Papel social de gênero: diferenças entre revisões

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A categoria gênero também inclui a transgeneridade (ou [[transexualidade]]). Hoje sabemos que a sociedade não possui apenas dois gêneros, embora possua dois sexos, e é fundamental identificar o conjunto de gêneros em determinado agrupamento social. Há ainda cientistas que identificam os papéis de gênero com a categoria sexo – homem e mulher, mas mesmo esses assumem que os papéis considerados masculinos ou femininos são socialmente determinados pelo conjunto de regras e valores de um determinado agrupamento humano.<ref name="Mead">{{Citar livro|primeiro=Margaret|ultimo=MEAD|título=Sexo e temperamento em três sociedades primitivas|editora=Perspectiva|local=São Paulo|ano=1988}}</ref>
A categoria gênero também inclui a transgeneridade (ou [[transexualidade]]). Hoje sabemos que a sociedade não possui apenas dois gêneros, embora possua dois sexos, e é fundamental identificar o conjunto de gêneros em determinado agrupamento social. Há ainda cientistas que identificam os papéis de gênero com a categoria sexo – homem e mulher, mas mesmo esses assumem que os papéis considerados masculinos ou femininos são socialmente determinados pelo conjunto de regras e valores de um determinado agrupamento humano.<ref name="Mead">{{Citar livro|primeiro=Margaret|ultimo=MEAD|título=Sexo e temperamento em três sociedades primitivas|editora=Perspectiva|local=São Paulo|ano=1988}}</ref>


As pessoas rompem as barreiras das identidades de gênero, o que não invalida a sua compreensão enquanto ferramenta de análise. Isso porque a categoria “[[identidade de gênero]]” não é a única que descreve o comportamento de um determinado grupo. Individualmente as pessoas são marcadas em seu comportamento de forma diferente e a vida em sociedade nos faz pertencer não somente a uma estrutura social (gênero), mas a um conjunto de estruturas sociais que, da mesma forma, também influenciam seus comportamentos e atitudes e, por consequência, os papéis que cada grupo joga na sociedade, tais como [[classe social]] ou fração de classe a que pertence, vivência com relação ao pertencimento de [[raça]], [[etnia]], [[orientação sexual]], etc.
As pessoas rompem as barreiras das identidades de gênero, o que não invalida a sua compreensão enquanto ferramenta de análise. Isso porque a categoria “[[identidade de gênero]]” não é a única que descreve o comportamento de um determinado grupo. Individualmente as pessoas são marcadas em seu comportamento de forma diferente e a vida em sociedade nos faz pertencer não somente a uma estrutura social (gênero), mas a um conjunto de estruturas sociais que, da mesma forma, também influenciam seus comportamentos e atitudes e, por consequência, os papéis que cada grupo joga na sociedade, tais como [[classe social]] ou fração de classe a que pertence, vivência com relação ao pertencimento de [[raça]], [[etnia]], [[orientação sexual]], etc.

'''CONSTRUÇÃO DO PAPEL SOCIAL DE GÊNERO E OS ESTEREÓTIPOS'''

Joan Scott, em seu trabalho Gênero: categoria útil de análise histórica, destaca a importância do termo gênero, uma vez que ele se refere a estudos sobre os papéis considerados adequados aos homens e às mulheres dentro de um contexto de construções sociais, e tem seu valor dentro de uma categoria de análise histórica da sociedade1.

Como argumentado por Alice Eagly em a Teoria do Papel Social, os papéis de gênero podem ser definidos como aquelas expectativas socialmente compartilhadas a respeito dos comportamentos e qualidades apropriados dos indivíduos, uma vez inseridos dentro da caracterização de gênero socialmente definido.


Para a teórica Teresa de Lauretis

“(...) gênero não é um simples derivado do sexo anatômico

ou biológico, mas uma contrução social sociocultural, uma

representação ou, melhor ainda, o efeito do cruzamento das

representações discursivas e visuais que emanam das diferentes

instituições - a família, a religião, o sistema educativo, os meios de

comunicação, a medicina ou a legislação -, mas também de fontes

menos evidentes, como a linguagem, a arte, a literatura, o cinema,

etc.”3 <ref>{{citar livro|título=Gênero: uma categoria útil de análise histórica}}</ref>


Pensando a construção social de papel de gênero que designa modos apropriados de pensar e agir relacionados à masculinidade ou à feminilidade, dentro de uma lógica binarista e relacional sexo/gênero, toda uma variedade de expectativas são criadas desde o momento no qual a criança, ainda na barriga da mãe, é identificada como sendo do sexo masculino ou feminino. Nesse contexto, tipos de brinquedos, cores de roupas, modos de agir, entre outros fatores, começam a ser impostos a esses seres, configurando-os para uma mentalidade pré-destinada e aceita socialmente.

