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Lepra

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(Redirecionado de Doença de Hansen)
Lepra
Lepra
Perna com lesões de lepra limítrofe (borderline)
Sinónimos Hanseníase, doença de Hansen
Especialidade Infectologia
Sintomas Diminuição da sensibilidade (térmica, dolorosa e tátil) [1]
Causas Mycobacterium leprae ou Mycobacterium lepromatosis[2][3]
Fatores de risco Proximidade com pessoas infetadas, pobreza[1][4]
Tratamento Terapia multidrogas[2]
Medicação Rifampicina, dapsona, clofazimina[1]
Frequência 514 000 (2015)[5]
Classificação e recursos externos
CID-10 A30, A30.9
CID-9 030, 030.9
CID-11 149072669
OMIM 607572, 609888, 613407
DiseasesDB 8478
MedlinePlus 001347
eMedicine 220455, 1104977, 1165419
MeSH D007918
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Lepra,[nota 1] doença de Hansen ou hanseníase é uma infeção crónica causada pelas bactérias Mycobacterium leprae ou Mycobacterium lepromatosis.[2][3] A infeção geralmente não manifesta sintomas durante os primeiros 5 a 20 anos.[2] Gradualmente, vão-se desenvolvendo granulomas nos nervos, trato respiratório, pele e olhos.[2] Isto pode resultar na diminuição da capacidade de sentir dor, o que por sua vez pode levar à perda de partes das extremidades devido a lesões ou infeções sucessivas que passam despercebidas ao portador.[1] Estes sintomas podem também ser acompanhados por diminuição da visão e fraqueza.[1]

A lepra é transmitida entre pessoas e possivelmente a partir de tatus (dasipodídeos, clamiforídeos).[7] Pensa-se que a transmissão se dê através da tosse ou pelo contacto com o muco nasal de uma pessoa infetada.[7] A lepra é mais comum em contextos de pobreza.[1] Contrariamente à crença popular, não é uma doença altamente contagiosa.[1] A doença é classificada em dois tipos principais: lepra paucibacilar e lepra multibacilar.[1] Os dois tipos distinguem-se pelo número de manchas de pele hipopigmentada e dormente – a lepra paucibacilar possui cinco ou menos e a multibacilar mais de cinco.[1] O diagnóstico é confirmado com a análise de uma biópsia.[1]

A lepra pode ser curada com um tratamento multidrogas.[2] O tratamento da lepra paucibacilar consiste na administração de dapsona e rifampicina durante seis meses.[1] O tratamento de lepra multibacilar consiste na administração de rifampicina, dapsona e clofazimina durante doze meses.[1] Podem também ser usados outros antibóticos.[1] A Organização Mundial de Saúde disponibiliza estes medicamentos de forma gratuita.[2] Em 2012, havia em todo o mundo 189 000 casos crónicos de lepra, uma diminuição acentuada em relação aos 5,2 milhões na década de 1980.[2][8][9] No mesmo ano registaram-se 230 000 novos casos.[2] Em 2022 foram notificados 174.087 novos casos da doença no mundo. A Índia é o país com o maior número de doentes e registrou 103.819 novos casos da doença em 2022. [10] O Brasil é o segundo país em número de casos de hanseníase com 19.635 casos notificados em 2022. [10] A maior parte dos novos casos ocorre em apenas 16 países, dos quais a Índia contabiliza mais de metade.[2][1] Nos últimos vinte anos foram curadas da lepra 16 milhões de pessoas em todo o mundo.[2]

A lepra afetou a Humanidade durante milhares de anos.[1] O nome da doença tem origem no termo grego λέπρᾱ (léprā), derivado de λεπῐ́ς (lepís; "escama"). O termo "hanseníase" é dado em homenagem ao médico norueguês Gerhard Armauer Hansen, que descobriu a causa da doença em 1873.[1] Isolar os portadores da doença em leprosarias, outrora comum em todo o mundo, ainda ocorre na Índia,[11] China,[12] e África.[13] No entanto, a maior parte das leprosarias foi encerrada, dado que a doença não é significativamente contagiosa.[13] Durante grande parte da História, os leprosos foram vítimas de estigma social, o que ainda continua a ser uma barreira para a procura de tratamento.[2] Devido a este estigma, muitas pessoas consideram o termo "leproso" ofensivo.[14] A condição está classificada como doença tropical negligenciada.[15]

Sinais e sintomas

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Rosto com engrossamentos típicos de lepra lepromatosa

