Espiritualismo

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Ilustração alusiva a uma sessão mediúnica familiar na capa de uma partitura de música (Boston, 1853).

Espiritualismo é uma denominação comum a várias doutrinas filosóficas e/ou religiosas, e tem como fundamento básico a afirmação da existência do espírito (ou alma) como elemento primordial da realidade[1][2], bem como sua autonomia, independência e primazia sobre a matéria[3]. É o contrário de materialismo, que só admite a existência da matéria.

Afirma a existência de uma alma imortal no homem, isto é, de um princípio substancial distinto da matéria e do corpo, razão absoluta de ser da vida e do pensamento. Em sentido mais amplo, doutrina que, além da tese referida, reconhece a existência de Deus, a imortalidade da alma e da existência de valores espirituais ou morais que são o fim específico da atividade racional do homem.

O termo espiritualismo, atualmente, é utilizado para denominar uma variedade enorme de religiões, sistemas filosóficos, doutrinas, crenças e seitas. Cada qual apresentando características próprias e regras particulares. Possuindo, em comum, o fato da crença na preponderância do mundo espiritual sobre o mundo material.

Frequentemente confundido com esoterismo. No entanto, este último tem uma conotação de "doutrina iniciática", ou seja, um conjunto de conhecimentos que só devem ser transmitidos à algumas pessoas escolhidas e preparadas para tal fim (os "iniciados"), não devendo ser vulgarizados[4].

Nos países de língua inglesa, o termo espiritualismo é usado como sinônimo de espiritismo, no sentido de em "espiritualismo experimental"[5]. No início do século XIX, também era usado a expressão "espiritualismo moderno" para identificar aquilo que foi nomeado de espiritismo por Allan Kardec em 1857. Todo espírita é necessariamente espiritualista; mas pode o espiritualista não ser um espírita.

O materialismo admite que pensamento, emoção e sentimentos são exclusivamente reações físico-químicas do sistema nervoso. Portanto, todos os religiosos, se aceitam a alma e Deus, são, por isso mesmo, espiritualistas, visto que essa doutrina admite outros tipos de visões[carece de fontes?].

Tal vocábulo também é empregado como referência à postura de certos indivíduos, que possuem espiritualidade sem religiosidade: são contrários ao materialismo e, ao mesmo tempo, não estão filiados a qualquer segmento religioso.

História

Origens

Antigo Egito: Anúbis, deus dos mortos, preparando um corpo.

Do xamã da América, passando pelo griot ou pelo marabuto islâmico na África, os personagens encarregados de contactar com o mundo dos espíritos (de que o submundo é uma parte), ou pelo contrário, encarregados de impedi-lo, são característicos de múltiplas culturas.

O moderno espiritualismo é geralmente apresentado como a continuação de uma tradição ancestral comum à maior parte das civilizações.[6][7][8][9]

A pré-História

A crença em uma vida após a morte surge primeiramente em fins do período Paleolítico, expressa pela prática de rituais de sepultamento dos mortos e em culto aos ancestrais.

A antiguidade Oriental

No Antigo Egito, o culto dos mortos atesta a sobrevivência do espírito, constituindo-se o Livro dos Mortos em um guia com preceitos e orientações para a viagem após a morte.

No Antigo Testamento, encontram-se diversas passagens alusivas a fenómenos mediúnicos, nomeadamente no Livro dos Números e no Deuteronómio. Numa delas, Moisés proíbe pitonisas e feiticeiras de se comunicar com espíritos. Por outro lado, aprova as atividades mediúnicas de Eldad e Medad. Em outro trecho, Saul, primeiro rei de Israel, consultou a chamada Bruxa de Endor para evocar o espírito do profeta Samuel.

A Civilização Minoica também praticou o culto aos mortos.

A antiguidade clássica

Na Grécia Antiga, era prática corrente a consulta aos oráculos, em busca de conselhos, auxílio e previsões do futuro. O mais famoso localizava-se no Templo de Delfos, dedicado ao deus Apolo, onde a pitonisa, após um banho ritual em uma fonte sulfurosa, sentava-se numa trípode (banco de três pernas) e, entre vapores de enxofre, a mascar folhas de louro (árvore sagrada de Apolo), entrava em transe e transmitia as palavras do deus. No poema "Odisseia", Homero narra o diálogo entre Ulisses e a alma de Tirésias, oráculo de Tebas. O filósofo Sócrates acreditava na imortalidade da alma. O tirano Periandro, de Corinto, consultou a alma de sua mulher (que ele próprio havia mandado degolar).

