutilismo|ruivas]].<ref name=":0" />


Estima-se que pelo menos 1 em cada 200 pessoas são intersexo, sendo que se estima que entre 1 em cada 1500 nascimentos, e 1 em cada 2000 nascimentos, nasce uma pessoa intersexo que possui características nos genitais tipicamente femininas e masculinas.<ref>Fausto-Sterling, Anne (2000). Sexing the Body: Gender Politics and the Construction of Sexuality. New York: Basic Books. ISBN 0-465-07713-7.</ref><ref name="Moara" />[https://oiieurope.org/intersex-person-speaks-in-the-european-parliament-for-the-first-time-ever-today/][https://isna.org/faq/frequency/]
Estima-se que pelo menos 1 em cada 200 pessoas são intersexo, sendo que se estima que entre 1 em cada 1500 nascimentos, e 1 em cada 2000 nascimentos, nasce uma pessoa intersexo que possui características nos genitais tipicamente femininas e masculinas.<ref>Fausto-Sterling, Anne (2000). Sexing the Body: Gender Politics and the Construction of Sexuality. New York: Basic Books. ISBN 0-465-07713-7.</ref><ref name="Moara" />[https://oiieurope.org/intersex-person-speaks-in-the-european-parliament-for-the-first-time-ever-today/][https://isna.org/faq/frequency/]


Tal como quem não é intersexo, a [[Identidade de gênero|identidade de género]], [[expressão de género]] e [[orientação sexual]] que uma pessoa intersexo possui varia mediante o indivíduo.
Tal como quem como qualquer pessoa, a [[Identidade de gênero|identidade de género]], [[expressão de género]] e [[orientação sexual]] de uma pessoa intersexo varia mediante o indivíduo.


A palavra intersexo é preferível ao termo [[hermafrodita]], já bastante estigmatizado, precisamente por intersexo denotar várias maneiras que o sexo biológico de alguém pode naturalmente não ser constituído somente por traços típicos masculinos ou femininos, e não necessariamente uma questão de possuir dois tipos de orgãos reprodutores, como hermafrodita se refere.<ref>{{citar web|url=https://www.minus18.org.au/index.php/articles/item/2-847-im-intersex-heres-what-that-means|titulo=Hermafrodita e intersexo|data=|acessodata=|publicado=|ultimo=|primeiro=}}</ref> Mesmo que diferente de intersexo, algumas pessoas intersexo, assim como qualquer outra pessoa, poderão ser [[transgênero|transgénero]], caso se encaixem na definição de transgénero.
A palavra intersexo é preferível ao termo [[hermafrodita]], já bastante estigmatizado, precisamente por intersexo denotar várias maneiras que o sexo biológico de alguém pode naturalmente não ser constituído somente por traços típicos masculinos ou femininos, e não necessariamente uma questão de conseguir produzir dois tipos de gametas, como hermafrodita se refere.<ref>{{citar web|url=https://www.minus18.org.au/index.php/articles/item/2-847-im-intersex-heres-what-that-means|titulo=Hermafrodita e intersexo|data=|acessodata=|publicado=|ultimo=|primeiro=}}</ref> Mesmo que diferente de intersexo, algumas pessoas intersexo, assim como qualquer outra pessoa, poderão ser [[transgênero|transgénero]], caso se encaixem na definição dessa [[Identidade social|identidade]].


== Classificação das variações intersexo ==
== Classificação das variações intersexo ==
Linha 40: Linha 40:
== História ==
== História ==
[[Ficheiro:Hermafrodito Massimo 01.JPG|miniaturadaimagem|Escultura "[[Hermafrodita Dormindo]]", representativa da figura mitológica [[Hermafrodito]], um ser intersexo.]]
[[Ficheiro:Hermafrodito Massimo 01.JPG|miniaturadaimagem|Escultura "[[Hermafrodita Dormindo]]", representativa da figura mitológica [[Hermafrodito]], um ser intersexo.]]
Quer fossem ou não socialmente toleradas ou aceites por qualquer cultura em particular, a existência de pessoas intersexo era conhecida de muitas culturas antigas e pré-modernas. O historiador grego [[Diodoro Sículo|Diodorus Siculus]] escreveu sobre o mitológico [[Hermafrodito]] no primeiro século a.C., que "nasceu com um corpo físico que é uma combinação do de um homem e o de uma mulher", e possuía alegadamente propriedades sobrenaturais.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>
Quer fossem ou não socialmente toleradas ou aceites por qualquer cultura em particular, a existência de pessoas intersexo era conhecida de muitas culturas antigas e pré-modernas. O historiador grego [[Diodoro Sículo|Diodorus Siculus]] escreveu sobre o mitológico [[Hermafrodito]] no primeiro século a.C., que "nasceu com um corpo físico que é uma combinação do de um homem e o de uma mulher", e possuía alegadamente propriedades sobrenaturais.<ref>{{Citar web|titulo=The Library of History|url=http://dx.doi.org/10.4159/dlcl.diodorus_siculus-library_history.1933|data=1933|ultimo=Diodorus Siculus}}</ref>


