Linha da Beira Alta
A Linha da Beira Alta é uma linha ferroviária internacional que liga o entroncamento ferroviário da Pampilhosa (Linha do Norte), perto de Coimbra, à fronteira com Espanha, em Vilar Formoso, com percurso paralelo ao eixo do rio Mondego; inaugurada em 3 de Agosto de 1882[1], é a principal ligação ferroviária de Portugal com a Europa.
Descrição
Possui um traçado bastante sinuoso, com grandes rampas e curvas de raio reduzido.[2]
História
Planeamento, construção e inauguração
A construção desta Linha detinha uma elevada importância, pois a região possuía uma forte densidade populacional, um grande número de indústrias, principalmente de fiação e tecelagem, e uma considerável produção agrícola, especialmente de gado e vinho[3]; com efeito, desde a sua abertura que se revelou como uns dos eixos mais importantes da rede ferroviária portuguesa, dos pontos de vista nacional e internacional.[1]
Esta ligação foi discutida pela primeira vez numa proposta parlamentar em 1874, tendo sido modificada por comissões parlamentares no ano seguinte; a proposta foi ratificada por uma lei de 26 de Janeiro de 1876, que estabeleceu a cidade de Coimbra como ponto inicial da Linha.[1] Foram, então, abertos dois concursos, em 20 de Maio e 11 de Setembro do mesmo ano, mas só apareceu uma proposta, que foi recusada porque se considerava prejudicial aos interesses públicos; entretanto, foi aprovado, em 25 de Maio, um novo plano, que estabelecia a estação inicial na Pampilhosa.[1] Devido ao insucesso dos concursos, o governo entregou ao parlamento, em 8 de Janeiro de 1877, uma moção para realizar a construção desta Linha; no entanto, no debate que se seguiu, decidiu-se fazer um novo concurso, que foi aberto pela lei de 23 de Março de 1878.[1] Um contrato foi, assim, lavrado no dia 3 de Agosto desse ano, com a Société Financière de Paris, que fundou a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses da Beira Alta para construir e explorar a Linha[1][4]; esta iniciou as obras logo em Outubro, no troço entre Vilar Formoso e Pampilhosa.[1] Desde o início, no entanto, que se procurou continuar a Linha da Beira Alta da Pampilhosa até à Figueira da Foz, que, devido ao seu porto marítimo, se apresentava indispensável para o tráfego da Linha, que se previa ser bastante intenso; esta pretensão entrou, porém, em conflito com os planos da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses, que também tinha planeado continuar as suas linhas até aquela cidade, segundo um contrato de 14 de Setembro de 1859.[1] Foi, assim, aberto o concurso para a ligação ferroviária até à Figueira da Foz, tendo a Companhia da Beira Alta pedido apenas metade do subsídio estatal que tinha sido imposto à Companhia Real, e, em 30 de Agosto de 1879, alterou as suas condições, prescindindo de quaisquer apoios financeiros por parte do governo; desta forma, a Junta Consultiva das Obras Públicas consignou-lhe a construção, tendo o contrato provisório sido assinado em 31 de Outubro, aprovado pelas cortes logo após a sua apresentação, em 19 de Janeiro de 1880, e promulgado por uma lei de 31 de Março.[1] Entretanto, a Companhia Real fez uma reclamação, que foi indeferida pelo Tribunal Arbitral em 7 de Outubro de 1880.[1]
O troço entre a Pampilhosa e Vilar Formoso entrou ao serviço, de forma provisória, em 1 de Julho de 1882, tendo a linha sido completamente inaugurada, entre a Figueira da Foz e a fronteira, no dia 3 de Agosto do mesmo ano.[1][5] Assim, a Linha da Beira Alta atingia, na sua totalidade, 252.522 quilómetros de comprimento.[6]
Entre Julho de 1895 e 1900, o Sud Express foi realizado pela Linha da Beira Alta.[4]
Século XX
A circulação nesta linha foi, tal como noutras ligações ferroviárias em Portugal, reduzida em 1917, devido à escassez de carvão sentida nesta altura, como resultado da Primeira Guerra Mundial.[4] Os funcionários da Companhia participaram, junto com os empregados de outras empresas ferroviárias em Portugal, na greve de 3 de Junho de 1918.[5]
Em 2 de Junho de 1926, o director geral da Companhia informa a Comissão Executiva que as pontes da Linha não conseguiam sustentar a passagem das locomotivas da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, devido ao seu peso.[5]
A exploração e o material circulante da Companhia dos Caminhos-de-ferro Portugueses da Beira Alta passaram para a gestão da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses em 2 de Maio de 1930, data em que o contrato de trespasse foi assinado.[5] A escritura para a transferência da concessão da Companhia da Beira Alta só foi, no entanto, executada em 28 de Fevereiro de 1946.[5]
Em 22 de Abril de 1937, a Companhia da Beira Alta suspendeu todo o tráfego internacional devido à Guerra Civil Espanhola, e, em 11 de Fevereiro de 1942, o tráfego nacional também é reduzido, por falta de combustível.[5]