A lepra é uma doença infectocontagiosa crónica causada pela bactéria Mycobacterium leprae.[10][16][17] Esta doença é particularmente conhecida por causar deficiências debilitantes e incapacidades associadas a danos no sistema nervoso periférico, na pele, mucosa nasal, olhos e, nas formas mais graves, nos órgãos internos e sistemas muscular e esquelético.[18][19][20][21][22]

Em 1982, a Organização Mundial de Saúde[23] classificou a lepra de acordo com o número de lesões cutâneas e a presença ou ausência de bacilos na pele e/ou mucosas nasais, independentemente do seu tamanho, localização ou características histológicas:[16][18]

  • Paucibacilar (<5 lesões cutâneas; ausência de bacilos);
  • Multibacilar (>5 lesões cutâneas; presença de bacilos; espessamento de nervos periféricos, perda de sensibilidade ou de força muscular).

A classificação da lepra é baseada em dados clínicos, histológicos e baciloscopias do muco nasal e pele, e pode ser considerada lepra: tuberculoide (TT), Borderline Tuberculoide (BT), Borderline-Borderline (BB), Borderline Lepromatosa (BL), Lepromatosa (LL) e Indeterminada (I).[16][18]

Lepra tuberculoide (TT)

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A Lepra Tuberculoide (TT) - “forma benigna” [1, 5] - é causada pelo Mycobacterium leprae e corresponde à forma imunologicamente estável, paucibacilar e pouco contagiosa da doença,[10][16][18] com baciloscopia negativa que ocorre em indivíduos com algum grau de resistência ao bacilo.[10][18]

Esta doença manifesta-se pela presença de um número reduzido de lesões cutâneas, que podem mostrar-se eritematosas, em descamação, anidróticas, alopécicas e anestésicas.[10][16][18] Esta perda de sensibilidade encontra-se distribuída de forma assimétrica e resulta na destruição dos nervos cutâneos,[18] que leva a alterações sensitivas e motoras das extremidades, osteoporose por desuso,[16][19] reabsorção óssea e mal perfurante plantar.[16]  

Lepra Borderline (B)

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As formas Borderline são as formas instáveis da doença.[16] É a forma mais comum, um tipo intermediário entre boa e má resposta do sistema imunitário. As lesões cutâneas assemelham-se às da lepra tuberculoide, mas são mais numerosas e irregulares. Grandes manchas podem afetar um membro inteiro e ocorre fraqueza e perda de sensibilidade nos pés, mãos e rosto; pode converter-se em lepra lepromatosa ou reverter, tornando-se mais parecido com a forma tuberculoide.[24]

Lepra Lepromatosa (LL)

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A Lepra Lepromatosa (LL) - forma “maligna” [10][18] - é causada pelo Mycobacterium lepromatosis[25] (espécie não consensual) e corresponde à forma multibacilar e altamente contagiosa com baciloscopia positiva da doença.[10][16][18] Esta forma ocorre em indivíduos com baixa resistência imunológica e permite a disseminação de grande número de bacilos por todo o organismo - pele, nervos,[a] nariz, boca, laringe, faringe, olhos e vísceras.[10][18]

As manifestações clínicas são numerosas, bilaterais e simétricas e de morfologia, extensão e localização variáveis.[16][18] As principais lesões cutâneas incluem:

As alterações da mucosa nasal, para além da obstrução nasal e epistaxes, podem conduzir a fenómenos destrutivos, com consequente perfuração do septo e colapso da pirâmide nasal.[16][18][22]

Quando não diagnosticada e tratada precocemente, pode atingir vários órgãos e ser causador de múltiplas morbilidades, como cegueira, lagoftalmia, conjuntivite, osteoporose, esterilidade, insuficiências hepática e renal, dedos “em garra” e mal perfurante plantar.[16][18][26]

Lepra Indeterminada (I)

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A forma Indeterminada é a forma inicial e transitória da doença, mais frequente em crianças;[10][16] por norma, tem cura espontânea.[10] A partir do estado inicial, a lepra pode permanecer estável (maior parte dos casos) ou pode evoluir para lepra tuberculoide ou lepromatosa, dependendo da predisposição genética particular de cada paciente. A lepra pode adotar também vários cursos intermediários entre estes dois tipos, sendo então denominada lepra dimorfa.[27]


Quer na forma tuberculoide quer na lepromatosa, a destruição dos nervos sensoriais é acompanhada por disfunção circulatória,[17] que resulta na perda progressiva da sensibilidade térmica, tátil e dolorosa das extremidades.[22][26] Esta falta de sensibilidade pode levar à formação de inúmeras lesões, sobretudo nos pés, que frequentemente levam ao aparecimento de infeções secundárias, gangrena (com eventual amputação) [19][26] e, em casos mais extremos, à morte.[17]  

Erupções cutâneas no peito e abdômen causada pela hanseníase.