Nas sociedades europeias, o direito romano, o direito canónico pós-clássico e, mais tarde, o direito comum, referia-se ao sexo de uma pessoa como [[Sexo masculino|masculino]], [[Fêmea|feminino]] ou [[hermafrodita]], com direitos legais como masculino ou feminino, dependendo das características que "pareciam mais dominantes"<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>. O Decretum Gratiani do século XII afirma que "Se um hermafrodita pode testemunhar um testamento, depende do sexo que prevalece".<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref> O fundamento da lei comum, os Institutos dos Lawes of England do século XVII, descreveram como uma pessoa "hermafrodita" poderia herdar "ou como macho ou fêmea, de acordo com aquele tipo de sexo que prevalece"<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref> Os casos legais têm sido descritos no direito canônico e em outros lugares ao longo dos séculos.
Nas sociedades europeias, o direito romano, o direito canónico pós-clássico e, mais tarde, o direito comum, referia-se ao sexo de uma pessoa como [[Sexo masculino|masculino]], [[Fêmea|feminino]] ou [[hermafrodita]], com direitos legais como masculino ou feminino, dependendo das características que "pareciam mais dominantes"<ref>{{Citar periódico|ultimo=Roller|primeiro=Lynn E.|data=1997-11|titulo=The Ideology of the Eunuch Priest|url=http://dx.doi.org/10.1111/1468-0424.00075|jornal=Gender & History|volume=9|numero=3|paginas=542–559|doi=10.1111/1468-0424.00075|issn=0953-5233}}</ref>. O Decretum Gratiani do século XII afirma que "Se um hermafrodita pode testemunhar um testamento, depende do sexo que prevalece".<ref>{{Citar web|titulo=Decretum Gratiani|url=http://dx.doi.org/10.1163/1877-5888_rpp_dum_03467}}</ref><ref>{{Citar web|titulo=Decretum Gratiani|url=http://dx.doi.org/10.1163/1877-5888_rpp_dum_03467}}</ref><ref>{{Citar periódico|ultimo=Thompson|primeiro=John L.|data=2004-03|titulo=A History of Women and Ordination, Vol. 1: The Ordination of Women in a Medieval Context. Edited by Bernard J. Cooke and Gary Macy. Lanham, Md.: Scarecrow, 2002. xiv + 184 pp. $55.00 cloth.|url=http://dx.doi.org/10.1017/s0009640700097894|jornal=Church History|volume=73|numero=1|paginas=196–197|doi=10.1017/s0009640700097894|issn=0009-6407}}</ref> O fundamento da lei comum, os Institutos dos Lawes of England do século XVII, descreveram como uma pessoa "hermafrodita" poderia herdar "ou como macho ou fêmea, de acordo com aquele tipo de sexo que prevalece"<ref>{{Citar periódico|editor-sobrenome=Thrope|editor-nome=Benjamin|titulo=ECCLESIASTICAL INSTITUTES|url=http://dx.doi.org/10.1017/cbo9781139177412.015|local=Cambridge|publicado=Cambridge University Press|paginas=394–444|isbn=978-1-139-17741-2}}</ref><ref>{{Citar livro|url=http://dx.doi.org/10.18574/nyu/9780814731895.001.0001|título=Intersexuality and the Law|ultimo=Greenberg|primeiro=Julie A.|data=2012-01-01|editora=NYU Press}}</ref> Os casos legais têm sido descritos no direito canônico e em outros lugares ao longo dos séculos.


Algumas sociedades não europeias têm sistemas de [[Diferença entre sexo e gênero|sexo ou género]] que reconhecem mais do que as duas categorias de homem ou mulher e de sexo masculino ou feminino. Algumas dessas culturas, por exemplo as comunidades [[Hijra]] do Sul da Ásia<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>, podem incluir pessoas intersexo em uma [[Terceiro gênero|terceira categoria de género]]. Embora, segundo Morgan Holmes, os antropólogos ocidentais classificaram essas culturas como "primitivas", Holmes argumentou que as análises dessas culturas têm sido simplistas ou romantizadas e não levam em conta a forma como os sujeitos de todas as categorias são tratados<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>.
Algumas sociedades não europeias têm sistemas de [[Diferença entre sexo e gênero|sexo ou género]] que reconhecem mais do que as duas categorias de homem ou mulher e sexo masculino ou feminino. Algumas dessas culturas, por exemplo as comunidades [[Hijra]] do Sul da Ásia<ref>{{Citar periódico|data=2017-02-17|editor-sobrenome=Ginicola|editor-nome=Misty M.|editor-sobrenome2=Smith|editor-nome2=Cheri|editor-sobrenome3=Filmore|editor-nome3=Joel M.|titulo=Affimative Counseling With LGBTQI+ People|url=http://dx.doi.org/10.1002/9781119375517|doi=10.1002/9781119375517}}</ref>, podem incluir pessoas intersexo em uma [[Terceiro gênero|terceira categoria de género]]. Embora, segundo Morgan Holmes, os antropólogos ocidentais classificaram essas culturas como "primitivas", Holmes argumentou que as análises dessas culturas têm sido simplistas ou romantizadas e não levam em conta a forma como os sujeitos de todas as categorias são tratados<ref>{{Citar periódico|ultimo=Morgan|primeiro=Philip|data=2004|titulo=Introduction: Locating Fascism|url=http://dx.doi.org/10.1007/978-0-230-80267-4_1|local=London|publicado=Macmillan Education UK|paginas=1–10|isbn=978-0-333-94998-6}}</ref>.