Desde pequenos, meninos e meninas serão influenciados por família, escola e mídia, a seguirem padrões previamente estabelecidos e uma lista de predileções, afazeres e tarefas específicas, construídos socialmente como “coisas de meninos” ou “coisas de meninas”. E é dentro dessa construção socialmente definida de papéis de gênero que os estereótipos encontram-se muito presentes.

Dentro de um contexto de categorização, estereótipos são ideias generalizadas e construídas dentro de uma sociedade, utilizadas para pré-definir alguém ou algo, ditando certos comportamentos. Os estereótipos de gênero ditam como homens e mulheres, em uma relação direta com masculinidade e feminilidade, devem agir, quais características devem ter e que funções sociais devem desempenhar.

Uma vez que as culturas diferem de país para país, é possível argumentar que existem pluralidades de masculinidade e feminilidade, já que elas são socialmente construídas dentro de contextos específicos. No entanto, o papel inferior designado à mulher, dentro da construção de uma ideia de sujeito submisso, pode ser visto como um estereótipo de gênero universal e compartilhado, em uma dinâmica de poder que costuma favorecer o homem e a heteronormatividade, ameaçando o pleno exercício da mulher como sujeito de direitos.

Valores como beleza e perfeição estética, instinto maternal intrínseco ao fato de ser mulher, prazer sexual como assunto proibido, inferiorização da capacidade intelectual e ações movidas pela emoção e não pela razão, são alguns dos exemplos de estereótipos de gênero criados socialmente e associados à uma feminilidade.

Na Europa, a partir do séc. XVIII, ensaios e estudos criaram uma sistemática de oposições, onde sexo masculino e feminino eram considerados completamente diferentes, dentro de uma necessidade de se estabelecer uma “hierarquia político-anatômica”, de acodo com Paul B. Preciado4. Diversas teorias, fundadas em aspectos biológicos com supostos vínculos com a ciência, procuravam provar que as mulheres eram intelectualmente inferiores e infantis em sua natureza5. Natureza essa que tinha muito pouco a ver com questões biológicas e diretamente relacionada às construções sociais que melhor convinham para manter as estruturas de poder do homem hétero branco.


A mulher, tomando-se como base análises equivocadas de características biológicas, entre elas a pouca força física e até mesmo o menor peso do cérebro, era considerada o sexo frágil, justificando assim a necessidade dela ficar em casa, ocupando-se de afazeres domésticos e dos filhos. Tudo dentro de uma lógica que procurava legitimar desigualdades sociais e explicar, dentro da construção do papel social de gênero de masculinidade, que homens eram de uma natureza forte, e por causa disso considerados superiores, e suas esposas e filhos considerados suas propriedades.6

No Brasil, no final do século XIX e início do século XX, era entendido pela sociedade que sendo o homem aquele que trabalhava para garantir o sustento da família, ele tornava-se o gestor legal dos bens familiares, dentro de um pensamento hierárquico e patriarcal. As mulheres, por sua vez, sustentadas pelos maridos, deveriam ficar em casa cuidando dos afazeres domésticos e dos filhos. Aquelas que quisessem trabalhar fora de casa eram obrigadas por lei a pedir autorização e, quando conseguiam, eram vistas, dentro das construções sociais de gênero impostas, como desviantes e inadequadas.7

Angela Davis, em sua obra Mulheres, Raça e Classe8, relata que durante os movimentos sufragistas no qual as mulheres brancas norte-americanas eram debatidas pelos homens na questão do direito ao voto, a maioria dos argumentos contrários eram de que mulheres não deveriam relacionar-se com assuntos sobre política e direitos sociais, uma vez que dentro da construção social de feminilidade

da época, a mulher devia ficar dentro de casa, ser submissa e não emitir opiniões. Davis chama atenção, no entanto, para o fato de que a feminilidade era apenas aplicada à mulher branca e de classe média, ao que o feminismo negro vai dar o nome de interseccionalidade. A mulher negra há muito tempo já estava trabalhando fora de casa, buscando sustento para os seus, mas a lógica do racismo que não as via como seres incluídos na sociedade, as excluía das conversas do sufrágio feminino e das convenções sociais de gênero.