Em 2 de Julho de 1953, é concedida, à firma alemã Fried Krupp Stahlban Rheinhausen, a empreitada da renovação das pontes metálicas nesta Linha; em 20 de Agosto do mesmo ano, o Conselho de Ministros autorizou que fossem entregues, como comparticipação do Departamento da Defesa Nacional, 15.000.000 de escudos à Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, para proceder à substituição das seis pontes na Linha da Beira Alta.[5] Em 1958, a Companhia empreendeu a renovação de várias pontes nesta Linha, no âmbito do I Plano de Fomento.[5]
Em 11 de Setembro de 1985, ocorreu o pior acidente ferroviário em Portugal, quando duas composições colidiram junto ao Apeadeiro de Alcafache, resultando em cerca de 150 mortos.[7]
Em Setembro de 1993, já se encontravam a circular as carruagens Sorefame remodeladas entre Lisboa e a Guarda.[8]
Em 1994, a Linha da Beira Alta era uma das principais ligações ferroviárias em Portugal, concentrando grande parte do tráfego internacional de mercadorias e passageiros, como os serviços Sud Express e o Lusitânia-Expresso. Assim, foi alvo de profundas obras de remodelação e modernização, em parte financiadas pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional. As obras incidiram, principalmente, nas estações e na via, tendo-se procedido à sua electrificação. Após o fim das obras, puderam introduzir-se as locomotivas da Série 5600, de tracção eléctrica.[2][9] Nesse ano, circulavam, entre Lisboa e Guarda, serviços Regionais na modalidade Auto-Expresso, que permitiam o transporte de automóveis[10]; este serviço seria terminado, nesta Linha, em 1 de Março de 2006, devido à introdução das automotoras da Série 2240.[11]
Em 1996, entraram ao serviço, no âmbito do programa de modernização da Linha da Beira Alta, os sistemas de sinalização automática e de telecomunicações, implementados entre as estações de Pampilhosa e Vilar Formoso.[4]
Século XXI
Em Novembro de 2006, uma composição Intercidades abalroou um veículo automóvel na passagem de nível de Oliveirinha; este acidente provocou danos na locomotiva, mas não houve vítimas a registar, tendo o único ocupante da viatura abandonado o veículo quando se apercebeu da chegada do comboio.[12]
A circulação ferroviária nesta Linha foi interrompida em Agosto de 2009, entre as localidades de Contenças e Gouveia, por causa de um incêndio florestal[13], e, em Fevereiro de 2010, devido à passagem do Ciclone Xynthia.[14] Em Agosto do mesmo ano, o tráfego foi, novamente, suspenso, devido ao deflagrar de um incêndio em Mangualde.[15]
Ver também
Referências
- ↑ a b c d e f g h i j k TORRES, Carlos Manitto (16 de Março de 1958). «A evolução das linhas portuguesas e o seu significado ferroviário». Lisboa. Gazeta dos Caminhos de Ferro. 71 (1686): 133, 134
- ↑ a b «Beira alta, Beira baja y los Ramales de Cáceres y Badajoz (I)». Madrid: A. G. B., s. l. Maquetren (em espanhol). 3 (26): 45, 50 1994
- ↑ Santos, 1995:116-118
- ↑ a b c d «150 Anos de História». Comboios de Portugal. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ a b c d e f g h «Cronologia». Comboios de Portugal. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ SOUSA, J. Fernando de (1 de Março de 1934). «Direcção Geral de Caminhos de Ferro: Relatório de 1931-1932». Lisboa. Gazeta dos Caminhos de Ferro. 47 (1109). 129 páginas
- ↑ BORGES, Alexandre (7 de Setembro de 2005). «Painel evoca 20 anos do acidente de Alcafache». Bombeiros Voluntários de Canas de Senhorim. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ BRAZÃO, Carlos (1993). «Nueva generación de coches intercidades». Maquetren (em espanhol). 2 (20). 23 páginas
- ↑ «252 y 5600: Automotoras de Alta Velocidad». Madrid: Resistor, S. A. Maquetren (em espanhol). 2 (18). 37 páginas 1993
- ↑ «Beira alta, Beira baja y los Ramales de Cáceres y Badajoz (II)». Maquetren (em espanhol). 3 (30). 8 páginas. 1994
- ↑ LAVRADOR, Filipe (24 de Fevereiro de 2006). «http://www.transportes-xxi.net/noticias/163». Transportes XXI. Consultado em 29 de Novembro de 2010 Ligação externa em
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(ajuda) - ↑ CUNHA, João (27 de Novembro de 2006). «Acidente em PN da Beira Alta». Transportes XXI. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ «Circulação de comboios cortada entre Contenças e Gouveia». Diário Digital. 19 de Agosto de 2009. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ SARAMAGO, João (27 de Fevereiro de 2010). «Xynthia pára auto-estradas e comboios». Correio da Manhã. Consultado em 29 de Novembro de 2010
- ↑ RESENDE, Elsa (10 de Agosto de 2010). «Incêndios: Reaberta Linha da Beira Alta - Refer». European Pressphoto Agency e Google. Consultado em 29 de Novembro de 2010
Bibliografia
- SANTOS, Luís Filipe Rosa (1995). Os Acessos a Faro e aos Concelhos Limítrofes na Segunda Metade do Séc. XIX. Faro: Câmara Municipal de Faro. 213 páginas
- BISCAIA, Álvaro Cação (2010). Linha da Beira Alta. Figueira da Foz: Casino Figueira, cb associação de ideias Publicações
Ligações externas
- Pedro Zúquete: «Estudo sobre a Linha da Beira Alta» (PDF)