O modo exato de transmissão da lepra é ainda desconhecido.[18] Contudo, sabe-se que a viabilidade do M. leprae, em secreções secas, varia entre 1 e 7 dias,[16] pelo que se presume que o contágio indireto seja mínimo;[18] consequentemente, a transmissão da lepra deverá ocorrer por secreções nasais e/ou gotículas orais de pessoas infetadas,[16][18][19] por inoculação através da mucosa nasal e, mais raramente, através de erosões cutâneas.[16][18] O contágio congénito da lepra é pouco provável, mas a amamentação pode ser considerada um vetor da doença.[18]

Ainda que seja um assunto muito controverso, é coletivamente aceite na comunidade científica que o período de incubação do M. leprae é bastante longo,[17] podendo variar de 6 meses a 40 (ou mais) anos.[28]

De todas a pessoas infetadas, só 5%-10% acaba por desenvolver a doença,[16][18] o que significa que existe variabilidade na suscetibilidade e resistência, dependendo de fatores genéticos,[16] bem como da resposta imunitária de cada indivíduo, que vai desempenhar um papel significativo na progressão da infeção e na sua manifestação clínica[10][16][17][19][21]: na lepra tuberculoide, a resposta imunitária é forte e limita a presença de bacilos no organismo; na lepra lepromatosa/virchowiana, a resposta imunitária é fraca e, por isso, o número de bacilos vai ser elevado.[16] Indivíduos com sistemas imunitários comprometidos, bem como mulheres grávidas, estão mais suscetíveis à infeção.[16]

A lepra não é uma doença hereditária; no entanto, a infeção costuma acontecer durante a infância, acabando por se manifestar mais tarde, sobretudo entre os 10 e os 20 anos,[16][18][19] com predomínio no sexo masculino, numa relação de 2:1.[16]

A frequência de ocorrência da hanseníase em crianças é um parâmetro epidemiológico importante, nomeadamente para a determinação da taxa de transmissão da doença. Ainda que seja rara em crianças com menos de 5 anos,[18] a forma de lepra mais comummente encontrada é a hanseníase nodular (NL), uma variante clínica benigna que afeta lactentes e crianças que permanecem em contacto permanente e próximo com alguém infetado. Em muitos casos, a criança cura-se sem qualquer intervenção médica, mas a doença pode reaparecer uns anos mais tarde.[19]

A hanseníase é geralmente diagnosticada após esfregaço cutâneo, zaragatoa nasal e exame histopatológico.[28]

Na 1ª Conferência Mundial sobre a Lepra, realizada em Berlim no ano de 1897, a lepra foi, finalmente, reconhecida como uma doença infectocontagiosa.[29][30] Foi nesta conferência que se consagrou a teoria do contágio e a proficiência no combate à lepra, através do isolamento domiciliar ou hospitalar dos infetados, de modo a evitar o contágio,[16][29][30] e foi traçado o modelo ideal para as leprosarias modernas, baseadas numa medicina social.[16][29][30]

No mundo existem muitas leprosarias para o abrigo e a cura dos doentes de Hanseníase. A Igreja administra, em todo o mundo, 547 leprosários, segundo dados do último Anuário Estatístico da Igreja: 198 em África, 56 na América, 285 na Ásia, 5 na Europa e 3 na Oceânia.

Apesar de não mortal, a lepra pode acarretar invalidez severa e/ou permanente se não for tratada a tempo. A OMS recomenda, desde 2018,[31] uma terapêutica tripla que consiste na administração de dapsona, rifampicina e clofazimina durante 12 meses nas formas multibacilares e durante 6 meses nas formas paucibacilares.[16] A Organização Mundial de Saúde disponibiliza estes medicamentos de forma gratuita.[32]

Para além dos antibióticos e da poliquimioterapia, quando as lesões já estão constituídas, o tratamento baseia-se em próteses, intervenções ortopédicas, calçados especiais, etc. Além disso, uma grande contribuição à prevenção e ao tratamento das incapacidades causadas pela lepra é a fisioterapia.[33]