No período da Segunda Guerra Mundial várias dessas construções sociais foram colocadas em questionamento, uma vez que com os homens longe de casa as mulheres começaram a ocupar diversas posições até então vistas socialmente como masculinas.

Com a introdução e o aumento da prática dos estudos de gênero, popularização do assunto, mobilização social e mudanças de mentalidade, transformações e expectativas socialmente criadas para os gêneros masculino e feminino foram sendo modificadas.

O modo de se vestir das pessoas, escolhas profissionais antes consideradas apropriadas para homens ou para mulheres, compartilhamento dos afazeres domésticos entre o casal, foram algumas das mudanças que hoje encontram-se mais aceitas e até incentivadas. No entanto, questões como agressões físicas à mulheres, comportamentos sexuais questionados, capacidade intelectual, entre outros, continuam sendo tratados dentro de uma lógica diferenciada9. Mulheres que saem do lar para trabalhar ainda encontram dificuldades no mercado de trabalho, ganhando menos que os homens e com menos possibilidades de alcançar cargos importantes.

Meninas pequenas e jovens são diariamente lembradas de como devem se comportar e o que devem ou não devem almejar, dentro de uma sociedade ainda expressivamente machista e patriarcal. E o mesmo se aplica aos meninos que, crescendo em um ambiente propício a replicar os preconceitos e estereótipos construídos socialmente, também sofrem imposições, perpetuando características e expectativas.


== Ver também ==
== Ver também ==
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*[[Determinismo]]
*[[Determinismo]]


{{referências}}APPIGNANESI, Lisa. Nervos. In: Tristes, loucas e más - A história das mulheres e seus médicos.
{{referências}}

D'AMORIM, Maria Alice. Estereótipos de gênero e atitudes acerca da sexualidade em estudos sobre jovens brasileiros. Temas psicol., Ribeirão Preto , v. 5, n. 3, p. 121-134, dez. 1997 . Disponível em:

<<nowiki>http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X1997000300010&lng=pt&nr</nowiki> m=iso>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. São Paulo: Boitempo, 2016.

DÍAZ, Margarita: CABRAL, Francisco. Relações de Gênero.

Disponível em: <<nowiki>http://www.adolescencia.org.br/site-pt-br/genero-1</nowiki>>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

DOS SANTOS, Jean Carlos. Masculinidades, feminilidades e androginia: uma análise interpretativa sobre a construção social de gêneros e suas implicações para o exercício de liderança no Poder Judiciários de Rondônia. 2013, Porto Alegre.

SANTOS, Juliana Anacleto dos. GÊNERO NA TEORIA SOCIAL: Papéis, interações e instituições. Disponível em: <<nowiki>https://www.ufjf.br/virtu/files/2010/05/artigo4a5.pdf</nowiki>>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

SCOTT, Joan. Gênero: Uma Categoria Útil De Análise Histórica. Educação & Realidade, v.lS, n.2, jul./dez. 1990.


PRECIADO, Paul B. Texto Junkie - Sexo, dorgas e biopolítica na era farmacopornográfica. n-1 edições, 2018.{{esboço-sociologia}}
{{esboço-sociologia}}


{{Identidade sexual}}
{{Identidade sexual}}

Revisão das 20h09min de 2 de setembro de 2021

Na imagem em cima, um homem cuidando de uma criança. Na imagem em baixo, um grupo de mulheres da polícia nacional afegã. Ao longo dos milênios, convencionou-se que mulheres deveriam se focar em tarefas voltadas para a família e homens em assuntos que necessitem força, como serviços militares.

Nas ciências sociais e humanas, papel social de gênero é um conjunto de comportamentos associados com masculinidade e feminilidade, em um grupo ou sistema social. Todas as sociedades conhecidas possuem um sistema sexo/gênero, ainda que os componentes e funcionamento deste sistema variem bastante de sociedade para sociedade.

Definição

Papéis de gênero referem-se a um conjunto de padrões e expectativas de comportamentos que são aprendidos em sociedade correspondentes aos diferentes gêneros e que conformam as identidades dos indivíduos pertencentes a esses grupos. São a manifestação social ou a representação social do que é ser macho ou fêmea, em diferentes culturas ou mesmo dentro de uma mesma cultura, segundo Miriam Grossi.[1] O processo de produção desses comportamentos não se dá de forma individual, mas depende das posições que esses indivíduos ocupam em uma determinada coletividade e em situações sociais concretas.