Durante a era vitoriana, autores médicos introduziram os termos "hermafrodita verdadeiro" para um indivíduo que tem tecido ovariano e testicular, "pseudo-hermafrodita masculina" para uma pessoa com testículos e genitais externos femininos ou atípicos, e "pseudo-hermafrodita feminina" para uma pessoa com ovários, e genitais externos masculinos ou atípicos. Algumas mudanças posteriores na terminologia têm reflétido avanços na genética, enquanto outras mudanças são sugeridas devido a associações pejorativas.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>
Durante a era vitoriana, autores médicos introduziram os termos "hermafrodita verdadeiro" para um indivíduo com ovariano e testicular, "pseudo-hermafrodita masculino" para uma pessoa com testículos, vulva e vagina ou genitais externos atípicos, e "pseudo-hermafrodita feminina" para uma pessoa com ovários, pénis e escroto ou genitais externos atípicos. Algumas mudanças posteriores na terminologia têm refletido avanços na genética, enquanto outras mudanças são sugeridas devido a associações pejorativas.<ref>{{Citar periódico|ultimo=Carpenter|primeiro=Morgan|data=2020-01-15|titulo=Intersex|url=http://dx.doi.org/10.1093/obo/9780199756384-0232|jornal=Sociology|publicado=Oxford University Press|isbn=978-0-19-975638-4}}</ref>


O termo intersexualidade foi cunhado por Richard Goldschmidt em 1917.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref> A primeira sugestão para substituir o termo 'hermafrodita' por 'intersexo' foi feita por Cawadias na década de 1940.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>
O termo ''intersexualidade'' foi cunhado por Richard Goldschmidt em 1917.<ref>{{Citar periódico|ultimo=Goldschmidt|primeiro=Richard|data=1917-10|titulo=INTERSEXUALITY AND THE ENDOCRINE ASPECT OF SEX|url=https://academic.oup.com/endo/article-lookup/doi/10.1210/endo-1-4-433|jornal=Endocrinology|lingua=en|volume=1|numero=4|paginas=433–456|doi=10.1210/endo-1-4-433|issn=0013-7227}}</ref> A primeira sugestão para substituir o termo 'hermafrodita' por 'intersexo' foi feita por Cawadias na década de 1940.<ref>{{Citar periódico|ultimo=Brockbank|primeiro=William|data=1960-01|titulo=Medical Terms: Their Origin and Construction.Ffrangcon Roberts. London: William Heinemann Medical Books Ltd., 3rd Edition, 1959; PP. vuii+92. 6s.|url=http://dx.doi.org/10.1017/s0025727300025151|jornal=Medical History|volume=4|numero=1|paginas=83–83|doi=10.1017/s0025727300025151|issn=0025-7273}}</ref>


Desde o surgimento da ciência médica moderna, algumas pessoas intersexo com genitais externos atípicos tiveram estes modificados cirurgicamente para se parecerem com os genitais típicos. Cirurgiões identificaram bebés intersexo como uma "emergência social" quando nascem.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref> Uma "política de gênero ideal", desenvolvida inicialmente por [[John Money]], afirmou que a intervenção precoce ajudou a evitar a confusão de [[Identidade de gênero|identidade de género]], mas isso carece de evidências<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>, e as intervenções precoces têm consequências adversas para a saúde psicológica e física<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>.
Desde o surgimento da ciência médica moderna, algumas pessoas intersexo com genitais externos atípicos tiveram estes modificados cirurgicamente para se parecerem com os genitais típicos. Cirurgiões identificaram bebés intersexo como uma "emergência social" quando nascem.<ref>{{Citar livro|url=https://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/summary?doi=10.1.1.628.4867|título=Surgical Management of Ambiguous Genitalia in the Infant and Child|ultimo=Coran|primeiro=G.|ultimo2=Polley|primeiro2=Theodore Z.}}</ref> Uma "política de gênero ideal", desenvolvida inicialmente por [[John Money]], afirmou que a intervenção precoce ajudou a evitar a confusão de [[Identidade de gênero|identidade de género]], mas tal carece de evidências<ref>{{Citar web|titulo=inta, 2012-23-38.pdf|url=http://dx.doi.org/10.35486/at.v9i1.47.g32}}</ref>, e as intervenções precoces têm consequências adversas para a saúde psicológica e física<ref>{{Citar periódico|ultimo=Hughes|primeiro=I. A.|ultimo2=Houk|primeiro2=C.|ultimo3=Ahmed|primeiro3=S. F.|ultimo4=Lee|primeiro4=P. A.|data=2006-07-01|titulo=Consensus statement on management of intersex disorders|url=https://adc.bmj.com/content/91/7/554|jornal=Archives of Disease in Childhood|lingua=en|volume=91|numero=7|paginas=554–563|doi=10.1136/adc.2006.098319|issn=0003-9888|pmid=16624884}}</ref>.