Malformações congénitas devido ao uso de Talidomida pelas mães no período gestacional resultavam em crianças nascidas com membros atrofiados – focomelia –, especialmente os membros superiores.[34] Muitas dessas malformações foram correlacionadas ao uso do medicamento durante a gravidez para controlo de enjoos.[34] Atualmente, o medicamento é usado no tratamento da hanseníase, lúpus sistémico e SIDA/AIDS.[35] Para o conseguir, é necessária documentação comprovativa e controlo rigoroso das receitas médicas, sendo proibida a sua venda em farmácias.[36]

Imunidade Cruzada: Lepra vs. Tuberculose

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A hanseníase e a tuberculose são doenças infecciosas causadas pelo complexo Mycobacterium[28] e associadas a fatores sociais, ecológicos e biológicos semelhantes, como pobreza, acesso precário a cuidados de saúde, desnutrição, sistemas imunitários comprometidos, etc..[21]

De acordo com a literatura, existe uma relação entre estas duas doenças, que se baseia na dinâmica de transmissão das infeções e no grau de imunidade cruzada,[37] que não permitiria que ambas as infeções ocorressem simultaneamente, ainda que hoje se saiba, com o recurso a estudos moleculares, que esta teoria não é totalmente correta.[19][28]

Esta hipótese é bastante controversa, mas o facto clínico mais aceite é que a vacinação contra a tuberculose (Bacillus-Calmette-Guérin - BCG) pode ajudar na prevenção da infeção por Mycobacterium leprae,[38][21] sendo eficaz em 20-91% dos casos de hanseníase.[19]

Epidemiologia

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Incidência mundial de lepra (em 2003). Brasil possui mais de 90% dos casos da América Latina

Há 200.000 novos casos por ano[39] e estima-se que seja entre 2 e 3 milhões o número de pessoas severamente descapacitadas pela lepra em todo o mundo.[40] Em 2018 foram notificados 208.619 novos casos em 127 países, nomeadamente na Índia, Brasil e Indonésia.[41]

A hanseníase é raramente encontrada na Europa, mas é, ainda, uma doença endémica em muitos países do mundo, sobretudo no Sudeste Asiático, em África e na América do Sul (principalmente no Brasil).[19][21][30] Os casos notificados de lepra, atualmente, na Europa são essencialmente casos importados de regiões endémicas;[30] porém, com a crescente imigração de indivíduos destes países, começa a assistir-se a um ligeiro aumento de novos casos de lepra na Europa, e, inclusivamente, em Portugal.[16]

Atualmente, em Portugal, existe um número muito reduzido de casos de hanseníase todos os anos: em 2018 foram notificados apenas 5 casos.[41] A doença é de notificação obrigatória.[42] O Brasil é o segundo país com maior número de casos em todo o mundo, com 26 875 casos em 2017.[43] Em 2016 existiam em Angola 1210 casos notificados de lepra.[44] Em 2017, Moçambique registou Moçambique registou 1.926 casos de lepra em 2017, mais 245 do que em 2016.[45]

O uso de sino era obrigatório para os leprosos na Idade Média
Dispensário anti-leproso na Guiné-Bissau

O nome da doença tem origem no termo grego λέπρᾱ (léprā), derivado de λεπῐ́ς (lepís; "escama"). O termo "hanseníase" é dado em homenagem ao médico norueguês Gerhard Armauer Hansen, que descobriu a causa da doença em 1873.[46]

Existem relatos de casos de lepra desde o ano 3000 a.C..[16] Não se sabe, no entanto, se esta doença terá surgido no continente africano ou no continente asiático, ainda que se considere o Médio Oriente como o local de propagação da doença para a Europa.[20][30]

Em 2017, Köhler e colaboradores[47] registaram cinco possíveis casos paleopatológicos de lepra (4 dos quais são apenas casos suspeitos, não se podendo excluir outras infeções) em Abony-Turjányos dűlő (Hungria). Estes indivíduos datam da Idade do Cobre tardia (3780–3650 a.C.),[47] constituindo o caso paleopatológico de lepra mais antigo da Europa de que há registo até à data.

Outras evidências paleopatológicas da lepra contam-se entre os exemplos da Necrópole de Casalechio di Reno (Bolonha, Itália),[48] dos Hospitais St. James e Sta. Maria Madalena em Chichester[49] e Sta. Maria Madalena em Winchester[50] no Reino Unido, e St. Jørgen's em Naestved[51] e St. Jørgen's em Odense[18] na Dinamarca.