A maioria dos pesquisadores reconhece que o comportamento dos indivíduos é uma consequência das regras e valores sociais, e da disposição individual, seja genética, inconsciente, ou consciente. Alguns pesquisadores enfatizam o sistema social e outros enfatizam orientações subjetivas e disposições.

Com o passar do tempo mudanças ocorrem sob regras e valores. Entretanto todos os cientistas sociais reconhecem que culturas e sociedades são dinâmicas e mudam. Há extensos debates em como e o quão rápido estas mudanças ocorrem. Tais debates são especialmente intensos quando envolvem o sistema sexo/gênero, já que as pessoas possuem uma gama de visões diferentes sobre o quanto gênero depende do sexo biológico.

Outro ponto de concordância é a possibilidade de mudança dos padrões de comportamento, na medida em que o comportamento dos indivíduos na sociedade é influenciado pela cultura (regras e valores coletivos) e pela disposição interna de cada um ou cada uma.[1][2][3][4]

A identificação dos diferentes comportamentos de gênero é uma ferramenta de análise fundamental para a compreensão do lugar ocupado pela categoria gênero na escala social e o valor socialmente dado a cada um dos grupos e, a partir daí, foi possível a sua desconstrução e desnaturalização.[3]

É importante também assinalar que esses padrões não são absolutos e homogêneos, o que significa que devemos compreendê-los como expectativas socialmente assumidas pela sociedade, mas que não representam o conjunto de atitudes e comportamentos de todos os indivíduos dos grupos de forma homogênea. Para Iris Marion Young, “dizer que uma pessoa é uma mulher pode antecipar algo sobre os constrangimentos e expectativas em geral com os quais ela precisa lidar. Mas não antecipa qualquer coisa em particular sobre quem ela é, o que ela faz, como ela vivencia sua posição social".[5]

Transgeneridade

A categoria gênero também inclui a transgeneridade (ou transexualidade). Hoje sabemos que a sociedade não possui apenas dois gêneros, embora possua dois sexos, e é fundamental identificar o conjunto de gêneros em determinado agrupamento social. Há ainda cientistas que identificam os papéis de gênero com a categoria sexo – homem e mulher, mas mesmo esses assumem que os papéis considerados masculinos ou femininos são socialmente determinados pelo conjunto de regras e valores de um determinado agrupamento humano.[2]

As pessoas rompem as barreiras das identidades de gênero, o que não invalida a sua compreensão enquanto ferramenta de análise. Isso porque a categoria “identidade de gênero” não é a única que descreve o comportamento de um determinado grupo. Individualmente as pessoas são marcadas em seu comportamento de forma diferente e a vida em sociedade nos faz pertencer não somente a uma estrutura social (gênero), mas a um conjunto de estruturas sociais que, da mesma forma, também influenciam seus comportamentos e atitudes e, por consequência, os papéis que cada grupo joga na sociedade, tais como classe social ou fração de classe a que pertence, vivência com relação ao pertencimento de raça, etnia, orientação sexual, etc.

CONSTRUÇÃO DO PAPEL SOCIAL DE GÊNERO E OS ESTEREÓTIPOS

Joan Scott, em seu trabalho Gênero: categoria útil de análise histórica, destaca a importância do termo gênero, uma vez que ele se refere a estudos sobre os papéis considerados adequados aos homens e às mulheres dentro de um contexto de construções sociais, e tem seu valor dentro de uma categoria de análise histórica da sociedade1.

Como argumentado por Alice Eagly em a Teoria do Papel Social, os papéis de gênero podem ser definidos como aquelas expectativas socialmente compartilhadas a respeito dos comportamentos e qualidades apropriados dos indivíduos, uma vez inseridos dentro da caracterização de gênero socialmente definido.