O diálogo entre os que antes eram grupos antagónicos de activistas e clínicos levou a apenas ligeiras mudanças nas políticas médicas e na forma como pacientes intersexo e as suas famílias são tratadas em alguns locais<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>. Em 2011, Christiane Völling tornou-se a primeira pessoa intersexo conhecida por ter sido processada com sucesso por danos num caso trazido por intervenção cirúrgica não consensual.<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref> Em Abril de 2015, Malta tornou-se o primeiro país a proibir intervenções médicas não consensuais para modificar a anatomia sexual, incluindo a das pessoas intersexo<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>. Muitas organizações da sociedade civil e instituições de direitos humanos apelam agora ao fim de intervenções desnecessárias não consentidas em indivíduos intersexo de modo a entrar dentro dos padrões de características sexuais, incluindo na declaração de Malta<ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar periódico|data=2019-12-20|titulo=Intersex|url=https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Intersex&oldid=931610619|jornal=Wikipedia|lingua=en}}</ref>.
O diálogo entre os que antes eram grupos antagónicos de activistas e clínicos levou a apenas ligeiras mudanças nas políticas médicas e na forma como pacientes intersexo e as suas famílias são tratadas em alguns locais<ref>{{Citar web|titulo=The intersections of intersex|url=http://dx.doi.org/10.1037/e620772011-100|data=2009|primeiro=Alice D.|ultimo=Dreger}}</ref>. Em 2011, Christiane Völling tornou-se a primeira pessoa intersexo conhecida por processar alguém com sucesso por danos num caso trazido por intervenções cirúrgicas não consensuais.<ref>{{Citar livro|url=http://dx.doi.org/10.5962/bhl.title.82301|título=The International Commission of Jurists; basic facts.|data=1962|editora=[s.n.]|local=Geneva}}</ref> Em Abril de 2015, Malta tornou-se o primeiro país a proibir intervenções médicas não consensuais para modificar as características sexuais, incluindo a de pessoas intersexo<ref>{{Citar web|titulo=New York Times New York City Poll, April 2004|url=http://dx.doi.org/10.3886/icpsr04094|data=2004-10-18}}</ref>. Muitas organizações da sociedade civil e instituições de direitos humanos apelam agora ao fim de intervenções desnecessárias não consentidas em indivíduos intersexo de modo a entrar dentro dos padrões de características sexuais, incluindo na declaração de Malta<ref>{{Citar periódico|data=2018-04-03|titulo=Public Statement|url=http://dx.doi.org/10.2307/j.ctvf3w44b.136|publicado=NYU Press|paginas=594–597|isbn=978-1-4798-0541-9}}</ref><ref>{{Citar web|titulo=Submission to the Committee of the UN Convention against Torture and Other, Cruel, Inhuman and Degrading Treatment|url=http://dx.doi.org/10.1163/2210-7975_hrd-5550-20180009}}</ref>.


== Integridade física ==
== Integridade física ==
Linha 73: Linha 73:


*'''Modelo centrado no sigilo e cirurgia''': Fazer a cirurgia e medicar nos primeiros 24 meses de vida;
*'''Modelo centrado no sigilo e cirurgia''': Fazer a cirurgia e medicar nos primeiros 24 meses de vida;
*'''Modelo centrado na pessoa intersexo''': Esperar a pessoa intersexo crescer, explicar a complexidade das questões envolvidas e permitir que tome a decisão sobre como agir quanto às suas características sexuais (seja, se deseja alterações, o momento que as faz, ou quais faz).
*'''Modelo centrado na pessoa intersexo''': Esperar a pessoa intersexo crescer, explicar a complexidade das questões envolvidas e permitir que tome a decisão sobre como agir quanto às suas características sexuais (seja se deseja alterações, o momento que as faz, ou quais faz).


Em caso de [[clitoromegalia]] e [[micropênis|micropénis]], esperar antes de fazer a cirurgia é importante para não correr o risco de prejudicar a funcionalidade do órgão sexual.<ref name=Moara/> Outro motivo para esperar antes de fazer a cirurgia é evitar a insatisfação da pessoa intersexo na alteração.<ref>Sarah M Creighton, Catherine L Minto, Stuart J Steele, "Objective cosmetic and anatomical outcomes at adolescence of feminising surgery for ambiguous genitalia done in childhood" (Lancet 2001; 358:124-25).</ref><ref>Sterlin, Anne (2000). Sexing the body: gender politics and the construction of sexuality. Chapter 3: Basic Books. pp. 44–77.</ref><ref name=Moara/> É importante que a família e a pessoa intersexo possua acompanhamento psicoterapêutico para lidar com a ansiedade e frustração que pode vir acompanhada a toda a complexidade envolvida em ser intersexo.<ref name=Moara/>
Em caso de [[clitoromegalia]] e [[micropênis|micropénis]], esperar antes de fazer decisões que envolvam cirurgia é importante para não correr o risco de prejudicar a funcionalidade do órgão sexual.<ref name=Moara/> Outro motivo para esperar antes de fazer a cirurgia é evitar a insatisfação da pessoa intersexo na alteração.<ref>Sarah M Creighton, Catherine L Minto, Stuart J Steele, "Objective cosmetic and anatomical outcomes at adolescence of feminising surgery for ambiguous genitalia done in childhood" (Lancet 2001; 358:124-25).</ref><ref>Sterlin, Anne (2000). Sexing the body: gender politics and the construction of sexuality. Chapter 3: Basic Books. pp. 44–77.</ref><ref name=Moara/> É importante que a família e a pessoa intersexo possua acompanhamento psicoterapêutico para lidar com a ansiedade e frustração que pode vir acompanhada à complexidade envolvida em ser intersexo.<ref name=Moara/>


Assim o tratamento moderno envolve [[psicoterapia]] para a pessoa intersexo e a sua família, [[cirurgia de redesignação sexual]], [[cirurgia plástica]] para caso queira modificar as suas características sexuais ou [[hormonoterapia|terapia hormonal]], caso desejada. É mais fácil fazer genitais femininos e por isso ela tem sido preferida pelo modelo médico tradicional. Mesmo na abordagem centrada na pessoa intersexo, recomenda-se que a cirurgia seja feita caso haja sério prejuízo funcional e desconforto genital.<ref name=Moara/>
Assim o tratamento moderno envolve [[psicoterapia]] para a pessoa intersexo e a sua família, [[cirurgia de redesignação sexual]], [[cirurgia plástica]] para caso queira modificar as suas características sexuais ou [[hormonoterapia|terapia hormonal]], caso desejada. É mais fácil fazer genitais femininos e por isso ela tem sido preferida pelo modelo médico tradicional. Mesmo na abordagem centrada na pessoa intersexo, recomenda-se que a cirurgia seja feita caso haja sério prejuízo funcional e desconforto genital.<ref name=Moara/>