Na Roma Antiga, cuja religião sofreu forte influência dos antigos gregos, um festival, a "Parentália", celebrado anualmente de 13 a 21 de fevereiro, homenageava os mortos. Durante o resto do ano, as mensagens do além eram recebidas e interpretadas pelos arúspices, personagens que interpretavam os presságios. Complementarmente, as sibilas entravam em transe para consultar os espíritos sobre as inquietudes da população. Cícero, na obra "Tusculanae", afirma que o seu amigo Ápio conversava frequentemente com os espíritos, e que no lago Avernus, sombras dos mortos apareciam na escuridão.

É através dos romanos que temos conhecimento dos druidas Celtas, que afirmavam que os homens constroem o seu destino com as ações praticadas neste mundo. As lendas de sua mitologia estão repletas de "espíritos protetores". Numa delas, o guerreiro Vercingetórix conversa com a alma de heróis mortos em combate.

A Idade Média

No contexto da Guerra dos Cem Anos, a francesa Joana d'Arc afirmava ouvir "vozes sagradas" desde menina. Entre essas destacavam-se as de São Miguel, Santa Catarina e Santa Margarida de Antioquia, que a incentivavam a lutar contra os ingleses. Giordano Bruno, na obra "Il Candelaio" (1582), regista a sua convicção da possibilidade de conversar com os mortos.

Moderno espiritualismo

Emanuel Swedenborg com o manuscrito de "Apocalypsis Revelata" (1766).

O moderno espiritualismo é um movimento religioso, que teve origem por volta do século XIX. A característica marcante deste movimento é a crença em que os espíritos dos mortos podem ser contatados pelos vivos. Assim como os termos espiritismo (1857) e espiritualismo não tem o mesmo significado, o Moderno espiritualismo também difere destes em sua definição, pois especifica o movimento espiritualista surgido por volta do século XIX.[10]

Em O Livro dos Espíritos (1857), Allan Kardec (o codificador do espiritismo), define o espiritualismo: "As palavras espiritual, espiritualista, espiritualismo têm uma significação bem definida; ... Com efeito, o espiritualismo é o oposto do materialismo; quem quer que acredite haver em si mesmo alguma coisa além da matéria é espiritualista; mas não se segue dai que creia na existência dos Espíritos ou em suas comunicações com o mundo visível." Portanto o espiritualismo é uma denominação comum a várias doutrinas filosóficas e/ou religiosas, crendo estas nas comunicações com o mundo incorpóreo ou não.[11]

Enquanto que, o moderno espiritualismo, especifica o espiritualismo desenvolvido, aproximadamente, a partir de Emanuel Swedenborg ao início do século XX, baseando-se na crença da comunicação dos espíritos com o mundo visível. Como é possível identificar o espiritualismo e o moderno espiritualismo estão interligados, mas não possuem o mesmo significado, visto que o primeiro é um termo abrangente e o segundo trata-se de algo mais específico.

O espiritismo trata-se de uma filosofia espiritualista como tantas outras que sejam contrárias ao materialismo, estas poderiam também estar enquadradas no espiritualismo como filosofias. Esta foi a razão pela qual Allan Kardec escreveu em "O Livro dos Espíritos"

Como especialidade, O Livro dos Espíritos contém a Doutrina Espírita; como generalidade liga-se ao espiritualismo, do qual apresenta uma das fases. Essa a razão por que traz sobre o título as palavras: Filosofia Espiritualista.

Todo espírita é espiritualista, mas pode o espiritualista não ser espírita.

O espiritismo está enquadrado como uma doutrina que surgiu no período que recebeu a denominação de moderno espiritualismo - de Emanuel Swedenborg (1688-1772) ao início do século XX, portanto faz parte do moderno espiritualismo da época.[nota 1] Com a tentativa de explicar os movimentos espiritualistas desta época, Kardec codificou a chamada "Doutrina Espírita" (ou espiritismo) que está sistematizada e codificada nas obras básicas do espiritismo.[12] O espiritualismo, o moderno espiritualismo e o espiritismo estão basicamente interligados, porém não possuem o mesmo significado. A seguir serão apresentados os pioneiros do moderno espiritualismo (chamados assim pelas contribuições nos estudos das comunicações com os espíritos).