Para a teórica Teresa de Lauretis

“(...) gênero não é um simples derivado do sexo anatômico

ou biológico, mas uma contrução social sociocultural, uma

representação ou, melhor ainda, o efeito do cruzamento das

representações discursivas e visuais que emanam das diferentes

instituições - a família, a religião, o sistema educativo, os meios de

comunicação, a medicina ou a legislação -, mas também de fontes

menos evidentes, como a linguagem, a arte, a literatura, o cinema,

etc.”3 [6]


Pensando a construção social de papel de gênero que designa modos apropriados de pensar e agir relacionados à masculinidade ou à feminilidade, dentro de uma lógica binarista e relacional sexo/gênero, toda uma variedade de expectativas são criadas desde o momento no qual a criança, ainda na barriga da mãe, é identificada como sendo do sexo masculino ou feminino. Nesse contexto, tipos de brinquedos, cores de roupas, modos de agir, entre outros fatores, começam a ser impostos a esses seres, configurando-os para uma mentalidade pré-destinada e aceita socialmente.

Desde pequenos, meninos e meninas serão influenciados por família, escola e mídia, a seguirem padrões previamente estabelecidos e uma lista de predileções, afazeres e tarefas específicas, construídos socialmente como “coisas de meninos” ou “coisas de meninas”. E é dentro dessa construção socialmente definida de papéis de gênero que os estereótipos encontram-se muito presentes.

Dentro de um contexto de categorização, estereótipos são ideias generalizadas e construídas dentro de uma sociedade, utilizadas para pré-definir alguém ou algo, ditando certos comportamentos. Os estereótipos de gênero ditam como homens e mulheres, em uma relação direta com masculinidade e feminilidade, devem agir, quais características devem ter e que funções sociais devem desempenhar.

Uma vez que as culturas diferem de país para país, é possível argumentar que existem pluralidades de masculinidade e feminilidade, já que elas são socialmente construídas dentro de contextos específicos. No entanto, o papel inferior designado à mulher, dentro da construção de uma ideia de sujeito submisso, pode ser visto como um estereótipo de gênero universal e compartilhado, em uma dinâmica de poder que costuma favorecer o homem e a heteronormatividade, ameaçando o pleno exercício da mulher como sujeito de direitos.

Valores como beleza e perfeição estética, instinto maternal intrínseco ao fato de ser mulher, prazer sexual como assunto proibido, inferiorização da capacidade intelectual e ações movidas pela emoção e não pela razão, são alguns dos exemplos de estereótipos de gênero criados socialmente e associados à uma feminilidade.

Na Europa, a partir do séc. XVIII, ensaios e estudos criaram uma sistemática de oposições, onde sexo masculino e feminino eram considerados completamente diferentes, dentro de uma necessidade de se estabelecer uma “hierarquia político-anatômica”, de acodo com Paul B. Preciado4. Diversas teorias, fundadas em aspectos biológicos com supostos vínculos com a ciência, procuravam provar que as mulheres eram intelectualmente inferiores e infantis em sua natureza5. Natureza essa que tinha muito pouco a ver com questões biológicas e diretamente relacionada às construções sociais que melhor convinham para manter as estruturas de poder do homem hétero branco.


A mulher, tomando-se como base análises equivocadas de características biológicas, entre elas a pouca força física e até mesmo o menor peso do cérebro, era considerada o sexo frágil, justificando assim a necessidade dela ficar em casa, ocupando-se de afazeres domésticos e dos filhos. Tudo dentro de uma lógica que procurava legitimar desigualdades sociais e explicar, dentro da construção do papel social de gênero de masculinidade, que homens eram de uma natureza forte, e por causa disso considerados superiores, e suas esposas e filhos considerados suas propriedades.6

No Brasil, no final do século XIX e início do século XX, era entendido pela sociedade que sendo o homem aquele que trabalhava para garantir o sustento da família, ele tornava-se o gestor legal dos bens familiares, dentro de um pensamento hierárquico e patriarcal. As mulheres, por sua vez, sustentadas pelos maridos, deveriam ficar em casa cuidando dos afazeres domésticos e dos filhos. Aquelas que quisessem trabalhar fora de casa eram obrigadas por lei a pedir autorização e, quando conseguiam, eram vistas, dentro das construções sociais de gênero impostas, como desviantes e inadequadas.7

Angela Davis, em sua obra Mulheres, Raça e Classe8, relata que durante os movimentos sufragistas no qual as mulheres brancas norte-americanas eram debatidas pelos homens na questão do direito ao voto, a maioria dos argumentos contrários eram de que mulheres não deveriam relacionar-se com assuntos sobre política e direitos sociais, uma vez que dentro da construção social de feminilidade

da época, a mulher devia ficar dentro de casa, ser submissa e não emitir opiniões. Davis chama atenção, no entanto, para o fato de que a feminilidade era apenas aplicada à mulher branca e de classe média, ao que o feminismo negro vai dar o nome de interseccionalidade. A mulher negra há muito tempo já estava trabalhando fora de casa, buscando sustento para os seus, mas a lógica do racismo que não as via como seres incluídos na sociedade, as excluía das conversas do sufrágio feminino e das convenções sociais de gênero.