Ser intersexo é frequentemente tratado como algo de carácter [[Patologia|patológico]], que deve ser ''corrigido'' com [[terapia hormonal]] ou cirurgias para encaixar as características sexuais das pessoas intersexo dentro de padrões.<ref name=":0" /> Se uma variação intersexo é descoberta no [[nascimento]] ou durante a [[infância]], os procedimentos médicos podem ser realizados sem que a criança ou pessoas responsáveis pela mesma dêem consentimento ou até mesmo estejam cientes, e muitas pessoas intersexo não são informadas sobre a sua variação intersexo, mesmo quando adultas.<ref name=":0" />
Ser intersexo é frequentemente tratado como algo de carácter [[Patologia|patológico]], que deve ser ''corrigido'' com [[terapia hormonal]] ou cirurgias para encaixar as características sexuais das pessoas intersexo dentro dos padrões de sexo biológico.<ref name=":0" /> Se uma variação intersexo é descoberta no [[nascimento]] ou durante a [[infância]], os procedimentos médicos podem ser realizados sem que a criança ou pessoas responsáveis pela mesma dêem consentimento ou até mesmo estejam cientes, e muitas pessoas intersexo não são informadas sobre a sua variação intersexo, mesmo quando adultas.<ref name=":0" />


== Discriminação contra indivíduos intersexo ==
== Discriminação contra indivíduos intersexo ==
Linha 86: Linha 86:
Profissionais de saúde muitas vezes carecem da formação e conhecimento necessário para compreender como lidar com as especificidades das pessoas intersexo, prestar cuidados adequados e respeitar a autonomia e os direitos à integridade física e à saúde das pessoas em causa.<ref name=":1" />
Profissionais de saúde muitas vezes carecem da formação e conhecimento necessário para compreender como lidar com as especificidades das pessoas intersexo, prestar cuidados adequados e respeitar a autonomia e os direitos à integridade física e à saúde das pessoas em causa.<ref name=":1" />


Algumas pessoas intersexo também enfrentam obstáculos e discriminação caso queiram ou necessitem alterar o sexo apresentado no certificado de nascimento ou nalgum documento oficial.<ref name=":1" />
Algumas pessoas intersexo também enfrentam obstáculos e discriminação caso queiram ou necessitem alterar o sexo atribuído no certificado de nascimento ou nalgum documento oficial.<ref name=":1" />


Em especial, [[Atleta|atletas]] intersexo enfrentam obstáculos específicos. Existindo vários casos de mulheres [[Cisgeneridade|cisgénero]] intersexo que foram desqualificadas de competições com base nas suas características intersexo. No entanto, ser intersexo por si só não garante um melhor desempenho. Ainda assim, características físicas que de facto afetam o desempenho, como a altura ou o desenvolvimento muscular não são sujeitas a tal escrutínio e restrições.<ref>{{citar web|url=https://ilga-portugal.pt/noticias/Noticias/factsheet_un_intersexo.pdf|titulo=Fact Sheet ILGA|data=|acessodata=|publicado=|ultimo=|primeiro=}}</ref><ref>{{Citar web|titulo=Um dilema chamado Caster Semenya|url=https://www.publico.pt/2016/08/17/desporto/noticia/um-dilema-chamado-caster-semenya-1741613|obra=PÚBLICO|acessodata=2019-12-20|lingua=pt|primeiro=Pedro|ultimo=Guerreiro}}</ref>{{Referências}}
Em especial, [[Atleta|atletas]] intersexo enfrentam obstáculos específicos. Existindo vários casos de mulheres [[Cisgeneridade|cisgénero]] intersexo que foram desqualificadas de competições com base nas suas características intersexo. No entanto, ser intersexo por si só não garante um melhor desempenho. Ainda assim, características físicas que de facto afetam o desempenho, como a altura ou o desenvolvimento muscular não são sujeitas a tal escrutínio e restrições.<ref>{{citar web|url=https://ilga-portugal.pt/noticias/Noticias/factsheet_un_intersexo.pdf|titulo=Fact Sheet ILGA|data=|acessodata=|publicado=|ultimo=|primeiro=}}</ref><ref>{{Citar web|titulo=Um dilema chamado Caster Semenya|url=https://www.publico.pt/2016/08/17/desporto/noticia/um-dilema-chamado-caster-semenya-1741613|obra=PÚBLICO|acessodata=2019-12-20|lingua=pt|primeiro=Pedro|ultimo=Guerreiro}}</ref>{{Referências}}

Revisão das 10h58min de 4 de abril de 2020

Bandeira intersexo, criada em 2013, por Morgan Carpenter, da Intersex Human Rights Australia

Intersexo, é um termo para pessoas que naturalmente, ou seja, sem ser a partir de intervenções médicas, desenvolvem características sexuais parte da definição típica de sexo masculino e do sexo feminino.[1]

Não existe somente uma maneira de ser intersexo. Algumas pessoas intersexo nascem com genitais fora do típico, outras nascem com genitais completamente comuns, umas possuem cromossomas XX e desenvolveram um pénis e escroto, outras possuem cromossomas XY e desenvolveram uma vulva e vagina, entre outras maneiras de ser intersexo.[1] Algumas variações intersexo são visíveis ao nascimento, enquanto outras, não são aparentes até à puberdade. Algumas variações podem inclusive não ser fisicamente aparentes.[1]

Segundo especialistas, entre 0,05% e 1,7% da população mundial é intersexo, a maior estimativa sendo semelhante ao número de pessoas naturalmente ruivas.[1]

Estima-se que pelo menos 1 em cada 200 pessoas são intersexo, sendo que se estima que entre 1 em cada 1500 nascimentos, e 1 em cada 2000 nascimentos, nasce uma pessoa intersexo que possui características nos genitais tipicamente femininas e masculinas.[2][3][2][3]

Tal como quem como qualquer pessoa, a identidade de género, expressão de género e orientação sexual de uma pessoa intersexo varia mediante o indivíduo.