Precursores do moderno espiritualismo

Ver artigo principal: John Dee

John Dee (1527-1608) foi um matemático e astrólogo inglês que testemunhou a comunicação com os anjos através de médiuns.

Ver artigo principal: Jakob Böhme

Jakob Böhme (1575-1624) foi um filósofo e místico luterano alemão. as suas ideias conquistaram muitos seguidores em toda a Europa e os seus discípulos ficaram conhecidos como os boehmistas.

Surgimento do moderno espiritualismo

Franz Anton Mesmer.
As irmãs Fox (1852).
Salão parisiense com as "mesas girantes" (revista "L'Illustration", 1853).
Senhoras em uma reunião espiritualista (Chicago, 1906).
Ver artigo principal: Emanuel Swedenborg

Emanuel Swedenborg (29 de janeiro de 168829 de março de 1772) foi um cientista e filósofo sueco. Formado na Universidade de Uppsala no equivalente hoje a Engenharia de Minas, viajou pela Inglaterra, os Países Baixos e a França. Ao retornar ao seu país, Carlos XII da Suécia convidou-o para aluno do inventor Christopher Polhem, uma das figuras mais importantes no processo de industrialização do país.

Abalado pela morte do pai em 1736, passou a empregar o seu tempo livre para provar a existência da alma, o que desembocou num estudo de anatomia.[13] Anos mais tarde, em 1743, durante um jantar em Londres viu um espírito que lhe disse: "Não coma demais". A mesma entidade manifestar-se-ia mais tarde, acordando Swedenborg de seu sono, identificando-se como Jesus Cristo e comunicando-lhe que o cientista tinha sido escolhido para revelar ao mundo o significado da Bíblia.

De 1747 até à sua morte, em 1772, viveu em Estocolmo, nos Países Baixos e em Londres. Durante esses 25 anos redigiu 14 trabalhos de natureza espiritual dos quais a maioria foi publicada durante a sua vida. Considerado um farsante por Immanuel Kant[14] e um poderoso médium por Arthur Conan Doyle,[15] as suas ideias encorajaram novas correntes de pensamento, como o martinismo e a teosofia.

Ver artigo principal: Franz Anton Mesmer

Franz Anton Mesmer (23 de maio de 17345 de março de 1815) descobriu o que chamou "magnetismo animal", também referido como "mesmerismo". O desenvolvimento das ideias e práticas de Mesmer levou o cirurgião escocês James Braid (1795–1860) a desenvolver o hipnotismo em 1841.

O espiritismo incorporou e conservou algumas práticas inspiradas ou diretamente tiradas do Mesmerismo, entre as quais o passe, e a chamada "água fluidificada" (fluidoterapia), utilizada como um remédio para o corpo físico e o corpo espiritual.

Ver artigo principal: Justinus Kerner

Justinus Kerner (1786-1862) publicou em 1830 o relato de suas observações sob o título "Die Seherin von Prevorst, Eröffnungen über das Leben - Menschen und über das Hineinragen einer Geisterwelt die unsere" ("A vidente de Prevorst, considerações iniciais sobre a vida interior do ser humano e a intervenção de um mundo dos espíritos no nosso").

Ver artigo principal: Irmãs Fox

As irmãs Fox - Catherine "Kate" (1838–1892), Leah (1814–1890) e Margaret (1836–1893) -, tiveram um papel decisivo no surgimento do espiritismo. Eram filhas de David e Margaret Fox, e foram residir em Hydesville, Nova Iorque. Em 1848 a família começou a ouvir sons de pancadas inexplicados. Kate e Margaret realizaram sessões de canalização numa tentativa de contato com a suposta entidade espiritual que promovia os sons, e declararam ter estabelecido contato com o espírito de um mascate que fora alegadamente assassinado e enterrado sob a casa. Um esqueleto, posteriormente encontrado na cave pareceu confirmar isso. As irmãs Fox tornaram-se imediatamente em celebridade. Suas demonstrações de comunicação com os espíritos incluíam principalmente batidas e pancadas e Kate tinha também a mediunidade de escrita direta, psicofonia, luzes espirituais, materialização e poltergeist.[16]

Os céticos suspeitaram que isto foi apenas um engano inteligente e uma fraude. Margaret posteriormente afirmou a utilização das juntas dos dedos dos seus pés para produzir sons mas depois ainda desmentiu essa sua afirmação, alegando tê-la feito em troca de dinheiro de religiosos que se aproveitaram da situação de pobreza dela e de suas irmãs. Todavia, a crença na capacidade de comunicar-se com os mortos cresceu rapidamente, constituindo um movimento religioso chamado moderno espiritualismo, e contribuindo em grande medida para as ideias de Allan Kardec.