A lepra foi uma doença prevalente em toda a Europa durante o período medieval até ao seu declínio a partir do século XVI.[52][30] Ainda que a razão para este declínio ainda não esteja totalmente clara e seja, ainda, um tema controverso, é bastante provável que múltiplos fatores tenham contribuído para esta diminuição de casos, como: mudança antigénica da bactéria; efeitos do isolamento e quarentena; mortalidade direta ou indireta causada por outras infeções (ex.: peste); mudanças na dieta, no vestuário e na habitação e saneamento; o aparecimento e aumento da tuberculose,[52][30] etc.

A ausência de tratamento eficaz e o medo de contágio conduziram à ostracização dos doentes, tanto pela sociedade, como pela própria família, pelo que, no século IV, terão surgido, na Capadócia, as leprosarias, destinadas ao isolamento dos doentes.[10][16][21][53] Estas começaram a difundir-se por toda a Europa a partir do século X.[16]

Em Portugal, há poucas evidências paleopatológicas desta doença. A primeira evidência foi descoberta em 2003 durante a escavação na região da Ermida de Santo André (Beja),[54] onde foram recuperados, pelo menos, 10 indivíduos: um indivíduo adulto do sexo masculino apresentava lesões compatíveis com um diagnóstico provável de lepra; quatro indivíduos (dois adultos jovens e dois adultos), possivelmente do sexo masculino, apresentam-se como casos possíveis, já que o estado de preservação dos mesmos não permite um diagnóstico diferencial preciso.[55]

Para além deste indivíduo, outro foi descoberto, também com lesões compatíveis com lepra, em Lagos (Valle da Gafaria),[17] datado entre os séculos XV e XVII. Mais recentemente, foi descoberto outro possível caso paleopatológico de lepra: um indivíduo adulto do sexo masculino em Travanca (Santa Maria da Feira), datado entre os séculos XVII-XIX.[56]  

Em Portugal terão existido, desde o século XI[16] ou XII,[30] cerca de 70 leprosarias (gafarias), que funcionavam como local de internamento para estes doentes e representavam a única medida preventiva da doença.[16]

Ainda que tenham existido dezenas de gafarias em Portugal ao longo dos séculos,[10][16][30] o mais conhecido, pelo menos durante o século XX, foi o Hospital Colónia Rovisco Pais. De modo a colmatar a abolição da assistência aos leprosos no Hospital da Universidade de Coimbra, o Professor Bissaya Barreto (1886-1974) criou, com o legado financeiro deixado por Rovisco Pais, a Leprosaria Nacional Rovisco Pais, inaugurada a 7 de setembro de 1947 e instalada numa propriedade agrícola, a Quinta da Fonte Quente, na Tocha (Cantanhede),[16][29][30] com lotação para mil doentes e isolado dos grandes centros populacionais.[29]

Este Hospital previa o internamento compulsivo dos doentes contagiosos que resultava na perda da cidadania dos mesmos;[29] a fuga era punível;[29][30] a circulação de dinheiro era proibida;[29][30] o trabalho era uma necessidade, mas era também utilizado como elemento fundamental para o processo terapêutico, com o objetivo de formação profissional para permitir a posterior reinserção social dos pacientes, e a alfabetização.[26][29][30]

Este estabelecimento, e, sobretudo, o seu desenho arquitetónico, encerrava em si toda a ideologia do regime do Estado Novo, como a ruralidade, a família, a religião e o trabalho.[29]

No Brasil, até meados do século XX, os doentes eram forçados ao isolamento em leprosários e tinham os seus pertences queimados, uma política que visava muito mais ao afastamento dos portadores do que a um tratamento efetivo[57]. Só em 1962 é que o internamento compulsivo dos doentes deixou de ser obrigatório. Este processo foi oficializado a 15 de outubro de 1968, através da Lei nº 5.511,[58] que revogava esta obrigatoriedade implantada desde a Lei nº 610 de 1949. Porém, o retorno dos pacientes ao seu convívio social era extremamente dificultado, devido à pobreza e isolamento social e familiar a que estavam submetidos.