A palavra intersexo é preferível ao termo hermafrodita, já bastante estigmatizado, precisamente por intersexo denotar várias maneiras que o sexo biológico de alguém pode naturalmente não ser constituído somente por traços típicos masculinos ou femininos, e não necessariamente uma questão de conseguir produzir dois tipos de gametas, como hermafrodita se refere.[4] Mesmo que diferente de intersexo, algumas pessoas intersexo, assim como qualquer outra pessoa, poderão ser transgénero, caso se encaixem na definição dessa identidade.

Classificação das variações intersexo

Escala Quigley para síndrome de insensibilidade androgénica.

Existem diversas variações intersexo, dentre elas[3]:

Heterogeneidade

Ver artigo principal: Heterogeneidade

Heterogeneidade significa diversidade genética e física (fenótipo). No caso da intersexuação[7] significa que algumas características sexuais da pessoa são femininas e outras são masculinas. Essas características sexuais podem ser relativas ao:

Por exemplo: uma pessoa com o síndrome da insensibilidade androgênica naturalmente desenvolve uma vulva, vagina, clítoris, mamas e internamente testículos no lugar de ovários. Uma pessoa com criptorquia bilateral naturalmente desenvolve um pênis e testículos mas estes não produzem testosterona suficiente para desenvolver barba e voz grave.

História

Escultura "Hermafrodita Dormindo", representativa da figura mitológica Hermafrodito, um ser intersexo.

Quer fossem ou não socialmente toleradas ou aceites por qualquer cultura em particular, a existência de pessoas intersexo era conhecida de muitas culturas antigas e pré-modernas. O historiador grego Diodorus Siculus escreveu sobre o mitológico Hermafrodito no primeiro século a.C., que "nasceu com um corpo físico que é uma combinação do de um homem e o de uma mulher", e possuía alegadamente propriedades sobrenaturais.[8]

Nas sociedades europeias, o direito romano, o direito canónico pós-clássico e, mais tarde, o direito comum, referia-se ao sexo de uma pessoa como masculino, feminino ou hermafrodita, com direitos legais como masculino ou feminino, dependendo das características que "pareciam mais dominantes"[9]. O Decretum Gratiani do século XII afirma que "Se um hermafrodita pode testemunhar um testamento, depende do sexo que prevalece".[10][11][12] O fundamento da lei comum, os Institutos dos Lawes of England do século XVII, descreveram como uma pessoa "hermafrodita" poderia herdar "ou como macho ou fêmea, de acordo com aquele tipo de sexo que prevalece"[13][14] Os casos legais têm sido descritos no direito canônico e em outros lugares ao longo dos séculos.

Algumas sociedades não europeias têm sistemas de sexo ou género que reconhecem mais do que as duas categorias de homem ou mulher e sexo masculino ou feminino. Algumas dessas culturas, por exemplo as comunidades Hijra do Sul da Ásia[15], podem incluir pessoas intersexo em uma terceira categoria de género. Embora, segundo Morgan Holmes, os antropólogos ocidentais classificaram essas culturas como "primitivas", Holmes argumentou que as análises dessas culturas têm sido simplistas ou romantizadas e não levam em conta a forma como os sujeitos de todas as categorias são tratados[16].

Durante a era vitoriana, autores médicos introduziram os termos "hermafrodita verdadeiro" para um indivíduo com ovariano e testicular, "pseudo-hermafrodita masculino" para uma pessoa com testículos, vulva e vagina ou genitais externos atípicos, e "pseudo-hermafrodita feminina" para uma pessoa com ovários, pénis e escroto ou genitais externos atípicos. Algumas mudanças posteriores na terminologia têm refletido avanços na genética, enquanto outras mudanças são sugeridas devido a associações pejorativas.[17]

O termo intersexualidade foi cunhado por Richard Goldschmidt em 1917.[18] A primeira sugestão para substituir o termo 'hermafrodita' por 'intersexo' foi feita por Cawadias na década de 1940.[19]

Desde o surgimento da ciência médica moderna, algumas pessoas intersexo com genitais externos atípicos tiveram estes modificados cirurgicamente para se parecerem com os genitais típicos. Cirurgiões identificaram bebés intersexo como uma "emergência social" quando nascem.[20] Uma "política de gênero ideal", desenvolvida inicialmente por John Money, afirmou que a intervenção precoce ajudou a evitar a confusão de identidade de género, mas tal carece de evidências[21], e as intervenções precoces têm consequências adversas para a saúde psicológica e física[22].

O diálogo entre os que antes eram grupos antagónicos de activistas e clínicos levou a apenas ligeiras mudanças nas políticas médicas e na forma como pacientes intersexo e as suas famílias são tratadas em alguns locais[23]. Em 2011, Christiane Völling tornou-se a primeira pessoa intersexo conhecida por processar alguém com sucesso por danos num caso trazido por intervenções cirúrgicas não consensuais.[24] Em Abril de 2015, Malta tornou-se o primeiro país a proibir intervenções médicas não consensuais para modificar as características sexuais, incluindo a de pessoas intersexo[25]. Muitas organizações da sociedade civil e instituições de direitos humanos apelam agora ao fim de intervenções desnecessárias não consentidas em indivíduos intersexo de modo a entrar dentro dos padrões de características sexuais, incluindo na declaração de Malta[26][27].