Ver artigo principal: Andrew Jackson Davis

Andrew Jackson Davis (1826-1910) sem qualquer educação científica foi capaz de produzir livros muito complexos para a sua época. Ditava os seus textos enquanto se encontrava em um estado de transe profundo e adquiriu nos Estados Unidos uma reputação de médium e de magnetizador.

Ver artigo principal: Mesas girantes

Logo após as notícias acerca das Irmãs Fox terem chegado à França, o interesse do público foi despertado pelo que por vezes foi denominado de "telégrafo espiritual". No início uma mesa girava com a "energia" dos espíritos presentes através de um ser humano intermediário (de onde a expressão "médium"). Mas, como o processo era demasiado lento e embaraçoso, um novo foi criado, supostamente por uma sugestão dos próprios espíritos: a "tábua falante".

Os primeiros exemplares de "tábuas falantes" eram cestos atados a um objeto pontiagudo que se movia sob as mãos dos médiuns, apontado para letras impressas em cartões espalhados em volta de, ou gravados em, uma mesa. Tais dispositivos foram chamados "corbeille à bec" ("cesto com um bico"). O objeto pontiagudo era normalmente um lápis.

Esses dispositivos eram de montagem e operação simples. Uma sessão típica consistia em pessoas a sentar-se em uma mesa redonda, os pés a descansar nos suportes das cadeiras e as mãos sobre o tampo de mesa ou, mais tarde, na própria tábua falante. A energia canalizada dos espíritos pelas mãos dos presentes fazia a tábua movimentar-se e indicar as letras que, uma vez registadas por um dos presentes, formavam palavras, frases e orações inteligíveis. O sistema foi um primitivo e menos eficiente antecessor dos tabuleiros Ouija que posteriormente se tornariam tão populares.

Espiritismo

O educador francês Allan Kardec, codificador do espiritismo.
Ver artigo principal: Espiritismo

Na França, o professor Hippolyte Léon Denizard Rivail interessou-se pelo moderno espiritualismo quando ouviu falar das Irmãs Fox, mas o seu primeiro contato com o fenómeno foi por meio das mesas dançantes ou mesas girantes, dos salões de Paris, em 1854. As explicações para a causa deste, do mesmo modo que o sistema filosófico delas derivado, constituiu a base da chamada Doutrina Espírita (que Rivail também denominou como "espiritismo", tendo sido a primeira oficialização desse termo, por isso a doutrina espírita é o único verdadeiro espiritismo).

As investigações de Rivail resultaram na publicação, sob o pseudónimo de Alan Kardec, de "O Livro dos Espíritos" (1857), "O Livro dos Médiuns"" (1861), "O Evangelho Segundo o Espiritismo" (1864), "O Céu e o Inferno" (1865) e A Gênese (1868). Em 1858 fundou a "Revue Spirite", que dirigiu até 1869, ano em que faleceu.

Logo na segunda metade do século XIX, muitas personalidades de renome, na Europa e nos Estados Unidos vieram a abraçar o espiritismo como uma explicação lógica da realidade, inclusive de temas relacionados com a transcendência, como Deus e a vida após a morte.

Espiritualismo e ciência

Para maiores detalhes, consulte Fenômenos espíritas e a ciência

Históricamente, em termos de medicina, indivíduos com sintomas como audição ou visão de "espíritos" foram tratados como sendo portadores de transtornos mentais; contudo, há muito a Organização Mundial de Saúde reconhece que esses sintomas não necessariamente implicam causas patogênicas de natureza física; e que em certos casos ou contextos, esses nem sequer implicam doença, para ser exato. Em verdade, desde sua fundação em 1948 [17], mesmo que criticada por vários autores que sugerem e esperam por alterações - para alguns considerada utópica, para outros incompleta por excluir o bem estar espiritual ou mesmo coletivo da definição [18] - segundo a Organização Mundial de Saúde, a definição de "saúde" faz-se pelo "estado de completo bem-estar físico, psicológico, e social" do ser humano [19].