No período da Segunda Guerra Mundial várias dessas construções sociais foram colocadas em questionamento, uma vez que com os homens longe de casa as mulheres começaram a ocupar diversas posições até então vistas socialmente como masculinas.

Com a introdução e o aumento da prática dos estudos de gênero, popularização do assunto, mobilização social e mudanças de mentalidade, transformações e expectativas socialmente criadas para os gêneros masculino e feminino foram sendo modificadas.

O modo de se vestir das pessoas, escolhas profissionais antes consideradas apropriadas para homens ou para mulheres, compartilhamento dos afazeres domésticos entre o casal, foram algumas das mudanças que hoje encontram-se mais aceitas e até incentivadas. No entanto, questões como agressões físicas à mulheres, comportamentos sexuais questionados, capacidade intelectual, entre outros, continuam sendo tratados dentro de uma lógica diferenciada9. Mulheres que saem do lar para trabalhar ainda encontram dificuldades no mercado de trabalho, ganhando menos que os homens e com menos possibilidades de alcançar cargos importantes.

Meninas pequenas e jovens são diariamente lembradas de como devem se comportar e o que devem ou não devem almejar, dentro de uma sociedade ainda expressivamente machista e patriarcal. E o mesmo se aplica aos meninos que, crescendo em um ambiente propício a replicar os preconceitos e estereótipos construídos socialmente, também sofrem imposições, perpetuando características e expectativas.

Ver também

Referências

  1. a b GROSSI, Miriam Pillar. «Identidade de gênero e sexualidade» (PDF). Consultado em 14 de outubro de 2013 
  2. a b MEAD, Margaret (1988). Sexo e temperamento em três sociedades primitivas. São Paulo: Perspectiva 
  3. a b SCOTT, Joan (1990). «Gênero: uma categoria útil de análise histórica» (PDF). Revista Educação e Realidade. Porto Alegre. Consultado em 14 de outubro de 2013 
  4. BIROLI, Flávia (2013). «Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista» (PDF). Revista Estudos Feministas. Florianópolis. Consultado em 14 de outubro de 2013 
  5. YOUNG, Iris Marion; BIROLI, Flávia (2013). «Autonomia, opressão e identidades: a ressignificação da experiência na teoria política feminista» (PDF). Revista Estudos Feministas. Florianópolis. p. 89. Consultado em 14 de outubro de 2013 
  6. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. [S.l.: s.n.] 

APPIGNANESI, Lisa. Nervos. In: Tristes, loucas e más - A história das mulheres e seus médicos.

D'AMORIM, Maria Alice. Estereótipos de gênero e atitudes acerca da sexualidade em estudos sobre jovens brasileiros. Temas psicol., Ribeirão Preto , v. 5, n. 3, p. 121-134, dez. 1997 . Disponível em:

<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X1997000300010&lng=pt&nr m=iso>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. São Paulo: Boitempo, 2016.

DÍAZ, Margarita: CABRAL, Francisco. Relações de Gênero.

Disponível em: <http://www.adolescencia.org.br/site-pt-br/genero-1>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

DOS SANTOS, Jean Carlos. Masculinidades, feminilidades e androginia: uma análise interpretativa sobre a construção social de gêneros e suas implicações para o exercício de liderança no Poder Judiciários de Rondônia. 2013, Porto Alegre.

SANTOS, Juliana Anacleto dos. GÊNERO NA TEORIA SOCIAL: Papéis, interações e instituições. Disponível em: <https://www.ufjf.br/virtu/files/2010/05/artigo4a5.pdf>

Acesso em: 25 de jul. 2021.

SCOTT, Joan. Gênero: Uma Categoria Útil De Análise Histórica. Educação & Realidade, v.lS, n.2, jul./dez. 1990.

PRECIADO, Paul B. Texto Junkie - Sexo, dorgas e biopolítica na era farmacopornográfica. n-1 edições, 2018.

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