Integridade física

Tem-se tornado prática comum sujeitar as crianças intersexo a intervenções cirúrgicas desnecessárias e a outros procedimentos que têm como propósito tentar fazer com que a sua aparência esteja de acordo com a definição típica de sexo masculino ou feminino.[28] Tais procedimentos, frequentemente irreversíveis, podem causar permanentemente infertilidade, dor, incontinência, perda de sensação sexual e sofrimento mental para o resto da vida, incluindo depressão.[28]

Estes procedimentos, são regularmente praticados sem o pleno consentimento, livre e informado, da pessoa em questão. Muitas vezes, esta é demasiado nova para poder tomar uma decisão e estes procedimentos podem violar os seus direitos à integridade física, a viver livre de tortura e outros atos tidos como degradantes e desumanos.[28]

Estas intervenções têm frequentemente como base normas culturais e de género e crenças discriminatórias relativas a pessoas intersexo e a sua integração na sociedade.[28] As Nações Unidas defende que "atitudes discriminatórias não podem nunca justificar violações de direitos humanos, incluindo tratamento forçado e violações ao direito à integridade física".[28]

Tais procedimentos são algumas vezes justificados por argumentos com base em benefícios de saúde, mas estes são frequentemente propostos com base em provas fracas e sem a discussão de soluções alternativas que protejam a integridade física e respeitem a autonomia das pessoas intersexo.[28]

Tais crenças e pressões sociais são frequentemente refletidas pela comunidade médica, e familiares responsáveis das crianças intersexo, que encorajam ou dão o seu consentimento para que tais procedimentos sejam feitos. Independentemente da falta de indicação médica, necessidade ou urgência, e também apesar do facto de que tais procedimentos possam violar direitos humanos. Muitas vezes o consentimento é dado na ausência de informação sobre as consequências a curto e longo prazo sobre essas intervenções e também com a falta de contacto com pessoas adultas intersexo e as suas famílias.[28]

Muitas pessoas adultas intersexo que foram expostas a cirurgias enquanto crianças realçam a vergonha e estigma associados à tentativa de apagar os seus traços intersexo, tal como o sofrimento físico e mental, incluindo como resultado as cicatrizes extensivas e dolorosas. Muitas também sentem que foram forçadas a assumirem um sexo e género que não lhes é adequado.[28]

Dado a natureza irreversível e o impacto na autonomia e integridade física da pessoa, tais procedimentos cirúrgicos, desnecessários, tais procedimentos procuram ser proibidos por várias associações.[28]

Modificação das características sexuais

O tipo de procedimentos vai depender da variação intersexo, existem dois modelos possíveis[3]:

  • Modelo centrado no sigilo e cirurgia: Fazer a cirurgia e medicar nos primeiros 24 meses de vida;
  • Modelo centrado na pessoa intersexo: Esperar a pessoa intersexo crescer, explicar a complexidade das questões envolvidas e permitir que tome a decisão sobre como agir quanto às suas características sexuais (seja se deseja alterações, o momento que as faz, ou quais faz).

Em caso de clitoromegalia e micropénis, esperar antes de fazer decisões que envolvam cirurgia é importante para não correr o risco de prejudicar a funcionalidade do órgão sexual.[3] Outro motivo para esperar antes de fazer a cirurgia é evitar a insatisfação da pessoa intersexo na alteração.[29][30][3] É importante que a família e a pessoa intersexo possua acompanhamento psicoterapêutico para lidar com a ansiedade e frustração que pode vir acompanhada à complexidade envolvida em ser intersexo.[3]

Assim o tratamento moderno envolve psicoterapia para a pessoa intersexo e a sua família, cirurgia de redesignação sexual, cirurgia plástica para caso queira modificar as suas características sexuais ou terapia hormonal, caso desejada. É mais fácil fazer genitais femininos e por isso ela tem sido preferida pelo modelo médico tradicional. Mesmo na abordagem centrada na pessoa intersexo, recomenda-se que a cirurgia seja feita caso haja sério prejuízo funcional e desconforto genital.[3]

Ser intersexo é frequentemente tratado como algo de carácter patológico, que deve ser corrigido com terapia hormonal ou cirurgias para encaixar as características sexuais das pessoas intersexo dentro dos padrões de sexo biológico.[1] Se uma variação intersexo é descoberta no nascimento ou durante a infância, os procedimentos médicos podem ser realizados sem que a criança ou pessoas responsáveis pela mesma dêem consentimento ou até mesmo estejam cientes, e muitas pessoas intersexo não são informadas sobre a sua variação intersexo, mesmo quando adultas.[1]

Discriminação contra indivíduos intersexo

As pessoas intersexo são frequentemente sujeitas a discriminação e abuso se for conhecido o facto de serem intersexo. Normalmente, as leis anti-discriminação não proíbem a discriminação contra pessoas intersexo, deixando-as vulneráveis a práticas discriminatórias em vários cenários, desde o acesso à saúde, educação, serviços públicos, emprego e desportos.[28]

Profissionais de saúde muitas vezes carecem da formação e conhecimento necessário para compreender como lidar com as especificidades das pessoas intersexo, prestar cuidados adequados e respeitar a autonomia e os direitos à integridade física e à saúde das pessoas em causa.[28]