Um dos experimentos do cientista inglês sir William Crookes, pelo qual ele atestou a mediunidade de Daniel Dunglas Home (c. 1870).

No tocante à ausência de "saúde", a Organização Mundial de Saúde mantém a Classificação internacional de doenças (CID)[20], atualmente em sua décima revisão [21][22], e no que tange o assunto espiritualismo essa é recorrente em discussões, sobretudo os que visam à valoração científica, dado o fato de na CID-10 encontrar-se referência explicita aos transtornos "possessivos".

Com esse enfoque, verifica-se que é realmente verdade que a CID-10 reconhece que podem ser comprometedores a saúde, em seu item F.44.3, os chamados "Estados de transe e de possessão", nela definidos como:

Transtornos caracterizados por uma perda transitória da consciência de sua própria identidade, associada a uma conservação perfeita da consciência do meio ambiente.

Contudo, explicitamente descreve em alínea seguinte:

Devem aqui ser incluídos somente os estados de transe involuntários e não desejados, excluídos aqueles de situações admitidas no contexto cultural ou religioso do sujeito.[23] [24]
"Croquis" de um médium: gravura da obra "Extériorisation de la sensibilité" de Albert de Rochas (Paris, 1899).

Nesse sentido é feita a distinção entre o estado de transe normal - a exemplo a hipnose, não considerado doença - e o transtorno dissociativo psicótico, uma patologia psiquiátrica. Exclui-se desse item também, entre outros, a esquizofrenia. E mesmo que muitos adeptos da existência dos "espíritos" afirmem o contrário, e busquem na presença da palavra "possessão" no referido item da CID a implicação de que a Organização Mundial de Saúde reconhece a existência de espíritos [25], evidencia-se também na CID-10 que os estados de transe tidos por espiritualistas como oriundos de "possessões espirituais" - certamente os defendidos em ambientes religiosos - não são reconhecidos como possuindo tal causa; não encontram-se acobertados por tal item, e não constituem estados que requerem tratamento, acompanhamento ou intervenção, quer médico, quer psicológico, quer similar. O item F.44.3 inclui-se no grupo das desordens neuróticas, relacionadas ao estresse ou ainda somatoformes.

A expressão "possessão" figura no referido item da CID com acepção que remete aos estados de agitação demasiada, de agressividade ou mesmo de fúria; e mediante tal acepção a leitura do item associado em íntegra implica, nitidamente, o não reconhecimento da tal causa "espiritual" (vide alínea). Argumento em favor da asserção inicial deriva também do fato de que o reconhecimento de tal causa pela Organização Mundial de Saúde implicaria a necessidade de tratamento ou acompanhamento específicos visto serem tais estados de "possessão" prontamente reconhecido, antes de mais nada pelos próprios espiritualistas, como situações muitas vezes prejudiciais à saúde do "possuído"; e que requerem por tal tratamento ou mesmo acompanhamento "espiritual" imediato, tratamentos esses certamente fornecidos - segundo suas crenças - pelos referidos grupos ou autoridades religiosas "capacitadas" junto aos seus templos ou ambientes de reuniões [26][27]; contudo ainda não definidos, estabelecidos, e pelo que consta não cogitados pela Organização Mundial de Saúde [28].

É importante ressaltar também que o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, em sua quarta revisão (1994), incluiu advertência contra a interpretação equivocada de experiências espirituais ou religiosas como transtornos mentais e distinguiu dos transtornos mentais uma outra categoria de problemas classificados como “outras circunstâncias que podem ser foco de atenção clínica”, incluindo-se a isto uma subcategoria específica denominada “problemas espirituais ou religiosos”, para a orientação de profissionais da saúde no diagnóstico e tratamento de alguns possíveis problemas não-patológicos dos pacientes.[29]

A Medicina segue assim a posição científica: mesmo estudados por várias personalidades de renome que acabaram por contribuir de outras formas, significativas ou não, à ciência em sua acepção moderna, tais cientistas não foram capazes de elucidar ou concluir pela existência de fatos que obedeçam aos rigores científicos e que levem à conclusão provada da realidade natural dos espíritos. A metodologia utilizada pelas correntes espíritas ou é bem diferente ou transcende o método científico, e por tal o espiritismo permanece, ainda hoje, como tema não científico quando se considera a acepção "stricto sensu" de ciência, encontrando-se o espiritismo notoriamente muito mais atrelado às religiões do que às academias científicas propriamente ditas.[30][31][32]

Em resumo, embora evoluindo gradualmente e já reconhecendo a influência do estado de espírito na saúde e bem-estar, verifica-se que, sendo uma cadeira científica, a medicina e a OMS mantêm-se alinhadas com a metodologia científica; e como a existência de espíritos não encontra-se cientificamente estabelecida ou tampouco provada[33][34], questões de saúde a eles atrelados transcendem necessariamente a medicina moderna.