O Brasil foi o único país das Américas que não conseguiu a meta de reduzir o número de novos casos para menos de 1 em cada 10.000 pessoas, prejudicando a erradicação nos países vizinhos.[59] No estado de São Paulo, constatou-se declínio dos casos entre 2004 e 2006 na maioria das regiões, e coeficientes mais elevados foram detectados ao norte do estado.[60]

Sociedade e cultura

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A lepra foi, durante muito tempo, incurável e muito mutiladora, forçando o isolamento dos pacientes em leprosarias (português de Portugal) ou leprosários (português do Brasil), principalmente na Europa durante a Idade Média, durante a qual eram obrigados a usar sinetas que anunciassem a sua presença, bem como roupas específicas, que ajudassem no seu reconhecimento por parte da restante população.[16][30]

Ainda que seja uma doença completamente tratável e curável, a lepra encontra-se, ainda, carregada de um enorme estigma social,[10][30][53][61] que pode dever-se, em parte, aos estereótipos sociais que desde sempre foram associados à lepra - vida de pecado e sinal de uma “alma impura” [30][61] -, que muitas vezes são instigados e agravados pelas características visíveis da doença e que resultam em discriminação e marginalização.[10][30][61]

Este estigma depende fortemente dos contextos sociais e culturais,[61][62] e afeta inúmeras áreas da vida destas pessoas, como o casamento, a interação social e o emprego.[61]

Em outros animais

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Ainda que a espécie humana seja a principal espécie a ser afetada pelo M. leprae, já foram observadas infeções pela mesma bactéria em primatas,[16] armadilhos nos estados Norte-americanos do Texas e Luisiana[16][18][21] e em esquilos vermelhos no Reino Unido.[21]

Investigação

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Paleopatologia

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As lesões esqueléticas características da hanseníase envolvem a face e o esqueleto apendicular distal. As características cranianas da hanseníase (fácies-leprosa ou síndrome rinomaxilar[63]), consistem na erosão e enfraquecimento progressivos do processo alveolar da maxila, com consequente perda dos incisivos centrais e laterais superiores,[17][18][20][22] e na destruição da espinha nasal anterior, no arredondamento e alargamento das margens da abertura piriforme[18][19][20][22][52] e na perfuração do palato.[18][19][52]

Podem ocorrer outras alterações que incluem deformidades nos ossos das mãos e dos pés, geralmente simétricas. Estas envolvem: a destruição da articulação e reabsorção dos dedos das mãos e dos pés, com deslocamento parcial e fusão óssea - dedos “em garra”;[17][18][20][22] a remodelação destrutiva dos ossos tubulares das mãos e dos pés, que se inicia nas extremidades distais do osso e que pode causar a total destruição do mesmo.[17][18] Podem existir evidências de osteomielite e/ou alterações neuropáticas das articulações dos pés ou do tornozelo.[64]

Uma grande dificuldade neste diagnóstico prende-se com o facto de várias patologias poderem causar alterações ósseas semelhantes.[20] No caso da lepra, a destruição óssea, nomeadamente na região nasal, no palato e nas falanges, pode ser confundida com alterações tafonómicas (fragmentação post mortem); a síndrome rinomaxilar pode ocorrer noutras patologias como as treponematoses, a tuberculose cutânea, a leishmaniose e neoplasias malignas;[65][66] as alterações dos ossos das mãos e dos pés podem ser idênticos a doenças como a diabetes, síndrome de Raynaud, ulceração e treponematoses.[65]

Um diagnóstico claro e evidente de lepra baseado em alterações paleopatológicas só pode ser feito se as alterações ósseas faciais (sobretudo as deformidades nasais) forem encontradas em combinação com a atrofia e truncamento dos dedos das mãos e dos pés,[18][20] sendo a presença simultânea destas alterações interpretada como “patognomónica” da doença.[18][65]

Odontodisplasia leprogénica

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A Odontodisplasia leprogénica (dens leprosus) consiste no desenvolvimento anormal da raiz dentária dos incisivos superiores (raiz reduzida) e é caracterizada pela presença de uma ranhura de constrição concêntrica.[65] Normalmente esta anomalia está associada à infeção por M. leprae durante a infância e é coincidente com as alterações rinomaxilares características da lepra,[65] nomeadamente o enfraquecimento dos processos alveolares da maxila e a perda dos incisivos superiores. Esta patologia é pouco comum no registo paleopatológico - 6 casos descritos na Escandinávia medieval, associados a leprosarias[65] - e não existem, até ao momento, casos clínicos relatados.[65][67]

Notas

  1. O termo "lepra", no Brasil, é de uso proibido pela lei n.° 9.010/95 em administrações públicas como sinônimo da hanseníase.[6]

Referências

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Ligações externas

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