Algumas pessoas intersexo também enfrentam obstáculos e discriminação caso queiram ou necessitem alterar o sexo atribuído no certificado de nascimento ou nalgum documento oficial.[28]

Em especial, atletas intersexo enfrentam obstáculos específicos. Existindo vários casos de mulheres cisgénero intersexo que foram desqualificadas de competições com base nas suas características intersexo. No entanto, ser intersexo por si só não garante um melhor desempenho. Ainda assim, características físicas que de facto afetam o desempenho, como a altura ou o desenvolvimento muscular não são sujeitas a tal escrutínio e restrições.[31][32]

Referências

  1. a b c d e f «UNFE Intersex Fact Sheet» (PDF) 
  2. Fausto-Sterling, Anne (2000). Sexing the Body: Gender Politics and the Construction of Sexuality. New York: Basic Books. ISBN 0-465-07713-7.
  3. a b c d e f g SANTOS, Moara de Medeiros Rocha; ARAUJO, Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de. Desenvolvimento da identidade de gênero em casos de intersexualidade: contribuições da Psicologia. 2006. 246 f. Tese de doutorado em psicologia. Universidade de Brasília, Brasília, 2006. [1]
  4. «Hermafrodita e intersexo» 
  5. http://www.ismh.org/en/sys/wp-content/uploads/2012/04/2_MERYN-epidemiology-SR-formatted-and-second-checked1.pdf
  6. http://www.brasilescola.com/biologia/sindrome-de-klinefelter.htm
  7. «Fonte do nome» 
  8. Diodorus Siculus (1933). «The Library of History» 
  9. Roller, Lynn E. (novembro de 1997). «The Ideology of the Eunuch Priest». Gender & History. 9 (3): 542–559. ISSN 0953-5233. doi:10.1111/1468-0424.00075 
  10. «Decretum Gratiani» 
  11. «Decretum Gratiani» 
  12. Thompson, John L. (março de 2004). «A History of Women and Ordination, Vol. 1: The Ordination of Women in a Medieval Context. Edited by Bernard J. Cooke and Gary Macy. Lanham, Md.: Scarecrow, 2002. xiv + 184 pp. $55.00 cloth.». Church History. 73 (1): 196–197. ISSN 0009-6407. doi:10.1017/s0009640700097894 
  13. Thrope, Benjamin (ed.). «ECCLESIASTICAL INSTITUTES». Cambridge: Cambridge University Press: 394–444. ISBN 978-1-139-17741-2 
  14. Greenberg, Julie A. (1 de janeiro de 2012). Intersexuality and the Law. [S.l.]: NYU Press 
  15. Ginicola, Misty M.; Smith, Cheri; Filmore, Joel M., eds. (17 de fevereiro de 2017). «Affimative Counseling With LGBTQI+ People». doi:10.1002/9781119375517 
  16. Morgan, Philip (2004). «Introduction: Locating Fascism». London: Macmillan Education UK: 1–10. ISBN 978-0-333-94998-6 
  17. Carpenter, Morgan (15 de janeiro de 2020). «Intersex». Oxford University Press. Sociology. ISBN 978-0-19-975638-4 
  18. Goldschmidt, Richard (outubro de 1917). «INTERSEXUALITY AND THE ENDOCRINE ASPECT OF SEX». Endocrinology (em inglês). 1 (4): 433–456. ISSN 0013-7227. doi:10.1210/endo-1-4-433 
  19. Brockbank, William (janeiro de 1960). «Medical Terms: Their Origin and Construction.Ffrangcon Roberts. London: William Heinemann Medical Books Ltd., 3rd Edition, 1959; PP. vuii+92. 6s.». Medical History. 4 (1): 83–83. ISSN 0025-7273. doi:10.1017/s0025727300025151 
  20. Coran, G.; Polley, Theodore Z. Surgical Management of Ambiguous Genitalia in the Infant and Child. [S.l.: s.n.] 
  21. «inta, 2012-23-38.pdf» 
  22. Hughes, I. A.; Houk, C.; Ahmed, S. F.; Lee, P. A. (1 de julho de 2006). «Consensus statement on management of intersex disorders». Archives of Disease in Childhood (em inglês). 91 (7): 554–563. ISSN 0003-9888. PMID 16624884. doi:10.1136/adc.2006.098319 
  23. Dreger, Alice D. (2009). «The intersections of intersex» 
  24. The International Commission of Jurists; basic facts. Geneva: [s.n.] 1962 
  25. «New York Times New York City Poll, April 2004». 18 de outubro de 2004 
  26. «Public Statement». NYU Press. 3 de abril de 2018: 594–597. ISBN 978-1-4798-0541-9 
  27. «Submission to the Committee of the UN Convention against Torture and Other, Cruel, Inhuman and Degrading Treatment» 
  28. a b c d e f g h i j k l «Fact Sheet ILGA» (PDF) 
  29. Sarah M Creighton, Catherine L Minto, Stuart J Steele, "Objective cosmetic and anatomical outcomes at adolescence of feminising surgery for ambiguous genitalia done in childhood" (Lancet 2001; 358:124-25).
  30. Sterlin, Anne (2000). Sexing the body: gender politics and the construction of sexuality. Chapter 3: Basic Books. pp. 44–77.
  31. «Fact Sheet ILGA» (PDF) 
  32. Guerreiro, Pedro. «Um dilema chamado Caster Semenya». PÚBLICO. Consultado em 20 de dezembro de 2019 

Ligações externas