Impacto cultural

Na cultura popular, muitas obras de arte apresentam ou contêm alusões a fatos, circunstâncias e conceitos que se assemelham ou retratam algumas crenças espiritualistas (principalmente crenças espíritas):

Literatura

O percurso de Dante do mundo espiritual, em um exemplar da Divina Comédia: ao lado da entrada para o inferno, os sete terraços do Monte Purgatório e a cidade de Florença, com as esferas do Céu acima (afresco de Domenico di Michelino, 1465).
"Hamlet e o fantasma" (gravura de Henry Fuseli, 1789).

Cinema

  • Sole Survivor (1970), um filme para a televisão protagonizado por Vince Edwards e Richard Basehart, desenvolve um enredo que se inicia com a queda de um bombardeiro B-25 Mitchell no deserto da Líbia durante a Segunda Guerra Mundial com a morte de todos os membros da tripulação. Décadas mais tarde, os destroços são localizados e uma equipa da Força Aérea é enviada ao local do acidente para investigá-lo. Os espíritos dos membros da tripulação, inconscientes de sua condição de mortos, continuam no local, à espera de serem salvos por uma expedição de resgate. O comportamento dos espíritos dos mortos nesta história é coerente com os ensinamentos da doutrina espírita.[38]
  • What Dreams May Come (1998), protagonizado por Robin Williams, falecido marido de uma artista plástica que já havia perdido os filhos num acidente de automóvel. A trama gira em torno da existência de diferentes planos espirituais, da possibilidade de comunicação entre eles, e da influência que os espíritos além da vida podem exercer sobre os vivos.
  • The Sixth Sense (1999), protagonizado por Haley Joel Osment no papel de um rapaz com capacidades mediúnicas, que recebe assistência de um psicólogo infantil (Bruce Willis) que não acredita em vida após a morte. A trama gira em torno da imortalidade da alma e da comunicação com os mortos. O filme teve seis indicações ao Óscar.[41]
  • The Gift (2000), protagonizado por Cate Blanchett, no papel de uma viúva, médium, que cobra pelos seus dons. A trama gira em torno de dois conceitos importantes para o espiritismo: os bons sempre recebem ajuda nos momentos difíceis e a mediunidade não deve servir a interesses materiais.
  • What Lies Beneath (2000), dirigido por Robert Zemeckis e protagonizado por Michelle Pfeiffer no papel de uma esposa traída que começa a ouvir vozes e a ver a imagem de uma jovem. É encaminhada a um psiquiatra pelo marido (Harrison Ford) que acredita tratar-se de algum distúrbio psicológico. O filme aborda a temática da mediunidade involuntária, que se manifesta independentemente da vontade do médium e que muitas vezes é confundida com perturbação mental.
  • Yesterday's Children (2000), filme baseado no livro autobiográfico de Jenny Cockell. O filme conta a história de Jenny (Jane Seymour), uma mulher que tem visões e sonhos de sua última encarnação, como Mary, uma mulher irlandesa que faleceu em 1932, aos 37 anos. Intrigada, Jenny viaja para a Irlanda, em busca de seus filhos da encarnação passada.
  • Shutter (2004) filme tailandês que retrata uma situação de obsessão espiritual razoavelmente precisa com o que relata o espiritismo. Teve um remake norte-americano em 2008.
  • Chico Xavier (2010), filme brasileiro protagonizado por Nelson Xavier e Ângelo Antônio. Narra a biografia do mais famoso e aclamado médium brasileiro, Francisco Cândido Xavier, tendo alcançado a marca de 3,5 milhões de espectadores nos cinemas em 2010.[44]

Televisão

Telenovelas

No Brasil, diversas telenovelas apresentaram conceitos espiritualistas, semelhantes aos que são contidos no espiritismo:

  • "O Profeta" (1977), produzida pela extinta TV Tupi, e que também conheceu "remake" pela TV Globo (ver O Profeta (2006)), mostra o personagem principal como um médium, capaz inclusive de predizer o futuro.
  • "Terra Nostra" (1999) incluiu uma subtrama acerca de um jovem obsidiado pelo espírito do jovem amante da sua mãe que havia sido morto por seu avô.
  • "Alma Gêmea" (2005), produzida pela TV Globo, narra a história de uma mulher que morre e renasce para reencontrar a sua alma gémea.
  • "Duas Caras" (2007), produzida pela TV Globo, incluiu um personagem chamado Ezekiel,[53] que era anti-cristão graças a manifestações de sua mediunidade.
  • "Escrito nas Estrelas" (2010), apresenta muitos temas espíritas, tais como a reencarnação, a evolução dos espíritos e a mediunidade.
  • "Amor Eterno Amor" (2012), apresenta forte presença do espiritismo kardecista, com inúmeras cenas retratando práticas mediúnicas.

Ver também

Notas

  1. A História do Espiritualismo - De Swedenborg ao início do século XX— Nota:. A FEB traduziu e publicou a obra em português conforme está no original em inglês —The History of Spiritualism— desta forma para evitar a confusão inerente em algumas editoras, que traduziram erroneamente, substituindo o próprio titulo da obra que ficou sendo reconhecida como: A História do Espiritismo. Entretanto, em inglês:. "Spiritualism" significa espiritualismo, e não espiritismo, este último termo em inglês é escrito:. "spiritism"

Referências

  1. Enciclopédia Eletrônica Barsa - versão 1.11 - CD - Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda.
  2. http://www.merriam-webster.com/dictionary/spiritualism
  3. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - CD - versão 1.0.5
  4. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa - CD - versão 1.0.5
  5. Enciclopédia Universo - Editora Delta e Editora Trẽs.
  6. "Si le spiritualisme naît aux États-Unis en 1847, si le spiritisme est théorisé en France à partir de 1854, ni les sœurs Fox ni Kardec ne sont les 'inventeurs' d'une pratique qui semble vieille comme le monde et répandue dans tous les cultures." BOUCHET, Christian, Spiritisme, Pardès, 2004, p. 11.
  7. "(...) the most prominent features of modern Spiritism are found in the ancient practices of Necromancy" Liljencrants p. 10 e "(...) however sudden may have been the rise of Modern Spiritism, it can not be said to have sprung into being on unprepared soil, for its way had been broken by Swedenborgianism and Mesmerism, which may be said to have been its direct forerunners" p. 12 op.cit.
  8. TAGER, Djénane Kareh, Le Spiritisme, Plon, 2006, 4×10{{{1}}} de cobertura "Que disent les religions de la communication avec l'au-delà? Comment se sont développées les techniques de contact avec les morts, depuis l'invocation des oracles de l'Antiquité jusqu'à l'utilisation d'internet? (...)"
  9. Le spiritisme dans le monde. l'initiation et les sciences occultes dans l'inde et chez tous les peuples de l'antiquité de Louis Jacolliot Marpon et Flammarion, 1900.
  10. A História do Espiritualismo - De Swedenborg ao início do século XX— publicado por Arthur Conan Doyle, em Londres (1926). O autor foi Presidente de Honra da Federação Espiritualista Internacional, Presidente da Aliança Espírita de Londres e Presidente do Colégio Britânico de Ciências Psíquicas, nos séculos XIX e XX
  11. O Livro dos Espíritos, primeiro livro da Codificação Espírita, Introdução, parte I - Espiritismo e Espiritualismo
  12. As obras básicas da Doutrina Espirita -O Livro dos Espíritos- Publicado em 1857. -O Livro dos Médiuns- Publicado em 1861. -O Evangelho Segundo o Espiritismo- Publicado em 1864. -O Céu e o Inferno- Publicado em 1865. -A Gênese- Publicado em 1868. Estes cinco livros foram publicados pelo pedagogo francês Hippolyte León Denizard Rivail sob o pseudônimo de Allan Kardec, entre 1857 e 1868, os quais compõem a Codificação Espírita
  13. DOLE, George F. "A Thoughtful Soul: Reflections from Swedenborg". Swedenborg Foundation, 1995.
  14. KANT, Immanuel. "Dreams of a Spirit Seer".
  15. DOYLE, Arthur Conan. História do Espiritismo.
  16. Doyle 1926: volume 1, p. 98.
  17. Frequently Asked Questions ; What is the WHO definition of health? - World Health Organization - Acessado em 28-01-2013 às 12:30 horas UTC
  18. Re-defining Healt - Bulletin of the World Health Organization
  19. Mental health - World Helth Organization
  20. International Classification of Diseases (ICD)
  21. International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems 10th Revision Volume 2 - Instruction manual
  22. ICD Version:2010
  23. F44 Transtornos dissociativos (de conversão). in FAU.com.br, consultado em 30 ago 2011.]
  24. CID em sua versão 10, conforme publicado pela Word Healt Arganization (WHO)
  25. Chaves, José Reis - "OMS reconhece a influência dos espíritos em nossa vida. A Organização Mundial de Saúde e sua coragem de dizer a verdade." - Coluna no jornal O Tempo de 14/01/2013 - Belo Horizonte
  26. Desobsessão - Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira - Federação Espírita Brasileira - Departamento Editorial - Rua Souza Valente, 17 CEP: 20941-040 - Rio - RJ - Brasil
  27. Chaves, José Reis - "A Organização Mundial de Saúde e sua coragem de dizer a verdade." - Artigo online do jornal O Tempo de 14/01/2013, e discussões - Belo Horizonte, MG.
  28. International Classification of Health Interventions (ICHI) - World Health Organization
  29. GREYSON, Bruce. Experiências de quase-morte: implicações clínicas. Rev. psiquiatr. clín., São Paulo , v. 34, supl. 1, 2007 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832007000700015&lng=en&nrm=iso>. access on 21 Nov. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-60832007000700015.
  30. Para maiores detalhes e referências, consulte Fenômenos espíritas e a ciência.
  31. "A ciência só pode determinar o que é, não o que 'deve ser', e fora de seu domínio permanece a necessidade de juízos de valor de todos os tipos" (Albert Einstein); "O homem domina a natureza não pela força, mas pela compreensão. É por isto que a ciência teve sucesso onde a magia fracassou: porque ela não buscou um encantamento para lançar sobre a natureza" (Jacob Bronowski). Ambas as citações conforme relatado por SINGH, Simon. Big Bang. p. 459.
  32. SINGH, Simon. Big Bang. Rio de Janeiro; São Paulo: Editora Record, 2006. ISBN 85-01-07213-3 Capítulo "O que é ciência?", e demais.
  33. (Vários colaboradores) Buckingham, Will; et. alli. - O Livro da Filosofia - Editora Globo - São Paulo, SP - 2011 - ISBN: 978-85-250-4986-5
  34. Cartner, Rita; et alii - O Livro do Cérebro - Rio de Janeiro - Agir - 2012 - ISBN:978-85-220-1361-6
  35. Deste tempos antigos, como em I Samuel 9:9 ("(Antigamente em Israel, indo alguém consultar a Deus, dizia assim: Vinde, e vamos ao vidente; porque ao profeta de hoje, antigamente se chamava vidente)."), e como prática corrente, como em I Samuel 10:6–24 ("E o Espírito do SENHOR se apoderará de ti, e profetizarás com eles, e tornar-te-ás um outro homem. (...)". Conforme o contexto, constituía-se numa prática arriscada, como ilustrado em II Crônicas 16:7–10.
  36. Outra evidência da existência desta prática entre o povo judeu, uma vez que não se proíbe aquilo que não existe: «Entre ti não se achará quem faça passar pelo fogo a seu filho ou a sua filha, nem adivinhador, nem prognosticador, nem agoireiro, nem feiticeiro; / Nem encantador, nem quem consulte a um espírito adivinhador, nem mágico, nem quem consulte os mortos; / Pois todo aquele que faz tal coisa é abominação ao SENHOR; e por estas abominações o SENHOR teu Deus os lança fora de diante de ti.» (Deuteronômio 18:10–12)
  37. O episódio da chamada Bruxa de Endor descreve o modo pelo qual era praticada a invocação do espírito dos mortos na região, à época, no que seria hoje considerada uma simples sessão mediúnica. Ver I Samuel 28:1–25.
  38. Sole Survivor - Vince Edwards, Richard Basehart, William Shatner, Lou Antonio - 1970
  39. http://www.imdb.com/title/tt0099653/?ref_=sr_3
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  53. Duas Caras, Personagens: Ezequiel

Bibliografia

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